termo de referência da biblioteca básica maranhense

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TERMO DE REFERÊNCIA
DA
BIBLIOTECA BÁSICA MARANHENSE
Rossini Corrêa
Se no principio era o Verbo, logo o Profeta Isaías recomendou que se fosse e se
escrevesse em uma tábua, aquilo que devesse ficar até o último dia, e perpetuamente
(Isaías 30:8). Ou seja, a tradição judaica, antepassada do código cristão, sem rebuços,
estabeleceu uma dupla afinidade eletiva: com o Verbo e com o Livro.
O mundo ibérico – de cuja civilização lusitana o Brasil e o Maranhão são
derivados – arquitetou uma relação desigual, entretanto, com o Verbo e com o Livro. Na
vertente portuguesa os cronistas foram valorizados pelos poderosos, na medida em que
escreviam os chamados Livros dos Feitos, exaltando o seu protagonismo na história, do
que é exemplo quase tardio Pero Vaz de Caminha, autor da Carta ao Rei Dom Manuel,
narrando a Descoberta do Brasil, em 1 de maio de 1500.
Em perspectiva exógena, entretanto, o mundo que o português criou foi, em
grande medida, refratário ao Verbo e ao Livro, ambos havidos como perigosos para os
interesses do Império Colonial sustentado pelas feitorias d’além mar. Tanto é verdade, e
não por acaso, que a repressão metropolitana aos ideais autonomistas sempre passou
pelo extermínio dos denunciados como boquirrotos e panfletários, morressem contentes,
qual Bequimão ou tivesse a Constituição dos Estados Unidos da América, a exemplo de
Tiradentes; pedissem aos algozes que atirasse, no coração, qual Padre Roma ou
garantissem que o liberal não morre nunca, como Frei Caneca.
É consabida a Ordem Régia do Estado Metropolitano, a realizar a proibição de
que livros fossem publicados e circulassem nos espaços coloniais lusitanos, o que
alcançava, por evidente, as folhas ou jornais. No acaso da Colônia, com a Família Real
residindo no Brasil e a Imprensa Régia funcionando, o viajante inglês Henri Koster foi
preso na Alfândega de São Luís e o motivo por que o foi consistiu em um só: portava
livros...
O processo de vitória sobre o obscurantismo foi denodado e conseguiu que
tipografias, jornais e livros iluminassem o caminho, em busca da difícil autonomia
nacional. César Augusto Marques, no Dicionário Histórico e Geográfico de Província
do Maranhão, não vacilou em registrar como relevante a primeira prensa a funcionar
em terras timbiras, consignando os versos publicados em honra do acontecimento. E
com razão.
Se Claude d’Abbeville relatou que os índios maranhenses contatados pelos
franceses eram grandes palradores, não parando de discursar, os intelectuais da
sociedade imperial da província se revelariam notáveis escritores, tanto em jornais
quanto em livros. O Maranhão, portanto, vencida a opressão colonialista, realizou a
urdidura de sua conexão com o Verbo e com o Livro, advindos das antiguidades
judaicas e prosperou na direção construtiva de um paradigma literário, qualificado por
José Veríssimo como o Grupo Maranhense.
Eis de onde é egressa a realidade do mito ou a mitologia real – tanto se meu
quanto se me dá – da Atenas Brasileira, reivindicada por nós e acreditada por outrem, a
repousar, pelo menos no passado, na qualidade da contribuição maranhense para as
letras, artes e ciências no Brasil. Quem escreve estas mal traçadas linhas disse ‘não’
(Formação Social do Maranhão: o presente de uma arqueologia) e disse ‘sim (Atenas
Brasileira: a cultura maranhense na civilização nacional) à realidade do mito ou à
mitologia real da Atenas Brasileiras, por amor à dialética, tendo-a, em qualquer
hipótese, como honrosa. Signo prognóstico – o de Atenas – ancorado no século de
Péricles e no chão filosófico pisado por Sócrates, Platão e Aristóteles, bem como
reinventado no Ressurgimento pela Família Medici, a batizar a sua república de sábios,
artes e academias, isto é, Florença, como a Atenas do Renascimento.
De qualquer maneira, do manancial literário em questão, talvez menos
evidente, mas nunca menos relevante, resultou uma arguta produção ensaística e
reflexiva, à luz das ciências, por meio da qual a sua inteligência ambicionou que os
maranhenses tomassem consciência de si mesmos, nas mais diferentes ordens do real
em fluxo. Essa valiosa produção, ora rara, ora dispersa, precisa ser resgatada, ordenada
e posta à disposição do livre e democrático acesso da juventude e dos pesquisadores,
fomentando o pensamento crítico e complexo sobre a questão maranhense, que é
condição do seu futuro, exigente, porém, do conhecimento do seu passado.
Eis o fundamento heurístico e propositivo, da criação de uma Biblioteca Básica
Maranhense, que tenha como ambição primeira a reunião de cem títulos essenciais para
o conhecimento da realidade estadual, de maneira a constituir uma autêntica
enciclopédia timbira. O espelho em que a presente sugestão está se mirando, em sua
condição sistemática, com efeito, responde pelos nomes de notáveis coleções nacionais,
quais sejam a Brasiliana, a Documentos Brasileiros, a Corpo e Alma do Brasil e a
Biblioteca Básica Brasileira. Esforços, estes, decorrentes dos préstimos, entre outros, de
Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Rubens Borba de Moraes, Afonso Arinos
de Mello Franco, Fernando Henrique Cardoso e Darcy Ribeiro.
Com a plasticidade do que só reconhece o dogma de não ter dogma, a
Biblioteca Básica Maranhense vai começar, entre outros títulos, com a publicação de A
Produção da Coisa Pública, de Raimundo Palhano e de O Modelo Jurídico da
Sociedade de Economia Mista e o Processo de Desenvolvimento Econômico e Social
do Estado do Maranhão, de João Batista Ericeira. Sugere-se que o projeto em questão,
em seguida, incorpore a reunião de toda a obra econômica de Bandeira Tribuzzi, isto é,
da Formação Econômica do Maranhão, dos Ensaios Econômicos e do Plano do
Governo Pedro Neiva de Santana, bem como o somatório dos estudos de Ignácio
Rangel e de Manuel Correia de Andrade sobre a questão agrária e os novos eixos
rodoviários brasileiros e a consolidação dos ensaios de Maureli Costa e de Sálvio Dino
sobre a passagem da Coluna Prestes pelo Maranhão.
E que parta, a Biblioteca Básica Maranhense, em busca de Raimundo José de
Sousa Gaioso, José Cândido de Moraes e Silva, César Augusto Marques, Luís Antônio
Vieira da Silva, Cândido Mendes, Rafael Estêvão de Carvalho, Odorico Mendes, João
Francisco Lisboa, José Ascenso da Costa Ferreira, Celso de Magalhães, Joaquim Serra,
Graça Aranha, Coelho Netto, Dunshee de Abranches, Humberto de Campos, Fran
Paxeco, Barbosa de Godois, Raimundo Lopes, Antônio Lopes, Astolfo Serra, Viriato
Corrêa, Jerônimo de Viveiros, Carlota Carvalho, Mário Meireles, D.Felipe Condurú
Pacheco, Nunes Pereira, Neiva Moreira, Elóy Coelho Netto, Carlos de Lima e, entre
outros, Nascimento Morais Filho e Bernadp Coelho de Almeida. Assim o projeto
editorial ora encerrado por-se-á a caminho e, com certeza, encontrará o seu vitorioso
norte.
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