Palavra, vocábulo, item lexical, listema ou nenhuma das opções? Aline Camila Lenharo1 Resumo Este artigo apresenta os diversos termos que podem ser empregados como sinônimos (ou não) de palavra. Parte-se das diversas concepções que a palavra teve ao longo dos anos e, heuristicamente, apresenta a definição do termo. Considera-se que conhecer essa terminologia é essencial para os estudantes de Letras. Espera-se, com este estudo, refletir sobre a importância da escolha dos termos empregados pelos graduandos e, especialmente, por aqueles que pretendem se dedicar aos estudos linguísticos, principalmente os relacionados à lexicologia. Palavras-chave: Lexicologia. Léxico. Palavra. Abstract This paper shows the different terms that can be used (or not) as synonyms of word (‘palavra’) in Portuguese. It starts with the different conceptions that the word had over the years and, heuristically, provides the definition of the term. It is considered that to know this terminology is essential for Literature students. With this study it is hoped to reflect on the importance of the choice of words used by undergraduates and, mainly, by those who want to delve into linguistic studies, especially those related to lexicology. Keywords: Lexicology. Lexicon. Word. Introdução As línguas naturais compõem a via única de acesso ao pensamento dos seres humanos (LOPES, 1995). A linguagem, manifestada através da fala ou da escrita, por sua vez, é a única forma de se acessar a língua, uma realidade imaterial (BIDERMAN, 1978). Devido a essa importância, muitos autores, a partir de diferentes abordagens 1 Doutora em Linguística e Língua Portuguesa, Professora Substituta do Departamento de Linguística da Faculdade de Ciências e Letras da UNESP, CEP 14800-901, Araraquara – SP. E-mail: [email protected]. teóricas, se propuseram a estudar o léxico (ALVES, 1990; ANDRADE, 1998; BARBOSA, 1991; BARROS, 2004; BIDERMAN, 1999, 1998, 1998a, 1978; BORBA, 2002, 2003; CHOMSKY, 1965). O léxico de uma determinada língua pode ser entendido como o conjunto de unidades significativas (as palavras) que se submetem às regras da gramática dessa língua. A união do léxico e da gramática constitui os meios necessários e suficientes para a codificação (a produção) ou a decodificação (a compreensão) das frases produzidas pelos falantes da língua em questão (REY-DEBOVE, 1984). Assim, um indivíduo, ao adquirir uma língua natural, incorpora tanto o léxico quanto o sistema de regras (a gramática) dessa língua, isto é, ele adquire uma competência léxico-gramatical (Cf. Fellbaum (1998) e Handke (1995) para exemplos). A área da Linguística que se dedica ao estudo do léxico e de sua organização, de vieses variados, é a Lexicologia (OLIVEIRA; ISQUERDO, 1998). O estudo do léxico pode, por exemplo, ser efetuado a partir de dois pontos de vista diferentes: o do léxico externo (o que é “público”) e o do léxico interno (o mental) (JACKENDOFF, 2002). O léxico externo, como um repositório de signos, é uma lista de itens lexicais organizadas de acordo com diferentes tipos de padrões. Os verbos, por exemplo, relacionam-se com formas nominais; os adjetivos relacionam-se com formas nominais e, possivelmente, com formas adverbiais. Além de ser um estoque estruturado de elementos de designação essenciais para a construção de enunciados, o léxico também é um sistema dinâmico, que se expande sempre que necessário através dos processos de formação de palavras, entre outros (BASÍLIO, 1980, 2000, 2004). Por sua vez, o léxico interno corresponde ao conhecimento que cada falante de uma língua natural possui das unidades e expressões lexicais dessa língua e de padrões gerais de sua estruturação, que permitem que ele interprete ou forme novos itens e expressões; trata-se, assim, do léxico mental do falante (JACKENDOFF, 1990, 2002). Um conceito fundamental, sendo um dos mais importantes, para quem se aventura na lexicologia é o de palavra. Mesmo quem não pretende se aprofundar nesse campo de investigação, mas se interessa por linguística, de modo geral, precisa ter em mente essa definição, principalmente os alunos do curso de Letras – observe-se, por exemplo, que, nos estudos morfológicos, saber conceituar e identificar adequadamente as palavras é fundamental para poder compreender, entre outros, o que são desinências flexionais, sufixos derivacionais e, consequentemente, o que são e como funcionam os processos de formação de palavras, principalmente a derivação e a composição.2 No entanto, definir o seu conceito não é uma tarefa fácil. Como se observará a diante, as palavras intuitivamente identificáveis em uma língua natural têm resistido a uma conceituação teórica universal, uma vez que cada língua possui características próprias e particularidades diversas que impossibilitam uma definição homogênea do que deve ser considerada palavra. Em soma, cada palavra remete a singularidades relacionadas ao momento histórico e à região geográfica em que se realizam na língua, à sua estrutura (fonética e morfológica) e, também, ao seu contexto sociocultural de realização (BIDERMAN, 1978, 1998a, 1999; ROSA, 2000). Além dessa não universalidade, há uma vasta discussão acerca dos termos que devem ser empregados: palavra, vocábulo, lexema, unidade ou item lexical, lexia ou listema, entre outros (Cf. BIDERMAN, 1978, 1998, 1998a, 1999; BORBA, 2002, 2003; DI SCIULLO; WILLIAMS, 1987; JACKENDOFF, 1990, 2002; ROSA, 2000). Qual seria a melhor opção? Buscando refletir sobre a importância do tema, este artigo apresentará, além desta introdução, os diversos termos que podem ser empregados como sinônimos (ou não) de palavra. Para isso, primeiramente, serão fornecidas as diversas concepções que a palavra teve ao longo dos anos e, em seguida, de modo heurístico, será apresentada sua definição. Por fim, após uma breve consideração final, serão apresentadas as referências bibliográficas consultadas para a elaboração deste trabalho. As concepções de palavra A palavra já teve várias concepções ao longo dos tempos (e de muitos estudos). Essas concepções diversificadas evidenciam as diferentes dimensões em que ela pode ser avaliada. De acordo com Biderman (1998a), a palavra pode ser considerada em, pelo 2 As desinências flexionais apresentam informações gramaticais, como, por exemplo, o morfe -s, que representa a ideia gramatical de número plural (em contrapartida ao morfe Ø, indicativo de singular), isto é, constitui a forma da desinência de número em português. As desinências flexionais diferem dos sufixos derivacionais, os responsáveis pela formação de novas palavras. Por exemplo, -inha e -ão, a partir de casa, através da derivação, um processo de formação de palavras muito produtivo em português, formam, respectivamente, casinha (‘casa pequena’) e casarão (‘casa grande’). Para mais detalhes sobre conceitos de Morfologia, conferir os trabalhos de Câmara Jr. (1970), Kehdi (1990), Laroca (2003), Monteiro (1990) e Rocha (2008). menos, três dimensões distintas. São elas: dimensão mágica e religiosa, dimensão cognitiva e dimensão linguística. Na primeira, a palavra é considerada o próprio nome e a própria essência do ser, pois, para o homem primitivo, a palavra e o referente que ela nomeia são inseparáveis. A palavra é vista como criadora, através da qual um poder divino, em algum passado distante, fez surgir sua cultura, como mostra a passagem bíblica sobre o mito da criação, em que Deus diz “Faça-se a luz!” e a luz é feita. Resquícios desta primeira dimensão da palavra podem ser observados ainda hoje, quando, por exemplo, alguém diz “isola, bate na madeira” após outra pessoa ter mencionado algo considerado ruim – imagine o cenário em que dois amigos estão preparando um fim de semana na praia e um deles afirma ter ouvido no noticiário que há previsão de chuva... Na segunda dimensão, reconhece-se que a palavra desempenha um papel fundamental nos processos de identificação, categorização e nomeação das entidades da realidade, pois servem para rotular os “processos cognitivos mediante os quais o homem interage cognitivamente com seu meio ambiente” (LENNEBERG apud BIDERMAN, 1998a, p. 90-91). É através desses processos que o homem pode organizar seus conhecimentos, e, dessa forma, gerar o léxico de sua língua. Entretanto, nesses processos, os critérios utilizados para se classificarem os objetos são diversificados e podem ser baseados, por exemplo, no uso que se faz de um determinado objeto, no seu tamanho, ou na emoção causada por ele ao usuário. Isso expõe o fato de o processo de categorização ser um processo criativo e dinâmico da organização cognitiva, e, portanto, pode se alterar ou se expandir para incluir novas criações/novos conhecimentos. Como esse processo muda de acordo com as culturas distintas, e é a partir dele que surge o léxico de uma dada língua, explica-se a grande diversidade dos léxicos das diferentes línguas – é, por exemplo, o que justifica a diferença de gênero entre palavras correspondentes entre as línguas: o mar e o carro (masculino em português) e la mer e la voiture (feminino em francês). Por fim, na terceira dimensão, a linguística, a palavra passa a ser objeto de estudo científico. Com Saussure, estabelece-se que o significado (conceito mental) e o significante (forma linguística) compõem o signo linguístico e que a relação entre ambos constructos é absolutamente arbitrária, isto é, imotivada (BIDERMAN, 1998a; SAUSSURE, 1969). Do ponto de vista linguístico, como toda língua natural possui características próprias e peculiaridades que a distingue das demais línguas, é impossível definir o conceito de palavra de maneira universal. Por isso, “a definição de palavra, bem como sua identificação no nível do discurso, tem que ser feita língua a língua” (BIDERMAN, 1999, p. 81). Além disso, há que se destacar que, de acordo com o propósito do estudo, isto é, da área de concentração do trabalho, podem ser verificados termos distintos para o mesmo fenômeno linguístico. A próxima seção apresentará alguns critérios heurísticos utilizados para a identificação das palavras, bem como os variados termos utilizados por diferentes autores (BARROS, 2004; BIDERMAN, 1978; BORBA, 2003; CÂMARA JÚNIOR, 1989; JACKENDOFF, 2002; DI SCIULLO; WILLIAMS, 1987; VILELA, 1995; entre outros). Terminologia e critérios de definição De acordo com Barros (2004, p. 60), que emprega o termo unidade lexical como sinônimo de palavra, a unidade lexical é “caracterizada pela não separabilidade dos elementos que a realizam do ponto de vista fonético e é identificada pela possibilidade de comutação no sintagma ou na frase”. Porém, na prática, definir e identificar uma unidade lexical não é tarefa simples. Há vários critérios que podem ser utilizados, mas nenhum deles é totalmente eficaz. O primeiro critério é o fonológico, que, embora necessário, não é suficiente, pois exige “o concurso de outros critérios para oferecer um mapa completo de todas as características definidoras de uma unidade léxica” (BIDERMAN, 1978, p. 109). Isso porque, de acordo com esse critério, a palavra é caracterizada como uma sequência fonológica que sempre recorre com o mesmo significado. Independentemente de qual seja a língua, os falantes costumam fazer pausas nos limites das palavras e não dentro delas. Desse modo, a palavra passa a ser uma sequência fônica que constitui uma emissão completa, após a qual pode haver uma pausa. Nesse contexto, o acento, próprio de cada palavra, auxilia no processo de segmentação ao individualizá-las. No português, as palavras não monossilábicas tendem a ser paroxítonas, embora também existam as oxítonas e, em menor escala, as proparoxítonas. Esses acentos do português são para Câmara Júnior (1970) uma marca nítida do vocábulo. Segundo ele, o acento do português é, além de delimitativo, distintivo, pois permite a distinção entre hábil idade e habilidade e entre sábia, sabia e sabiá, por exemplo. Como esses acentos se mantêm proeminentes dentro da entonação frasal, são muito importantes no processo de identificação das unidades léxicas. Entretanto, as fronteiras vocabulares podem não coincidir com os limites de um grupo fônico e as pausas podem resultar de fatores subjetivos relacionados ao discurso. O segundo critério para identificar uma unidade lexical é o gramatical. Este atua simultaneamente com o critério formal e com o critério funcional, aplicando as regras morfossintáticas do sistema linguístico em questão. O critério formal leva em consideração “a classificação gramatical da palavra, em função dos marcadores morfossintáticos que ela apresenta e, portanto, a filiação a determinados paradigmas”, enquanto o critério funcional considera “a função exercida pela palavra na sentença” (BIDERMAN, 1999, p. 85). Dentro do critério gramatical, o princípio da permutação é um indicador formal muito útil na delimitação e identificação de uma palavra, assim como o princípio da coesão interna. O primeiro diz que, em uma frase como (1), pode haver seis permutações possíveis, desde que sejam mantidas as sequências de artigo-substantivo e preposição-substantivo (o garoto, no parque).3 (1) Vi o garoto no parque. O princípio da coesão interna diz que, apesar do vocábulo português poder ter grande mobilidade no discurso, internamente deve haver coesão e estabilidade entre seus morfemas, pois não há como dissociar morfemas de uma palavra sem destruí-la (ARONOFF, 1976; BIDERMAN, 1999). Assim, em português, há casa, casas, 3 Comparem-se as seguintes frases, em que é possível perceber a diferença de foco: (a) No parque, vi o garoto. (b) Vi, no parque, o garoto. (c) O garoto, vi no parque. (d) No parque, o garoto vi. (e) O garoto, no parque vi. casarão, casinhas, casamento, etc., mas não há *cainhasa, *casasinha, *mentocasa ou *casãomento.4 Em outros termos, há, no vocábulo, coesão interna – caracterizada pela não separabilidade dos elementos que o realizam do ponto de vista fonético, o que não permite a inserção de outros elementos mórficos – e a possibilidade de permutação (isto é, a possibilidade de comutação no sintagma ou na frase, ou, de modo mais simples, a possibilidade de troca de lugar na ordem da frase). O terceiro critério, com papel decisório no processo de definição e identificação de uma unidade lexical, é o semântico. De acordo com Biderman (1978, p. 118-119), “só a dimensão semântica nos fornece a chave decisiva para identificar a unidade léxica expressa no discurso”. Isso, porque a semântica congrega as informações de nível inferior (fonológico e gramatical) para fornecer uma identificação e uma delimitação correta da palavra, o que faz, muitas vezes, que a palavra seja considerada a unidade semântica mínima do discurso (ULLMANN, 1952 apud BIDERMAN, 1978). Com base nesses três critérios (o fonológico, o gramatical e o semântico), Biderman (1978, 1999) conceitua a palavra, ou vocábulo, como uma sequência fônica que constitui uma emissão completa, após a qual pode haver uma pausa, que apresenta coesão e estabilidade entre seus morfemas e possui um valor semântico. Em consonância com essas ideias, Borba (2003, p. 19) explica que utilizar o termo palavra para descrever unidades com extensões inferiores a uma construção de uma língua românica não é problema para a descrição linguística, dado que o seu conceito “chega a ser até intuitivo”. Porém, ao se tratar de línguas indo-europeias, o autor sugere que se adote o termo lexia ou lexema. Considerando os três termos como sinônimos, o ele ressalta que seus traços definitórios básicos são: [...] (i) forma livre mínima, isto é, forma que não admite outras subdivisões em outras formas livres; (ii) configuração fônica estável, isto é, bloco fônico que não permite inserção de outros elementos mórficos; (iii) expressão de um conteúdo significativo único ou amalgamado; (iv) preenchimento de funções gramaticais específicas. (BORBA, 2003, p. 19). Vale lembrar que, de acordo com Câmara Jr. (1970), a forma livre é uma sequência morfofonológica que pode, isoladamente, funcionar como comunicação 4 O asterisco (*) indica a agramaticalidade do item. suficiente. Pode, por isso, ser utilizada como resposta a certas perguntas, como, por exemplo, chá, no contexto (2). As formas livres diferem das formas presas, que só funcionam ligadas a outras, como em im + pre + vis + ível (várias formas presas) ou as desinências flexionais, como o -s (marca de plural). Há, ainda, aquelas formas que não são livres (porque não podem funcionar isoladamente como comunicação suficiente), mas também não são presas (porque outra(s) forma(s) livre(s) pode(m) ser intercalada(s)): são as chamadas formas dependentes – como, por exemplo, os artigos e os clíticos pronominais. (2) – O que você quer beber? – Chá. Borba (2002, 2003), entretanto, contrariamente a Biderman, que utiliza os termos vocábulo e palavra como sinônimos, o autor explica que os termos palavra, lexia ou lexema se referem ao sistema linguístico como entidade abstrata e supraindividual, e diferem-se, portanto, do termo vocábulo, que se refere ao discurso, isto é, à fala, ao uso da língua pelos indivíduos. De acordo com o autor, as lexias podem ser classificadas, do ponto de vista da estrutura mórfica, em simples ou compostas (estas também denominadas lexias complexas). As lexias simples são aquelas compostas por uma única forma livre, como, por exemplo, peixe, navio e vento (BORBA, 2003). As lexias complexas são formadas pela combinação de mais de uma forma livre, como, por exemplo, porta-luvas, joão-de-barro e pé de cana, ou pela combinação de uma forma livre e uma (ou mais) forma(s) presa(s), como desconsolo, incontável, imprevisível. O grau de estruturação e de automatização das lexias complexas pode variar: do sintagma livre (no extremo de menor grau), passando pelo sintagma semifixo e pela construção fixa, até o extremo oposto, com a frase fixa (BORBA, 2003). Vale destacar que a hifenização não deve ser usada como critério exclusivo para se identificar uma lexia complexa, uma vez que suas regras de uso são ditadas por convenção política e podem sofrer alteração (como ocorreu, recentemente, com a adoção do Novo Acordo Ortográfico). A verificação dos princípios de coesão interna e de permutação – apresentados anteriormente, como indicativos da lexia simples –, se mostra útil mais uma vez, pois esses princípios também se aplicam às lexias complexas: da união de duas ou mais formas, surge um todo significativo único ou amalgamado. Dessa maneira, em (3), embora não se empregue hífen entre as unidades pé, de e cana, deve-se considerar a existência de quatro (e não seis) itens lexicais. Isso, porque pé de cana constitui um único item significativo, utilizado para se referir ao indivíduo que consome muita bebida alcoólica (principalmente cachaça) e se embriaga com frequência. (3) O pé de cana está dormindo. Como exemplificam (4-6), há coesão interna entre pé, de e cana. Há, também, a possibilidade de aplicação do princípio da permutação, que permite a realização, por exemplo, de (7). Além disso, se houvesse a necessidade de utilização de um sinônimo, o todo formado pelos três itens seria substituído, como indica (8). (4) *O pezão de cana está dormindo. (5) *O pé grande de cana está dormindo. (6) *canaspé de (7) Dormindo, o pé de cana está. (8) O beberrão está dormindo. Por fim, sob uma visão de base gerativista (JACKENDOFF, 2002; DI SCIULLO; WILLIAMS, 1987), devem-se distinguir os termos item lexical e palavra, frequentemente utilizados sem nenhum critério, pois o item lexical (também chamado de listema) denota um item armazenado no léxico, isto é, na memória passiva do falante de uma língua natural, enquanto o termo palavra é utilizado de acordo com a teoria gramatical. Na fonologia, por exemplo, a palavra fonológica é um domínio sobre o qual são definidas certas expressões linguísticas segmentadas e prosódicas; na sintaxe, a palavra corresponde, aproximadamente, às categorias de nome, verbo, adjetivo e preposição. Pode-se concluir, com base nas propostas dos autores apresentados ao longo desta seção, que, entre os termos discutidos, o de palavra é o de valor mais ambíguo, o “que torna desaconselhável o seu uso num discurso especializado” (VILELA, 1995, p. 97). Assim, aconselha-se a utilização do termo unidade (ou item) lexical para nomear unidades como os verbos e os substantivos, que são unidades semanticamente plenas e tipicamente registradas no léxico da língua e têm a potencialidade de se combinar umas com as outras ou com elementos afixais para formarem outras unidades ou sintagmas. Para as unidades semanticamente “esvaziadas”, como os clíticos, os pronomes e os artigos, que são unidades que operam na gramática da língua, sugere-se a adoção do termo unidade (ou item) gramatical. Conclusão Como observado ao longo deste artigo, é desaconselhável o emprego do termo palavra por estudantes da área de Letras, que se dedicam aos estudos linguísticos, especialmente em discursos especializados como monografias, trabalhos de conclusão de curso e artigos científicos, por se tratar de um termo muito geral e ambíguo. Aconselha-se a utilização dos termos unidade (ou item) lexical – para se referir a itens que possuem uma sequência morfológica e uma sequência fonológica, um significado intrínseco e, ainda, são indivisíveis, como, por exemplo, os verbos – e unidade gramatical – para os demais itens, que, isoladamente, não apresentam nenhum significado semântico, como os artigos. São termos mais especializados (do que palavra) que, no entanto, não estão comprometidos com nenhuma teoria específica (ao passo que listema, por exemplo, está relacionado com o Gerativismo). Desse modo, os textos produzidos ganham clareza e qualidade em sua fundamentação teórica. Enfim, com essas observações acerca da definição de palavra, espera-se ter contribuído com o aperfeiçoamento de graduandos em Letras e interessados no tema em geral. Referências bibliográficas ALVES, I. M. Neologismos: a criação lexical. São Paulo: Ática, 1990. ANDRADE, M. M. 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