AS HORTALIÇAS NÃO-CONVENCIONAIS NO PROJETO HORTA DOMÉSTICA: O CONHECIMENTO E O CONSUMO 1 2 3 4 Mônica Tiho Chisaki Isobe ; Simone Pereira Marques ; Nilbe Carla Mapeli ; Santino Seabra Júnior . 1 Acadêmicas do curso de Agronomia da Universidade do Estado de Mato Grosso. Bolsista 2 3 FAPEMAT/MT. Bolsista PROBIC/UNEMAT. Professora orientadora, departamento de Agronomia, 4 UNEMAT. Professor co-orientador, departamento de Agronomia, UNEMAT. e –mail: [email protected] 1,2 Resumo: As hortas domésticas são pequenos espaços, geralmente situados nos quintais das famílias, onde são produzidas hortaliças destinadas à subsistência. São locais propícios para o cultivo de hortaliças não-convencionais, plantas, muitas vezes, denominadas “daninhas” ou “inços”, porém, de grande importância pelos seus aspectos nutricionais, econômicos e ecológicos. Estas espécies estão atualmente em desuso pela maior parte da população. O objetivo deste trabalho é fazer o levantamento das espécies de hortaliças não-convencionais conhecidas e o consumo delas entre as famílias cadastradas no Projeto Horta Doméstica da Universidade do Estado de Mato Grosso. Para isso foram utilizados questionários semi-estruturados em 50 famílias da área de abrangência do PSF Vitória Régia em Cáceres-MT, no período de novembro de 2007 a maio de 2008. Foram citadas 29 espécies de hortaliças não convencionais. As espécies mais citadas, quanto o conhecimento e consumo delas como plantas alimentícias, respectivamente, foram a taioba (98%; 80%), o coentrão (48%; 40%), a serralha (38%; 32%), o caruru (30%; 30%) e o alho folha (28%; 20%). A taioba merece uma atenção, pois é resultado de um trabalho de divulgação da espécie dentro do Projeto Horta Doméstica realizado nos anos anteriores. É necessário que o uso dessas e de outras hortaliças nãoconvencionais sejam estimuladas, pois são de fácil cultivo, podem apresentar teores mais elevados de vitaminas que hortaliças convencionais e se constituem como fontes acessíveis de nutrientes para auxiliar na melhoria da segurança alimentar da população. Palavras chaves: hortaliças não-convencionais, hortas domésticas, segurança alimentar. Introdução A horta doméstica é um tipo de horta de pequeno porte, onde as hortaliças produzidas são destinadas principalmente ao consumo e sustento da própria família (Trani et al., 2007). As despesas alimentares consomem grande parte da renda das famílias pobres das cidades e, por isso, elas buscam constantemente alternativas que reduzam estes gastos e garanta a segurança alimentar (Drechsel et al., 1999). As hortaliças não convencionais são plantas alimentícias, muitas vezes denominadas "daninhas" ou "inços", pois medram entre as plantas cultivadas, porém, são espécies com grande importância ecológica e econômica. Muitas destas espécies, por exemplo, são alimentícias, mesmo que atualmente em desuso pela maior parte da população. O mesmo é válido para plantas silvestres, genericamente chamadas de "mato" ou "planta do mato" que, no entanto, são recursos genéticos com usos potenciais inexplorados (Kinupp; Barros, 2007). As hortas domésticas, as hortas comunitárias e os pequenos agricultores são potenciais produtores de alimentos não convencionais, pois tem na sua forma de produção, a capacidade de propiciar uma maior variedade de alimentos. A diversidade é fonte nutricional para atender as necessidades diárias e, também, proporciona novos sabores, perfumes, cores e formas nos alimentos do dia a dia (Ming, 2007). Em função da carência de informações básicas sobre o uso e cultivo de hortaliças não convencionais, foi proposto o presente estudo do levantamento sobre o conhecimento e consumo destas hortaliças entre as famílias participantes do Projeto Horta Doméstica, com o objetivo de auxiliar na divulgação para o aumento do consumo de hortaliças e o resgate de hortaliças não-convencionais. Material e método Foram realizadas visitas as 50 famílias na área de abrangência do Programa de Saúde Familiar (PSF) Vitória Régia – Cáceres (MT), cadastradas no Projeto Horta Doméstica/FAPEMAT, no período de novembro de 2007 a maio de 2008. Entre essas famílias, foram entrevistados os responsáveis pela horta doméstica, com a aplicação de um questionário semi-estruturado, no intuito de identificar o conhecimento e o consumo de espécies de hortaliças não convencionais entre as famílias. Foram realizadas revisões de literatura sobre estas espécies identificadas como potenciais, visando obter informações sobre substâncias nutricionais e antinutricionais, segundo Tabela de Composição Nutricional das Hortaliças da EMBRAPA Hortaliças, consultas em livros, artigos, teses, dissertações, entre outros trabalhos acadêmicos. Resultados e discussão O levantamento de espécies consideradas não-convencionais pelos moradores apresentou 29 espécies. As cinco espécies de hortaliças mais citadas foram Taioba, Coentrão, Serralha, Caruru e Alho folha. A taioba (Xanthosoma sp.), da família das Araceae, cujas plantas apresentam folhas sagitadas, verdes ou purpúreas, longas, pecioladas de coloração verde ou púrpura, rizoma principal de tamanho grande e formato irregular, com poucas brotações secundárias (Noda, 1997). Entre as famílias, 98 % têm conhecimento do potencial alimentício da planta e 80% afirmam consumi-la. Esse fato ocorre devido aos trabalhos realizados anteriormente no Projeto Horta Doméstica, com ênfase na propagação por meio de rizomas da taioba e efetiva distribuição de mudas e informativos sobre a cultura, que divulgou e implantou a espécie nas hortas domésticas (Santos, 2007). O coentrão, também conhecido como chicória (Eryngiun foetidum L.), pertencente à família Apiaceae, é uma planta herbácea aromática, que tem distribuição cosmopolita (Noda, 1997). As folhas, dispostas em roseta, são glabras, lanceolado-espatuladas ou oblongo-lanceoladas de 50-180 mm de comprimento, com 15-50 mm de largura e margens serreado-espinescentes. São a parte mais utilizada como tempero. O coentrão pode ser propagado vegetativamente por secções da base do talo ou sexuada, por sementes. Noda (1997) considera que o seu hábito reprodutivo seja autogâmico, tendo em vista que as plantas, quando cultivadas isoladamente, produzem, em abundância, sementes viáveis e originam plantas rústicas, capazes de crescer e se reproduzir em condições ambientais as mais adversas possíveis. O autor afirma, ainda, que no Brasil, do ponto de vista social, a cultura do coentrão tem se tornado uma fonte de renda importante para suprir algumas necessidades básicas de famílias de pequenos produtores dos municípios circunvizinhos de Manaus. Em Cáceres-MT, é possível observar alguns produtores comercializando esta espécie na feira. Na população entrevistada foi citado por 48% e consumido por 40% das famílias, sendo reconhecida por seu uso condimentar, principalmente em pratos a base de peixe, comum na região. A serralha (Sonchus oleraceus), da família das Asteraceae, conhecida por 38% das famílias e consumida por 32% delas é uma planta, conforme os dizeres da população, mais difícil de ser encontrada, pois necessita de clima mais ameno. Comumente, esta planta não tem sido observada nos quintais das famílias do Projeto Horta Doméstica, porém é considerada uma planta invasora, comum em plantios de café, e bastante apreciada no estado de Minas Gerais. É uma planta anual, herbácea, de sabor amargo e sua distribuição é mundial. Schaffer et al. (2005) apontam estudos relacionados a propriedade antioxidante de plantas nativas como a serralha e afirmam que os nutrientes em plantas não cultivadas são maiores que em plantas cultivadas. Estes estudos indicam, tamb que as diferentes condições ambientais podem influenciar nos teores de nutrientes. As Amaranthaceae constituem uma família de espécies bastante rústicas. Dentre as inúmeras espécies de plantas alimentícias existentes no gênero Amaranthus, o caruru de porco ou caruru verde (Amaranthus viridis) foi citado por 30% dos participantes, sendo estes, todos consumidores. São plantas invasoras, não requerem tratos especiais, sendo adaptadas aos mais diversos ambientes, variando de solos muito ácidos com alto conteúdo de alumínio até em solos alcalinos e salinos, de temperaturas amenas à climas desérticos e tropicais (Noda, 1997). É uma planta anual, herbácea, de fácil dispersão por produzir um grande número de sementes. Na região de Cáceres-MT tem sido observada a presença do caruru em todas as áreas, como hortas, calçadas, terrenos baldios, entre outros. O alho folha ou nirá (Allium tuberosum Rottler ex Sprengel syn. A. odorum), conhecida como cebolinha chinesa, é utilizada como condimento e cultivada por japoneses e seus descendentes nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil (Lima et al., 2005). Entre as famílias participantes do projeto, 28% conhecem o alho folha e 20% delas o consomem. Da família das Liliaceae, o alho folha se reproduz por sementes, e pode ser multiplicada por divisão de touceiras, de fácil crescimento, vigorosa, prefere locais ensolarados e adaptam-se a várias condições de solo. É uma planta perene, que pode viver de 7 a 30 anos, dependendo das condições. As cores das folhas variam de verde escura a verde claro, sendo a base da planta esbranquiçada (Larkcom, 1991). O conhecimento das famílias sobre o uso de outras hortaliças nãoconvencionais, ou consideradas por elas como não convencionais, diminui significativamente, como vê-se a seguir. Entre 20% a 10% da população conhecem espécies como o inhame, a beldroega, o ora-pro-nobis e o jiquiri. O consumo destas espécies está entre 18% a 10%. Abaixo de 10 % de citação e consumo estão espécies como o espinafre, açafrão, capisova, feijão de corda, pariparoba, mangarito, melão de são caetano, erva da lua, dente de leão, batata arroba. Foram citadas espécies ditas usualmente como convencionais na literatura e geralmente comercializadas, ditas pelos moradores como não-convencionais, como o almeirão (6%), maxixe (4%), rúcula, pimentão, couve-flor, acelga e mostarda (2%), pelo fato de não serem consumidas com freqüência pelas famílias. A hortelã é de uso comum como planta medicinal e vem sendo introduzida na alimentação das famílias em forma de saladas ou como planta condimentar, sendo citada e consumida por 2% como hortaliça. Conclusão As hortaliças não-convencionais apresentam características de adaptação ambiental e conclui-se que praticamente são desconhecidas pelas populações urbanas, pois, entre as 29 espécies citadas, apenas a taioba, coentrão, serralha, caruru e alho folha apresentou um significativo número de conhecedores. Com o avanço das hortaliças voltadas para o mercado, a população tem acesso mais fácil às hortaliças. No entanto, em um país como o Brasil, onde são detectados bolsões de carências nutricionais é necessário divulgar o conhecimento que gradualmente tem caído no esquecimento sobre as hortaliças não-convencionais e o consumo delas. Referências Bibliográficas DRECHSEL, Pay; QUANSAH, Charles.; de VRIES, Frits Penning. Urban and periurban agriculture in West Africa – characteristic, challenges, and need for action. In: SMITH, Olanrewaju B. (ed.) Agriculture urbaine en Afrique de l’Ouest. Une contribution à la sécurité alimentaire et à l’assainissement des villes. 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