Perfil nutricional e epidemiológico dos pacientes com úlceras por

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Artigo Original
Nogueira PD et al.
Perfil nutricional e epidemiológico dos pacientes com úlceras por
pressão internados em um Hospital de Fortaleza-Ceará
The nutritional and epidemiologic profile of the pressure ulcers patients on treatment in a Hospital in
Fortaleza-Ceará
Patrícia Diniz Nogueira1
Adriana Bessa Fernandes Medeiros2
André Ricardo Bindá de Borba3
Ana Mary Viana Jorge4
Unitermos:
Úlcera por pressão. Cicatrização de feridas. Estado
nutricional. Terapia nutricional.
Key words:
Pressure ulcer. Wound healing. Nutritional status.
Nutrition therapy.
Endereço para correspondência:
Patrícia Diniz Nogueira
Rua Profa. Heloisa Ferreira Lima, 2201, Casa G, Bairro
Itapery – Fortaleza, CE - CEP: 60742-100
E-mail: [email protected]
Submissão
19 de junho de 2009
Aceito para publicação
1 de fevereiro de 2010
1.
2.
3.
4.
Acadêmica do Curso de Ciências da Nutrição
da Universidade de Fortaleza.
Enfermeira, Mestre em Enfermagem em Cuidados Clínicos pela Universidade Estadual
do Ceará (UECE); Enfermeira da Comissão
Interdisciplinar de Prevenção de Lesões do
Hospital Geral Waldemar Alcântara (HGWA).
Nutricionista, Especialista em Nutrição Clínica
pela Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Nutricionista, Mestre em Bioquímica pela
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);
Docente do Curso de Ciências da Nutrição da
Universidade de Fortaleza.
RESUMO
Introdução: As úlceras por pressão constituem um sério problema de saúde pública,
aumentam o tempo de internação dos pacientes e ocasionam custos extremamente altos
no ambiente hospitalar. Objetivo: O objetivo deste estudo foi avaliar o perfil dos pacientes
hospitalizados com úlceras por pressão quanto ao estado nutricional, características
epidemiológicas das úlceras por pressão e características da terapia nutricional. Método
e Resultados: Dentre os resultados encontrados, a incidência foi 53% e prevalência
47%, sendo 11% em estágio I, 63% em estágio II, 3% em estágio III e 8% em estágio IV.
Em relação à localização das úlceras, a região sacra esteve presente em 55% da população estudada, a região calcânea em (24%) e lombar (8%). O estado nutricional dessa
população era de 48% de eutróficos e 52% de desnutridos. A terapia nutricional em oito
(35%) pacientes foi instituída por via oral e em 15 (65%) por via enteral, com prevalência
de intervenções nutricionais com o perfil de dietas hipocalóricas (57%) e hiperprotéicas
(74%), não condizendo com o fato de que ofertas ótimas calórico-protéicas, com todos os
micronutrientes, fazem-se necessárias para o sucesso de uma cicatrização mais rápida
e eficiente. Conclusão: Concluiu-se, portanto, a importância de um acompanhamento
interdisciplinar sistêmico para prevenção e tratamento das úlceras por pressão, no que
diz respeito ao uso adequado e racional das medidas preventivas e intervencionistas, a
fim de reduzir o tempo de internação hospitalar, minimizar os custos com o tratamento e,
sobretudo, diminuir o sofrimento dos pacientes. Deste modo, a assistência ao enfermo
torna-se mais eficiente, trazendo, assim, uma gradativa resolução para o problema.
ABSTRACT
Introduction: The pressure ulcers are a serious problem for the public health system, by
the increased hospitalizing time of the patients and for making the costs of the hospital
ambient extremely high. Objective: The objective of the following study was to evaluate the
hospitalized patients profile with pressure ulcers, as the nutritional condition, pressure ulcers
epidemiological characteristics and the therapy’s nutritional characteristics. Methods and
Results: Among the encountered results, the occurrence was of 53 % and prevalence was
47%, being 11% at stage I, 63% at stage II, 3% at stage III and 8% at stage IV. By the way
of the pressure wounds localization, the sacra region was present on 55% of the studied
population, the heeling region on 24%, and the loin region on 8%. The nutritional condition
of this population was of 48% of eutrophics and 52% of malnourished. The nutritional
therapy on 8 (35%) patients was made by oral way and fifteen (65%) by a enteral way, with
a nutritional intervention prevalence with a hypo caloric profile diet (57%) and hyper protein
(74%,) not agreeing with the fact that high caloric-protein offers, with all micronutrients is
made necessary for a faster and successful wound healing. Conclusion: A conclusion was
found pointing to the importance of a systemic multidisciplinary following for a successful
preventing and healing of the pressure ulcer, regarding the appropriate and rational use of
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Perfil nutricional e epidemiológico dos pacientes com úlceras por pressão internados em um Hospital de Fortaleza
the preventive and interventional attitudes, to reduce the length of hospital stay, to minimize
the treatment cost and, especially, to reduce the patient suffering. Making the assistance
to the sick more efficient, bringing this way a gradual resolution to the problem.
INTRODUÇÃO
As úlceras por pressão são definidas pela European Pressure
Ulcer Advisory Panel1 como uma área de morte celular, localizada na pele e tecidos subjacentes, causada por pressão, cisalhamento, fricção ou a combinação desses, ocorrendo tipicamente
em áreas de proeminências ósseas”. As úlceras por pressão são
classificadas de acordo com o comprometimento tecidual, em
diferentes estágios. Segundo National Pressure Ulcer Advisory
Panel2, o método de classificação mais amplamente revisado,
as úlceras por pressão classificam-se em:
• Estágio I – Lesão eritematosa não esbranquiçada em pele
intacta;
• Estágio II – Perda parcial da pele, envolvendo a epiderme/
derme ou ambas, apresentando-se de forma abrasiva, bolha
ou desepitelização superficial;
• Estágio III – Perda da pele na sua espessura total, envolvendo
danos em uma necrose do tecido subcutâneo, que pode se
aprofundar;
• Estágio IV – Perda tecidual extensa e necrose de músculos,
osso e/ou tendões subjacentes.
As úlceras por pressão têm sido um problema comum em
serviços de saúde, pois acometem a população de forma geral,
independentemente do sexo, idade ou etnia, determinando um
alto índice de pessoas com alterações na integridade da pele,
constituindo, assim, um sério problema de saúde pública3.
Apesar da modernização dos cuidados de saúde, a prevalência
das úlceras por pressão permanece elevada nos pacientes
hospitalizados e domiciliares. Estas úlceras são uma importante
causa de morbidade e mortalidade, afetando a qualidade de
vida do doente e dos seus cuidadores, contribuindo para uma
insustentável sobrecarga econômica para os serviços de saúde4.
Os custos das úlceras por pressão no ambiente hospitalar são
extremamente altos, aumentando em 137% os dias de internação
e 157% os custos da internação dos pacientes que apresentam
essas lesões5. Nos Estados Unidos, anualmente, mais de 1 milhão
de pessoas hospitalizadas desenvolvem úlceras por pressão e
aproximadamente 60.000 morrem por complicações decorrentes
dessas úlceras6. No Brasil, análises acerca dessa problemática
são escassas. No estudo de Rogenski7 sobre a incidência de
úlceras por pressão em um hospital universitário, obteve-se um
índice de 39,8% e, no de Petrolino8, desenvolvido em pacientes
de unidade de terapia intensiva (UTI), foi encontrada uma
incidência de 10,62%.
Os principais fatores de risco para o desenvolvimento dessas
lesões podem ser descritos em dois grupos: fatores extrínsecos,
relativos à exposição física do paciente, como fricção, cisalhamento, umidade e pressão; e fatores intrínsecos, inerentes
ao estado clínico do paciente, como idade, perfusão tecidual,
doenças crônicas como o diabetes melito e doenças cardiovasculares, uso de alguns medicamentos e o estado nutricional. Dentre
os fatores etiológicos relacionados ao paciente, o estado nutricional é um dos mais relevantes, pois a desnutrição resultante
da carência nutricional afeta todo o sistema corporal, altera a
regeneração tissular, a reação inflamatória e a função imune,
podendo levar à perda de peso, atrofia muscular e redução da
massa tecidual, atuando na patogênese e não cicatrização dessas
úlceras6,9-12.
Após a manifestação da ferida, inicia-se o processo de
cicatrização, que é definido como uma resposta dinâmica e
imediata do organismo a uma lesão, com o intuito de restaurar
a característica anatômica, funcional e estrutural do tecido.
Esse processo pode ser dividido em fases bem definidas que
exigem nutrientes específicos e um bom estado nutricional geral
do indivíduo para que haja melhores resultados e redução no
tempo de cicatrização13,14.
A fase inicial é chamada de inflamatória e caracteriza-se pela
homeostase, coagulação, ativação da resposta imune local, fagocitose e a migração celular. A segunda fase é a de proliferação,
marcada pelo intenso desenvolvimento das células epiteliais e
fibroblastos, responsáveis pela produção do colágeno. A fase
final é a de remodelação, quando ocorre o processo de maturação
e estabilização do colágeno, conferindo força tênsil à cicatriz13,14.
As fases do processo cicatricial são mediadas por uma série
de fatores e, principalmente, vários nutrientes. Alguns aminoácidos específicos estão associados com a melhora do processo,
como a cisteína, que funciona como co-fator do sistema enzimático envolvido na síntese de colágeno; a metionina, associada à
síntese protéica; a glutamina, que reduz a degradação e aumenta
a síntese protéica; e a arginina, que é precursora do colágeno
através da via ornitina, prolina e hidroxiprolina, além disso,
estimula a síntese de hormônios anabólicos, especialmente o
hormônio de crescimento, que contribui significativamente para
a regeneração tecidual13-16.
Alguns micronutrientes também são de grande importância
na terapia nutricional de pacientes com úlcera por pressão. A
vitamina A aumenta a fibroplasia, o acúmulo de colágeno na
ferida e a taxa de diferenciação dos fibroblastos; a vitamina C
também é importante, pois tem participação em todas as etapas
da cicatrização; sua ingestão insuficiente leva os fibroblastos
a produzirem um colágeno deficiente e de degradação rápida.
Possui, ainda, função antioxidante, combatendo os radicais
livres, assim como a vitamina E. Alguns minerais são essenciais
no processo de cicatrização, como o zinco, que funciona como
co-fator enzimático para a síntese protéica, replicação celular
e síntese de colágeno, cuja deficiência retarda o processo de
cicatrização; o cobre promove a maturação do colágeno e a
síntese de elastina e ainda exerce ação antioxidante através da
enzima superóxido dismutase, a qual necessita de dois átomos
de cobre por molécula; e o selênio, que faz parte da glutationa
peroxidase, enzima antioxidante, que catalisa a redução do
peróxido de hidrogênio, protegendo as células da oxidação13-15.
A nutrição adequada é um dos mais importantes aspectos
para o sucesso do processo de cicatrização, pois a dinâmica da regeneração tecidual exige uma série de interações
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físico-químicas e maior necessidade energética. Assim como
os micronutrientes, as calorias fornecidas como carboidratos e
lipídeos possibilitam que as proteínas sejam destinadas para seus
fins construtivos e impedidas de serem convertidas a glicose, e,
consequentemente, energia. Logo, os carboidratos se apresentam
como de extrema importância, pois vão servir de energia para
leucócitos, fagócitos, para a proliferação celular e função fibroblástica, além de garantir a função plástica da proteína11,13. Do
mesmo modo, os lipídeos são importantes, pois são constituintes
das membranas celulares e serão bastante exigidos devido à
intensa replicação celular17.
As proteínas são fundamentais para todo o processo de
cicatrização, sendo essenciais para a síntese de colágeno, para
o sistema imunológico e para a proliferação fibroblástica.
Pompeo18 considera que a adequada ingestão protéica é essencial para uma boa cicatrização. Visto que sua depleção parece
retardar a cicatrização por prolongar a fase inflamatória, inibindo
a fibroplasia, síntese de colágeno e neoangiogênese19.
Os trabalhos científicos bem conduzidos não deixam
dúvidas de que o fornecimento de nutrientes apropriados não
somente beneficia o estado nutricional, como também aumenta
a mobilidade, acelera a cicatrização das lesões, possibilita um
fechamento mais rápido e reduz substancialmente os custos
mediante a introdução de suplementos específicos contendo
proteínas e micronutrientes que estão envolvidos na estimulação
da cicatrização de feridas5,20-22.
Considerando-se os aspectos nutricionais como fator fundamental na etiopatogenia das úlceras por pressão, interferindo
no desenvolvimento e cicatrização dessas lesões, optou-se pela
realização desse estudo com os seguintes objetivos: avaliar o
perfil dos pacientes hospitalizados com úlceras por pressão
quanto ao estado nutricional, características epidemiológicas
das úlceras por pressão e características da terapia nutricional.
MÉTODO
Tratou-se de estudo transversal descritivo, realizado com
todos os pacientes portadores de úlcera por pressão, independentemente da doença de base, idade e sexo, internados
na Unidade de Cuidados Especiais de um Hospital Público,
durante um período definido de 30 dias. A população total foi
constituída por 32 pacientes. Destes, foram considerados para
avaliação nutricional 23 e excluídos nove sujeitos por estarem
em anasarca, impossibilitando a aferição de medidas.
Os dados foram coletados no dia da internação, utilizando-se
um protocolo previamente definido, composto por três partes.
A primeira referia-se à obtenção de informações do prontuário
(diagnóstico clínico, exames bioquímicos e tipo de dieta prescrita); a segunda para aquisição do diagnóstico nutricional, por
meio da avaliação clínica, antropométrica, física e bioquímica
com posterior cálculo das necessidades nutricionais, e a terceira
para obtenção das características da úlcera tais como número,
incidência, prevalência, localização e estadiamento. Para se
tomar as medidas de circunferência do braço (CB) e altura do
joelho, foi utilizada uma fita métrica inelástica em centímetros
com precisão para milímetros e para aferição das pregas cutâneas tricipital (PCT), bicipital (PCB) e subescapular (PCSE)
foi utilizado um adipômetro da marca Lange Skinfold Caliper®.
Os resultados oriundos das medidas de CB e PCT, tais como
o percentual de adequação da CB, da circunferência muscular
do braço (CMB) e da PCT, foram categorizados conforme a
classificação modificada de Blackburn, G.L. & Thornton, P.A23.
A avaliação física incluiu o aspecto geral do paciente, observando se ele apresentava edema, ascite, alterações cutâneas,
alterações mucosas, petéquias, equimoses, glossite, estomatite
ou queilose.
Os parâmetros bioquímicos utilizados para auxiliar na
avaliação clínica e nutricional foram o hemograma e a Contagem
Total de Linfócitos (CTL), respectivamente. A CTL foi interpretada como: Depleção Leve: 1200-2000 cel/mm³; Depleção
Moderada: 800-1999 cel/mm³; Depleção Grave: < 800 células/
mm³, de acordo com a classificação de Blackburn & Bistrian24
e o hemograma de acordo com o laboratório de análises do
hospital.
Para a identificação do estado nutricional dos pacientes,
na impossibilidade de locomoção, a estatura e o peso foram
estimados por meio das Equações de Chumlea25 e o peso ideal
pelo índice de massa corporal (IMC) médio para sexo e idade,
classificado de acordo com os critérios da Organização Mundial
de Saúde (WHO, 1995 e 1997), que define como pontos de
corte: Eutróficos os indivíduos com IMC entre 18,5-24,9 kg/
m²; Desnutrido Grave: < 16,0 kg/m²; Desnutrido Moderado:
16,0-16,9 kg/m²; Desnutrido Leve: 17,0-18,4 kg/m²; Sobrepeso:
25,0-29,9 kg/m²; Obesidade Grau I: 30-34,9 kg/m²; Obesidade
grau II: 35,0-39,9 kg/m² e Obesidade Grau III: > = 40,0 kg/
m². Para adolescentes foi utilizado como parâmetro para baixo
peso o percentil 5 da distribuição do IMC da atual referência de
crescimento (WHO, 2007); e os pontos de corte para sobrepeso
e obesidade foram os percentis 85 e 95 da mesma população.
A dieta avaliada foi a prescrita na admissão, considerando a
via de administração, tipo e características da dieta. As necessidades nutricionais foram calculadas por meio de fórmulas
diretas, de acordo com as recomendações da American Society
for Parenteral and Enteral Nutrition26 para pacientes portadores
de úlceras por pressão. Com relação às características das úlceras
por pressão, foram avaliados os dados de incidência, prevalência,
número, localização e estadiamento; quanto à classificação dos
estágios I, II, III ou IV, foram adotadas como referência as diretrizes publicadas pela National Pressure Ulcer Advisory Panel1.
As variáveis foram todas analisadas e os gráficos elaborados
a partir do programa Microsoft Excel 2007 e os dados apresentados de forma descritiva.
RESULTADOS
Durante o período de coleta de dados, março a abril de 2009,
23 pacientes atenderam aos critérios de inclusão previamente
estabelecidos. Da população em estudo, nove (39%) eram do
sexo masculino e 14 (61%) do sexo feminino, com média de
idade de 64,7 anos, sendo 56,2 ± 27,1 no sexo masculino e 75,0
± 14,0 anos no sexo feminino (Figura 1).
Foram encontradas 38 úlceras por pressão. Os resultados
permitiram verificar que a incidência de pacientes com úlceras
foi 53% e prevalência 47%. Quanto ao estadiamento, 11% eram
classificadas em estágio I, 63% em estágio II, 3% em estágio III,
8% em estágio IV e 16% classificadas como esfacelo (Tabela 1).
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Perfil nutricional e epidemiológico dos pacientes com úlceras por pressão internados em um Hospital de Fortaleza
No que diz respeito à localização das úlceras, a região sacra
foi a mais frequente, estando presente em 55% da amostra
estudada, seguida pelas regiões calcânea (24%) e lombar (8%),
como mostra a Tabela 2.
As doenças preexistentes predominantes foram a hipertensão
(73%) e diabetes melito (27%). As causas da hospitalização foram
diversas, sendo 69% por doenças que causaram algum comprometimento neurológico (Acidente Vascular Cerebral, Parkinson,
Síndrome Demencial, Alzheimer, Lesão Medular, Encefalopatia
Hipóxica e Traumatismo Cranioencefálico), 10% por pneumonias, 7% por insuficiência respiratória e 14% outras (Neoplasia,
DPOC, ICC e Litíase Vesical), como mostra a Figura 2.
Segundo o IMC, o estado nutricional dessa população era de
48% eutróficos e 52% desnutridos. Desses últimos, 67% eram de
desnutridos graves, 25% desnutridos leves e 8% desnutridos moderados. Analisando-se a composição dos compartimentos corporais,
pôde-se verificar que 78% dos pacientes apresentavam perda de
gordura corpórea em grau moderado ou grave, representada pela
medida de adequação da PCT, e 52% dos pacientes possuíam
comprometimento da massa muscular corpórea em grau leve ou
moderado, representada pela adequação da CMB (Tabela 3).
Ao exame físico, os sinais e sintomas mais comumente
encontrados foram: alterações cutâneas (31%), equimoses
(28%), petéquias (20%), edema (16%), ascite (12%) e glossite
(4%). No que se refere aos marcadores bioquímicos, em 52%
dos pacientes a CTL estava abaixo de 1500/mm3 e os valores
de hemoglobina e hematócrito apresentaram-se reduzidos em
20 (87%) pacientes.
Quanto à via de administração da dieta, foi verificado que em
oito (35%) pacientes a dieta era administrada por via oral e em 15
(65%) por via enteral (Figura 3). Destes últimos, 12 (80%) recebiam
uma fórmula polimérica padrão sem suplementação específica e três
Masculino
39%
7%
Pneumonia
10%
Masculino
Feminino
61%
Doenças com comprometimento
neurológico
14%
Insuficienciência respiratória
Feminino
69%
Figura 1 - Gráfico da distribuição do grupo de pacientes estudados segundo o sexo.
Figura 2 - Gráfico das causas da hospitalização.
Tabela 1 - Estadiamento das úlceras por pressão.
Estágio da úlcera
Tabela 2 - Localização da úlcera por pressão.
Região corporal
Número de úlceras
Estágio I
4 (11%)
Estágio II
24 (63%)
Estágio III
1 (3%)
Estágio IV
3 (8%)
Esfacelo
6 (16%)
Total
Outras
Número de úlceras
Sacra
Calcâneo
Trocânter
Lombar
Ombro
Perna
Maléolo
Total
38 (100%)
21 (55%)
9 (24%)
1 (3%)
3 (8%)
2 (5%)
1 (3%)
1 (3%)
38 (100%)
Tabela 3 - Estado nutricional na internação.
Dados
Antropométricos
IMC
n
CB
%
n
CMB
%
n
PCT
%
n
%
Obesidade
0
0
0
0
0
0
1
4%
Sobrepeso
0
0
0
0
0
0
1
4%
Eutrofia
11
48%
5
22%
9
39%
2
9%
Desnutrição leve
3
13%
6
26%
6
26%
1
4%
Desnutrição moderada
1
4%
5
22%
6
26%
5
22%
Desnutrição grave
8
35%
7
30%
2
9%
13
57%
Total
23 (100%)
Rev Bras Nutr Clin 2010; 25 (2): 164-70
167
Nogueira PD et al.
Via sonda
65%
Via oral
35%
Via oral
Via Sonda
Figura 3 - Gráfico da distribuição dos pacientes de acordo com a via de
administração da dieta.
(20%) recebiam uma fórmula polimérica padrão intercalada com
uma fórmula específica para a cicatrização de feridas. Dos pacientes
que se alimentavam por via oral, nenhum fazia uso de suplemento
alimentar. Com relação ao teor protéico das dietas avaliadas, 17
(74%) apresentaram quantidade de proteína > 1,5g/kg/dia, cinco
(22%) entre 1,0-1,1g/kg/dia e uma (4%) 0,2g/kg/dia. Com relação
às calorias prescritas durante o estudo, dez (43%) pacientes tiveram
uma prescrição > 100% das recomendações energéticas e 13 (57%)
tiveram abaixo. Dentre os últimos citados, dez (77%) pacientes
receberam entre 75-90% das necessidades energéticas; dois (15%)
entre 50% e 75% e um (8%) recebeu abaixo de 50%.
DISCUSSÃO
As úlceras por pressão representam uma das principais
complicações que acometem pacientes críticos hospitalizados6.
Nesse contexto, é importante avaliar os fatores de risco para
agravamento do quadro clínico do paciente, possibilitando
que a equipe intervenha principalmente de forma preventiva.
Nesse estudo, procurou-se estabelecer as características epidemiológicas e alguns fatores potenciais relacionados ao estado
nutricional e terapia nutricional que podem contribuir para o
surgimento e não cicatrização das úlceras por pressão.
Demograficamente, os pacientes com úlcera por pressão
caracterizaram-se por idade média elevada, 64,7 anos, sendo
superior no sexo feminino (75,0 ± 14,0) em comparação com
o masculino (56,2 ± 27,1), que apresentou um maior desvio
padrão devido dois adolescentes de 16 e 18 anos fazerem parte
desse grupo. A idade é apontada, pela maioria dos autores, como
um dos mais relevantes fatores envolvidos na fisiopatogênese
das úlceras por pressão, principalmente quando associados a
outros fatores como desnutrição, mobilidade e umidade6,7,9,10,27,28.
Os resultados apontaram ainda para uma população com
predomínio de mulheres (61%). Similarmente aos resultados
aqui encontrados, um estudo com pacientes idosos institucionalizados afirmou que o sexo feminino e a presença de úlcera
por pressão prévia foram considerados como fatores preditivos
para a ocorrência de lesões por pressão10. Diferentemente dos
resultados apresentados em outros estudos, para os quais se
verificou predomínio do sexo masculino6,7,27. Devido à ausência
de um consenso da literatura quanto ao sexo como variável de
influência na gênese da úlcera por pressão, esse dado foi apresentado somente como característica demográfica.
Foi possível verificar que, dos 23 portadores de úlcera por
pressão, 53% desenvolveram a lesão no hospital. Os outros 47%
ao serem hospitalizados já possuíam a úlcera. Estudo realizado
com pacientes internados em um hospital de São Paulo avaliou
78 pacientes. Destes, 68% adquiriram a úlcera durante a fase
de hospitalização6. Esse dado é reafirmado pelos resultados
encontrados no presente estudo, revelando que durante a fase
de internação os casos de incidência foram superiores aos de
prevalência, confirmando, assim, a necessidade de se incorporar
à prática clínica um programa de prevenção e intervenção mais
eficiente, a fim de aperfeiçoar a assistência ao enfermo e reduzir
o tempo de permanência hospitalar.
Quando analisamos o número de úlceras por paciente,
observamos um índice de 1,6 úlceras por paciente. Esse dado é
semelhante ao resultado apresentado pelo estudo feito na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, que revelou um
índice de 1,7 úlceras por paciente, e superior ao dado encontrado
em um estudo feito na Universidade da Califórnia que mostrou
um índice de 0,7 úlceras por paciente29. Tal constatação, talvez
possa ser explicada por uma menor eficiência e investimento
nos cuidados locais de saúde ou alterações sistêmicas desfavoráveis dos pacientes avaliados nos estudos brasileiros por uma
pior condição social.
Das 38 úlceras avaliadas, os maiores percentuais foram de
úlceras classificadas em estágio II (63%) e em esfacelo (16%).
No entanto, as úlceras consideradas como esfacelo, segundo
Hess30, referem-se a uma ferida em possível estágio III ou
IV, completamente recoberta por tecido necrótico, tornando-a
impossível estagiá-la até que a base da ferida seja visível. Alguns
estudos realizados com pacientes hospitalizados apontaram para
uma pertinente prevalência de casos de úlceras em estágio II7-9.
Com relação à localização das úlceras, a grande maioria se
desenvolveu na metade inferior do corpo, havendo predomínio
na região sacra, seguida pela região calcânea, locais estes considerados de apoio quando o paciente assume o decúbito dorsal.
Outros estudos confirmam a prevalência dessa distribuição
anatômica e relatam que a região sacra é considerada uma das
mais suscetíveis para o desenvolvimento de úlceras por pressão
em razão das proeminências ósseas e proximidade com áreas
de incontinências9,20,31,32.
Considerando os motivos da internação, as doenças que
originaram algum tipo de comprometimento neurológico
representaram 69% das hospitalizações. Esta porcentagem
considerável permite afirmar que essas afecções contribuíram
com a ocorrência de úlceras por pressão por causarem incapacidade e dependência, caracterizando pacientes com vários
fatores de risco, como diminuição da atividade e da percepção
sensorial9. Bispo et al.33, ao avaliar a incidência de úlceras por
pressão em residentes de uma instituição de longa permanência,
observaram que 55% dessas úlceras eram causadas por doenças
neurológicas.
No contexto das doenças preexistentes, houve prevalência
da hipertensão arterial sistêmica e diabetes melito. A mesma
prevalência foi encontrada nos estudos realizados com pacientes
hospitalizados em São Paulo6 e Santa Catarina9, confirmando,
assim, que doenças que alteram a perfusão sanguínea e a
oxigenação tecidual atuam como importante fator intrínseco
associado ao desenvolvimento de úlceras por pressão em
pacientes hospitalizados.
A importância do cuidado nutricional ao paciente hospitalizado tem sido cada vez mais amplamente reconhecida na
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Perfil nutricional e epidemiológico dos pacientes com úlceras por pressão internados em um Hospital de Fortaleza
literatura. Assim, a avaliação do estado nutricional deve ser
considerada como base de todo esse processo34. A realidade
encontrada neste estudo mostrou uma prevalência de indivíduos
desnutridos, com perdas consideráveis de gordura corpórea e
massa muscular e com CTL < 1500 cel/mm3. Resultados estes
que foram apontados como fatores relacionados ao desenvolvimento e gravidade das úlceras por pressão. Estudos mostram que
critérios antropométricos e bioquímicos de má nutrição estão
associados a um aumento da incidência e gravidade das úlceras
por pressão4,11,12. Allman et al.35 indicaram que a linfopenia e o
baixo peso corporal presentes na admissão no hospital estiveram
associados com a presença de úlceras por pressão durante a
hospitalização. É interessante que no grupo em estudo, nenhum
paciente estava obeso. Vale ressaltar que indivíduos obesos
geralmente apresentam melhor reserva nutricional e, por isso,
menor incidência de úlceras por pressão36.
Em relação aos valores de hemoglobina e hematócrito
adotados como parâmetro de avaliação clínica, percebeu-se que
uma quantidade expressiva de pacientes (87%) revelou depleção
nesse indicador bioquímico. Como fator de risco para úlceras
por pressão, esse dado associou-se positivamente com a alta
incidência de úlceras, visto que a anemia pode contribuir para a
formação de úlceras ao diminuir a quantidade de oxigênio para
os fibroblastos e, com isso, reduzir a formação de colágeno e
aumentar a susceptibilidade do tecido ao desenvolvimento desse
e de outros tipos de lesões11.
Diferentes estratégias de intervenção nutricional podem ser
usadas antes que o paciente desenvolva a úlcera (prevenção
primaria) ou no tratamento da úlcera já estabelecida (prevenção
secundaria)19. No presente estudo, as necessidades energéticas e
protéicas foram avaliadas levando-se em consideração o diagnóstico nutricional e clínico, o grau da úlcera e o catabolismo
do paciente, de acordo com as recomendações da ASPEN26,
específica para pacientes com úlceras por pressão, com variação
de 25 a 40 kcal/kg/dia e 1,0-2,0g/kg/dia de proteína respectivamente. Observou-se que os resultados obtidos, quando
comparados com os encontrados, revelaram predominância de
intervenções nutricionais com o perfil de dietas hipocaloricas
(57%) e hiperprotéicas (74%), não havendo padronização no
tratamento desses casos. Esse fato foi atribuído à diferente
metodologia adotada pela instituição em estudo para cálculo
das necessidades calórico-protéicas.
Pompeo18 considera que o fornecimento e assimilação
inadequados de proteína são as causas mais comuns de falha na
terapia nutricional nesses pacientes, pois ofertas ótimas calóricas e protéicas são imprescindíveis para o sucesso da cicatrização. Soriano et al.20 sugeriram que o aumento da ingestão de
proteína em pacientes com úlceras por pressão não é suficiente
para cicatrizar e reduzir a superfície da lesão em período de
tempo aceitável e que a intervenção nutricional, sob a forma de
suplementação nutricional oral específica, resultou em redução
significativa da área das úlceras e melhora do aspecto da lesão
em pacientes com úlceras por pressão em grau III ou IV, em um
período de três semanas.
Quanto à suplementação nutricional específica para cicatrização de feridas, apenas três (13%) pacientes receberam e os
outros 20 (87%) não tiveram acesso, sendo usada somente dieta
de rotina do hospital nos pacientes que se alimentavam por via
oral e fórmulas poliméricas nos pacientes que se alimentavam
por via enteral. Benati et al.21, ao avaliarem 36 pacientes com
úlceras por pressão tratados durante duas semanas com dieta
hospitalar normal (A); dieta hospitalar normal mais suplemento
oral com alto teor calórico protéico (B); dieta hospitalar normal
mais suplementação oral isocalórica e isoprotéica enriquecida
com arginina, vitaminas e oligoelementos antioxidantes (C),
observaram que os pacientes com o tratamento C tiveram uma
melhora mais rápida na cicatrização das úlceras por pressão
do que os pacientes com tratamento A e B. Coelho & Silva36,
quando observaram pacientes que recebiam suplemento específico para cicatrização, com nutrientes fundamentais a este
processo, encontraram uma eficácia de 85%, visto que a porcentagem de indivíduos que ingeriram, melhoraram o estágio da
úlcera e nenhum piorou.
Estratton et al.37, em metanálise sobre terapia nutricional
na prevenção e tratamento de úlceras por pressão, caracterizaram bem que suplementos orais são nitidamente superiores
à alimentação tradicional, mostrando-se associados com incidência significativamente mais baixa de úlcera por pressão em
pacientes cirúrgicos, idosos e cronicamente hospitalizados e que
combinando-se também de um lado os suplementos orais e as
dietas enterais e comparando do outro lado com o atendimento
dietético usual, foi possível demonstrar que dietas especializadas
para úlceras por pressão superam as prescrições comuns.
CONCLUSÃO
O diagnóstico institucional aqui obtido caracterizou uma
população com predomínio de pacientes do sexo feminino,
idosos, desnutridos, com maior número de casos de incidência,
com lesões principalmente em estágio II, sendo a região sacra
a mais afetada.
No entanto, ficou clara que a presença do profissional nutricionista como parte de uma equipe multiprofissional, atuando
tanto na prevenção como no tratamento dessas lesões, é de suma
importância, visto que a oferta das necessidades nutricionais
adequadas para cada indivíduo se faz necessária para que haja
melhora tanto da úlcera, quanto do estado geral do paciente.
Os dados ainda apontaram para a importância e necessidade de um acompanhamento interdisciplinar sistêmico para
prevenção e tratamento das úlceras por pressão, no que diz
respeito ao uso adequado e racional das medidas preventivas
e intervencionistas, a fim de reduzir o tempo de internação
hospitalar, minimizar os custos com o tratamento e, sobretudo,
diminuir o sofrimento dos pacientes. Tornando, assim, a assistência ao enfermo mais eficiente, trazendo assim uma gradativa
resolução para o problema.
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Local de realização do trabalho: Hospital Geral Waldemar Alcântara, Fortaleza, CE.
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