Se não houver cooperação mundial, a economia não vai funcionar: nem aqui nem na China Lucas Lautert Dezordi A cada dia que passa, fica mais evidente que os mecanismos do mercado financeiro internacional, por si só, não vão conseguir restabelecer a dinâmica do crédito necessária para uma recuperação da economia mundial. Nesse sentido, muitos economistas estão defendendo atuações mais fortes do governo brasileiro, com programas de investimentos e políticas monetárias que venham ativar o crédito interno de nossa economia. Contudo, estas políticas de ampliação no prazo do recolhimento do compulsório e queda na taxa de juros, de liberação de recursos para construção habitacional por parte da Caixa Econômica Federal, de queda no IPI dos automóveis e de uma possível ampliação dos investimentos governamentais irão estabilizar, parcialmente, o nível de atividade econômica no Brasil. Isto é, a economia nacional irá crescer em 2009, mas com uma forte restrição externa. O problema central da crise financeira mundial está, em grande medida, nas relações econômicas internacionais da China com o resto do mundo e, em especial, com os Estados Unidos, seu maior parceiro comercial. O acúmulo de mais de US$ 1,8 trilhão de reservas internacionais pelo Banco Central da China foi obtido, em grande medida, por uma política artificial de manutenção da taxa de câmbio yuan em relação ao dólar norte-americano, extremamente desvalorizado, estimulando o aumento nas exportações chinesas no mundo. Nos últimos cinco anos, as exportações cresceram em média 31% ao ano, em valores monetários, fazendo com que o setor externo contribuísse com 21,5% do crescimento do PIB em 2007, que foi de 11,9%. Estimo que, neste ano, a economia cresceu 7,1% acima de sua tendência de longo prazo e convido o leitor para a seguinte análise na composição do PIB pela ótica da demanda agregada em dois períodos não muito distantes. Em 1996, a economia chinesa apresentava as seguintes variáveis em porcentagem do PIB: o consumo das famílias representava 45,8%; gasto do governo, 13,4%; formação bruta de capital fixo (compra de máquinas e equipamentos), 32,4%; formação de estoques de 6,4% e exportações líquidas de bens e serviços de 2%. Neste ano, a abertura comercial (exportações + importações), em relação ao PIB, foi de 32,5%. A economia crescia em média 10% ao ano e, após as crises da Ásia e Russa, a economia passou a crescer, por dois anos consecutivos, a uma taxa de, aproximadamente, 7,5% ao ano. Em 2006, dados revisados mais recentes, a situação da economia asiática apresentava uma composição diferente. As variáveis em porcentagem do PIB mostravam a seguinte configuração: consumo das famílias 36,2%; gasto do governo 13,7%; formação bruta de capital fixo 40,8%; formação de estoques de 1,8% e exportações líquidas de bens e serviços de 7,5%. Neste ano, a abertura comercial (exportações + importações), em relação ao PIB, foi de 63,7%. A economia está bem mais aberta e, consequentemente, muito mais acelerada do que há 10 anos. Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.2, n.1, março 2009 1 A crise Americana de crédito, as recessões na Alemanha e no Japão estão desaquecendo rapidamente o comércio mundial, e a China poderá registrar, por pelo menos três anos consecutivos, um crescimento do PIB de, aproximadamente, 7% ao ano. Em virtude dessas preocupações, o governo lançou um programa de expansão de gastos em infraestrutura equivalente a US$ 586 bilhões, a ser usado até 2010 para impulsionar a demanda doméstica. Os gastos são expressivos e representam 17,3% do PIB, ou um gasto adicional anual de 8,6% que, aliado à queda na taxa de juros, irão amenizar a contração da atividade produtiva. Porém, cabe ressaltar que essas políticas fiscais e monetárias expansionistas devem ser implementadas por um programa que intensifique as mudanças na administração da taxa de câmbio, com a finalidade de tornar o yuan uma moeda mais valorizada em relação aos seus grandes parceiros comerciais. Com isso, defendo uma política fiscal expansionista na economia asiática, que venha gerar deficit em transações correntes. Com relação ao programa de expansão fiscal do novo governo de Obama, acredito que não será suficiente para restabelecer as fontes de crescimento mundiais, pois o efeito sobre o consumo doméstico será minimizado pelo elevado endividamento das famílias norteamericanas, e os deficits externos em transações correntes irão se aprofundar, tornando o comércio mundial mais desequilibrado e instável. Portanto, uma valorização da moeda chinesa, aliada a uma política fiscal fortemente expansionista estimularão as importações chinesas dos produtos americanos reativando, assim, o aparelho produtivo dos EUA. Se a China fizer isso, ela cresce. E os Estados Unidos também. Efetivamente, a economia mundial só irá crescer com um comércio internacional equilibrado, e a economia chinesa deve deixar a sua taxa de câmbio flutuar para reativar o aparelho produtivo norteamericano, permitindo, desse modo, que os mecanismos do mercado internacional funcionem. Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.2, n.1, março 2009 2