Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 Artigo Científico Aspectos cognitivos da percepção na propaganda Cognitive aspects of advertising perception Leandro Leonardo Batista, Carla Daniela Rabelo Rodrigues, Janaína Geraldes Brizante e Reginaldo Franchesci Escola de Comunicações e Artes (ECA), Universidade de São Paulo, São Paulo, São Paulo, Brasil Resumo Na percepção de propagandas, pelo menos três processos de influência no indivíduo podem ser considerados: 1) processos derivados do conteúdo explícito da propaganda (informações, personagens, formato de apresentação, entre outros), que intencionalmente ou não, evidenciam para o receptor parâmetros para que ele adote ou abandone comportamentos pela demonstração do valor destes comportamentos; 2) processos resultantes de colocação de propagandas no campo de visão onde não constituem o centro da atenção do indivíduo, sendo as informações captadas de forma não intencional; e 3) processos associados a estímulos captados fora da consciência do indivíduo, os chamados subliminares. Assim, o objetivo principal deste trabalho é apresentar as relações entre a exposição e a influência da propaganda, considerando os níveis automáticos, voluntários e não-conscientes de atenção. © Cien. Cogn. 2008; Vol. 13 (3): 137150. Palavras-chave: influência; propaganda; atenção; percepção; subliminar; comunicação. Abstract In the perception of advertising, at least three influence processes can be considered: 1) derived processes of the explicit content of the ads (information, characters, presentation format, among others), that intentionally or not, suggest to the receiver parameters for him to adopt or abandon behaviors by the demonstration of the value of these behaviors; 2) resulting processes of ads' placement in the vision field where they don't constitute the center of the individual's attention, being the information captured in a non intentional way; and 3) processes where information is captured out of the individual's conscience, called subliminal. Therefore, the main objective of this paper is to present the relationships between the exhibition and the influence of the advertising, considering the automatic, volunteers and noconscious levels of attention. © Cien. Cogn. 2008; Vol. 13 (3): 137-150. Keywords: influence; communication. propaganda; attention; perception; sublimina; 137 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 1. Introdução Os processos de influência na relação da propaganda com o indivíduo podem ser considerados a partir do seu conteúdo explícito, ou seja, as informações, os personagens, o formato de apresentação, entre outros, que intencionalmente ou não, evidenciam para o receptor parâmetros para que ele adote ou abandone comportamentos pela demonstração (visual e/ou verbal) do valor destes comportamentos nas suas relações sociais, como será visto na parte 2 (Influência e risco: intenção e não intenção). No entanto, esta influência pode ocorrer também pela inserção de material publicitário de maneira não obstrutiva, ou seja, pela colocação de propagandas no campo de visão do indivíduo, onde estas não constituem o centro da atenção e, desta maneira, enquanto o interesse por outra atividade prende a atenção do receptor, a informação da propaganda é captada de forma não intencional. Este aspecto será discutido no item 3 (Influência e exposição não-obstrutiva). Uma terceira forma de influência, muito mais polêmica, é aquela associada a estímulos fora da consciência do indivíduo, os chamados subliminares, que longe de produzirem os efeitos mágicos no comportamento apregoados por estudos duvidosos, têm capacidade de influência que é limitada pela consciência do receptor, apresentado no tópico 4 (A percepção subliminar: um caso de atenção e consciência). Desta forma, o objetivo principal deste trabalho é apresentar as relações entre a exposição e a influência da propaganda. 2. Influência e risco: intenção e não intenção Decisões, em geral, são frutos de influências, sejam elas conscientes ou inconscientes, intencionais ou não. A influência é um dos fenômenos habitualmente ocorridos no relacionamento interpessoal e pode induzir o indivíduo a um determinado comportamento. “A enorme soma de dinheiro gasta em propaganda demonstra a confiança na possibilidade de as pessoas serem influenciadas” (Rodrigues et al., 1999: 179). A influência afeta a vida das pessoas contribuindo na formação de valores e está dividida em três linhas gerais: 1. Influência normativa ou utilitária, que ocorre quando indivíduos, buscando conformidade ou recompensa direta, modificam seus comportamentos e suas crenças para atender às expectativas de determinado grupo evitando uma sanção. Essas normas podem influenciar a marca do carro que uma pessoa compra ou a marca da roupa que veste, por exemplo; 2. A influência por identificação ou influência por valores faz o indivíduo aceitar ou internalizar normas, valores, atitudes e comportamentos para suprir sua necessidade de associação psicológica com um grupo. Há uma busca por conselhos e opiniões de outros para tomada de decisões. Um exemplo são os grupos que buscam constantemente informações sobre alimentos saudáveis; 3. A influência informacional, que ocorre quando o indivíduo, ao contato com uma nova situação, encontra dificuldade em tomar uma decisão, precisando de recomendações externas do grupo de referência ou de um especialista com fragmentos de informações potencialmente úteis (Hawkins et al., 2007). A influência informacional ocorre freqüentemente em propagandas de produtos para higiene pessoal, como no caso dos cremes dentais onde aparece um odontólogo endossando, dando credibilidade e, conseqüentemente, autorizando o uso do produto ou marca. 138 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 De maneira geral, as propagandas utilizam todas as formas de influências por meio de recursos como: indicação de um especialista, personagem ou celebridade; grupos positivos de referência; aprovação ou aceitação social, etc. Outro recurso adotado para conquistar o grupo-alvo é a diferenciação dos demais grupos, desse modo os anúncios podem empregar formatos antiéticos, ou mesmo considerados anti-sociais. É comum encontrar em alguns anúncios condutas de sub-representação estereotipada ou representações distorcidas de papéis (gênero, orientação sexual, etnias, faixa etária, renda) e incitação a comportamentos nocivos ou prejudiciais (dirigir de modo irresponsável, violência, consumo de tabaco, consumo excessivo de bebidas alcoólicas e alimentos hipercalóricos). Uma das maiores evidências em pesquisas de influência negativa da propaganda foi a da indústria tabagista, com a marca Camel e seu personagem Joe Camel, onde estudos1 indicaram clara referência ao universo infantil (Neeley e Schumann, 2004) pretendendo uma confirmação atitudinal positiva à marca ou pelo menos ao ato de fumar. Diante de notável apelo e comprovação de efeitos, como o aumento de jovens fumantes2, 3, os órgãos reguladores de vários países, por meio da Organização Mundial de Saúde, resolveram extinguir a publicidade tabagista. Considerações mais atuais, semelhantes e também relacionadas à saúde coletiva, mencionam as propagandas de alimentos não-saudáveis e refrigerantes como influenciadores significativos da obesidade infanto-juvenil e adulta (Hawkes, 2006). Discutem ainda as propagandas de bebidas alcoólicas como motivadoras de dependência e condutas sociais nocivas, como violência e risco de dirigir em alta velocidade (Pinsky e Pavarino Filho, 2007). Ainda dentro dos fenômenos atuais levantados estão as propagandas de medicamentos ou produtos farmacêuticos sem exigência de prescrição médica, em relação às quais existem representações em órgãos legislativos para seu banimento devido a problemas decorrentes da automedicação. Esses são exemplos de influências negativas que, aparentemente, acontecem como efeitos colaterais em campanhas cuja intenção era apenas aumentar a participação das marcas no mercado. Dessa forma, nota-se que alguns produtos legais e anunciados dentro das normas legais têm o potencial de causar influências negativas na sociedade por causa do impacto causado pelo seu conteúdo ilustrativo (ex. Joe Camel). Assim, como em outros países, no Brasil o papel da propaganda na sociedade ganha destaque em discussões no âmbito da saúde coletiva, onde são pesquisados os fatores de influência social em campanhas publicitárias, mais especificamente fatores propulsores de comportamentos de risco com efeitos prejudiciais à saúde, ou na busca de modificação de comportamento buscando uma vida mais saudável e segura. No entanto, do mesmo modo que pode influenciar e gerar efeitos negativos (anúncios de medicamentos, fast food, produtos tóxicos, bebidas alcoólicas), a propaganda pode influenciar em efeitos benéficos aumentando a percepção de risco acerca do produto ou serviço anunciado. Risco percebido representa as apreensões do consumidor quanto às questões de seu comportamento. As conseqüências de um comportamento adotado podem ser boas ou más com grau de valor diferente para cada indivíduo, dependendo de suas crenças (Bettman, 1973). Dowling (1986) define risco percebido tendo como base a avaliação dos possíveis resultados negativos e da probabilidade de que esses resultados ocorram, partindo inicialmente da percepção que o receptor tem da negatividade da seqüência de suas ações. A percepção de risco influencia a motivação do receptor em buscar informações sobre o produto, serviço ou tema, e esse aprendizado pode reduzir a exposição aos riscos. Daí deriva a possibilidade de considerar a comunicação como um fator preponderante pelo caráter originariamente informativo. Os efeitos ocasionados pela influência da propaganda são classificados por Leiss (apud Pinsky e Pavarino Filho, 2007) em efeitos intencionados e efeitos não-intencionados, 139 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 onde o primeiro grupo resulta de metas empresariais definidas e claras, e o segundo enquadrase no que supostamente não foi planejado, mas que gerou conseqüência. De forma a coadjuvar o monitoramento de mídia, faz-se imprescindível a averiguação desses efeitos para então sugerir a prática de novas categorias restritivas nos órgãos reguladores competentes ou implementação da comunicação de risco efetiva baseada em estudos empíricos objetivando esclarecimento ou aprendizado social. Uma das formas mais óbvias na utilização de mecanismos para controlar a exposição de riscos de um produto na propaganda é o uso da advertência (disclaimer no original em inglês; Stutts e Hunnicutt, 1987) que evita que o anúncio seja interpretado como decepcionante ou enganoso, apresentando informações sobre seu uso. O objetivo da advertência é o esclarecimento de algo que possivelmente não tenha ficado claro no anúncio ou permita interpretações diferentes da intenção do anunciante. Um dos diversos formatos de advertência é a frase ‘ao persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado’, uma advertência determinada pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para figurar em anúncios de medicamentos demonstrando a possibilidade do problema não ser resolvido com o uso do produto. Outro exemplo de advertência associada à comunicação de risco está relacionado a outra decisão da ANVISA4, em 2005, sobre os produtos alimentícios que usam em suas informações de rotulagem e/ou material publicitário, alegações de propriedade funcional e/ou de saúde. Ela delimitou que esses produtos devem obrigatoriamente associar à informação nutricional a seguinte advertência: ‘Seu consumo deve estar associado a uma dieta equilibrada e hábitos de vida saudáveis’. No entanto, o uso de advertência não garante o entendimento do receptor, com relação ao risco embutido nestas propagandas. Retomando a advertência proposta pela ANVISA (‘ao persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado’), um efeito nãointencionado pode ser a sugestão de que vale a pena tentar a automedicação para posteriormente, procurar um médico, o que não deve ser o propósito da advertência. Outro efeito não intencionado pode estar presente nos anúncios de cigarros em pontos de venda (único local permitido pela lei atual), mostrando modelos sorrindo e com lindos dentes à mostra, enquanto ao lado desta imagem encontra-se a advertência de que fumar faz mal aos dentes. Segundo Rangel-S (2007), uma comunicação eficaz deve contemplar as contradições e conflitos entre as partes envolvidas, produzindo um discurso ideológico eficaz no controle dos riscos dentro da diversidade das audiências no campo de influência. Assim, o controle dos riscos ganha possibilidade principalmente com a competência comunicativa social para lançar estratégias de controle de riscos à saúde. Os apontamentos teóricos discutidos por Rangel-S (id. ibidem) acrescentam informações em que, para subjugar obstáculos de comunicação, os pensadores da comunicação de risco, com respaldo da psicologia social, têm em conta que numa situação crítica, com nível de preocupação elevado, pessoas “processam apenas 20% das informações recebidas, em uma espécie de paralisação cognitiva”. E afirma que essa ocorrência seria aperfeiçoada caso houvesse “entendimento e manejo de fatores que afetam a percepção de riscos e os níveis de confiança e credibilidade” (id. ibidem: 1379). Assim, a relação comunicação e risco é entendida como um fluxo explicativo ou comunicativo de informações sobre saúde, segurança e risco. Desta forma, talvez mais eficaz como comunicação de risco sejam as campanhas de saúde sobre determinados comportamentos sociais, onde são traçadas as intenções de esclarecimentos, por meio da influência da propaganda direta, para gerar efeitos saudáveis. Uma campanha informativa sobre a dengue, por exemplo, deve ser elaborada e transmitida com linguagem clara e apropriada ao público-alvo, demonstrando a importância das ações individuais nos resultados coletivos5. Mas é importante também que 140 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 sejam considerados os efeitos não intencionais presentes em outras campanhas, que salientem positivamente, por exemplo, o foco em comportamentos individuais. 3. Influência e exposição não-obstrutiva Ao longo da história dos estudos de percepção, pesquisadores se dedicam a explorar como se dá no ser humano a percepção visual em cenas complexas (a partir da modulação da atenção e da memória), onde o número de estímulos distratores abunda no ambiente no qual o observador se encontra (Henderson e Hollingworth, 2002). Alguns utilizam para isso registros eletrofisiológicos6 (como o eletroencefalogra, EEG), outros aparelhagem específica (como eye trackers7), outros questionários e/ou escalas (Turley e Shannon, 2000). Alguns reproduzem em laboratório a cena visual estudada (Hollingworth e Henderson, 2002; Irwin, 1991; e Rensink, 2000), outros realizam pesquisas em campo, na situação “real” em que a cena ocorre. Principalmente nesse último caso, estudam-se também efeitos de anúncios (presentes nessas cenas) no comportamento de compra dos observadores. Um exemplo é o estudo realizado por Turley e Shannon (2000), em estádio de basquete durante toda uma temporada, nos EUA. Os pesquisadores avaliaram o impacto de anúncios presentes no estádio, através da taxa de recall8 e influência em intenção e comportamento de compra de uma amostra de torcedores. Segundo eles, a taxa média de recall entre os respondentes foi de 2,68, indicando que os torcedores não processaram muitos anúncios presentes no estádio, já que a média de anúncios por dia de jogo era de 45. Além disso, quanto maior foi a freqüência de exposição, maiores taxas de recall de anúncios, e possível influência em intenção e comportamento de compra. Assim, a vantagem é que, se os distratores são numerosos, é também generoso o tempo em que os potenciais consumidores ficam expostos ao anúncio. De fato, diversas pesquisas9 que estudaram efeitos de anúncios em arenas de esporte tendem a indicar que esses anúncios têm ao menos algum impacto nos fãs presentes nos jogos. Oito anos após a pesquisa de Turley and Shannon, depara-se com a necessidade de um estudo diferente. Ao invés de se estudar o impacto de anúncios presentes em estádios de basquete, é mais relevante explorar esse impacto em estádios de futebol, esporte mais popular (logo, com mais espectadores) não só no Brasil, mas em praticamente todo o mundo. Ampliando-se o foco para considerar as placas eletrônicas (animadas/digitais) que rodeiam o campo e nas quais o anúncio está presente, em movimento. Além disso, um efeito mais abrangente implica em usar como amostra do estudo o espectador de TV, eliminando-se boa parte dos distratores presentes no campo (diminuindo possíveis variáveis secundárias), e considerando um público muito maior, já que o jogo transmitido pela TV é assistido por mais pessoas do que as presentes no estádio. As diferenças básicas entre os dois estudos se resumem na tabela 1. Frente a essa situação de estudo, acredita-se que haveria diferenças importantes entre este e aquele realizado por Turley and Shannon (2000). Primeira, placas em movimento poderiam captar atenção automática do observador, favorecendo a percepção do anúncio (o que poderia ocorrer várias vezes ao longo do jogo, podendo levar a uma espécie de “repetição” mental, aumentando a chance do conteúdo fazer parte da memória de longa duração)10. Aspectos centrais da noção cotidiana que se tem de atenção envolvem basicamente a idéia de seletividade (algumas coisas “chamam” mais a atenção do que outras, logo são mais atendidas), capacidade limitada (apenas parte dos estímulos que se tem contato são “realmente” percebidos) e esforço (algumas atividades exigem que haja grande esforço para nelas “manter-se” a atenção, outras não – Scholl, 2001; Reisberg, 1997). Resumidamente, atenção é uma atividade neural que facilita o processamento de determinados estímulos em detrimento de outros: atender é intensificar a atividade 141 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 neurofisiológica de algo que se está presenciando pela primeira vez, ou de algo que já está na memória (a partir de Kandel et al., 2003; Lent, 2001; e Helene e Xavier, 2003, entre outros). Mas o indivíduo precisa que essa atividade seja modulada. Algumas tarefas que executa demandam manter a atenção alocada a elas durante todo o período de sua duração, e nesse ínterim outros estímulos irrelevantes devem ser ignorados. Porém, existem estímulos que, apesar de não pertencerem à tarefa em curso, não devem ser ignorados. O problema crítico do sistema de atenção é justamente esse: a necessidade de engajamento atencional continuado contra a necessidade de sua interrupção (Nahas e Xavier, 2004). Para lidar com esta necessidade, o sistema funciona de tal forma que as características da tarefa parecem levar a diferentes “modulações” atencionais11. Processos controlados seriam flexíveis e versáteis, mas funcionariam de forma serial e relativamente lenta. Já os automáticos ocorreriam de maneira rápida e em paralelo, porém com ausência de flexibilidade (Eysenck e Keanne, 1994). Estes podem ocorrer concomitantemente a outros processamentos sem sofrerem interferência significativa, e ser desencadeados inesperadamente pelo ambiente, sem que inicialmente a atenção do indivíduo estivesse direcionada ao estímulo. Isso poderia ocorrer com o espectador de TV que teria sua atenção automaticamente captada pelo anúncio em movimento na beirada do campo. Interessante notar que alguns autores consideram que o sistema que controla ação seria o mesmo que controla a atenção espacial (Rizzolatti e Craighero, 1998)12. ESTÁDIO – BASQUETE (Turkey e Shannon, 2000) Consumidor no estádio (presencial). Placas fixas. Mais distratores (outros torcedores, conversas, gritos, vendedores, luzes). Exposição contínua (observador permanece ligado ao jogo, geralmente, até que este acabe). Foco de atenção vai mais rápido de um lado ao outro do estádio. Jogo é muito dinâmico, mas tem intervalos (exige alto foco atencional enquanto o jogo corre, porém oferece paradas). ESTÁDIO – FUTEBOL (ESTUDO PROPOSTO) Consumidor assistindo jogo pela TV (nãopresencial). Placas animadas (eletrônicas/digitais). Menos distratores (observador pode até estar sozinho). Exposição possivelmente descontínua (observador pode se ausentar totalmente do jogo a qualquer momento). Foco de atenção vai lentamente de um lado ao outro do estádio. Jogo é lento e tem poucas paradas (exige foco atencional relativamente menor enquanto o jogo corre, porém não oferece muitos intervalos). O campo de jogo é relativamente pequeno O campo de jogo é grande (até120mx90m). (28mx15m). Tabela 1 - Comparação entre características do estudo realizado por Turvey e Shannon (2000) e os efeitos visualizados neste trabalho. Material obtido no endereço eletrônico http://www.inmetro.gov.br em 09/05/2008. Segunda diferença: menos distratores competindo pela atenção do observador poderia favorecer a percepção do anúncio, e a posterior manutenção da atenção para ele. Isso porque o processamento de estímulos conta com mais ou menos prioridade dependendo da atividade que o indivíduo desempenha no momento (Rizzolatti e Craighero, 1998). O engajamento em certas atividades parece pré-ativar redes de modo que seu processamento passe a ter prioridade nos sistemas atencionais. Assim, a modulação da atenção dependeria também do contexto no qual o organismo de insere. Assistir a um jogo de futebol no estádio 142 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 pré-ativaria sub-rotinas bastante diferentes daquelas ativadas em um indivíduo que assiste um jogo com dois ou três companheiros, ou mesmo sozinho, em sua casa. Terceira, o sistema atencional do espectador da TV estaria menos sobrecarregado, tanto pela natureza do jogo (em comparação com o basquete) quanto pela quantidade de estímulos concorrentes. Um jogo mais lento poderia favorecer o ‘passeio’ visual da atenção pelo campo e seu entorno, sem grandes perdas do andamento do jogo, favorecendo percepção dos anúncios ao redor do campo. De acordo com a linha de pesquisa sobre atenção visual defendida por Lavie (1995)13, por exemplo, o estágio da seleção depende da “carga” de processamento da primeira tarefa (quanto mais difícil a tarefa, maior seria a carga). Este autor mostrou que a resposta neural para um estímulo irrelevante em movimento foi mais fraca quando a tarefa em prática era difícil do que quando era fácil. Esse resultado pode sugerir que quanto mais a atenção está alocada para uma tarefa, mais tempo leva para ser direcionada para outros estímulos. A atenção pode diretamente afetar a representação de aspectos visuais específicos (não só movimento, mas também cor e forma – Kanwisher e Wojciulik, 2000; Gordon, 2004). Ela seria central para a construção de toda a experiência visual que compõe o ato de assistir a um jogo. Assim, o sistema atencional do observador em um jogo de basquete estaria mais sobrecarregado do que em um jogo de futebol, já que aquele é mais dinâmico do que este (além de todos os outros motivos, também pelo tamanho do campo em que os jogadores se deslocam). Além disso, o torcedor em um estádio teria sua atenção mais sobrecarregada do que quando o jogo é assistido pela TV (pela maior quantidade de estímulos concorrentes), dificultando o deslocamento da atenção para outros estímulos (como os anúncios). De fato, estudos com anúncios em quadras de basquete e futebol de universidades mostram que torcedores dos jogos de basquete apresentaram maiores níveis de reconhecimento de anúncios do que torcedores de futebol, porém mais torcedores de futebol declararam ter notado anúncios nos jogos que assistiram14. Isto talvez ocorra porque, apesar do jogo de basquete ser mais dinâmico, o tamanho do campo é bem menor do que o campo de futebol. O número de sacadas e fixações em um mesmo ponto da cena é maior (já que há um menor espaço físico a ser “escaneado” durante o jogo, um mesmo local é “escaneado” mais vezes). Um resultado seria maior freqüência de exposição a um mesmo estímulo, o que comprovadamente aumenta taxas de reconhecimento e recall. Assim, torcedores do jogo de basquete teriam maiores taxas do que os de futebol. Da mesma forma, como o campo de futebol é bem maior do que o de basquete, talvez um número maior de anúncios estivesse presente naquele campo, ajudando a explicar as maiores taxas de declaração de notabilidade de anúncios no campo15. Assim, se por um lado no jogo de basquete a atenção exigida nos lances é maior, por outro o campo de jogo é menor. No futebol, o contrário – lances mais lentos exigem atenção menos sobrecarregada (favorecendo “passeio” visual pela cena sem perda de lance), porém o campo de jogo é maior (número de vezes que se volta a atenção para um determinado anúncio é menor). Resta saber quais seriam as implicações destas diferenças. Sabe-se que a maior parte das múltiplas cores, formatos e movimentos que populam o campo visual dos indivíduos não perduram na memória. A natureza seletiva da percepção de cenas impõe um forte limite à sua reconstrução perceptual (Hollingworth e Henderson, 2002). Acredita-se que a distribuição da atenção visual comande qual informação visual de uma cena complexa é representada (Irwin, 1991). Hollingworth e Henderson (2002) propuseram que uma representação relativamente detalhada da cena visual é construída conforme os olhos e a atenção são dirigidos para suas múltiplas regiões. Quando se assiste a um jogo, por exemplo, os olhos se movem pela cena visual, porém, durante o movimento ocular (entre uma fixação e outra), a percepção visual é suspensa16. Assim, os movimentos oculares dividem a percepção da cena em uma série de episódios perceptuais discretos (fixações) pontuados por breves 143 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 períodos de “cegueira” resultantes da supressão sacádica12. Não se sabe como ocorre a junção das informações, mas este seria o processo que resultaria (somado a outros) em notar um jogo a que se assiste, e todos os elementos a ele ligados. Assim, a percepção do que está sendo visto muda conforme o objetivo/intenção do observador se altera, ou conforme sua atenção se altera (Zigmond et al., 1999). Uma vez que percepção depende de memória e memória é modulada e modula atenção, todos esses fenômenos estão em íntima relação, funcionando juntos. 4. A percepção subliminar: um caso de atenção e consciência As pesquisas acima salientam a importância de considerar os efeitos da exposição à propaganda levando em consideração conteúdos explícitos e implícitos, mas sempre ao alcance consciente do indivíduo. Nesta parte discutiremos efeitos relacionados a estímulos abaixo do limiar da percepção consciente do indivíduo. 4.1. Atenção e percepção subliminar Embora as primeiras experiências sobre esse assunto datem do final do século XIX, elas só assumiram um caráter realmente científico da década de 80 do século passado; a partir daí, os experimentos passaram a embasar uns aos outros, freqüentemente atingindo resultados similares, mas com olhares diferentes, o que ajudou a construir um cenário sólido para essa área de pesquisa. A fim de que se possam compreender melhor os experimentos, explica-se três termos muito citados nesses estudos: Skin Conductance Response (SCR), Magnetic Resonance Imaging (MRI) e “pré-ativação”, algumas vezes chamadas pelo termo em inglês prime. SCR é a sigla em inglês para Resposta de Condutância da Pele, tratando-se de um aumento da condutância elétrica da pele em situações específicas, como estresse, reconhecimento de objetos ou pessoas conhecidas, prazer, etc. A cada momento em que uma pessoa tem seu estado emocional alterado por algum motivo, a SCR se altera; embora possa ser detectada somente com sensores aplicados diretamente à pele, a SCR é um bom indicador de que algum estímulo foi percebido pelo receptor, mesmo que de forma inconsciente. MRI é o que chamamos de Ressonância Magnética, um exame feito utilizando as propriedades de excitação dos átomos em um tecido num campo magnético, a fim de gerar uma imagem da área analisada. Esse método é utilizado em medicina para avaliar eventuais danos em áreas internas no corpo com grande precisão, e também para analisar a atividade cerebral. Finalmente, a pré-ativação é um estímulo inicial que irá desencadear alguma resposta, consciente ou não, a qual poderá ser medida de várias formas, incluindo a SCR. Embora préativações possam ocorrer de várias formas, em laboratório são utilizadas especificamente para despertar certas reações nos indivíduos estudados. Quando se imagina um estudo sobre percepção subliminar, a maneira mais imediata de realizá-lo é apresentar um estímulo abaixo do limiar de percepção de um indivíduo e medir sua reação relacionada ao conteúdo do estímulo. Foi esse o princípio usado na experiência de Cheesman e Merrikle (1984), bastante comentada por estudiosos da área de comunicação e percepção. Nesse estudo, os pesquisadores apresentavam numa tela o nome de uma cor qualquer (azul, rosa, etc) e em seguida apresentavam uma cor efetivamente, ambos por curtíssimos tempos de exposição; em seguida, apresentavam um quadro só contendo ruídos de imagem (chamado “máscara”). Após terem mostrado todos os quadros, os pesquisadores perguntavam às pessoas quais as palavras e cores que tinham visto, bem como o grau de certeza da resposta; como o prime (no caso, as palavras e cores) aparecia por muito pouco 144 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 tempo na tela, a maioria dos pesquisados afirmava não ter certeza alguma da resposta dada, e diziam estar apenas “chutando”. Após catalogar e compilar todas as respostas, os pesquisadores notaram que o percentual de acerto era algo em torno de 66%, mesmo entre os que afirmavam não ter idéia da cor ou da palavra que tinham visto; esse foi um resultado extremamente curioso, já que a chance esperada de acerto girava em torno de 25%. Assim, o experimento mostrou que, mesmo sem ter consciência do fato, os indivíduos perceberam os estímulos e souberam identificá-los, o que era um forte indício de percepção subliminar. Esse estudo, embora simples, acabou servindo de referência para outros efetuados posteriormente. O fato de ter conseguido boas evidências de que existe efetivamente uma percepção subliminar, mas não ter provado exatamente como ela age, despertou a curiosidade de pesquisadores, como por exemplo, a experiência de Davenport e Potter, (2003), quase 20 anos depois da experiência citada anteriormente. Seguindo uma premissa semelhante, esse trabalho procurou avaliar de que forma os cenários afetam a percepção das figuras em primeiro plano. Nessa experiência, os voluntários pesquisados deveriam observar figuras com planos de fundo consistentes e inconsistentes. Por exemplo: jogador de futebol americano num estádio (consistente), padre num campo de futebol (inconsistente), zebra na savana (consistente), etc. Os testes eram feitos com vários grupos de pessoas, sendo que um dos grupos deveria identificar qual a figura em primeiro plano, o outro grupo deveria identificar só o plano de fundo, um outro grupo deveria identificar os dois (fundo e figura) e, por fim, um quarto grupo veria apenas fundo (sem figuras) e deveria identificá-los. Os quadros eram apresentados em frações de segundo (precisamente por 80 ms), mas dessa vez os entrevistados não precisariam declarar seu grau de certeza na resposta. Na análise dos resultados, Davenport e Potter (2003) perceberam que as figuras eram identificadas com mais dificuldade em cenários inconsistentes (por exemplo, menos pessoas conseguiram identificar o padre no estádio, quando comparado com o quadro do padre na igreja). Da mesma forma, cenários sozinhos ou com figuras consistentes eram identificados com mais facilidade do que aqueles acompanhados de figuras inconsistentes. Isso, na prática, mostrou que estímulos subliminares não só são percebidos, como também são afetados por detalhes, como o contexto. É interessante perceber que, embora os motivos dos dois experimentos sejam diferentes – o de Cheesman e Merrikle (1984) buscava puramente evidenciar a percepção subliminar, e o de Davenport e Potter (2003) queria demonstrar como a percepção de fundos acontecia mesmo em situações subliminares), ambos apresentam evidências sólidas de que existe efetivamente uma percepção abaixo do limite da consciência, que pode, inclusive, reconhecer detalhes, diferenciar planos, etc. 4.2. Influência subliminar Com base nos estudos apresentados que representam parcialmente o conhecimento na área, é possível imaginar que as mensagens subliminares têm realmente uma capacidade de influenciar a decisão de uma pessoa a respeito de comportamento, compra, etc., já que o indivíduo é capaz de reconhecer as mensagens e perceber até mesmo detalhes. Estariam os alarmistas certos ao dizer que certas músicas, jogos, parques de diversões e filmes contém mensagens capazes de alterar drasticamente a opinião ou o comportamento dos indivíduos? Uma boa pista foi dada pela experiência de Van Den Hout e colaboradores (2000). A exemplo do caso de Davenport e Potter (2003), este trabalho buscava respostas para um outro fenômeno, e acabou trazendo informações valiosas também para o estudo da percepção subliminar como um todo. A proposta deles era analisar a teoria de Öhman e 145 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 Soares (1994), que definia que a reação de uma pessoa a uma imagem era ligada à percepção da imagem em si; Jong e seus colegas acreditavam que a percepção não era ligada a imagem, mas sim ao significado dela para cada pessoa. Por isso, resolveram fazer um estudo envolvendo fobias e palavras relacionadas a elas. Reunindo homens e mulheres com aracnofobia comprovada, os pesquisadores apresentavam um prime relacionado à fobia, e alternavam com palavras gerais de violência e palavras neutras (todas apresentadas por apenas 20ms); assim, o indivíduo poderia ver a palavra “aranha”, e em seguida ver “batata”, e por fim ver “assassinato” (palavra fóbica, neutra e violenta, respectivamente). As palavras eram apresentadas com e depois sem máscaras, e o resultado da percepção era medido segundo as SCR. Como era de se esperar, a percepção subliminar foi novamente evidenciada pelo estudo; esse, contudo, trouxe algo a mais. Verificando as SCRs dos indivíduos, pode-se notar que eles não tinham quase reações ao serem expostos às palavras neutras, mas apresentavam reações um pouco mais pronunciadas quando expostos a palavras violentas. E, quando analisando as reações às palavras fóbicas, constataram que as SCRs eram ainda mais ressaltadas em relação às demais situações. Para completar, as palavras cobertas com máscaras não apresentavam variação significativa de SCR. Note-se que os indivíduos declaravam não identificar nenhuma imagem apresentada. Ora, sabendo que a combinação de letras por si só não causa fobia (as letras “a-r-a-nh-a”, sozinhas, não são um prime fóbico), e levando em conta que houve SCR variando de acordo com a palavra apresentada, chega-se à conclusão que as pessoas efetivamente extraiam um significado de forma subliminar de cada palavra apresentada. Apesar disso, os indivíduos não apresentavam nenhuma reação consciente ao prime, muito embora ele fosse inconscientemente registrado e percebido pelas SCR. Isso é um argumento muito eloqüente contra a idéia de que mensagens subliminares podem causar reações nas pessoas sem que elas percebam; independente de haver ou não mensagens escondidas em diversos meios, a recepção das mesmas causará, no máximo, uma reação inconsciente, que não afetará o indivíduo, mesmo em casos extremos, como o de fobias. Assim, a experiência de Van Den Hout e colaboradores (2000) apresenta um ponto de vista novo e bastante decisivo contra a idéia popular das mensagens subliminares, além de complementar a experiência de Davenport e Potter e mostrar que, além de detalhes, é possível perceber significados de maneira subliminar (e, ao contrário do que sugeria a teoria de Öhman e Soares (1994), notou-se que a reação do indivíduo não é ligada à imagem, mas sim ao significado carregado pelo estímulo). Para finalizar essa discussão, é interessante mostrar mais um recente estudo sobre as pesquisas de percepção subliminar; o Dr. Bahador Bahrami e sua equipe realizaram um experimento muito similar aos descritos anteriormente, obtendo resultados compatíveis com os mesmos, com duas diferenças: primeiro, eles utilizaram o MRI para medir as respostas, ao invés das medições de SCR, por ser um método mais preciso, além de permitir ver quais áreas do cérebro são ativadas com cada estímulo. Segundo, eles não apenas apresentaram estímulos subliminares, mas o fizeram num contexto em que o indivíduo estaria engajado em outra atividade. A idéia do experimento era avaliar o quanto a concentração era relevante na recepção de estímulos subconscientes; como resultado, Bahrami e colaboradores (2007) perceberam que os estímulos dados durante as tarefas fáceis eram registrados no cérebro, enquanto aqueles emitidos nas tarefas difíceis simplesmente eram ignorados. Assim, eles puderam perceber que, por mais direto que seja o contato de uma mensagem subliminar com o indivíduo, ela ainda estará sujeita à atenção que o mesmo dispensa à fonte dessa mensagem. 146 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 Com base nestes estudos científicos, podemos considerar que estímulos subliminares são percebidos e avaliados pelo indivíduo de forma inconsciente, sofrem efeitos de contexto (figura-fundo), dependem de disponibilidade de atenção, mas são incapazes de iniciar um comportamento mesmo que relacionado com fobias do receptor. 5. Considerações finais Nos estudos sobre a influência da propaganda no comportamento do receptor, é muito importante que sejam considerados aspectos diretamente ligados a atenção dada aos conteúdos de sua mensagem, ou seja, a intenção clara do emissor. Por outro lado, devemos considerar também os aspectos que por não serem centrais à mensagem passam desapercebidos aos órgãos reguladores, mas acabam por exercer influência nos receptores. Assim, uma advertência em uma propaganda de cigarros sobre os males do cigarro nos dentes do fumante pode ser enfraquecida pela atenção dada ao lindo sorriso do modelo usado na propaganda, causando efeitos intencionais e ou não intencionais e enfraquecendo a capacidade da advertência. A influência da propaganda pode ser observada ainda em situações onde a propaganda não é o fator de atratividade principal para o receptor, como em arenas esportivas. Mas, ainda assim, a propaganda pode ser efetiva, principalmente se combinada com as características do estímulo principal (por exemplo, movimento) causando efeitos na memória e no comportamento de compra dos receptores de forma não obstrutiva, portanto com pouca resistência destes. Complementando estas observações, temos que consciência do estímulo se torna fator preponderante em alterar comportamentos. Ou seja, embora o indivíduo tenha capacidade de absorver informação de estímulos abaixo do seu limiar de percepção, essa capacidade não é suficiente para desencadear alterações de comportamento, como no caso dos indivíduos com fobia a aranhas expostos a estímulos subliminares a elas relacionados. Assim, temos que a relação entre atenção e influência dos comerciais deve considerar no mínimo três níveis: a atenção voluntária, a automática e a percepção não consciente. 6. Referências bibliográficas Arnetta. J.J. e Terhanianb, G. (1998). 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Desses, estima-se que 1,2 milhão morrerá por doenças relacionadas ao fumo. O estudo, intitulado Sharing the blame: smoking experimentation and future smoking attributable mortality due to Joe Camel and Marlboro avertising promotions, chega a apontar quantas dessas mortes estarão associadas a marcas específicas de cigarro". As autoras expõem ainda outro estudo realizado em Hong Kong (cidade com grave problema de saúde pública devido ao consumo de tabaco por jovens) entre estudantes de 12 a 15 anos e que analisou a relação entre o hábito de fumar e uma série de fatores, entre eles a propaganda de tabaco. Os autores do trabalho, publicado no American Journal of Preventive Medicine, concluíram que a propaganda contribui efetivamente para o envolvimento dos estudantes com os cigarros, e propõem a proibição de toda e qualquer forma de publicidade por parte da indústria do tabaco. (3) Para aprofundamento no tema: Arnetta e Terhanianb (1998) e Pierce e colaboradores (1998). (4) Disponível em http://www.anvisa.gov.br/alimentos/comissoes/tecno_lista_alega.htm, acessado em 20/05/08. 149 Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (3): 137-150 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição Submetido em 12/06/2008 | Revisado em 31/10/2008 | Aceito em 06/11/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 10 de dezembro de 2008 (5) O tema remete à teoria do dilema social. Para mais informações, consultar: Ostrom, E (1998). A Behavioral aproach to the racional choice theory of collective action: presidential address, American political science association, 1997. Am. Political Sci. Rev., 92 (1), 1-22. (6) Registros eletrofisiológicos são feitos a partir da medição, realizada através eletrodos situados muito próximos à membrana celular, de sinais elétricos dessas células. Para saber mais: Kandel e colaboradores (2003). (7) Dispositivo utilizado para medição da posição e movimento ocular na observação visual (como nos estudos realizados por Hollingworth e Henderson, 2002). (8) Recall é uma medida de lembrança bastante usada para medir efeitos da propaganda na memória do receptor. (9) Como: Cunneen e Hannan (1993), Shilbury e Berriman (1996) e Stotlar e Johnson (1989), citados em Turley e Shannon (2000). (10) Sabe-se que movimentos rápidos de cenas visuais são processados pela via magno, compostas de neurônios mielinizados, transmitindo informações rapidamente para os centros de processamento visuais do cérebro (cor e forma, por outro lado, são processados pela via parvo, mais lenta do que a magno) – Kandel (2003) (11) Shiffrin e Schneider (1977), citados em Nahas e Xavier (2004). (12) Esta teoria é chamada de teoria pré-motora da atenção seletiva espacial, proposta por Rizzolatti e Craighero (1998). Esta teoria defende que a atenção seria controlada por centros óculos-motores e por redes neurais relacionadas a movimentos corpóreos. (13) Lavie, N. (1995) Perceptual load as a necessary condition for selective attention. J. Exp. Psychol. Hum. Percept. Perform., 21, 451–468, apud Kanwisher e Wojciulik (2000). (14) Stotlar e Johnson (1989), citados em Turley e Shannon (2000). (10) Sabe-se, por exemplo, que informações globais da cena tornam-se disponíveis mais rapidamente do que informações locais específicas (Gordon, 2004). (15) Por isso a imagem não “borra”, nem “corre” o texto que se está lendo. (16) Essa visão é consistente com a abordagem de teorias que enfatizam a natureza construtiva da memória operacional (Baddeley, 1974). Pesquisas também sugerem que a orientação espacial da atenção é uma parte necessária da memória operacional, mais do que meramente um fenômeno correlacionado a ela (Awh e Jonides, 2001). - L.L. Batista é Mestre em Propaganda (University of North Carolina) e Doutor em Comunicação Social (University of North Carolina). Atua como Professor na ECA-USP. Email para correspondência: [email protected]. 150