o impacto da crise econômico-financeira de 2008

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O IMPACTO DA CRISE ECONÔMICO-FINANCEIRA DE 2008-2009 NAS
RELAÇÕES ECONÔMICAS DO BRASIL COM A CHINA
LEILA BARBOSA DE OLIVEIRA NETA
Resumo:Este trabalho questiona qual foi o impacto da crise de 2008 nas relações
econômicas entre Brasil e China.Parte-se da hipótese de queessa última resultou em
uma intensificação ainda maior dessas relações e em um aumentoda dependência
brasileira em relação à exportação de produtos primários para a China. Analisando-se as
políticas econômicas e diplomáticas do governo brasileiro desde o início da década de
1990, percebe-se que esses dois fenômenos iniciaram com a abertura econômica
brasileira nessa época. Logo, o aumento da dependência brasileira de exportação de
primários para a China no período pós-crise foi uma mudança importante e faz parte de
um processo que já dura cerca de duas décadas.
Palavras-chave: Brasil – China -Relações comerciais.Crise econômica.Brasil – China –
Dependênciaeconômica.PolíticaExterna.
Abstract:This work questions what was the impact of the 2008 crisis in the economic
relations between Brazil and China. Considering the hypothesis that the latter resulted in
the further intensification of these relations and an increase in Brazilian dependence on
primary commodity exports to China. Analyzing the economic and diplomatic policies
of the Brazilian government since the early 1990s, one realizes that these two
phenomena started with Brazilian economic openness that time. Therefore, the increase
in Brazilian dependence on exports of primary products to China in the post-crisis
period was an important change and is part of a process that has lasted nearly two
decades.
Key-words:Brazil - China - Trade relations. Economic Crisis.Brazil - China Economic Dependence.Foreign Policy.
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1Introdução
Aproveitando o “boom” no mercado imobiliário estadunidense em 2005, as empresas
financeiras desse setor, com a expectativa de valorização nos preços dos imóveis, passaram a
financiar imóveis para clientes “subprime”, que são aqueles que têm dificuldades de comprovar
renda e não têm como dar garantias de pagamento. Isso foi incentivado porque, apesar de
esses clientes representarem maior risco, esse tipo de empréstimo oferecia uma taxa de
retorno mais alta do que os demais. Além disso, na busca de maiores lucros, vários
bancos passaram a comprar os títulos subprime, provocando, assim, uma enorme cadeia
de venda desses títulos (ENTENDA..., 2008).
Porém, a alta dos juros em 2006 encareceu o crédito e a diminuição da demanda
por empréstimos fez o preço dos imóveis cair. Outra consequência do aumento da taxa
de juros foi o aumento da inadimplência e, com ele, o receio de novos calotes,
ocasionando uma desaceleração ainda maior do crédito. Assim, com a quebra de
instituições financeiras, desencadeou-se a crise econômica nos Estados Unidos em
meados de 2007 (ENTENDA..., 2008).
Até o início de 2008, o Brasil estava em ótimo crescimento econômico,
suportando relativamente bem os efeitos da crise internacional graças, principalmente,
às elevadas reservas internacionais e à evolução dos preços de commodities. Tal
crescimento só foi interrompido em setembro de 2008porque, nesse momento, a crise
tomou proporções sistêmicas com a quebra do Banco Lehman Brothers(CASTILHO,
2011).
Alguns dos principais efeitos sobre a economia nacional recaíram sobre o
comércio exterior brasileiro, que foi fortemente afetado pela diminuição da demanda
externa, pela consequente queda dos preços das commodities e pela desvalorização do
câmbio. Nessa área comercial, a crise provocou transformações que se alastraram até o
presente momento. Uma delas foi a redução das exportações destinadas aos países
desenvolvidos, como Estados Unidos e União Europeia; e o aumento das exportações
para mercados em desenvolvimento, como a China (CASTILHO, 2011).
A intensificação das relações comerciais com a China já era uma tendência antes
mesmo do estopim da crise. Isso porque, após a Guerra Fria, o Brasil passou a estabelecer
relações econômicas com a China, devido às estratégias brasileiras de inserção internacional
3
naquele momento. Desde 2000, houve uma crescente intensificação das relações comerciais
entre esses países. A partir de 2002, a China, então, se tornou o principal foco das exportações
brasileiras destinadas ao continente asiático, ultrapassando o Japão. Surpreendentemente, após o
estouro da crise, em 2009, as exportações brasileiras para China ultrapassaram as destinadas aos
Estados Unidos, passando a ser o primeiro parceiro comercial do Brasil (CASTILHO, 2011;
OLIVEIRA, 2006).
As percepções a respeito da intensificação das relações sino-brasileiras variam
muito. Por um lado, existem aqueles que acreditam que as relações econômicas entre
China e Brasil são fundamentalmente complementares, implicando em um efeito
positivo para ambos os países. Deste ponto de vista, a China seria uma alternativa para
promover comércio e investimentos para a economia brasileira. Em contrapartida,
outros estudiosos entendem que essa relação complementar é, na verdade, uma nova
forma de dependência econômica. Eles argumentam que apesar da rápida expansão dos
investimentos chineses gerar benefícios a curto-prazo para ambas as partes, esse tipo de
relação comercial baseada na exportação de produtos primários por parte do Brasil
reforçaria os padrões disfuncionais de desenvolvimento do país e dificultaria o processo
de industrialização (FERCHEN, 2011).
Nesse contexto, o problema de pesquisa do presente trabalho é: Qual foi o
impacto da crise de 2008 nas relações econômicas entre esses países? A fim de
responder a essa pergunta de pesquisa, o presente trabalho pauta-se na hipótese de que a
crise levou a uma intensificação das relações entre esses países e a uma maior
dependência do Brasil em relação à exportação de produtos primários. Para comprovar
as hipóteses, serão analisadas as relações econômicas sino-brasileiras no período
anterior à crise - como eram tais relações - e o seu caráter a partir do ano de 2009 como elas se tornaram.
Ao longo do estudo, percebe-se que a dependência brasileira em relação à China
não é algo totalmente novo, mas é resultado do processo de abertura econômica do
Brasil e da sua aproximação com a China nas últimas duas décadas. Tal pesquisa se
revela pertinente, nesse momento,devido à atualidade do tema e aos efeitos que a crise
causou na economia brasileira e nas relações econômicas entre os seus principais
parceiros comerciais, principalmente com a China.
Para melhor desenvolvimento do objeto de estudo, este artigo será dividido em
quatro partes. A primeira expõe a história da abertura econômica brasileira desde o final
dos anos 1980. A segunda realiza uma breve abordagem histórica das relações bilaterais
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entre Brasil e a China. A terceira busca analisar o impacto da crise de 2008 nas relações
econômicas entre Brasil e China. Já a última parte discorrerá sobre a questão da
dependência do Brasil diante da China no contexto pós-crise 2008-2009.
2 Materiais e métodos
O presente trabalho é resultado de uma pesquisa bibliográfica focada na
problemática do impacto da crise 2008/2009 nas relações econômicas do Brasil com a
China. Metodologicamente, a pesquisa seguiu dois momentos importantes. O primeiro
diz respeito à realização de um levantamento da literatura pertinente e crítica sobre o
assunto (livros, artigos em revistas especializadas, monografias, dissertação de mestrado
ou teses de doutorado, artigos em jornais e revistas, documentos governamentais
constantes nos sites oficiais dos dois países ou expostos em jornais impressos ou
eletrônicos, informações em sites doIPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada,
CEPAL – Comissão Econômica para América Latina e Caribe, FMI - Fundo Monetário
Internacional -, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio –MDIC -,
Ministério das Relações Exteriores - MRE -, etc.).
Inclusive, foram coletados dados econômicos do período pós-2008 dentro de
tabelas e gráficos dispostos, posteriormente, em um banco de dados. Foram utilizadas,
majoritariamente, fontes secundárias. As fontes primárias utilizadas foram dois tratados:
Plano de Ação Conjunta de 2010 e o Plano Decenal de Cooperação de 2012, além dos
dados utilizados na elaboração de alguns gráficos, que foram coletados no Aliceweb e
MDIC. Já o segundo momento consistiu na análise do material bibliográfico pesquisado
e dos indicadores econômicos coletados.
3 Resultados
3.1 Histórico da Abertura Econômica Brasileira
Desde a década de 1930, e, principalmente durante as décadas de 1950 e 1970, o
Brasil passou por um processo de industrialização e urbanização que buscava superar o
modelo primário-exportador (BICHARA et al., 2012). Tal industrialização substitutiva
visava modificar qualitativamente as importações e diversificar a pauta de exportações
brasileiras a fim de diminuir a vulnerabilidade associada à dependência da exportação
de produtos primários. O país alcançou tal objetivo parcialmente, pois entre 1964 a
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1980 sua pauta exportadora se tornou mais diversificada. No entanto, com a crise de
endividamento da década de 1980, o Brasil voltou a se concentrar na exportação
primária, visto que os elevados superávits comerciais desse período tiveram forte
contribuição do setor agrícola que se tornou fundamental para financiar o déficit em
conta corrente (CARDOZO; NASCIMENTO; NASCIMENTO, 2008).
A partir do final da década de 1980, a política de importação do Brasil foi
modificada substancialmente devido ao processo de liberalização comercial. Em 1988, o
governo brasileiro reduziu as alíquotas de importação e retirou algumas proteções
tarifárias da indústria doméstica. Na década seguinte, esse processo foi ainda mais
intenso com o estabelecimento de uma nova Política Industrial e de Comércio Exterior,
que acabou com parte significativa das barreiras não tarifárias e definiu um cronograma
de redução das tarifas de importação (FARIA, 2007).
As exportações brasileiras se concentraram essencialmente em commodities
agrícolas, minerais ou industriais de baixo valor agregado. Em contrapartida, os
produtos manufaturados, principalmente os de elevado conteúdo tecnológico, e de bens
não duráveis de consumo compunham uma parte mínima da pauta de exportações
(FARIA, 2007).
O Plano Real almejava combater a inflação, valorizando a moeda a fim de
incentivar as importações. Dessa maneira, a redução dos preços dos produtos
importados pressionaria para baixo os preços dos produtos nacionais semelhantes. Por
isso, esta nova estratégia governamental gerou graves consequências para a pauta de
exportação brasileira, pois as mercadorias domésticas perderam competitividade no
mercado internacional, estagnando os setores nacionais de exportação (FARIA, 2007).
O principal setor prejudicado por essa abertura comercial foi a indústria. A
insatisfação dos empresários nesse setor ficou clara com a manifestação durante o
primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, organizada pela FIESP - Federação
das Indústrias do Estado de São Paulo - e CNI - Confederação Nacional da Indústria–
para protestar contra a abertura comercial e a elevação das taxas de juros daquele
momento. Devido a essas pressões, o governo brasileiro, apesar de não alterar sua
política geral, passou a criar barreiras à importação de tecidos da China, da Coréia do
Sul e de Formosa e à importação de brinquedos (BOITO JUNIOR, 2007).
Logo, a abertura comercial promovida durante essa década levou a uma maior
especialização produtiva nacional e a uma maior dependência de importações, de forma
que o coeficiente importado elevou-se muito mais em relação ao coeficiente exportado a
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partir de 1994, com o câmbio valorizado. Porém, mesmo com a mudança no regime
cambial, a partir de 1999,a tendência à especialização em produtos primários foi
mantida. Evidência disso é que os setores mais intensivos em tecnologia tiveram um
déficit crescente durante o período de 1990 a 1998, enquanto os setores intensivos em
recursos naturais continuavam a aumentar seu superávit na balança comercial
(CARDOZO; NASCIMENTO; NASCIMENTO, 2008).
Após o período de 1995-1998, caracterizado por elevados déficits na balança
comercial, o governo brasileiro passou a criar algumas barreiras para a liberalização
comercial, através do aumento no valor das tarifas de alguns bens de consumo e
reintrodução de dificuldades administrativas de importação (FARIA, 2007).
No cenário internacional, os anos de 1999 a 2002 foram caracterizados por forte
instabilidade econômica devido à crise asiática de 1997, à crise da bolsa NASDAQ de
2000 eaos atentados terroristas às torres gêmeas do ano de 2001, eventos esses que
desaceleraram o mercado internacional (PINTO, 2010).
Apesar do contexto externo adverso, as contas externas brasileiras melhoraram.
Isso pode ser explicado pela forte desvalorização do real “e a configuração de três novos
eixos para a política econômica, a saber: sistema de meta de inflação, política de
superávits primários elevados e o regime de câmbio flutuante.” (PINTO, 2010, p. 106).
O último fator citado foi o que mais contribuiu para o ajuste externo. Afinal, o processo
de desvalorização da moeda brasileira, que durou até 2003, possibilitou um aumento
significativo das exportações e a recuperação dos saldos negativos da balança comercial
em um cenário externo de reduzido crescimento econômico (PINTO, 2010).
Já em 2004, a tendência de desvalorização do real foi revertidae passou a se
valorizar ano após ano até 2008. E mesmo com a valorização crescente doreal, entre
2003 e 2007, as exportações cresceram bastante e houve uma significativa melhora das
contas externas. Isso ocorreu por causa do aumento do índice geral de preços de
commodities (FARIA, 2007; PINTO, 2010).
O crescimento vigoroso das exportações brasileiras pode ser atribuído
em grande parte aos efeitos da China sobre os produtos primários que
nós exportamos e sobre outros países que exportam produtos
primários para os quais o Brasil vende produtos industrializados,
como muitos dos nossos parceiros comerciais na América Latina.
(CARVALHO, 2009, p. 119).
Durante seu governo, o presidente Lula iniciou uma política de exportação
agressiva focada no agronegócio, nos recursos naturais e nos produtos industriais de
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baixa densidade tecnológica. Dessa forma, o perfil da indústria no Brasil se transformou
- com o crescimento de setores industriais ligados aos recursos naturais, manifestando o
declínio dos setores industriais de produtos de maior tecnologia (BOITO JUNIOR,
2007).
Portanto, nas últimas três décadas, o Brasil permaneceu com suas exportações
especializadas em produtos de baixo valor agregado. E, além disso, tais produtos são os
únicos que contribuem para a geração de saldos positivos da balança comercial
brasileira. Portanto, o Brasil atual intensificou ainda mais uma característica estrutural
econômica, que, para muitos estudiosos seria apenas uma realidade do passado colonial
que teria sido superada pela industrialização substitutiva de importações(CARDOZO;
NASCIMENTO; NASCIMENTO, 2008).
3.2Histórico das Relações Bilaterais entre Brasil e China
Com a Fundação da República Popular da China pelo líder comunista Mao
TséTunge o alinhamento desse país com a URSS, em 1949, o Brasil rompeu relações
diplomáticas com a China continental e reconheceu Taiwan como a legítima
representante do povo chinês. Isso ocorreu no contexto da Guerra Fria, em que o Brasil
estava alinhado com os Estados Unidos, potência líder do bloco capitalista (VILLELA,
2004).
Em maio de 1974, durante o governo do general Ernesto Geisel, o Brasil reatou
relações diplomáticas com a China. Diversos fatores contribuíram para reaproximação
entre esses países. Por um lado, a China diminuiu seu apoio aos movimentos
revolucionários na América Latina. Por outro, Brasil buscava diversificar suas parcerias
internacionais paraaumentar a sua competitividade externa e favorecer seu
desenvolvimento econômico. Por isso, tal aproximação com a China foi incentivada
pelo empresariado nacional, que estava à procura de novos mercados externos. A
reaproximação com a república chinesa também era fundamental para concretizar os
objetivos brasileiros em sua política externa, pois isso contribuiria para atuação do
Brasil nos fóruns multilaterais (BECARD, 2011; LUZ, 2011; OLIVEIRA, 2006;
VILLELA, 2004).
Em 1979, com a assinatura do primeiro Acordo Comercial sino-brasileiro, as
trocas bilaterais entre esses países passaram a evoluir gradualmente. Durante o início da
década de 1980, o Brasil exportava para a China essencialmente produtos
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manufaturados e importava, principalmente, matérias-primas agrícolas, minerais e
metais (BACCHI; MIRANDA; MORTATTI, 2011; BECARD, 2011).
Produtos primários como algodão, açúcar e farelo de soja figuraram
entre os mais exportados para a China naquele momento (50% do
total), enquanto, sobretudo, elementos químicos e farmacêuticos (67%
do total) foram os produtos chineses mais importados pelo Brasil. A
partir de 1978, o petróleo passou a representar mais de 95% dos
produtos importados da China por brasileiros. (BECARD, 2011, p.
33).
No início da década de 1990, com a abertura comercial brasileira e as reformas
econômicas chinesas, houve uma maior inclusão desses países na economia mundial,
intensificando suas trocas comerciais (VILLELA, 2004).Nesse momento, Brasil e China
atuaram juntos em temas de política internacional – por exemplo, na defesa da
reestruturação da Organização das Nações Unidas - e no desenvolvimento de
tecnologias espaciais. Essa aproximação levou os dois países a considerarem a parceria
sino-brasileira como sendo estratégica (BECARD, 2011).
Já a partir do início do século XXI, as relações econômicas sino-brasileiras
aumentaram significativamente como consequência de três fatores:o fim do Plano Real
no Brasil - e extinção da paridade entre real e dólar -;a superação da crise asiática; e o
crescimento econômico chinês que gerava uma forte demanda por produtos primários
(BECARD, 2011).
A produção agrícola chinesa, nesta década (2000-2010), não
conseguiu suprir a sua demanda interna, o mesmo ocorreu com o setor
industrial que se obrigou a importar do Brasil grandes quantidades de
matéria prima para suas indústrias de base. (LUZ, 2011, p.72).
Para Paulino e Pires (2011), a expansão do comércio entre esses países durante
esse período também é reflexo do ingresso da China na OMC em 2001 e da retomada
do crescimento econômico brasileiro após décadas de estagnação.
No ano de 2000, o Brasil obteve um pequeno déficit comercial com a China,
uma vez que o foco de suas relações comerciais ainda eram os Estados Unidos. Porém,
a partir de 2001, o Brasil intensificou suas exportações para a China, conseguindo obter
superávits com este país até 2006. Entretanto, de 2001 a 2003, as exportações brasileiras
para a economia chinesa foram caracterizadas por produtos de baixo conteúdo
tecnológico. Em 2003, as importações de mercadorias chinesas realizadas pelo Brasil
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foram marcadas por produtos manufaturados – equipamentos eletrônicos e químicos e
farmacêuticos (LUZ, 2011).
Assim como nas exportações, a China tem avançando, desde 2001,
como um dos principais países de origem das importações brasileiras.
Os três maiores parceiros – Estados Unidos, Argentina e Alemanha –
têm diminuído suas participações. No caso dos Estados Unidos,
verifica-se uma tendência de queda mais pronunciada. Embora em
valores absolutos o Brasil venha aumentando suas importações dos
Estados Unidos, as compras de produtos oriundos da China têm
crescido a um ritmo muito superior. A rápida ascensão da China como
parceiro comercial do Brasil pode ser verificada pelo grau de
integração da economia brasileira com esse país, vis-à-vis com o resto
do mundo. Utilizando como indicador a corrente de comércio com
cada uma dessas áreas sobre o PIB brasileiro, observa-se que a
integração com a China, ainda que em patamares menores, tem sido
crescente: saiu de 0,5% em 2000 para 2,5 % em 2009, enquanto com o
mundo esse percentual decresceu depois de 2003, de 24% para 17%.
(ACIOLY; CINTRA; PINTO, 2011, p. 24).
Em 2003, presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), como estratégia de
política externa, passou a buscar a diversificação de parcerias com o objetivo de
transformar o país em global trader e player. Assim, em sua agenda internacional, o
Brasil passou a priorizar a procura de mercados em diferentes regiões do globo, se
utilizandodo universalismo como princípio essencial para a política externa brasileira.
Dessa forma, justificou-se a maior aproximação com a China durante esse período
(BECARD, 2011).
Em maio de 2004, o presidente Lula fez uma viagem à China, acordando nove
atos bilaterais e 14 contratos empresariais. O objetivo era demonstrar aos chineses a
relevância estratégica e comercial que o Brasil visava conferir nas relações com a
China. Em novembro daquele mesmo ano, o Presidente Hu Jintao visitou o Brasil para
assinar o “Memorando de Entendimento sobre Cooperação em Matéria de Comércio e
Investimento”, através do qual o Brasil reconheceu a China como economia de
mercado. Nesse mesmo documento, foram especificados diversos acordos nas áreas de
planejamento e infra-estrutura, propondo uma parceria entre esses países. No entanto, o
reconhecimento da China como economia de mercado ainda não foi regulamentado
(ÁRABE NETO; PANZINI, 2011; BARBOSA; MENDES, 2006; BECARD, 2011;
LUZ, 2011).
Tal interesse em estimular relações diplomáticas e econômicas com a China
advém do fato que a ascensão da economia chinesa, ao longo do século XXI, estimulou
a demanda por recursos naturais e, desta forma, contribuiu para melhorar os termos de
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intercâmbio. Assim, não apenas o Brasil, mas também as demais economias latinoamericanas ricas em recursos naturais puderam crescer e melhorar suas condições
macroeconômicas e sociais a partir de 2003 (BICHARA et al., 2012).
Diante disso, alguns analistas afirmam que as relações com a China são
construtivas e complementares, enfatizando o potencial benéfico das relações
econômicas sino-brasileiras. Porém, é preocupante a excessiva especialização da
exportação de produtos intensivos em recursos naturais para a economia chinesa. Tal
situaçãoreflete uma deterioração na qualidade das relações comerciais bilaterais entre
esses países, nas quais a China importa produtos de baixo valor agregado e exporta
produtos de alta tecnologia, o que se assemelha com o padrão de comércio Norte-Sul.
Por isso, existe uma preocupação crescente, entre muitos estudiosos, de que o processo
de reprimarização da pauta exportadora brasileira seja potencializado pelas intensas
relações comerciais com a China (BICHARA et al., 2012).
3.3 O Impacto da Crise nas Relações Bilaterais entre Brasil e China
A estagnação da economia estadunidense, ao longo de 2009, foi claramente
observada em seu comércio exterior. Entre o início de 2008 e início de 2009, as
exportações caíram 26,9%, devido à desaceleração da economia mundial, enquanto as
importações caíram 38,6% (PINTO, 2010).
O processo de difusão da crise estadunidense ocorreu em três fases. A primeira
com o estopim da crise em meados de 2007, que ocorreu nos Estados Unidos e teve
efeito direto sobre os financiamentos internacionais. A segunda teve impacto sobre o
preço das commodities em meados de 2008. E por fim, a terceira fase ocorreu com a
falência do banco estadunidense Lehman Brothers. A partir desse momento, os efeitos
da crise tiveram impacto nas economias de todos os países do mundo, inclusive o
Brasil, que no primeiro momento não foi tão afetado, principalmente, devido às suas
reservas internacionais e ao crescente aumento nos preços das commodities (OCAMPO,
2009).
A transmissão da crise sobre a China ocorreu através da queda da demanda
externa por mercadorias chinesas. As estratégias chinesas de recuperação geraram
efeitos relevantes para a economia mundial e brasileira. Uma dessas estratégias foi
diversificar as suas exportações a fim de evitar uma diminuição de seu crescimento, já
que os EUA e a União Europeia sofreram uma grave contração econômica (PINTO,
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2010; VADELL, 2011). Além disso, o estímulo do governo chinês para aquecer sua
economia frente à crise favoreceu a forte aquisição de matérias-primas e alimentos,
como soja, petróleo, e minério ferro, que são mercadorias das quais o Brasil é grande
exportador (PAULINO; PIRES, 2011).
Por um lado, a necessidade chinesa de grande quantidade de matériasprimas e de alimentos reitera a posição altista dos preços das
commodities, por outro lado, a produção de manufaturas chinesas,
intensiva em trabalho e também em tecnologia, para o mercado
interno e para exportação reforça a posição baixista dos preços desses
produtos devido ao efeito escala da produção chinesa. Isso poderá
gerar mudanças nas estruturas das exportações e importações de
diversos países. (PINTO, 2010, p. 103).
Tal diversificação de mercados por parte da China após a crise está demonstrada
claramente na Tabela 1. Observa-se que os países em desenvolvimento que, na média
do período de 1980 a 2000, representavam 17% dos compradores e exportadores da
China, passaram a representar 25% dos mercados compradores e 35% dos exportadores
no período pós-crise. Há um destaque maior para o intercâmbio comercial chinês com
os países da América Latina e Pacífico Asiático. Ao mesmo tempo, o intercâmbio
comercial chinês com os países de alta renda diminuiu durante esse período. Lembrando
que esse movimento já vem se intensificando desde a entrada da China na OMC,
quando as exportações chinesas cresceram substancialmente (BICHARA et al., 2012).
Tabela 1 - Destino das Exportações e Origem das Importações Chinesas, 1980-2010
Exportações
Importações
1980-2000
2001-2007
2008-2010
1980-2000
2001-2007
2008-2010
Países de Alta Renda
83,1
82,8
74,9
83,2
71,8
64,4
África Subsaariana
1,5
1,8
2,7
0,8
2,3
4
2
3,2
5,1
3,2
3,8
6,4
Europa e Ásia Central
2,2
3,3
4,9
4,3
3,4
3,3
Mundo Árabe
4,9
3,1
4,4
1,5
3,6
5,7
Oriente Médio e Norte da
África
3,8
1,6
2,3
0,7
1,6
2,4
Pacífico Asiático
4,3
5,3
6,5
4,7
8,9
9,2
Sul da Ásia
1,6
2
3,4
0,7
1,3
1,7
América Latina
Fonte: Bichara e outros (2012, p. 13), com base nos dados do World DevelopmentIndicators do
ano de 2012.
Além de tentarem diversificar seus mercados de destino de exportações e
importações, após a crise, os exportadores chineses têm buscado elevar a agregação de
12
valor e tecnologia da pauta exportadora. Mas essa já é uma tendência que pode ser
observada desde 1995, como é mostrado na tabela 2. Percebe-se, durante esse período,
uma redução significativa dos produtos intensivos em trabalho nas exportações e um
aumento na participação dos produtos manufaturados intensivos em pesquisa e
desenvolvimento (BICHARA et al., 2012).
Tabela 2 - Exportações e Importações chinesas por intensidade tecnológica – 1995
e 2010
Tipologia
Produtos Primários
Produtos Intensivos em Recursos Naturais
Manuf. Intensivos em Trabalho
Manuf. Intensivos em Economias de Escala
Manuf. Produzidos por Fornecedores
Especializados
Manuf. Intensivos em P&D
Não-classificados
Total
Exportações
1995
2010
8,20%
2,30%
11,40% 8,00%
45,60% 27,70%
15,60%
20%
Importações
1995
2010
8,50% 24,00%
18,20% 14,70%
20,00% 8,70%
10,40% 9,70%
7,30% 24,00% 24,00% 16,80%
5,90% 17,90% 11,20% 24,80%
5,90%
0,10%
7,70%
1,30%
100,00% 100,00% 100,00% 100,00%
Fonte: Bichara e outros (2012, p. 15), com base nos dados do Global TradeInformation Services
(GTIS).
Assim como na China, a crise internacional foi transmitida ao Brasil de forma
indireta, visto que os agentes financeiros brasileiros não estavam ligados diretamente
aos riscos do mercado hipotecário subprime dos Estados Unidos. Por isso, no caso
brasileiro, os principais canais de propagação foram o comércio exterior e a súbita saída
de capitais. O comércio exterior devido à queda da demanda externa e dos preços das
commodities.E a saída de capitais devido à frustração das expectativas dos investidores
que levou a uma desvalorização do real - a taxa de câmbio saltou de 1,6 R$/US$ em
agosto de 2008, para 2,4 R$/US$ em dezembro de 2008 (CASTILHO, 2011; PINTO,
2010).
Graças a esse contexto de insegurança internacional e forte desaceleração da
economia mundial, acreditava-se que haveria uma desaceleração das exportações
brasileiras. Porém, não foi isso que aconteceu já que as contas externas se recuperaram a
partir do segundo trimestre de 2009. Isso se deve, parcialmente, às políticas anticíclicas
na economia durante o auge da crise,à melhoria no cenário externo a partir do segundo
13
trimestre de 2009 e às elevadas reservas internacionais que o país mantinha
(HOLANDA, 2011; PINTO, 2010).
Outro fator que explica a rápida recuperação das exportações brasileiras é a
recuperação das importações chinesas resultantes das políticas na China para ampliar a
demanda interna e aquecer a economia. O gráfico 1 evidencia a relevância das
importações chinesas para a recuperação das contas brasileiras. Nele, percebe-se uma
redução drástica das exportações brasileiras para o resto do mundo, simultaneamente ao
crescimento das exportações para a China durante o ano de 2009 (PINTO, 2010).
40
6
36
35
5
5
30
5
25
24
25
17
20
15
1
4
21
3
2
3
Mundo exceto China
2
1
10
Bilhões
Bilhões
Gráfico 1–Exportações brasileiras para o resto do mundo (exceto China) e para a
China durante o período de jan/2008 a dez/2009(US$ bilhões)
China
1
5
nov/09
set/09
jul/09
mai/09
mar/09
jan/09
nov/08
set/08
jul/08
mai/08
mar/08
0
jan/08
0
Fonte: Elaboração própria com base nos dados doAliceweb (2014).
Carvalho (2009) também entende que com a crise de 2008, a redução das
exportações só não foi pior devido às vendas de produtos primários para a China. Ainda
Oliveira (2010, p. 93) afirma:
A economia brasileira certamente sentiu o aperto da crise econômica
global, mas quatro respostas podem ser consideradas como
fundamentais para a superação mais rápida: o controle exercido pelo
governo brasileiro, a capacidade de efetuar as reformas necessárias
para promover o crescimento de longo prazo, a diversidade de seus
parceiros econômicos e a manutenção da forte demanda chinesa.
Nesse contexto, a China tornou-se, em 2009, o principal destino das exportações
brasileiras, enquanto houve uma diminuição de importância para os Estados Unidos
(principal parceiro comercial do Brasil até 2008) e a União Europeia. A tabela 3
14
demonstra que a China manteve sua posição como primeiro parceiro comercial do
Brasil mesmo nos anos seguintes à crise internacional. Logo, a partir desse momento,
observa-se uma significante mudança no comércio exterior brasileiro, principalmente na
pauta das exportações (ARBACHE, 2011; BICHARA et al., 2012; CASTILHO, 2011;
HOLANDA, 2011; POCHMANN, 2011).
Tabela 3 - Intercâmbio Comercial Brasileiro (Exportações + Importações) - US$
Bilhões - 10 Principais Parceiros 2009 - 2011 (Janeiro – Agosto)
Intercâmbio Comercial
Países
2009
2010
2011
VALOR VALOR VALOR PART.%
TOTAL GERAL
176
240,6
313,5 100,00%
PAÍSES SELECIONADOS
99,7
138,7
181,9
58,00%
CHINA
24,8
35,4
50
15,90%
ESTADOS UNIDOS
22,9
29,6
38,2
12,20%
ARGENTINA
13,9
20,5
25,7
8,20%
ALEMANHA
9,9
13,1
16,1
5,10%
JAPÃO
6,2
8,6
10,8
3,40%
PAÍSES BAIXOS
5,8
7,5
10,4
3,30%
REPÚBLICA DA CORÉIA
4,5
7,8
9,7
3,10%
ITÁLIA
4,3
5,7
7,7
2,50%
CHILE
3,2
5,1
6,8
2,20%
FRANÇA
4,2
5,4
6,5
2,10%
Fonte: Brasil (2011), com base em dados do MDIC/SECEX/Aliceweb.
Segundo Oliveira (2010), a crise possibilitou uma intensificação dos laços e da
parceria estratégica entre Brasil e China, pois estes países passaram a atuar cada vez
mais juntos a fim de aumentar suas influências nas instituições internacionais de tomada
de decisões econômicas, como o G20 e a OMC. No ano de 2008, o presidente brasileiro
e o presidente chinês se encontraram em três momentos distintos, durante a cúpula do
G8+ (África do Sul, Brasil, China, Índia e México), na cerimônia inaugural dos Jogos
Olímpicos de Pequim e na reunião de cúpula do G20. Em janeiro de 2009, o vicepresidente chinês visitou o Brasil para estabelecer acordos de cooperação energética e,
em maio do mesmo ano, o presidente Lula viajou a China para concluírem treze acordos
de cooperação (OLIVEIRA, 2010; MARTINS, 2011).
Nesse sentido, a crise reforçou a tendência de crescimento na taxa de comércio
entre o Brasil e a China durante essa década e contribuiu para intensificar as relações
econômicas sino-brasileiras (OLIVEIRA, 2010). Tal fato foi evidenciado em abril de
15
2010, quando os líderes de ambos os países assinaram o Plano de Ação Conjunta entre o
Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Popular da China
2010-2014, que fornece orientações abrangentes para o fortalecimento da parceria
estratégica bilateral Brasil-China (BRASIL, 2010).
Um ano depois, os dois países elaboraram o Plano Decenal de Cooperação a fim
de promover ainda mais a implementação do Plano de Ação Conjunta, “com objetivo de
assinalar as áreas prioritárias e os projetos-chaves em ciência e tecnologia e inovação;
cooperação econômica; e intercâmbios entre os povos dos dois lados de 2012 a 2021.”
(BRASIL, 2012). De acordo com o texto do Plano Decenal, ambos os governos
reconhecem a parceria econômica entre eles no contexto da crise (BRASIL, 2012).
Desde a crise econômica internacional de 2008, os dois países vêm mantendo
consultas frequentes para mitigar seus efeitos. Para refletir esse novo estágio das
relações sino-brasileiras, ambos os países decidiram designá-las Parceria Estratégica
Global, de forma que essa parceria transcendesse o campo bilateral (BRASIL, 2012).
Segundo Holanda (2011), a crise de 2008 foi um “divisor de águas” visto que,
apesar de a Parceria Estratégica entre existir desde 1993, a agenda sino-brasileira era
limitada praticamente apenas pelas relações comerciais bilaterais, exceto o projeto
CBERS de 1989 que foi o primeiro acordo entre países em desenvolvimento no campo
da alta tecnologia. Foi com a crise internacional que essas relações se intensificaram
muito mais e passaram a ter uma nova configuração devido aos acordos de longo
prazo,à maior diversificação da agenda bilateral e à ampliação da agenda multilateral
(HOLANDA, 2011; MARTINS, 2011).
No entanto, apesar da parceria diplomática entre Brasil-China, da elevada
demanda chinesa no século XXI e do auxílio chinês para a recuperação econômica
brasileira pós-crise, as exportações para a China têm se baseado essencialmente em
produtos primários (ACIOLY; CINTRA; PINTO, 2011).
As relações comerciais sino-brasileiras evoluíram ao longo da década passada
até que se estabelecesse um padrão bem definido: o Brasil importa cada vez mais
produtos manufaturados de alto valor agregado e exporta cada vez mais produtos
básicos e semimanufaturados intensivos em recursos naturais (ARBACHE, 2011).
Como ilustrado no gráfico 2, desde 2000, o Brasil exporta mais produtos básicos do que
manufaturados para a China, uma tendência crescente ao longo do tempo, com um
destaque maior para o período pós-crise de 2008.
16
Gráfico 2– Exportações Brasileiras para a China por fator agregado em milhões
US$
40000
35000
30000
25000
20000
Básicos
15000
Semi
10000
Manufaturados
5000
0
Fonte: Elaboração própria com base nos dados presentes em Gomes (2012).
Ao mesmo tempo, as importações brasileiras da China se restringiam cada vez
mais a produtos de alto valor agregado, os quais já representam mais de 85% do total
das exportações chinesas (ARBACHE, 2011). No ano de 2000, as importações de
produtos de alta tecnologia da China eram de US$ 487 milhões, em 2008 esse valor
passou para US$ 8 bilhões, e em 2010 esse valor aumentou para quase US$ 10 bilhões.
Enfim, os principais produtos chineses importados pelo Brasil em 2009 foram: químicos
e orgânicos (7%); caldeiras e máquinas mecânicas (20%); máquinas e aparelhos
elétricos (33%) (POCHMANN, 2011).
Como se observa no gráfico 3, desde o ano 2000 o Brasil importa mais produtos
industriais da China do que produtos agrícolas e minerais. A discrepância aumentou no
tempo e tornou-se mais acentuada a partir do ano de 2007. Diante desses dados,
percebe-se que a intensificação das relações econômicas entre Brasil e Chinaimplicou
no aumento da dependência do país em relação à exportação de bens primários,
causando uma reprimarização nas exportações brasileiras (CARVALHO, 2009;
OLIVEIRA, 2010).
Gráfico 3–Importações de Produtos Chineses para o Brasil de Acordo com a
Classificação da NCM em Grupos: Agrícolas, Minerais e Industriais
Milhões
17
35.000
30.000
25.000
20.000
AGRÍCOLAS
15.000
MINERAIS
INDUSTRIAIS
10.000
5.000
2011
2010
2009
2008
2007
2006
2005
2004
2003
2002
2001
2000
0
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Aliceweb (2014).
O gráfico 4 demonstra que durante a década de 1990, as exportações brasileiras
permaneceram estacionadas e, apenas a partir de 2001 começaram a se elevar. Como já
foi dito, isso se deveu a outros fatores, e principalmente ao “efeito China”. Esse
crescimento foi elevado até meados de 2008, quando o país começou a sentir os efeitos
da crise. A partir desse momento, exportações brasileiras decaíram significativamente e,
em meados de 2009 voltara a crescer. Porém, as exportações de produtos básicos
superaram as exportações de manufaturados, motivadas, provavelmente, pela demanda
chinesa.
Milhares
Gráfico 4 – Exportações Brasileiras para o Resto do Mundopor Fator Agregado:
1990 a 2011. Valores em US$ milhões FOB.
140
120
100
80
Básicos
60
Semi
40
Manufaturados
20
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
0
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do MIDIC.
18
A ascensão chinesa durante o século XXI contribuiu para o crescimento da
demanda internacional de commodities, que, consequentemente, ficaram mais caras.
Assim como o Brasil, vários países latino-americanos exportadores de produtos
primários, também se beneficiaram desde momento, aproveitando para ampliar sua
inserção externa e conduzindo um maior crescimento de suas economias. No entanto, os
principais destinos das exportações brasileiras de produtos industrializados são os
Estados Unidos, os países da América do Sul e os demais países subdesenvolvidos,os
mesmos mercados que interessam à China para a exportação de tecnologias. Assim, a
disputa entre Brasil e China por essa fatia de mercado se acirrou principalmente, após a
crise financeira de 2008 (BICHARA et al., 2012).
Após o ano de 2003, as exportações de manufaturas tanto do Brasil como da
China para a América Latina aumentaram muito devido à recuperação econômica
latino-americana pós 2002. Porém, as exportações chinesas cresceram 40 vezes mais
que as do Brasil. A partir de 2007, a exportação de produtos manufaturados chineses
vem crescendo mais rápido que a exportação de produtos manufaturados brasileiros
(BICHARA et al., 2012).
Em 1996, o índice de comercio complementar das exportações
chinesas para a América Latina (excluindo o Brasil) era de 47,6,
enquanto que em 2008 cresceu para 58,9. No mesmo período, o índice
de comercio complementar das exportações brasileiras foi,
respectivamente, 56,9 e 50,8.(BICHARA et al., 2012, p. 20).
De acordo com Bichara et al. (2002), o Brasil conseguiu superar os déficits a
partir do ano de 2002. Isso porque nesse momento a demanda mundial foi intensa e
havia taxas de câmbio favoráveis. Desde então o país veio gerando superávits
comerciais, no entanto, a indústria de transformação perdeu a capacidade de gerar
saldos positivos e, inclusive, a partir de 2008, esses déficits aumentam ainda mais. Isso
se justifica pelo fato de, com a crise, há um cenário internacional de menor crescimento;
maior concorrência (principalmente chinesa); expansão da demanda doméstica e
valorização da moeda nacional. Nota-se que todos os setores foram fortemente
deficitários no período pós-crise, exceto a indústria de baixa tecnologia (idem).
4 Discussão
19
Como foi visto no item anterior, após a crise de 2008, a China intensificou ainda
mais a sua posição como exportadora de manufaturas e capitais, enquanto o Brasil
estaria passando por um processo de reprimarização da pauta exportadora, com a perda
de diversificação da estrutura produtiva e predomínio de produtos de baixa intensidade
tecnológica. Esse processo é resultado da especialização regressiva da estrutura
industrial doméstica que tem se concentrado cada vez mais nos segmentos intensivos
em recursos naturais (BICHARA et al., 2012).
Segundo Pinto (2010) a regressividade da pauta exportadora brasileira
evidencia-se pelo fato de as importações de produtos intensivos em tecnologia ter
aumentado mais rapidamente que as exportações desses produtos; e os superávits
comerciais são gerados por produtos intensivos em recursos naturais e com baixa
intensidade tecnológica. Percebe-se que com a crise econômico-financeira intensificou
mais ainda esse processo, visto que a regressão produtiva aprofundou-se de forma ainda
mais acelerada durante o período de 2007 e 2009.
Para Paulino e Pires (2011), se a intensificação das relações comerciais entre
Brasil e China não possibilitarem um aumento no valor agregado das exportações
brasileiras, estará estabelecendo-se um padrão de trocas semelhante ao que ocorre entre
Norte e Sul. Essas relações estariam levando o Brasil a uma nova dependência da
produção de matérias-primas.
Pedrozo e Silva (2011) também acreditam que a pauta de exportações brasileira
é dependente, e preocupam-se com o fato de que se a China diminuir expressivamente
suas importações de produtos primários exportados pelo Brasil, este terá grandes
dificuldades para manter o equilíbrio das divisas e impulsionar sua economia.
Conforme Arbache (2011), a China foi um dos fatores fundamentais que
contribuíram para a primarização da economia brasileira, visto que a forte elevação dos
preços das commodities durante a década de 2000 foi determinada, principalmente, pela
demanda chinesa por produtos primários. Por isso, com a ascensão chinesa, países com
abundância de recursos naturais conseguiram acelerar seu crescimento e melhorar as
condições macroeconômicas e sociais. No entanto, a indústria de transformação
brasileira continua crescendo muito pouco e o investimento agregado e a produtividade
têm permanecido em níveis relativamente baixos (BICHARA et al., 2012).
Além disso, a política industrial chinesa e a política cambial de atrelamento do
yuan ao dólar tiveram impactos relevantes no comércio com parceiros comerciais que
mantêm regimes de câmbio flutuante, como o Brasil (ARBACHE, 2011). Ao mesmo
20
tempo, com a crise econômica mundial, a concorrência nos mercados de manufaturas
intensificou-se ainda mais, de forma que a China passou a ocupar novos espaços
(BICHARA et al., 2012).
Segundo Carcanholo e Mattos (2011), o recuo do comércio do Brasil com os
Estados Unidos e União Europeia, devido aos efeitos da crise, é preocupante visto que
eles importavam metade das exportações brasileiras de produtos industrializados de
média e alta tecnologia. Além disso, as exportações brasileiras de bens manufaturados
de média tecnologia para os países asiáticos vêm diminuindo. Portanto, o comércio
sino-brasileiro é mais assimétrico que o padrão de comércio entre Brasil e Estados
Unidos e Brasil e União Europeia. Como mostra no gráfico 5, em 2008, o comércio
intraindústria do Brasil com Estados Unidos foi de 50% enquanto com a China esse
valor foi de 14% (ARBACHE, 2011).
Gráfico 5 - Participação do comércio intra-indústria do Brasil com alguns de seus
principais parceiros (%) - 2008
70
62
60
50
54
50
40
39
40
União
Europeia
Alemanha
30
20
14
10
0
China
Estados
Unidos
Mundo
Mercosul
Fonte: Sarquis (2011, apud ARBACHE, 2011)
Em contrapartida, tem aumentado as exportações brasileiras para os países
latino-americanos, as quais são baseadas, principalmente, em bens manufaturados de
média e alta tecnologia. Diante da crise, portanto, observa-se uma maior diversificação
geográfica dos parceiros comerciais do Brasil. No entanto, como o país ainda é muito
dependente de produtos primários e produtos manufaturados baseados em recursos
naturais, percebe-se que tal diversificação não tem sido acompanhada por uma
21
ampliação de alternativas para a exportação de bens de maior valor agregado
(CARCANHOLO; MATTOS, 2011).
Segundo Pinto (2010), a especialização produtiva no Brasil foi intensificada
durante o século XXI, principalmente, devido à valorização do real e a demanda chinesa
por produtos primários e energia. Porém, esse é um processo que ocorre desde a década
de 1995, com o avanço da desregulação e liberalização comercial, produtiva e
financeira.
A relação econômica bilateral sino-brasileira é tão preocupante atualmente
porque ela beneficia o Brasil em curto prazo, mas leva a uma crescente dependência da
economia brasileira à economia chinesa no longo prazo. E essa dependência aumenta a
exposição da economia a choques externos, visto que os preços internacionais das
commodities são muito voláteis. E história demonstra que os países dependentes das
exportações desses produtos crescem muito mais lentamente do que aqueles que
possuem pautas de exportação mais diversificadas (ARBACHE, 2011).
Além disso, a primarização da economia brasileira tem um efeito negativo
porque o setor de commodities emprega muito pouco, o que dificulta ainda mais os
problemas de distribuição de renda no Brasil. “Em 2010, 3,2% dos trabalhadores
formais estavam empregados no setor agropecuário e menos de 0,5% no setor mineral.”
(ARBACHE, 2011, p. 242). Outra consequência negativa da dependência de primários é
que o caráter não-renovável de certas commodities, como petróleo e minérios podem
levar à excessiva exploração dos recursos naturais e causar poluição e outros problemas
ambientais (BICHARA et al., 2012).
5Conclusão
Analisando-se o processo de abertura econômica do Brasil, nota-se que, ao longo
das últimas três décadas, o processo de liberalização econômica, de privatização e a
falta de uma política industrial ampla e ativa, fez com que o país desnacionalizasse
grande parte da indústria nacional, abandonasse setores estratégicos e aumentasse ainda
mais sua vulnerabilidade externa. O resultado dessas políticas é a atual especialização
da pauta de exportações brasileira no agronegócio (PEDROZO; SILVA, 2011).
Devido a essas políticas econômicas adotadas pelo governo brasileiro, o país é
obrigado a importar grande parte dos produtos de alta tecnologia da China que têm
exportado cada vez mais essas mercadorias. Logo, percebe-se que as relações
22
comerciais entre esses países são benéficas para a China, pois esta compra,
principalmente, commodities do Brasil, e vende, por outro lado, produtos
industrializados (LUZ, 2011).
A nosso entender, esta é a realidade das relações comerciais sino-brasileiras
desde o início do século XXI. Com a crise econômica iniciada nos Estados Unidos em
2007, percebe-se uma aproximação ainda maior entre Brasil e China, que é evidenciada
pelo fato de ela ter se tornado em 2009 o principal parceiro econômico brasileiro. Podese dizer que nesse contexto a pauta exportadora brasileira tornou-se ainda mais
dependente de produtos primários.
Um dos motivos da rápida recuperação do Brasil frente à crise foi a forte
demanda chinesa por produtos primários, o que contribuiu para o crescimento das
exportações brasileiras mesmo diante de um cenário internacional não favorável. Assim,
a crise econômica de 2008, ao provocar uma retração nas economias dos EUA e União
Europeia, contribuiu para que o Brasil se apoiasse na economia chinesa.
É preciso atentar, no entanto, que essa estratégia do governo brasileiro de se
aproximar ainda mais da China em um momento de crise funcionou relativamente bem
no curto prazo, porém, gerando nova dependência no longo prazo. Diante disso, torna-se
importante que o Brasil crie estratégias para produzir tecnologias dentro do próprio país
a fim de não se tornar um mero produtor de matérias-primas não apenas para a China,
mas para os demais países desenvolvidos do mundo.
Enfim, comparando-se as relações sino-brasileiras no período anterior e
posterior à crise de 2008, observa-se que a crise evidenciou o aprofundamento dessas
relações e a dependência econômica brasileira em relação à China, visto que estas já são
tendências que vêm sendo notadas durante aproximadamente duas décadas.
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