AVALIAÇÃO DA EVOLUÇÃO NA TERAPIA MEDICAMENTOSA ESPECÍFICA PARA HEPATITE C EM PACIENTES ATENDIDOS PELA FARMÁCIA AMBULATORIAL DO HOSPITAL FEDERAL DE BONSUCESSO NOS MESES DE JANEIRO E JULHO DE 2008 E JANEIRO DE 2009 DA MATA, Carla 1 RODRIGUES, Hugo 1 1 - Serviço de Farmácia - Hospital Geral de Bonsucesso (MS/RJ) - Avenida Londres, nº 616, Prédio 3, 4º andar - Bonsucesso - Rio de Janeiro, RJ - Autor responsável: H.M.Rodrigues E-mail: [email protected] 1 - Introdução: A infecção pelo vírus da hepatite C é um problema mundial de saúde pública. Estima-se que cerca de 200 milhões de pessoas, sejam portadores de hepatite C crônica (Consensus, 2004). É atualmente a principal causa de transplante hepático em países desenvolvidos e responsável por 60% das hepatopatias crônicas. Não se conhece ao certo a prevalência da infecção pelo HCV no Brasil. Em estudo transversal realizado em bancos de sangue, a prevalência de doadores com anti-HCV positivo foi de 1,23% (Strauss, 2001). A hepatite C é a inflamação do fígado causada pela infecção pelo vírus da hepatite (VHC ou HCV), que pertence ao gênero Hepacivirus da família flaviviridae. Essa inflamação ocorre na maioria das pessoas que adquire o vírus e no início é assintomática (Seeff, 1997). Em função do tempo de duração da infecção, pode levar a fibrose, cirrose e hepatocarcinoma, embora outros fatores sejam bastante influentes para esta condição, tal como idade, sexo, uso de álcool.(Pagliaro, 1999). Nos anos 90, o tratamento de primeira linha para Hepatite C era interferon, mas como em muitos casos a resposta virológica sustentada (RVS) girava em torno de 15% (Thevenot, 1999; Myers, 2004), foi introduzida a terapia combinada com a ribavirina, o que significou uma melhora na resposta virológica sustentada para 38-43% dos casos, com correspondente melhora na análise histológica (biópsia) e, possivelmente, nas complicações em longo prazo da hepatite. Preconiza-se, nas infecções mais prevalentes provocadas pelo vírus C, a combinação do interferon-alfa convencional, três vezes por semana com a ribavirina numa dose entre 1000 a 1250 mg por dia para a terapia medicamentosa (Ministério da Saúde, 2002). As doses exatas em cada manejo clínico e o período de tratamento são determinados no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Ministério da Saúde (PCDT), atualizado em 2007 através da portaria nº 34, de 28 de setembro deste mesmo ano. O tempo padrão de tratamento combinado é de, no máximo, um ano (com suspensão da terapia após este período) e avaliações sobre as respostas ao tratamento são verificadas a cada seis meses, quando se opta por continuá-lo ou suspendê-lo. Tem-se verificado, ultimamente, na prática clínica, a utilização de ribavirina em monoterapia como uma opção terapêutica, sob alegação que a ribavirina melhora a resposta bioquímica e histológica nos pacientes que não teriam outra opção terapêutica para o tratamento após insucesso da terapia combinada (Consensus, 2004). Esta conduta, entretanto, é controversa e contradiz o que determinada a Portaria nº 34. Tanto o interferon convencional quanto a ribavirina fazem parte da grade de medicamentos da farmácia ambulatorial e são dispensados ao todos os pacientes portadores de hepatite C em tratamento na unidade. 2 – Objetivos: Avaliar a evolução na terapia medicamentosa específica contra o vírus C nos pacientes atendidos pelo serviço de farmácia em intervalos de seis meses: janeiro 2008, julho de 2008 e janeiro de 2009. Verificar se os tratamentos prescritos aos pacientes acompanhados no ambulatório seguem a determinação do protocolo clinico e diretrizes terapêuticas (PCDT) do Ministério da Saúde. 3 – Materiais e métodos: O trabalho foi realizado após avaliação e autorização do Comitê de Ética em Pesquisa e da chefia do Serviço de Farmácia do HGB. Os dados sobre a identidade dos pacientes foram mantidas sob sigilo, de modo que nenhuma informação pessoal foi mostrada nos resultados, garantindo confidencialidade. Trata-se de um estudo observacional e retrospectivo. Inicialmente foram identificados todos os pacientes cadastrados e regularmente atendidos pelo Serviço de Farmácia Ambulatorial. Deste grupo, foram escolhidos todos os pacientes que foram cadastrados no programa até o mês de dezembro de 2007. Optou-se por este corte para que se pudesse acompanhar a evolução do tratamento no período de um ano. Após a definição dos nomes, foi identificada qual a terapia medicamentosa utilizada pelos pacientes nos três períodos do trabalho: janeiro de 2008, julho de 2008 e janeiro de 2009. Foi avaliado, então, as mudanças na terapia medicamentosa durante o período estudado. Os resultados dessa avaliação foram compilados e apresentados em gráfico. 4 – Resultados e discussão: Conforme os dados coletados, estão cadastrados (e são atendidos) 55 pacientes portadores do vírus C no Programa Ambulatorial de Hepatite do HGB. Entretanto, deste grupo, 25 pacientes (45,5%) foram enquadrados nos critério de inclusão do trabalho, por terem sido cadastrados até o mês de dezembro de 2007. A evolução na terapia medicamentosa dos pacientes no período de um ano está descrita no gráfico abaixo: EVOLUÇÃO NO TRATAMENTO 24 21 18 15 12 9 6 3 0 4 21 21 20 3 3 1 Janeiro 2008 Interferon 1 Julho 2008 1 Janeiro 2009 Interferon + Ribavirina Ribavirina Figura 1: Perfil de tratamento nos três períodos estudados Apenas um paciente fez a terapia combinada de interferon e ribavirina durante o período estudado, o que, teoricamente, está em concordância com o preconizado no protocolo. Entretanto, verificou-se que o mesmo fazia a terapia combinada desde 2006, conduta que não está previsto no PCDT, que diz que a terapia combinada deve ser feita por um período de, no máximo, 48 semanas. Um dos quatro pacientes que faziam tratamento com interferon convencional em monoterapia em janeiro de 2008, substituiu-o por ribavirina em monoterapia. Como este paciente iniciou seu tratamento em abril de 2007, esperava-se que, uma não depois, em abril de 2008, houvesse, segundo o PCDT, a suspensão do tratamento e que não fosse utilizada mais nenhum medicamento na terapia, como foi observado. Os outros três pacientes, que iniciaram o tratamento com interferon em monoterapia antes de dezembro de 2007, ainda faziam tratamento em janeiro de 2009, ou seja, mais de um ano após o fim do prazo máximo de tratamento estabelecido no PCDT, que é de um ano. O dado mais relevante foi identificar que 84% dos pacientes faziam tratamento com ribavirina em monoterapia há, no mínimo, um ano. Após análise dos cadastros, verificou-se que estes pacientes já haviam feito o tratamento combinado sem sucesso (não conseguiram a RVS) e, segundo o PCDT, não deveriam mais fazer tratamento. Mesmo assim, os clínicos adotaram a ribavirina como opção terapêutica. 5 - Conclusão: O presente trabalho visava avaliar a evolução na terapia medicamentosa especifica para o tratamento da Hepatite C no período de um ano e estabelecer algum paralelo entre a conduta prática e o determinado pelo Protocolo Clínico. Observou-se que mais de 84% dos pacientes faziam ribavirina em monoterapia e que todos já tinham feito, sem sucesso, o tratamento combinado por um ano. Esta opção pela monoterapia, é controversa, pois alguns autores justificam que a ribavirina melhora a resposta bioquímica e histológica nos pacientes que não teriam outra opção terapêutica para o tratamento após insucesso da terapia combinada, enquanto outros relatos de literatura indicam que não há melhora na resposta virológica sustentada, principalmente para indivíduos genótipo 1, objetivo principal do tratamento contra a doença. Mesmo contrariando o PCDT, a adoção da monoterapia com ribavirina já é uma realidade. E parece ainda que a evolução na conduta terapêutica venha sugerir que exista um adaptação deste mesmo protocolo clínico para a realidade clínica do serviço, baseada nas experiências e nas evidências encontradas, o que embasaria a utilização da ribavirina. Estudos clinicos mais detalhados e controlados, entretanto, poderiam ser desenvolvidos para dar mais validade a esta conduta terapêutica adotada 6 – Referências bibliográficas: 1. ALVES, A. V.; AZEVEDO A. P. C.; PERIN C.; RAMOS G. Z.; BRANDÃO A. B. M.; MATTOS A. A.; ALMEIDA P. R. L. Tratamento de pacientes com hepatite crônica pelo vírus C com interferon e ribavirina: a experiência da Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul. ARQGA, 1089; vol 40 nº 4, 2003; p227-232. 2. BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de medicamentos de dispensação excepcional . Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=25315. Acesso em: 11/03/2008 3. BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Medicamentos excepcionais. Disponível em: http://dtr2001.saude.gov.br/sas/dsra/protocolos/index.htm. Acesso em 12/03/2008 4. CONSENSUS STATEMENT. Journal of Viral Hepatitis 2004; 11: 2-4 5. IMBERT-BISMUT F.; RATZIU V. PIERONI L.; CHARLOTTE F.; BENHAMOU Y.; POYNARD T. Biochemical markers of liver fibrosis in patients with hepatitis C virus infection: a prospective study. The Lancet 2001, vol. 357, no9262, pp. 1069-1075 6. MARCELLIN P.; HEZODE C.; CASTELNAU C.; BARANGE K; COUZIGOU P.; LARREY P.; Randomized controlled trial of combination therapy with (IFN) alfa-02A and ribavirin, in patients with chronic hepatitis C who relapsed after interferon therapy. Hepatology 1999, 30: 192A. 7. PAGLIARO, L.; PERI V.; LINEA C.; CAMMA C.; GIUNTA M.; MAGRIN S. Natural history of Hepatitis C. Italian Journal of Gastroenterology and Hepatology 1999; 31:28-44 8. SEEFF, L.B. Natural history of Hepatitis C. Hepatology 1997; 26:21S-28S 9. STRAUSS, E. Hepatite C. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 2001, 34(1):69-82, jan-fev. 10. THEVENOT T.; REGIMBEAU C.; RATZIU V.; LEROY V.; OPOLON P.; POUNARD T. Meta-analysis of interferon randomized trials in the treatment of viral hepatitis C in naive patients: 999 update. Journal of Viral hepatitis 1999;8:48-62