Integração da Descoberta de Conhecimento em Bases de Dados como Suporte a Actividades de CRM Autoria: Filipe Pinto, Alzira Marques, Pedro Gago, Manuel Filipe Santos Resumo: Actualmente as organizações recorrem com interesse crescente à utilização exaustiva das suas bases de dados como instrumento de suporte ao desenvolvimento de estratégias de fidelização de clientes. A Descoberta de Conhecimento em Base de Dados constitui uma área de interesse a nível da prática empresarial e da investigação aplicada, no domínio do marketing, especialmente do Marketing Relacional. A Gestão da Relação com o Cliente (CRM) apoiada nas tecnologias de informação desenvolver relacionamentos com o cliente numa base individual, visando a sua rendabilização de uma forma profícua e duradoura para ambos. Neste contexto, partindo da aplicação do conceito de ciclo de vida do cliente, pretende-se com este artigo estabelecer uma nova framework que viabilize e oriente a utilização dos dados em actividades de Gestão da Relação com o Cliente através da Descoberta de Conhecimento em Bases de Dados. 1 1. Introdução A capacidade de captar e conservar clientes é provavelmente a chave do sucesso e um dos maiores desafios das organizações contemporâneas (Kotler, 2002). Muitas organizações adoptam as Tecnologias de Informação (TI) com meio de suporte e desenvolvimento das suas actividades promocionais, não havendo, contudo, ainda capitalizado o seu potencial em termos de marketing interactivo (Rowson, 1998). Alguns autores têm referido o potencial da integração das Bases de Dados (BD) em geral e das actividades de Descoberta de Conhecimento em Bases de Dados (DCBD) em particular, para a definição das estratégias de marketing nas organizações (O’Leary, 2004; McClymont, 2003; Bretzke, 2005; Hughes, 1995). Pese embora a importância reconhecida, verifica-se ainda a ausência de uma investigação pragmática que integre os dados e o conhecimento deles extraído em actividades de marketing. Existem referências acerca do trabalho a desenvolver sobre os dados (McClymont, 2003) ou do desenvolvimento de actividades de marketing suportadas por DCBD (Pinto, 2004) não havendo contudo qualquer referência à sua integração, de uma forma sistematizada, como suporte a actividades de relacionamento com o cliente. Tendo como premissa, as BD permitem às organizações não só, encontrarem soluções como também, auxiliarem a definir as actividades para a Gestão da Relação com os Clientes (definido aqui como CRM - Customer Relationship Management), este artigo visa propor uma framework, que integre os dados e apresente os passos necessários, através da DCBD, de modo a auxiliar os marketers no desenvolvimento de programas de CRM. Na primeira parte do artigo é apresentada a definição de CRM bem como os seus objectivos, funcionamento e estrutura. Na parte seguinte faz-se um enquadramento das actividades de CRM em função do Ciclo de Vida do Cliente (CVC). A terceira parte é dedicada à DCBD, na quarta parte, faz-se um exercício de integração dos conceitos referidos nas fases anteriores, do qual resulta a proposta de uma framework. Por último, o artigo termina com as conclusões e orientações para futuras investigações. 2. Gestão da Relação com o Cliente 2.1. Definição e enquadramento Peter Drucker (Drucker, 2001) ao afirmar existir apenas uma definição válida para objectivos de negócio: os clientes, exprimiu de um modo simples, o elemento nuclear das organizações comerciais contemporâneas. De acordo com uma das primeiras definições que surgiram para definir marketing de relacionamento, referiam-no como a estratégia para atrair, manter e proporcionar relações com os clientes (Berry, 1983). O termo CRM surgiu posteriormente, como uma versão marketing de relacionamento, que inclui um conjunto de actividades de carácter mais tecnológico. Ambas as designações são usadas indiferenciadamente em muita literatura (Arndt, 2001). Actualmente, as organizações procuram actuar de modo dinâmico nos mercados competitivos de modo, a captar e manter os seus clientes. O CRM encontra-se descrito como uma estratégia de organização (Kotler, 2002), ou como uma ferramenta e processo de trabalho (Gray, 2001). Berry Linnoff além da ligação do CRM ao marketing de relacionamento, apresenta-o com um significado similar a one-to-one marketing, sugerindo ainda sinónimos 2 como real-time marketing ou customer intimacy (Linoff, 1997). Existem ainda autores que argumentam que o CRM deve ser abordado como um conceito de gestão, particularmente de gestão de relacionamentos com os clientes e não como um produto ou uma tecnologia (Berson, 1999). A permuta de informação entre o cliente e a organização torna-se mutuamente benéfica, na medida em que os consumidores fornecem informações em troca de um serviço personalizado que satisfaça as suas necessidades individuais (Linoff, 2000). Esta abordagem coloca a utilização das TI, num contexto de CRM, como elemento fundamental, sempre que se deseje estabelecer relacionamentos com os consumidores numa base individual e usar a informação disponível para tratar os consumidores de forma diferenciada. O CRM combina as políticas e técnicas de marketing com as tecnologias de informação, nomeadamente na utilização e exploração das BD – processos de Database Marketing (DBM) ou simplesmente de DCBD. A utilização das BD num contexto de CRM aparece reforçado por Berson quando explicitamente afirma que o CRM consiste na análise dos dados criados pela relação entre a organização e o cliente (Berson, 1999). À luz do processo de revisão exposto, é possível então sintetizar o CRM como um processo de Gestão, que visa manter a Relação com o Cliente, suportada numa base tecnológica de BD (Figura 1). A Gestão enquanto elemento orientador das estratégias organizativas; a Relação, sinónimo do conjunto de actividades em prol do relacionamento com os clientes ou potencias clientes; o Cliente, alvo económico para muitas organizações e o receptor ou não, das politicas de relacionamento; e, finalmente as Bases de Dados que representam as tecnologias de informação, de onde se recolhem dados e registam informações sobre toda actividade entre as empresas e os seus clientes. Figura 1 – Enquadramento das actividades de relacionamento com o cliente. 2.2. Objectivos Actualmente o CRM é considerado, por alguns autores, como uma das abordagens mais sofisticadas e eficientes, para promover o aumento da rentabilidade dos clientes (Bretzke, 2005; Brown, 2000; Burnett, 2001). A estratégia de CRM consiste em adquirir melhor conhecimento sobre os clientes, antecipar as suas expectativas e necessidades, fornecer serviços personalizados, e diferenciar-se dos concorrentes (Peppers, 1999; Bretzke, 2005). Através de uma melhor compreensão das necessidades dos clientes, é possível a segmentação do mercado, identificando onde podem ser construídas relações lucrativas permanentes (Linoff, 2000). A principal premissa do CRM é de que os clientes tomarão as suas decisões de compra baseadas no relacionamento que têm com os seus fornecedores e, em troca da sua preferência, desejam reconhecimento, valor, qualidade e respeito. Saliente-se, por último, que o CRM passa também pela gestão integrada dos recursos internos, construindo as condições necessárias para a criação de relações de proximidade entre 3 a organização e seus clientes. Relações essas, construídas através da recolha e tratamento da informação nas várias frentes de contacto, permitindo atingir o objectivo principal de uma organização: a retenção de clientes (Bretzke, 2005). Em síntese, o processo de CRM tem como objectivo atender, reconhecer e fidelizar o cliente em tempo útil. Para o efeito, transforma dados dispersos em informações concretas e centralizadas, as quais serão utilizadas em benefício do cliente para lucro da organização. Parece ser um método eficaz para satisfazer os clientes e por consequente, garantir o nível de vendas. Parte importante da componente operativa do CRM suporta-se nas BD disponíveis e no seu desenvolvimento entre a actividade do cliente, a gestão e as actividades de relacionamento desenvolvidas pela organização (Gray, 2001). O CRM incorpora a recolha, armazenamento, uso sistemático e melhoria contínua dos dados relativos a clientes sob o pressuposto de que as únicas organizações capazes de construir relações duradouras com os seus clientes são aquelas que, previamente, processam e mantêm um volume adequado de informação sobre os mesmos (Arndt, 2001). O CRM, enquanto gestão de relacionamento com os clientes, é um processo que se baseia na evolução do seu comportamento, na aprendizagem obtida a partir de cada contacto (e.g., aquisição de produtos, promoções ou reclamações), na perspectiva do fortalecimento das relações cliente-organização. A concretização de um projecto de CRM processa-se ao nível: operacional e analítico (Arndt, 2001): • O CRM operacional caracteriza-se pelo seu carácter pragmático considerando como actividades todas aquelas que traduzem o contacto efectivo entre a organização e o cliente e, se desenrolam no seio dos departamentos que pressupõem esse mesmo tipo de contacto, como sejam os departamentos de vendas, marketing ou serviços. Entre os objectivos de CRM operacional é possível distinguir os relacionados com programas singulares (aumento do recurso ao cross-selling no âmbito da fidelização) e os que implicam a sobreposição de objectivos (uso eficiente do orçamento e criação de introspecções ao cliente). • O CRM analítico caracteriza-se pelo seu contexto de análise, consistindo em acções com vista à preparação de todas as componentes susceptíveis de estudo (e.g., dados de clientes, mercados), de modo a viabilizar a análise das características dos consumidores (comportamentos e condutas) e planificar e executar as actividades do CRM operacional, relativas às expectativas e necessidades dos mesmos. A organização das diferentes actividades de CRM operacional e analítico obriga à sua implementação em programas distintos, com interfaces nítidas, objectivos especiais e actividades (e.g., marketing directo) adequadas – programas de fidelização e recuperação. Por exemplo, os clientes com uma elevada probabilidade de deixarem de o ser, podem ser detectados no programa de fidelização, se existir uma base de dados sobre os clientes que já abandonaram a organização e as razões pelo qual o fizeram. Em ambas as vertentes o objectivo do CRM, consiste em fornecer toda a informação necessária para criar um canal de diálogo cruzado, feito à medida de cada cliente e baseado nas suas reacções actuais (Arndt, 2001). Existem duas abordagens, para organizar este processo cruzado e funcional de CRM (Wyner, 1999): através de propostas orientadas para a organização (orientação para a produção e para projectos) – fora do âmbito do estudo - e através de propostas orientadas para os ciclos, como sejam o ciclo de vida do cliente, do produto ou do mercado. Este artigo refere-se à abordagem orientada para o CVC, apresentado na secção seguinte. 4 3. CRM baseado no Ciclo de Vida do Cliente A abordagem considerada neste trabalho é baseada no CVC, decorrendo do facto do CRM se centrar na análise dos desejos e na satisfação das necessidades de cada cliente ao longo da relação com a organização. Cumulativamente, o CVC apresenta-se como o cenário temporal mais estável, possibilitando a realização das actividades de CRM operacional de acordo com o estágio de relação dos indivíduos que compõem o target (conjunto de pessoas definidos com o perfil de consumidor para determinado produto ou serviço de uma organização). O CVC refere-se às várias etapas de relacionamento entre a organização e o cliente podendo servir de referencial para informar da sua intenção de compra de produtos ou serviços (Figura 3). Associado a este indicador são considerados os diferentes estágios dos clientes termos de marketing: suspect, prospect, cliente activo e ex-cliente (Arndt, 2001). Cada relação começa, teoricamente, muito antes de qualquer contacto físico. Durante um período de formação de opinião o indivíduo, denominado de suspect, está em contacto com toda a informação disponível no mercado sobre as diversas marcas de produtos existentes. Após este contacto em massa com o mercado considera-se que o suspect agrupa o conhecimento de um conjunto de marcas capazes de satisfazer as suas necessidades. A primeira etapa do processo, define-se quando o suspect reconhece alguma necessidade ou desejo insatisfeito relativamente ao produto ou serviço. Por essa altura, após ter formado uma intenção de compra concreta entra em contacto com as organizações fornecedoras desse produto ou serviço, tornando-se então num prospect. Nesta fase do ciclo, o potencial consumidor/cliente decide que tipo de produto ou marca irá comprar, bem como o local onde o irá adquirir e quais as condições de venda (preço, entrega, concessão de crédito), terminando esta etapa com a primeira compra. Este momento determina a passagem do prospect a cliente activo e começa então a relação comercial com a organização, traduzida na compra, utilização e avaliação do produto em função das expectativas face às necessidades e às promessas transmitidas pela comunicação, sendo que o resultado desta avaliação influenciará o comportamento de compra do cliente. Com o decorrer do tempo o cliente cria o cenário da substituição da marca. Caso a relação com a organização nos diferentes níveis seja do agrado do cliente, aumenta a probabilidade de manter a relação. Se pelo contrário, não for do agrado do cliente, aumenta a probabilidade de substituir a marca e, consequentemente o seu ciclo de vida relativamente à organização termina. O cliente entra na fase denominada como abandono, abrindo na organização uma necessidade de reconquista dos consumidores desertors (ex-clientes.) Figura 3 – Utilização das bases de dados em CRM tendo como referência o Ciclo de Vida do Cliente. 5 A utilização das BD em actividades de CRM encontra-se directamente relacionada com o CVC (Arndt, 2001). A caracterização é realizada nas três fases que traduzem os estágios da relação entre o consumidor e a organização e se traduzem em actividades ou programas de CRM: de aquisição; de fidelização e de recuperação de clientes: • Programas de Aquisição (suspects/prospects): implica o estabelecimento de um diálogo com os suspects pertencentes aos grupos alvo, com o objectivo de formarem uma opinião em relação ao produto da organização e mais tarde o invoque a outro indivíduo. Neste programa, são utilizados vários tipos de origem de dados, sendo nesta fase do CVC dada especial importância às fontes de dados externas uma vez que permitem a recolha de informação externa à própria organização, como exemplo geral, a necessidade de identificação e diferenciação de novos suspects (sobre os quais se detém apenas informação adquirida externamente, e.g., nome e morada); • Programas de Fidelização (activos): A fidelização centra-se no estabelecimento de uma comunicação permanente com os clientes activos, com o objectivo de construir um relacionamento a longo prazo, mutuamente lucrativo. As actividades de fidelização proporcionam uma utilização permanente das BD, seja na recolha de informação seja no registo de dados sobre os clientes. No contexto do CVC esta fase corresponde à maior taxa de participação das BD em actividades de marketing (Drozdenko e Drake, 2002). • Programas de Recuperação (ex-clientes): O cliente torna-se num alvo para o programa de recuperação quando deixa de ser cliente activo. A recuperação pressupõe a reconquista dos clientes que deixaram de adquirir produtos ou abandonaram a organização. Essa reconquista não é feita de forma imediata, mas sim através de um diálogo com o cliente e da manutenção do contacto com o mesmo. Na prática, um cliente raramente informa a organização das suas intenções de abandono por isso é necessário encontrar variáveis de explicação adequadas. As razões reconhecidas para o abandono constituem, na sua maioria, a base para o desenvolvimento de programas de recuperação, mas também são importantes para o programa de fidelização. 4. Descoberta de Conhecimento de Bases Dados (DCBD) Até final da década de 80, as BD eram orientadas quase só para o processamento de transacções, servindo como meros suportes de informação para apoio às actividades correntes da organização. Os avanços conseguidos na tecnologia de BD ao longo dessa década, aliados ao crescente desenvolvimento tecnológico e à diminuição dos custos de armazenamento, conduziram à informatização dos mais diversos serviços e, consequentemente, ao registo de todo o género de dados que existem nas organizações. 6 Figura 4 – Fases do processo de DCBD (adaptado de Fayyad, 1996). A DCBD é comummente aceite como sendo um “processo não trivial de identificação de padrões, presentes nos dados, válidos, novos, potencialmente úteis e compreensíveis” (Fayyad, 1996). Em termos muito genéricos é possível afirmar que o processo de DCBD se resume às quatro etapas a seguir descritas (Figura 4): • Definição dos objectivos do processo - São vários os autores que alertam para a importância que esta fase tem no sucesso ou fracasso do processo de DCBD. Qualquer processo de DCBD deve iniciar-se com uma definição clara dos seus objectivos (o que se quer saber e o que se vai fazer). Para a execução do processo de DCBD é essencial trabalhar com especialistas da área de negócio onde se enquadra, e.g., marketers, os quais também deverão estar envolvidos na definição dos objectivos. • Estudo e preparação dos dados - Como acontece na maioria dos processos informáticos (e não só) o resultado final encontra-se bastante dependente do que é fornecido à entrada. A conhecida regra GIGO (Garbage In, Garbage Out), aplica-se em pleno ao processo de DCBD (Feelders, 2002). Para que o processo conduza a resultados de boa qualidade é necessário uma fase de análise e transformação dos dados, normalmente designada de pré-processamento dos dados. Trata-se de uma fase crucial para o sucesso do processo de DCBD e é frequentemente a fase mais demorada, chegando a consumir mais de metade do tempo total (Linoff, 1997). Como acontece com todas as fases do processo de DCBD, esta fase pode ser repetida várias vezes, até que se possa assegurar a qualidade e utilidade dos resultados obtidos. O préprocessamento dos dados inclui, embora não necessariamente por esta ordem, as seguintes etapas: - Obtenção e exploração dos dados: conhecimento dos dados recolhidos, o que são e aquilo que representam; - Limpeza e Transformação dos dados: preparação dos dados para se poder aplicar técnicas de Data Mining (DM). • Selecção e aplicação dos algoritmos de extracção de padrões – Data Mining, Esta é a fase central do processo de DCBD e aquela que tem recebido mais atenção por parte dos investigadores. Após um bom conhecimento dos dados, faz-se a escolha do, ou dos, algoritmos a aplicar aos dados para extracção de padrões. Regra geral, o objectivo desta fase é encontrar uma descrição para os dados que possa ser utilizada para fazer previsão em novos casos. A escolha do algoritmo de DM a ser utilizado vai depender da tarefa a realizar e dos dados disponíveis. Alguns algoritmos não funcionam com 7 valores numéricos, outros pelo contrário, apenas funcionam com valores numéricos. Nesta fase pode ser necessário voltar atrás e fazer novas iterações sobre os dados (préprocessamento) de modo a que o formato em que são apresentados os dados se adeqúe melhor a um dado algoritmo (e.g., fazer a conversão de valores simbólicos em valores numéricos ou transformar uma variável com valores numéricos numa variável com valores simbólicos). No processo de escolha do algoritmo a aplicar deve começar-se por exprimir o problema em termos de uma das “tarefas de alto nível” do DM (Frawley et al., 1991). Quase todos os problemas de DCBD podem ser expressos numa das seguintes tarefas de alto nível: classificação, regressão, clustering, sumarização, modelação de dependências ou detecção de desvios. • Avaliação dos resultados - Uma vez aplicados os algoritmos de DM é necessário efectuar a analise dos resultados obtidos por forma a verificar a sua validade e utilidade. A validade refere-se ao facto dos novos padrões serem confirmáveis por aplicação em novos dados (objectivos de DM); a utilidade refere-se à aplicabilidade do novo conhecimento em ambiente real (cumprimento dos objectivos de marketing). Um estudo realizado para uma seguradora que concluiu que o número de acidentes de viação era mais elevado entre clientes com o signo Peixes. Uma análise dos resultados permitiu verificar que a companhia tinha mais clientes desse signo que dos outros, e portanto, se os clientes desse grupo eram mais, era natural que existisse um número mais elevado de acidentes (Cabena, 1998). O processo de DCBD, normalmente, não é linear, e envolve uma forte interacção com o analista e várias iterações entre as suas fases constituintes (e.g., ao analisar os padrões, o analista pode chegar à conclusão de que não são válidos e fazer com que o processo volte à fase de pré-processamento). Essas iterações estão representadas na Figura 4 pelas setas a tracejado e podem, inclusivamente, fazer o processo voltar à fase de especificação dos objectivos. 5. DCBD em actividades de CRM O CRM incorpora um conjunto de Tecnologias de Informação (TI) relativas ao registo, exploração das bases de dados e consequente aplicação nas suas actividades. A framework proposta neste trabalho aborda o desenvolvimento do CRM orientado ao CVC e expõe como o processo de DCBD, nas suas três vertentes, pode ser utilizado neste contexto (Sánchez, 2003): • Captação e angariação de clientes: a aplicação da DCBD como suporte a actividades com vista à captação de clientes; • Fidelização: utilização em acções que permitam conhecer qual o perfil dos clientes da empresa em termos de desejos, necessidades e expectativas; • Recuperação de clientes activos: determinar quais as causas que levaram ou contribuíram para a desistência ou abandono. Em comum as três vertentes apresentadas têm o facto de estarem associadas a actividades dinâmicas e dependentes da informação que existe em cada momento sobre os clientes. O desenvolvimento das políticas de CRM baseadas no Ciclo de Vida dos Clientes (CVC) pressupõe um conhecimento profundo da actividade dos clientes, bem como das suas características registadas em BD (Gray, 2001; Arndt, 2001). A concretização do estudo e conhecimento dos clientes é suportado tecnologicamente num processo de DCBD, tratando-se de um processo não trivial (Ingolf, 2002), interactivo e multi-faseado (Wyner, 1999) que requer uma aplicação e avaliação contínua dos resultados obtidos. 8 5.1 Framework para Integração da DCBD em actividades de CRM A secção anterior permitiu a apresentação do CRM suportado no CVC como um conjunto de três programas – aquisição; fidelização e recuperação. A framework proposta ilustrada pela Figura 5 evidencia a validade dos processos de DCBD aplicáveis a cada um destes programas, incorporando uma visão sobre a utilização dos dados registados em BD. Figura 5 – Actividades de CRM suportadas por processos de DCBD. A framework proposta caracteriza-se por agregar na mesma abordagem: os dados (associados aos quais se inclui a problemática da angariação, importação, e constituição de BD de clientes); a exploração da BD através da DCBD (transformação e pré-processamento de dados, aplicação de algoritmos de DM e avaliação dos resultados); aplicação do conhecimento obtido em actividades de CRM, com enfoque nos programas de captação, retenção e recuperação de clientes. Estas fases são detalhadas em seguida. 5.1.1. Dados O sucesso da aplicação dos processos de DCBD em actividades de marketing depende directamente dos dados disponíveis e sobre os quais se irá desenvolver. Estes dados podem entre outros aspectos, ter naturezas distintas: internos (e.g., dados da própria organização, dados de clientes, fornecedores, acções promocionais ou registo de vendas) ou externos (e.g., aluguer de BD ou provenientes de promoções realizadas em parceria com outras empresas); A recolha de dados depende de um conjunto de aspectos que condicionam a disponibilidade e qualidade dos mesmos. • Dados internos: dados em diferentes sistemas de informação da organização; dados relativos a campanhas anteriores de marketing (suporte digital ou suporte tradicional como sejam os cupões de resposta ou formulários respondidos por clientes) • Dados externos: provenientes de BD disponíveis no mercado, alugadas a empresas diversas (nome e morada) ou outras fontes externas à organização. O processo de recolha de dados conduz à constituição da BD de clientes sobre a qual irá decorrer a DCBD. A BD irá funcionar como o “armazém de informação” devendo por isso estar disponível e actualizada (existe a tendência do seu conteúdo vir a tornar-se desactualizado com o passar do tempo), evitando erros estratégicos (Pinto, 2004). As BD de clientes para poderem estar ao nível das solicitações e permitirem uma utilização facilitada deverão ter como características relevantes, as seguintes: • Organizadas por tópicos, por departamentos ou outras funções organizacionais; • Integridade dos seus dados, embora provenientes de sistemas ou plataformas heterogéneas, são registados de um modo padronizado, sem duplicação, permitindo inclusive, a integração de dados externos à própria organização; 9 • Constantes ou estáveis, uma vez que o seu conteúdo deverá possuir um horizonte temporal alargado, não sendo actualizadas com a frequência de outras e.g., BD transaccionais dos sistemas financeiros ou contabilísticos; • Não voláteis, permitindo apenas operações de carregamento, actualização ou consulta. 5.1.2 Desenvolvimento da DCBD no contexto de programas de aquisição de clientes Os programas para conquista e captação de clientes pressupõem o estabelecimento de contactos com indivíduos, aos quais se pretende apresentar um novo produto ou serviço. Face ao rigor financeiro que os departamentos de marketing estão actualmente sujeitos, importa mais determinar as estratégias de comunicação mais eficazes do que massivas ou intensivas, as quais se têm revelado bastante menos eficazes que as de contacto directo. Numa abordagem tecnológica, estas acções implicam a existência de dados relativos aos indivíduos suspects ou prospects. Uma vez constituída a BD dos indivíduos alvo aplicam-se as técnicas de DCBD. A DCBD surge como uma forma de resolver um problema corrente em muitas organizações que possuem BD, mas para os quais os processos clássicos de recolha de informação são insuficientes. O desenvolvimento do processo de DCBD num contexto de aquisição de novos clientes passa por definir o perfil, os padrões de comportamento e consumo dos clientes actuais para projectar no desenvolvimento de acções de marketing com vista à aquisição dos novos clientes. Para ilustrar (Reichheld, 2001) refere como exemplos os seguintes: • Uma organização que actua no ramo segurador descobriu que, no seu caso, em termos de fidelidade e propensão à aquisição dos seus produtos, os indivíduos têm como características: são normalmente casados; vivem na região norte do país (adquirem maior variedade de produtos que as do sul); são proprietários de casa própria, sendo mais rendíveis que os que vivem em casa arrendada. • Um banco descobriu que os indivíduos agregados em grupos de afinidade – e.g., ordem de engenheiros, médicos ou advogados – nesse contexto de membro, adquirem com maior facilidade de produtos a crédito que quando contactados fora desse contexto. Os resultados do processo de descoberta de conhecimento, quando novos e relevantes, poderão servir para a delineação de estratégias de captação de clientes. 5.1.3.Desenvolvimento da DCBD em programas de fidelização de clientes Ao longo da relação entre o cliente e a organização existe um conjunto de informação libertada que se vai acumulando em BD (internas à organização) – e.g., vendas, questionários respondidos, registos financeiros, promoções em que participou, formulários, reclamações. A análise do comportamento, numa perspectiva de DCBD permitirá a determinação de desejos “secretos” dos clientes; expectativas frustradas ou simplesmente o desejo de satisfação e retribuição pela relação. O conhecimento da vertente “escondida” do cliente (Kotler, 2002) permitirá o desenvolvimento de programas de fidelização correctamente orientados e com elevado probabilidade de sucesso, e.g., Cães & Gatos da Master foods ou revista consigo da Lever (Castro, 2005). A DCBD permite à organização desenvolver actividades de marketing que sustentem a fidelização do cliente. O aprofundamento do conhecimento sobre os clientes, ou sobre a complexidade do comportamento dos clientes, o qual não é explicitamente expresso, é possível que seja descrito com base em regras ou descrições escondidas por entre os dados que a organização possui. Como exemplo da identificação do perfil de clientes fieis, uma empresa do ramo da distribuição descobriu que os indivíduos provenientes de campanhas de 10 desconto são menos fieis que outros provenientes do contacto casual com as suas lojas (Reichheld, 2001). 5.1.4.Desenvolvimento da DCBD em programas de recuperação de clientes Um cliente, quando pretende abandonar a relação com uma organização, normalmente não avisa, simplesmente desiste (Kotler, 2002). A desistência não pode ser considerada uma decisão simples, mas antes o culminar de um processo, que ilustra um padrão de comportamento (Wyner, 1999). A permanência de um indivíduo como cliente activo por vários ciclos de compra, permite à organização a recolha de dados internos que servirão para o conhecer melhor. Sempre que o cliente desiste da relação (quando existe um intervalo de tempo considerável sem que exista qualquer contacto com a organização), os seus dados permanecem na organização e são actualizados para um novo estatuto – desertor (ex-cliente). A utilização da DCBD é particularmente eficaz na detecção de desvios e abandonos através da determinação de padrões de comportamento atípicos, no interior das BD que contêm os registos detalhados dos clientes. O processo de DCBD desenvolve-se sobre os dados relativos a toda a actividade dos clientes (e.g., registo de reclamações, inquéritos respondidos, promoções) e permitirá à organização adaptar a sua relação com os clientes. 5.2 Sistematização da framework Os resultados deste trabalho permitem sistematizar ainda as diferentes etapas da framework desenvolvida, evidenciando o aproveitamento das BD para além do uso tradicional normalmente dado às BD. O modelo desenvolvido sugere também, a integração de processos que vão desde a recolha de dados até à sua efectiva utilização em actividades de CRM nos programas referenciados, assim como, denota o feedback entre os resultados obtidos e os dados de entrada (Figura 6). Outras considerações, decorrem das incidências decorrentes da estrutura da própria framework, onde são mais relevantes quatro momentos: definição dos objectivos, dados, processamento e resultados. Objectivos: as metas estabelecidas em termos de marketing funcionam como elementos orientadores não só em termos de selecção dos dados como também da prática dos procedimentos de DCBD; Dados: conforme exposto ao longo do artigo o sucesso da utilização dos dados em actividades de marketing depende deles próprios. É importante colocar a ênfase nos dados na medida que pode haver necessidade de angariação de outros dados para garantia do processo. Finalmente, os dados devem também estar ajustados ao domínio de aplicação no qual serão utilizados, e.g., quando se pretende analisar o comportamento de compra dos consumidores deve existir informação acerca desse assunto; Processamento: a inovação da framework aqui proposta assenta sobretudo na aplicação das actividades de DCBD em actividades de CRM. O processamento concretiza a integração dos dados nos programas de CRM através dos procedimentos para preparação e transformação dos dados e da aplicação de algoritmos de DM; Resultados: no âmbito do trabalho desenvolvido procurou-se compreender como os dados podem ser utilizados para desenvolver ou optimizar as actividades de CRM. No quadro dos três programas considerados é possível indicar um conjunto de estratégias onde existe de facto interesse em aplicar o conhecimento extraído das BD de clientes (O’Leary, 2004): prospecção de novos clientes; segmentação de clientes; retenção de clientes; identificação dos interesses de clientes, para envio de promoções; suporte a actividades de marketing relacional; affiliate marketing e marketing sob contrato. As BD de clientes são potenciais fontes de informação 11 para construção de relações fortes e duradouras e em ultima análise condicionar o modo como a relação entre cliente e organização é construída, desenvolvida e mantida. Figura 6 – Passos a percorrer, aspectos a considerar: desde dos dados aos resultados. O dinamismo advém do feedback entre os resultados obtidos e os dados, permitindo incorporar nas BD da organização os resultados obtidos em iterações ou programas anteriores. 6. Conclusões e Trabalho Futuro O facto de existirem muitos dados nas organizações, não significa necessariamente que as mesmas possuam a informação que necessitam sobre os seus clientes. O trabalho desenvolvido permitiu o estudo, numa perspectiva tecnológica, da importância das bases dados na prossecução de objectivos de mercado, como sejam a captação e a fidelização de clientes em projectos de CRM. O desenvolvimento do CRM baseado no CVC traduz-se por um lado, numa fonte de dados muito importante para o esforço de marketing, mas por outro lado, confirma que apenas será possível o desenvolvimento de projectos neste âmbito, se existir uma utilização eficaz das BD. Expôs-se ao longo deste artigo o papel que a DCBD pode representar nos três programas propostos no âmbito do CRM: programas de aquisição, fidelização e recuperação de clientes. A abordagem seguida é baseada no CVC, decorrendo do facto de se assumir que o CRM centra-se na análise dos desejos e na satisfação das necessidades de cada cliente, ao longo da relação com a organização. Esta abordagem contudo, apresenta limitações para objectos de estudo distintos. Sempre que uma organização introduz no mercado um novo produto fará mais sentido organizar o processo de CRM em torno do ciclo de vida do produto. 12 A framework proposta é inovadora na medida que coloca de lado processos estatísticos clássicos ou simples bem como procedimentos tradicionais de interrogação das BD existentes, em prol uma abordagem pró-activa e dinâmica sobre os dados através da DCBD. Como trabalho futuro, face às limitações expostas no processo de CRM baseado no CVC, é possível abrir espaço para a realização de trabalhos de investigação cientifica em domínios de CRM baseados em ciclo de vida de produto ou outros, onde como e.g., as naturezas das BD são distintas e diversas. Referências bibliográficas Arndt, Dirk, Gersten, Wendy (2001). Data Management in Analytical Customer Relationship Management, Workshop:“Data mining for marketing applications”. Universidade Hasselt, Belgica Berry, L. L. (1983). Relationship Marketing, In: Berry L.L.; Shostack G. D., Upah G.D. (eds): Emerging perspectives in Service Marketing, Chicago pp25-28. Berson, Alex, Smithy, Stephen, Theraling, Kurt (1999). Building Data Mining Applications for CRM. McGraw-Hill, NewYork. Bretzke, Miriam (2005). CRM Como Diferencial Competitivo. http://www.bretzkemarketing.com.br, (acedido a 20-06-2005). Brown, Stanley A. (2000). Customer Relationship Management. John Willey & sons, Ontario, Canada. 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