A SAÚDE 20 SAÚDE - VIVA MAIS, VIVA MELHOR Reconhecer a depressão Todos os anos, cerca de 400 mil portugueses sofrem de depressão. Ainda assim, são muitas as pessoas que continuam a achar que esta doença só afeta os outros. Texto Prof. Dr. Diogo Telles Correia PSIQUIATRA E PSICOTERAPEUTA PROFESSOR DE PSIQUIATRIA E DE SAÚDE MENTAL DA FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE LISBOA SAÚDE - VIVA MAIS, VIVA MELHOR 21 A SAÚDE A depressão é uma perturbação psiquiátrica que tem alguns sintomas característicos, nomeadamente, humor deprimido, Salta de energia, di»culdade em dormir, falta de motivação, incapacidade de sentir prazer e até dor física. Em depressões mais graves, as ideias de suicídio são frequentes. Começam por ser planos idealizados e, por vezes, culminam em tentativas de suicídio que pode ser consumado. Esta patologia é muito frequente e tem uma preval|ncia de ". 6sto signi»ca que qualquer um de nós tem 15% de probabilidade de vir a sofrer de depressão ao longo da sua vida. E não pense que é algo que só acontece aos outros, especialmente porque os números no nosso país não são animadores: Portugal é o país da União Europeia com a taxa de depressão mais elevada e é o segundo no mundo - só ultrapassado pelos Estados Unidos da América. A sua prevalência é de tal forma elevada 22 SAÚDE - VIVA MAIS, VIVA MELHOR que, pelo menos, 8% da população geral é afetada a cada ano, qualquer coisa como 400 000 portugueses, entre os 18 e os 65 anos. A prevalência de suicídio, no entanto, é mais reduzida em Portugal do que noutros países, nomeadamente, nos nórdicos. É importante perceber que o peso da depressão está aumentar e são vários os estudos que referem que em 2020, 15% de toda a disfunção provocada por doença será causada por doença mental, em particular, por depressão. O que causa a depressão? À semelhança do que acontece com todas as patologias psiquiátricas, a causalidade da depressão não é linear. Aceita-se que possam estar na sua base fatores biológicos, que têm relação direta com os genes que herdámos dos antepassados, e fatores ambientais, nomeadamente, situações in- Quando prescrita por um médico psiquiatra experiente, a medicação psiquiátrica permite alcançar resultados realmente milagrosos e sem efeitos secundários relevantes fatores biológicos, como podemos optar pela psicoterapia, que tenta aceder e melhorar os fatores psicológicos, nomeadamente a reagir melhor aos fatores indutores de stresse. ! ESTEJA ATENTO AOS SINAIS < Grande tristeza espontânea e prolongada Incapacidade para sentir prazer Falta de motivação Dificuldade em dormir Falta de energia Pensamentos suicidas < < < < < dutoras de stresse que vamos sentindo ao longo da vida. No meu novo livro “A vida num degrau”, conto quatro histórias que foram inspiradas por casos reais. Na primeira história, a personagem principal é o António que luta contra uma depressão endógena, cujos fatores causais são predominantemente biológicos. Na segunda e na terceira histórias, Afonso e Pedro debelam depressões reativas, cujos fatores causais são, sobretudo, situações de vida indutoras de stresse. No último caso, Joana, que tem um diagnóstico de perturbação bipolar - episódios depressivos e de euforia que se intercalam - é assolada por uma depressão endógena gravíssima. Esta causalidade multifatorial que abordei no meu livro, explica também por que é que o seu tratamento é feito de várias formas. Tanto podemos recorrer a medicação para, através de fármacos, reequilibrarmos os Diagnosticar a doença O diagnóstico da depressão nem sempre é fácil. Tem de ser feito por um médico psiquiatra porque só ele será capaz de despistar as doenças orgânicas, como as patologias hormonais, os dé»ces vitamínicos, os problemas neurológicos, entre outros, que podem ter uma apresentação muito semelhante à depressão. Depois de ser feito o diagnóstico, é planeado o tratamento que pode passar essencialmente por dois tipos de abordagem: Psicofarmacologia (medicamentos) e psicoterapia. Em relação aos medicamentos psiquiátricos, hoje em dia há vários que são muito e»cazes e têm mínimos efeitos secundários. Apenas os médicos podem medicar e, naturalmente, os que têm mais conhecimentos sobre este tipo de medicação são os psiquiatras. É fundamental que os pacientes só aceitem conselhos sobre medicamentos psiquiátricos de médicos. Alguns pacientes vêm medicados com medicação psiquiátrica prescrita por outros médicos que não são psiquiatras e há também aqueles que referem que os adquirem na farmácia sem receita médica (algo muito grave e que não pode legalmente acontecer!). Em relação à psicoterapia, vulgarmente chamada de “tratamento psicológico”, pode ser preconizada por médicos psiquiatras que tenham formação em psicoterapia ou psicólogos que tenham também esta formação. É fundamental que se perceba que médicos e psicólogos que não tenham formação especí»ca em psicoterapia, não são psicoterapeutas. Através da psicoterapia conseguimos ajudar o paciente no seu autoconhecimento profundo e conduzi-lo por um caminho mais saudável, que lhe traga maior felicidade. É essencial perceber que, nos casos em que a medicação é necessária (aspeto avaliado pelo médico psiquiatra), a psicoterapia não substitui a medicação, apenas a complementa. E é importante que não se diabolize a medicação. Quando prescrita por um médico psiquiatra experiente, a medicação psiquiátrica permite alcançar SAÚDE - VIVA MAIS, VIVA MELHOR 23 A SAÚDE Há alguns fatores protetores que nos ajudam a reagir melhor aos momentos de maior dificuldade, nomeadamente, estarmos rodeados de relações afetivas e de amizade equilibradas, e fazermos coisas positivas na vida, tais como ter hobbies e praticar desporto 24 resultados realmente milagrosos e sem efeitos secundários relevantes. Os produtos naturais que muitas vezes são vendidos para tratar situações psiquiátricas como a depressão podem ter consequências muito mais graves! Estes produtos, ao contrário dos medicamentos, não foram sujeitos, na maioria dos casos, a testes rigorosos de segurança. Já vi vários doentes nas urgências, com consequências dramáticas, por terem abusado de “produtos naturais” comprados fora das farmácias. Por isso, é essencial ir a um psiquiatra experiente que determinará se é ou não necessário tomar medicação. Se for necessário tomar medicação, hoje em dia há escolhas muitíssimo seguras, com resultados fantásticos, sem efeitos secundários relevantes e que são tomadas geralmente por um período limitado de tempo. A medicação psiquiátrica pode salvar vidas e só quem não vê pacientes com depressões de enorme gravidade pode negar esta realidade. As pessoas que denigrem a imagem da medicação psiquiátrica não têm experiência em prescrevê-la e não conhecem os seus resultados. O outono é propício a depressões? O humor tem variações normais ao longo das várias fases do ano, no entanto, os episódios depressivos, assim como os episódios de mania (fases de euforia características da perturbação bipolar - que se caracteriza pela oscilação de episódios de mania e depressão), são mais frequentes no outono e no inverno. Estas oscilações podem ser explicadas, sobretudo, por fatores de ordem »siológicas, mas não se sabem ainda ao certo quais são os mecanismos que as desencadeiam. SAÚDE - VIVA MAIS, VIVA MELHOR A quantidade de luz solar é, sem dúvida, um dos grandes fatores que pode explicar esta tendência, pois sabe-se que o aumento da radiação pode ter um efeito bené»co sobre a depressão. 6nclusivamente, o tratamento da depressão também recorre aos raios UV e são muitos os estudos que con»rmam a maior prevalência de depressão em países com menor radiação solar, tal como acontece com os países nórdicos. Prevenção Infelizmente, não há nenhuma medida que possa prevenir a depressão a 100%, assim como não há nenhuma pessoa que esteja completamente imune ao aparecimento desta patologia. É algo que foge muito ao nosso controlo, uma vez que não conseguimos controlar todos os eventos negativos que nos vão surgindo ao longo do tempo e, muito menos, a tendência biológica que herdámos dos nossos pais. No entanto, há alguns fatores protetores que nos ajudam a reagir melhor aos momentos de maior di»culdade, nomeadamente, estarmos rodeados de relações afetivas e de amizade equilibradas, e fazermos coisas positivas na vida, tais como ter U\OOVR` e praticar desporto. A atividade física, por exemplo, é um fator fundamental na prevenção e no tratamento da depressão. Por outro lado, assim que surgem os primeiros sintomas da depressão, é essencial consultar um psiquiatra que poderá fazer o diagnóstico e despistar outras doenças que estejam, eventualmente, a simular uma depressão. Esta precocidade é fundamental para que seja feito o diagnóstico atempado e programado o tratamento mais adequado. ™