Funcionamento sistémico do cérebro

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Funcionamento sistémico do cérebro
A ideia de que o cérebro é o órgão que domina grande parte dos nossos comportamentos é
bastante recente. É natural que esta conceção vigorasse tanto tempo, porque as experiências
pessoais reforçam o papel ativo do coração: quando sentimos uma emoção, como o medo, a
angústia, é no coração que se manifestam alterações, como o aumento do ritmo cardíaco. Esta
posição foi defendida por Aristóteles.
Mais tarde Descartes defendia a separação do pensamento consciente do corpo, portanto, do
cérebro. Para ele, a glândula pineal, localizada no cérebro, estabelecia a ligação entra a alma
imaterial e o corpo.
São os frenologistas que vão defender a relação íntima entre o cérebro e as caraterísticas da
personalidade e do temperamento das pessoas. A partir dos crânios dos condenados à morte e de
outras pessoas célebres, procuram estabelecer uma relação entre as proeminências da caixa
craniana e o seu comportamento.
Como é óbvio esta teoria não faz qualquer sentido, no entanto convém assinalar que os
frenologistas foram os primeiros a afirmar que o estudo da mente humana se deve basear no
conhecimento biológico do cérebro. Desde então as descobertas têm sido significativas.
O cérebro humano é o maior e com mais circunvoluções, mas, para além da distinção da sua
estrutura, o cérebro humano organiza-se segundo determinadas funções que lhe conferem um
caráter único – especialização funcional.
Hemisférios cerebrais
Os hemisférios estão separados por uma fissura longitudinal e ligados por um sistema de
fibras nervosas chamado corpo caloso. O córtex cerebral é a camada cinzenta que cobre os dois
hemisférios, residindo aí as capacidades superiores dos seres humanos. Os hemisférios cerebrais
controlam a parte oposta do corpo, porque os feixes nervosos que conduzem as instruções até aos
músculos cruzam-se no percurso.
A Lateralização Hemisférica é a especialização de cada um dos hemisférios do cérebro
humano em funções diversas. O hemisfério direito controla a formação de imagens, as relações
espaciais e o pensamento concreto, já o hemisfério esquerdo é o responsável pelo pensamento
lógico, pela linguagem verbal, pelo discurso e pelo cálculo.
Apesar de os hemisférios terem diferentes funções, o seu funcionamento é complementar. É
graças ao funcionamento integrado que, por exemplo, atribuímos significado a uma expressão
verbal, a um diálogo.
Lobos Cerebrais
Cada hemisfério cerebral é constituído por quatro lobos – frontal, parietal, occipital e
temporal – que têm funções específicas, atuando de forma coordenada e complementar.
Os Lobos Occipitais estão situados na parte inferior do cérebro, esta área é também
designada por córtex visual, porque processa os estímulos visuais. Depois de percebidos por esta
área – área visual primária – estes dados passam para a área visual secundária ou área visual de
associação. A área visual, ou córtex visual, comunica com outras áreas do cérebro que dão
significado ao que vemos tendo em conta a nossa experiência passada, as nossas expetativas. O
nosso cérebro é orientado para discriminar determinados estímulos.
Os Lobos Temporais situam-se na zona por cima das orelhas, processam os estímulos
auditivos. Os sons produzem-se quando a área auditiva primária é estimulada. A área de associação
– área auditiva secundária – recebe os dados e, em interação com outras zonas do cérebro, permitenos reconhecer o que ouvimos.
Os Lobos Parietais localizados na parte superior do cérebro, têm duas subdivisões: a anterior
e a posterior. A primeira, o córtex somatossensorial, possibilita a receção de sensações (o tacto, a
dor, etc.). Nesta área primária, responsável pela receção de estímulos que têm origem no
ambiente, estão representadas todas as áreas do corpo. A área posterior é uma área secundária que
analisa, interpreta e integra as informações recebidas pela área anterior ou primária, que permite
a localização do nosso corpo no espaço, o reconhecimento dos objetos através do tacto, etc.
NOTA: a área de Wernicke, zona onde convergem os lobos occipital, temporal e parietal,
desempenha um papel muito importante na produção do discurso. Permite-nos compreender o que
os outros dizem e que nos faculta a possibilidade de organizarmos as palavras em frases
sintaticamente corretas.
Os Lobos Frontais, situados na parte da frente do cérebro, são responsáveis pelas atividades
cognitivas que requerem concentração, pelos comportamentos de antecipação, planificação de
actividades, pensamento abstrato, memória de trabalho, raciocínio complexo, intervindo também
na regulação das emoções. Uma das diferentes partes dos lobos frontais é o córtex motor,
responsável pelos movimentos da responsabilidade dos músculos. Por trás do córtex motor, fica
situada a área de Broca, responsável pela linguagem falada e pela produção do discurso. Esta
relaciona-se com a área de Wernicke: a forma e as palavras adequadas são seleccionadas por esta
área e depois passadas para a área de Broca, traduzindo-as em sons que serão transformados em
movimentos adequados ao produzir o discurso.
(ver quadro pág. 67)
Papel das áreas pré-frontais
As áreas pré-frontais (córtex frontal) são responsáveis pelas principais funções intelectuais
superiores que distinguem a espécie humana de todas as outras. Têm uma relação com a memória,
permitindo-nos recordar o passado, planear o futuro, resolver problemas, antecipar
acontecimentos, refletir, tomar decisões, criar o próprio mundo. Organizam o pensamento reflexo
e a imaginação. Permitem-nos ter consciência das funções acima referidas. Têm uma relação
complexa com as emoções. As relações entre o córtex pré-frontal e as emoções dão-se nos dois
sentidos: por um lado, o córtex apoia-se nas informações emocionais para tomar decisões
adaptadas, por outro lado, tem um papel de inibidor das emoções.
Especialização e integração sistémica
O desenvolvimento da neurofisiologia e das neurociências modificaram algumas conceções
que vigoraram durante décadas. A evolução de conhecimentos levou ao reconhecimento de novas
funções e à redistribuição de outras já identificadas.
Foi possível concluir que as várias estruturas funcionam de um modo integrado, implicando-se
umas às outras na concretização das diferentes funções. Assim o cérebro funciona como um todo.
Constatou-se, também, que uma função perdida devido a uma lesão pode ser recuperada por uma
área vizinha - função vicariante. Isto deve-se à plasticidade do cérebro. Quer com isto dizer que a
redundância das funções cerebrais explica o facto de outras regiões do cérebro poderem substituir
as funções afectadas por lesões.
Auto-organização permanente
No decurso das 42 semanas de gestação, o cérebro atinge 2/3 do tamanho em adulto. Os
neurónios, formados a um ritmo impressionante, dividem-se, estabelecendo entre si milhões de
ligações - corticalização (construção do córtex cerebral).
Apesar de o bebé ter todas as áreas corticais formadas, o seu desenvolvimento cerebral não
está concluído. Nos primeiros seis meses de vida produzem-se mais modificações no córtex do que
em qualquer outro período de desenvolvimento.
O cérebro é influenciado pelo meio intra-uterino e depois do nascimento pelo meio ambiente
- estímulos assimilados conduzem a processos de adaptação que se reflectem na formação do
cérebro. O processo de desenvolvimento de auto-organização continua a desempenhar um papel
importante.
Estabilidade e mudanças nos circuitos sinápticos
O desenvolvimento do cérebro ocorre pelo crescimento em número dos neurónios e das
sinapses, mas também, pela morte e eliminação dos mesmos, já que este é um processo de seleção
em que se anulam as conexões que não são necessárias e se retêm as eficazes. Este processo está
relacionado com o potencial genético da espécie e, em última análise, do próprio indivíduo. No
entanto, na formação das redes neuronais também influenciam os fatores epigenéticos (decorrem
da relação com o meio).
O processo de moldagem mantém-se ao longo da vida, sempre que os neurónios se modificam
quanto à forma e dimensão em resposta à estimulação ambiental.
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