A segurança no uso de antibióticos como marcadores de seleção

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A segurança no uso de antibióticos como marcadores de seleção
Vivemos em uma época de quebra de paradigmas na biologia molecular. A
quantidade de informações geradas nos vários projetos genoma nos permite desenhar
mapas genéticos de alta resolução que ajudam a entender melhor o funcionamento de
diversos organismos e a composição dos seus genes e fornecem pistas preciosas de
como eles são regulados. Sabemos como modificar, clonar e transferir genes de um
organismo para outro. A estes organismos receptores de um determinado “novo gene”,
que podem ser bactérias, fungos, animais ou mesmo plantas, chamamos transgênicos.
O processo de transferência gênica é denominado de transformação. A
transformação tem, em geral, baixa eficiência. Somente uma proporção pequena de
eventos ocorre e podemos assim dividi-los em três fases: introdução do gene clonado,
por exemplo, em células vegetais; identificação ou seleção das células que tiveram o
gene transferido inserido no seu genoma e regeneração das células, as quais se
tornam uma planta com um desenvolvimento normal. Precisamos lançar mão dos
chamados marcadores de seleção para que seja possível identificar as células
transgênicas, monitorá-las e então selecionar as plantas filhas, ou seja, a progênie.
Os marcadores de seleção são genes que codificam proteínas, as quais
permitem ou não o crescimento ou a seleção do vegetal na presença de substratos
como antibióticos, herbicidas e outras drogas. Tais marcadores são divididos em
diferentes categorias, dependendo do tipo de seleção praticada, podendo ser positiva
ou negativa. A seleção positiva é definida como aquela que permite o crescimento da
planta transgênica na presença do substrato e, a negativa, na ausência.
Os genes marcadores podem ser co-transferidos (transformados) juntamente
com outros genes que irão conferir outras características agronômicas de interesse. Os
marcadores de seleção foram e são os principais instrumentos no desenvolvimento de
plantas geneticamente modificadas. Mais de 55 deles foram testados e avaliados
quanto à sua eficiência, biossegurança e aplicabilidade laboratorial, além da utilização
em plantas que chegarão ao mercado consumidor.
Entre todos os marcadores de seleção ou de resistência, os antibióticos são os
mais utilizados. Recentemente li um artigo da Medical News Today no qual se comenta
que a probabilidade de que estes marcadores possam ser transferidos, seja para
bactérias patogênicas (nocivas à saúde humana e animal), seja para o ser humano,
seria bem menor que ganhar na Megasena três semanas seguidas! Fazendo uma
leitura de artigos científicos e relatórios de renomadas instituições científicas, como a
Sociedade Britânica de Quimioterapia Antimicrobiana, todos foram categóricos na
afirmação de que não existem antibióticos em nossos alimentos ou evidências de
impacto negativo na saúde humana pelo uso destes marcadores.
Os antibióticos mais usados são a ampicilina e a canamicina. Estes foram
escolhidos porque foram quase que totalmente banidos da prática médica devido ao
fato de, hoje, a maioria das bactérias patogênicas serem resistentes a estes fármacos.
Estudos recentes relatam que bactérias não-patogênicas do intestino humano, na sua
maioria, são resistentes à ampicilina e podem passar essa característica para
patógenos bacterianos humanos com uma eficiência extraordinária.
O que podemos concluir é que é muito mais fácil existir uma transferência gênica
entre bactérias do que de uma planta para uma bactéria. Entretanto, não podemos
excluir esta possibilidade. Porém, ainda que viesse a ocorrer, seria um fato sem
nenhum impacto para a saúde humana. Observamos na comunidade científica que
existe um consenso sobre marcadores de antibióticos presentes nas plantas
geneticamente modificadas: eles não são um risco para o meio ambiente ou para a
saúde humana.
Podemos então pensar que nossas plantas transgênicas poderiam passar esses
genes para o ambiente e que transformariam as bactérias patogênicas ainda não
resistentes a estes genes. Todavia, muitos trabalhos foram realizados nos últimos 10
anos e conclui-se que a possibilidade de transferência gênica dos marcadores de
seleção das plantas geneticamente modificadas para patógenos humanos é quase
nula. Paradigmas e dogmas existem para serem quebrados.
Vasco Azevedo é Médico veterinário, Ph.D. em Genética Molecular de
Microorganismos e professor da Universidade Federal de Minas Gerais.
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