ENVELHECIMENTO E LINGUAGEM: CARACTERÍSTICAS

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ENVELHECIMENTO E LINGUAGEM: CARACTERÍSTICAS
INTRODUTÓRIAS
Andrey Ximenez1
Matheus Gazzola Tussi2
Introdução
O envelhecimento, bilinguismo e cognição são temas em voga nas pesquisas na
atualidade, em termos nacionais e internacionais, devido à importância de se analisar
como é possível assegurar e amplliar a qualidade de vida da população idosa.
No presente artigo, serão discutidos importantes aspectos relacionados a esses
três temas: Plasticidade cerebral, aspectos sobre a memória, modelos de reorgnização
cerebral, qualidade de vida e recursos cognitivos e envelhecimento.
Plasticidade Cerebral
A plasticidade neural é uma propriedade do sistema nervoso. É o
desenvolvimento de alterações estruturais em resposta às experiências, adaptando-se a
condições mutantes e a estímulos repetidos.
Cada nova experiência, cada novo conhecimento adquirido, faz com que as
sinapses mais antigas sejam reforçadas, e também possibilita a criação de novas
sinapses, possibilitando, assim, um maior caminho de opções que cérebro pode recorrer
para recuperar determinada informação.
Nota-se a grande importância de plasticidade cerebral em casos de danos à
determinadas regiões do cérebro. Em casos de afasia (AVC) ou traumatismos cranianos,
danos, às vezes irreversíveis, impossibilitam que determinada área do cérebro continue
exercendo suas funções corretamente. Não raras vezes uma pessoa sofre um AVC e
acaba por perder o domínio da linguagem, nosso foco nesse trabalho. Nesses casos é
possível se notar que o conhecimento sobre o que deseja ser falado continua perfeito,
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Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – Rio Grande do Sul – Brasil.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – Rio Grande do Sul – Brasil.
porém a maneira de expressa-lo não funciona corretamente ao ter uma determinada área
danificada.
Mesmo uma determinada área estando danificada, não permitindo que as
sinapses sejam realizadas e por fim suas informações recuperadas, a plasticidade
cerebral garante que o cérebro utilize-se de outros caminhos, outras maneiras e até
mesmo outras sinapses para alcançar o conhecimento que necessita. Porém levará um
determinado tempo, que varia de pessoa para pessoa, para que esses novos caminhos
sejam traçados.
É analisando este conceito de plasticidade que fonoaudiólogos auxiliam pessoas
que necessitam de tratamento. Um bom exemplo disso é um homem que sofreu um
acidente de carro e teve a região responsável pela fala afetada por um traumatismo
craniano. Porém este homem é um ótimo músico e cantor. Sendo assim os especialistas
utilizar-se-iam dessa região relacionada a arte e canto para re-desenvolver a fala do
paciente.
A estruturação neurofuncional do cérebro em envelhecimento é afetada por
alterações em aspectos como os mecanismos de controle inibitório e excitatório
(BEEMAN, 1998; CRAIK), as funções executivas (STEMMER, 1999) e a memória, em
especial a memória de trabalho (PARENTE, 2006).
Aspectos sobre a Memória
Memória é a capacidade de reter, armazenar e recuperar informações. Ela
também nos permite, a partir de um conhecimento prévio, nos adaptarmos às situações
apresentadas no presente e guiar-nos para o futuro.
É importante compreender-se que o sistema de memórias pode ser decomposto
em diferentes subsistemas.
Segundo a classificação proposta por Mello e Xavier (2006, p.109), baseado nos
estudos de Baddeley, em termos gerais, pode-se categorizar este sistema em memória de
longa duração e memória operacional.
A memória de longa duração pode ser dividida basicamente em dois tipos. O
primeiro seria a memória explícita, onde se encaixam a memória semântica, que nada
mais é que o conhecimento de mundo absorvido pelas pessoas e a memória episódica,
que traz a tona uma lembrança de um determinado episódio da vida de uma pessoa.
Chama-se de explícita, pois pode ser explicada e exposta pela pessoa. O segundo tipo de
memória seria a implícita, que se caracteriza como habilidades percepto-motoras,
esqueléticas e respostas emocionais. Chamam-se implícitas pelo fato de não se saber
explicar ou detalhar seu funcionamento de maneira verbal a uma pessoa. Andar de
bicicleta ou dirigir um carro são bons exemplos de memória implícita.
A memória operacional, ou de trabalho como também é chamada, é a memória
responsável por reter dados apresentados momentaneamente para uma pessoa,
permitindo ela trabalhar mentalmente com as informações apresentadas. É subdividida
em quatro elementos, que são:
a) Central executiva: responsável pelo sistema de controle de atenção e tomada
de decisão;
b) Alça fonológica: armazenamento temporário e manipulação de informações
verbais, lembrar do nome de uma palavra ou número por exemplo;
c) Esboço visuoespacial: armazenamento temporário e manipulação de
informações visuoespaciais, reter uma informação visual de uma
determinada disposição de objetos sobre uma mesa, jogo de memória por
exemplo;
d) Retentor episódico: que é o elemento responsável pela comunicação entre a
memória operacional e os sistemas de memória de longa duração.
Cada
um
desses
subsistemas
pode
ser
diferentemente
afetado
pelo
envelhecimento (SKA, JOANETTE, 2006). Por exemplo, evidências mostram que a
memória semântica, incluindo a aquisição de vocabulário, continua a aprimorar-se com
a idade (VERHAEGHEN, 2003), ao passo que a episódica verbal (testada, por exemplo,
através da repetição imediata ou adiada de uma lista de palavras) parece sofrer um
declínio.
Tais estudos concluíram que o primeiro tipo de memória a decair é a memória
prospectiva, responsável pelo planejamento prévio de alguma atividade. Tomar
remédios ao acordar, preparar o almoço pontualmente ao meio-dia, buscar os filhos no
colégio.
O segundo tipo a sofrer influência negativa com a idade seria a episódica,
exemplificada mais acima. Em seguida viria a memória de trabalho, tornando-se de
certa maneira mais lenta e debilitada. A memória semântica seria a última apresentar
qualquer alteração e poderia mesmo aprimorar-se com o avançar da idade.
Modelos de Reorganização Cerebral
Durante o envelhecimento as maneiras de organização cerebral se alteram.
Analisando este fato, pesquisadores formularam teorias para alcançar uma compreensão
maior dessas alterações.
Citaremos abaixo os três principais modelos que abordam este assunto. São eles:
a) Modelo de HAROLD (Hemispheric Asymmetry Reduction in Older Adults):
elaborado por Cabeza (CABEZA, 2002; CABEZA ET AL., 2002), que
sugere uma dediferenciação e um mecanismo de compensação por parte do
cérebro. Essa dediferenciação se faz presente pela redução das assimetrias
hemisféricas cerebrais. Se determinada função ativava uma região do lado
direito do cérebro somente, ela passaria a ativar de ambos os hemisférios.
b) Modelo de PASA (Posterior-Anterior Shift in Aging): fenômeno abordado
por Davis e colaboradores (2007) a partir do modelo HAROLD. Neste
estudo, os pesquisadores perceberam existe um aumento na atividade frontal
cerebral, área esta responsável pelos controles de atenção e tomadas de
decisão. Seus estudos também apontaram que esse aumento de atividade não
é influenciado pela dificuldade da tarefa.
c) Modelo STAC (Scaffolding Theory of Aging and Cognition): proposto por
Park e Reuter-Lorenz (2009). Seus estudos apontaram que o aumento de
atividade cerebral frontal, apresentado por PASA, era uma medida
compensatória ao declínio funcional e anatômico que ocorre com o cérebro
no decorrer dos anos.
Qualidade de Vida
Um dos conceitos que vem sendo estudado desde o século passado é de suma
importância para o entendimento do estado cognitivo e psicológico daqueles que
adentram na chamada terceira idade.
Tal conceito é nomeado como qualidade de vida, estudo esse que tem uma
ampla gama de conceitos, que podem ser eles patológicos, psicológicos, sociais e
emocionais.
E importante se perceber que uma velhice com uma ampla qualidade de vida tem
seus efeitos prorrogados para a cognição. O idoso que com a idade percebe-se bem,
satisfeito consigo mesmo, tem uma propensão a continuar evoluindo e sofrer menos
com os efeitos da velhice.
Tais conceitos de qualidade de vida são compilados no trabalho de Parente e
colaboradores (PARENTE, 2006) onde estudos apontam que a qualidade de vida
baseia-se num ideal de bem-estar consigo mesmo, com a sociedade e com o papel em
que se enquadra nela.
Recursos Cognitivos e Envelhecimento
Cognição é a habilidade do cérebro de conhecer, perceber e raciocinar sobre
determinados conhecimentos. Em variados estudos terá conceitos ainda mais amplos.
Para este trabalho, no entanto, basta nos determos no fato de ser o fator responsável pela
atenção e percepção do cérebro no que diz respeito à obtenção e utilização de tais
conhecimentos.
É evidente que a população idosa não é afetada uniformemente pelos declínios
ocasionados pelo envelhecimento. Um dos fatores que mais determina isso são as
reservas cognitivas adquiridas pelas pessoas ao longo da vida, fato este que está
relacionado diretamente ao conceito de plasticidade cerebral.
Essas reservas cognitivas se apresentam durante toda a vida da pessoa. Podemos
listar aqui os conhecimentos escolares e acadêmicos dela. Acesso à leitura e obtenção de
conhecimento. O tipo de trabalho que pessoa exerce ou exerceu e inúmeros outros
conhecimentos e experiências de vida que o cérebro humano é capaz de captar e se
aprimorar. Tais experiências estão diretamente correlacionadas às capacidades de
plasticidade cerebral e aos tipos de memória da pessoa.
Outro fator que conta muitíssimo como reserva cognitiva é o fato de a pessoa
possuir domínio sobre uma segunda língua. Tal domínio, que pode ser relacionado com
o conceito de bilinguismo, permite uma maior gama de opções para se usufruir um
determinado conhecimento.
Pessoas bilíngues, que neste trabalho consideramos aquelas que nasceram ou
foram imersas numa sociedade aprendendo pelo menos duas línguas, possuem um
recurso cognitivo apurado inerente, pois a variedade de opções de uso de palavras, de
situações onde elas devem ser usadas, no controle de atenção para selecioná-las e
utilizá-las, ampliam e fortificam determinadas funções cognitivas.
Considerações finais
Com o crescimento da faixa da população idosa brasileira e mundial, muitas
pesquisas têm se voltado a essa população. Questões linguísticas e de outras áreas da
cognição no envelhecimento são objeto de estudo de pesquisadores na atualidade. A
população idosa busca uma melhor qualidade de vida e as pesquisas podem auxiliar essa
população a manterem-na ou aprimorarem-na. O estudo do bilinguismo, das questões
relacionadas à memória e outras capacidades cognitivas podem trazer importantes
subsídios na busca da qualidade de vida desta população.
Referências
BEEMAN, M.J. Coarse coding and discourse comprehension. In: M. Beeman &
Chiarello (Eds.). Right hemisphere language comprehension: Perspectives from
cognitive neuroscience, 255-284, Mahwah, NJ: Erlbaum, 1998.
CRAIK, F. I. M., & SALTHOUSE, T. A. (Eds.). The handbook of aging and cognition
2. ed. Mahwah, NJ: Erlbaum, 2000
MELLO, C.B., & XAVIER, G.F. Desenvolvimento da memória: Influências do
conhecimento de base e do uso de estratégias. Em: C.B. Mello, M.C. Miranda & M.
Muszkat, M. (Orgs.). Neuropsicologia do Desenvolvimento. São Paulo: Memnon, 2006.
PARENTE, M. A. Cognição e Envelhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2006.
SKA, B., & JOANETTE, Y. Vieillissement normal et cognition. Medecine Sciences:
Vieillissement. SRMS : Montréal, mars, v. 3, 22, p. 284-287, 2006.
STEMMER, B. Discourse Studies in Neurologically Impaired Populations: A Quest for
Action. Brain and Language, 68, p. 402-418, 1999.
VERHAEGHEN, P. Aging and vocabulary scores: A meta-analysis. Psychology of
Aging, 18, p. 332-9, 2003.
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