Avanos no melhoramento gentico assistido por marcadores

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Avanços no melhoramento genético assistido por marcadores
moleculares
Carlos Antonio Fernandes Santos1
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Embrapa Semi-Árido. Caixa Postal 23. 56302-970. Petrolina, PE. E-mail: [email protected].
Muitos dos caracteres agronômicos submetidos a seleções são complexos,
controlados não só por vários genes, mas também influenciados por fatores ambientais. Até
recentemente, o acúmulo de alelos favoráveis foram efetuados exclusivamente com base
no fenótipo, que combina efeitos de genes e do ambiente. A seleção de caracteres
quantitativos tem como referência a estimativa de parâmetros genéticos como
herdabilidade, variâncias e correlações genéticas (Dekkers e Hospital, 2002). A teoria da
genética quantitativa é baseada no modelo infinitesimal proposto por Fisher, que assume
um número infinito de genes, independentes e não epistáticos, cada um com um efeito
infinito, atendendo às suposições de normalidade e linearidade. Apesar de ser claramente
uma descrição incorreta da biologia, o modelo infinitesimal tem propiciado uma predição
satisfatória da resposta de seleção por um período moderado (Gibson, 1999). Por sua vez,
há o debate em torno do fenômeno do vigor de heterose, se é devido aos efeitos de
dominância ou sobre-dominância, mas que não tem impedido o desenvolvimento da
poderosa indústria de híbridos em cebola ou em milho, por exemplo, e nos consideráveis
incrementos de produtividade obtidos com a exploração dos mesmos.
Com o advento dos marcadores moleculares de DNA, em meados da década de 70,
passou-se a detectar as diferenças genéticas diretamente ao nível de DNA. Essa mudança
de paradigma resultou na aplicação em diferentes estudos como diversidade genética,
evoluções entre e dentro populações, investigações de processos biológicos (sistema
reprodutivo, movimento de pólen e dispersão de plantas), identificação de cultivares e
clones, manejo de recursos genéticos, entre outras. Uma proeminente aplicação foi à
associação de marcas anônimas ou não dispersas pelo genoma com caracteres controlados
por vários genes (de herança quantitativa) ou por um único gene (de herança qualitativa),
que é à base da seleção assistida por marcadores (SAM) (FAO, 2003).
A
aplicação
da
SAM
para
caracteres
qualitativos é simples e de fácil aplicação, com metodologias bem definidas, como a Bulk
Segregant Analysis (BSA) aplicadas em caracteres de herança simples em populações
originadas de parentais contrastantes. Neste caso, o objetivo é identificar o próprio gene
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(seleção direta) ou um marcador genético a uma distância genética inferior a 1,0 cM ao
gene alvo (seleção indireta). Para caracteres quantitativos, a questão é mais complexa,
sendo que os modelos de análise e identificação de Quantitative Trait Loci (QTLs) ainda
estão em desenvolvimento (Dekkers e Hospital, 2002). Para estes, a distância de 10 a 20
cM, possível na maioria dos modelos matemáticos, e a contribuição porcentual para o
caráter em seleção, torna a questão mais complexa na atual fase de conhecimento. Sem
dúvidas, um dos maiores desafios da genética e do melhoramento atual é a associação das
informações de dados fenótipos com regiões ou marcas em mapas de ligações genéticas,
objeto de estudos das estimativas de QTLs.
Os resultados das análises de QTLs têm sido inconsistentes com a teoria do modelo
infinitesimal proposto por Fisher, e base da clássica genética quantitativa, pois ao contrário
de regiões com pequeno efeito, tem sido detectado regiões com grande expressão nos
caracteres de variação continua. Baseado nos resultados das análises de QTLs, Orr (1998)
propôs um modelo alternativo a teoria do Fisher, na qual assume a evolução para o ótimo
por etapas.
A revista Theoretical and Applied Genetics, que publica artigos originais nas
modernas áreas da genética, da genômica e da biotecnologia de plantas, dedicou 25% dos
seus artigos para tratar da identificação de QTLs em diferentes espécies vegetais. Estes
números indicam a atração ao tema dos QTLs, apesar das suas limitações e das suas poucas
aplicações práticas.
As estratégias para aplicação de marcadores para o melhoramento vegetal
geralmente envolvem: 1) identificação de parentais contrastantes para algumas
características, ou seja, em vez de estudar apenas uma característica, o ideal é estudar
várias na mesma população de forma a diminuir custos; 2) desenvolvimento de populações
segregantes, sendo que as mais comuns nas plantas são retrocruzamentos, populações F2 e
linhas F6 endógamas; 3) escolha do marcador molecular adequado: marcadores
dominantes, como RAPD (Random Amplification of Polymorphic DNA) e AFLP
(Amplified Restriction Fragment Polymorphism) podem ser tão valiosos na informação
gerada quanto marcadores co-dominantes, como microsatélites, SNP (Single Nucleotide
Polymorphism) e RFLP (Restriction Fragment Length Polymorphism), em populações de
retrocruzamentos ou linhas endógamas. Para populações F2, para as quais os marcadores
dominantes são mais limitados, a estratégia tem sido obter um grande número de
marcadores e alinhá-los na presença de marcadores co-dominantes para estimativas
confiáveis de grupos de ligações e de distâncias genéticas entre elas. Para caracteres de
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herança simples, estratégias como a BSA, onde indivíduos contrastantes (por exemplo,
resistentes x susceptíveis são analisados) para estimativas da distância genética, seguida do
desenvolvimento de marcadores específicos tipo SCAR (Sequence Characterized
Amplified Region) ou SNP, são as estratégias mais usadas. Para caracteres de herança
complexa, como produtividade, tolerância a estresses abióticos, entre outros, existe a
necessidade da construção de mapas de ligações e do emprego de modelos estatísticos para
identificar uma região do genoma com genes de impacto no caráter (QTLs).
Apesar de algumas sofisticadas tecnologias para a aplicação dos marcadores no
melhoramento vegetal, existe ainda espaço para a aplicação de tecnologias mais baratas,
desde que empregadas em populações adequadas. Neste contexto, destaca-se a aplicação
do marcador dominante AFLP para estudos de caracteres de herança simples como
também de herança complexa, em populações de retrocruzamentos e de linhas endógamas.
Nesta situação, uma rede pode ser estabelecida com laboratórios dotados de estrutura
mínima para reações de PCR e análises de géis de poliacrilamida, na qual cada laboratório
pode ser responsável pela realização de um determinado número de combinações de
primers de AFLP, todos tendo o mesmo DNA pré-amplificado das populações fenotipadas
em um ou em vários ambientes. Esta estratégia vem sendo adotado por um consórcio
internacional visando a identificação de QTLs para seleção assistida em goiabeira (Psidium
guajava L.). Exemplificando este raciocínio e assumindo a obtenção de oito bandas
polimórficas por combinação de primer de AFLP em uma dada população segregante de
100 indivíduos, o custo com reagentes para obtenção de 300 bandas será de
aproximadamente R$ 8.000,00, ou seja, R$ 0,27 por cada informação. O custo para equipar
um laboratório com a estrutura mínima para extração de DNA, reações de PCR,
eletroforese e revelação dos géis em nitrato de prata deve ser em torno de R$ 80.000,00.
Revisões completas sobre os princípios básicos, estratégias, limitações e aplicação
de marcadores moleculares para seleção assistida em vegetais podem ser encontradas em
Collard et al. (2005), FAO (2003) e Dekkers e Hospital (2002).
Alguns exemplos da aplicação da seleção assistida por marcadores em hortaliças
Os avanços no melhoramento genético assistido por marcadores moleculares são
mais proeminentes em hortaliças que possuem um maior número de cientistas dedicados,
maior demanda de consumo pela sociedade e menores limitações para o desenvolvimento
de populações adequadas para o mapeamento de genes. Vários são os exemplos da SAM
em paises desenvolvidos, raros são os relatos em paises em desenvolvimento. No Brasil,
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nenhum artigo cientifico reportando a aplicação do SAM foi publicado nos anos de 2005 e
2006 na principal revista da olericultura brasileira, a Horticultura Brasileira.
Barone (2003) adotou as seguintes estratégias para identificar marcadores
associados via PCR com genes de resistência em tomate: 1) marcadores disponíveis na
literatura especializada. Para o autor citado, 20 genes tolerantes a várias doenças e viroses
foram mapeados no gênero Lycopersicum; 2) primers desenvolvidos de seqüências de
genes clonados depositados no GenBank (www.ncbi.nlm.nih.gov/Genbank); e 3) primers
desenvolvidos de RFLP fortemente ligados com genes de resistência. Adotando estas
estratégias Barone (2003) reporta que seis marcadores entre nove relacionados com
diferentes genes de resistência foram empregados para o avanço de três gerações por ano,
no esquema de retrocruzamento. Para Lecomte et al. (2004) a seleção assistida em
retrocruzamento possibilitou a transferência de até cinco regiões de QTLs relacionadas
com a qualidade do fruto do tomateiro.
Segundo Barone (2004) o mapa de ligações genéticas com mais de 350 marcadores
distribuídos uniformemente nos 12 cromossomos de batata tem possibilitado a localização
de mais de 25 genes de herança simples, entre os quais, genes que conferem resistência a
nematóides, auto-incompatibilidade, 22 genes associados com resistência a doenças e
QTLs associados com resistência a pragas e produtividade e qualidade da túbera.
Em pepino, Fan et al. (2006) relatam a primeira aplicação da SAM para QTLs
associados com arquitetura vegetal numa hortaliça, por intermédio da introgressão por
retrocruzamentos. Para os autores, a SAM pode ser amplamente aplicada em programas de
melhoramento de pepino para alterar ginoecia, número de ramos laterais e razão entre
comprimento e diâmetro de fruto.
Em cenoura, os seguintes exemplos do uso da SAM em programa públicos e
privados são apresentados (Philipp W. Simon, comunicação pessoal): 1) três primers
possibilitaram a identificação de plantas para os alelos Rs/Rs, Rs/rs e rs/rs, que
condicionam para o acúmulo preferencial de glucose e frutose e sucrose, respectivamente,
uma semana após a germinação (Yau et al. 2005); 2) dois co-dominantes sequence-tagged
site (STS) para identificação de linhas resistentes ao Meloidogyne javanica (Mj-1)
(Boiteux et al. 2004); 3) identificação do tipo de citoplasma para o desenvolvimento de
híbridos, por intermédio do desenvolvimento de uma série de marcadores mitocondriais
que possibilitam a identificação do tipo petalóide (Sp) e do macho-fértil (N) (Bach et al.
2002). Em cenoura dois QTLs principais estão sendo usados para predizer se linhas
endógamas de raiz amarela demonstraram ação complementar para produzir a cor laranja.
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Para cebola, o uso da SAM estão relacionados a: 1) identificação de bulbos de cor
rósea, que é indesejável em cebola roxa e que é de difícil eliminação por ser condicionada
por alelo recessivo (Kim et al. 2004); 2) identificação do citoplasma normal (N), estéril
tipo S e tipo T tornou-se possível como desenvolvimento de cinco primers (Engelke et al.,
2003). A SAM para o tipo de citoplasma possibilitou a identificação de linhas
mantenedoras da macho-esterilidade, tipo estéril T, na cultivar Alfa São Francisco (Santos
et al. 2006); 3) identificação de SNP na sintase do gene do fator de lacrimejação publicado
por Imai et al. (2002) deverá possibilitar a identificação de linhas mutantes para essa
indesejável característica em cebola; 4) um marcador SNP tem sido usado em populações
em desequilíbrio de ligação para identificar o lócus Ms do sistema da CMS(S) (Gokçe et
al. 2002). Esforços estão sendo realizados para clonar o lócus Ms visando genotipá-lo sem
erros (Michael J. Havey, comunicação pessoal).
Em melão, os seguintes exemplos da SAM são apresentados: 1) um SCAR ligado a
5,5 cM do gene “a”, que está envolvido com a monoécia ou tipo sexual (Noguera et al.,
2005), 2) fragmentos de AFLP ligados a 0,5 cM ao gene da resistência do papaya
ringsport vírus – estirpe melancia (Teixeira, 2004); 3) marcadores ligados ao gene da
resistência Fusarium oxysporum f.sp. melonis (Burger et al. 2003).
Outros exemplos da aplicação da seleção assistida em outras espécies vegetais.
Em soja, uma das importantes commodities mundiais, Cahill e Schimidt (2004)
destacam que a aplicação da SAM tem fortemente impactado a seleção em gerações
iniciais, resultando no desenvolvimento de cultivares comerciais nos últimos 10 anos na
multinacional Pioneer Hi-Bred. Ainda segundo os autores, a SAM tem sido aplicada com
sucesso para seleção de plantas de soja resistentes a Heterodera glycines, Phytophthora
sojae e Phialophora gregata.
Alzate-Marin et al. (2005) apresentam duas aplicações dos marcadores na SAM: 1)
em feijoeiro foram obtidas linhagens com características fenotípicas similares às da
cultivar recorrente, contendo alelos de resistência à antracnose, ferrugem e mancha
angular; 2) identificação de dois marcadores microssatélites (Satt038 e Satt163)
flanqueando o alelo de resistência rhg1 e também marcadores ligados a um QTL que
confere resistência à raça 14 do nematóide do cisto da soja. Os autores ainda destacam que
SAM é uma realidade em diversos programas de melhoramento no mundo inteiro que
visam ao desenvolvimento de cultivares resistentes a doenças e que o seu uso efetivo no
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melhoramento depende de uma maior sintonia entre o melhorista e o biólogo molecular de
plantas.
Outros exemplos para outras hortaliças e espécies vegetais podem ser encontrados
na literatura especializada, sendo que na maioria das situações a seqüência dos primers é
publicada, possibilitando os ajustes para emprego na rotina do melhoramento. Para Barone
(2003), o emprego da tecnologia da SAM não é sempre direto, pois podem ocorrer
mudanças nas condições de um laboratório para outro, destacando que quando um
marcador é identificado o seu emprego passa a ser rotina. Este tem sido o caso da
identificação do tipo de citoplasma em cebola na Embrapa Semi-Árido, que possibilitou a
identificação da planta mantenedora da macho-esterilidade em dois anos de trabalho.
Conclusões
Os avanços da seleção assistida por marcadores
para caracteres qualitativos são mais proeminentes em commodities como soja, sendo que
nas hortaliças os trabalhos existentes dependem da importância da espécie, bem como do
número de cientistas dedicados. Para caracteres quantitativos a questão é mais complexa,
sendo que um dos maiores desafios da genética e do melhoramento atual é a associação das
informações de dados fenótipos com regiões ou marcas em mapas de ligações genéticas,
objeto de estudos das estimativas de QTLs. No Brasil, os exemplos são bastante limitados
e são dependentes também da importância econômica das espécies vegetais, bem como dos
grupos de pesquisadores envolvidos. A mudança do paradigma da genética, ou seja, da
inferência do genótipo com base em observações fenotípicas para avaliações no próprio
genoma, tem possibilitado aplicações antes não imagináveis em diversas áreas e a sua
integração com o melhoramento vegetal clássico é definitiva.
Literatura citada
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