Artigo de Opinião As opiniões expressas neste artigo são da exclusiva responsabilidade do seu autor e não representam necessariamente a opinião da ICF Portugal. A Análise Transacional ao serviço do coaching Patrícia Mateus As relações que estabelecemos com os outros e os comportamentos, emoções e questões que as mesmas geram em nós são temas muito presentes no âmbito do coaching. Se pensarmos que somos, aos olhos do outro, o comportamento que assumimos e que, enquanto seres comunicantes, gregários e sociais, estamos em interacção permanente com quem nos rodeia, vale a pena reflectir acerca da raiz desses comportamentos. Dos nossos e dos outros. É neste enquadramento que a Análise Transacional pode ser uma útil ferramenta para a prática do coaching, não apenas no que respeita à reflexão, identificação e origem dos comportamentos presentes em determinado contexto mas também na tomada de consciência e na descodificação da forma como estes são utilizados para estabelecer interacções e fazer emergir determinadas reacções e respostas por parte dos outros. Mas que se de que trata afinal a análise transacional e quais são as suas principais características? A teoria da análise transacional foi apresentada ao mundo em 1964 por Eric Berne com o lançamento sua obra “Games people play”. Jogo, para Berne, associa-se a interacção e a sua teoria incide na análise das interacções humanas. Berne defende que todos os processos de comunicação provêm de um dos três estados do nosso Eu: Pai, Criança ou Adulto. Quando comunicamos no nosso estado do Eu Pai significa que estamos a transmitir o que aprendemos com os nossos pais. Esta é, tipicamente, uma forma autoritária de comunicar. Por outro lado, quando recorremos ao estado do Eu Criança somos mais emotivos e tendemos a adoptar os comportamentos que manifestávamos na nossa infância. O Estado do Eu Adulto leva-nos a analisar situações ou eventos racionalmente e de um modo não disruptivo. Compreender a forma como comunicamos pode ajudar a melhorar o relacionamento interpessoal e a efectuar uma auto-avaliação do nosso comportamento e do seu impacto nos outros. Tentando abordar o conceito essencial da Análise transacional de uma forma simples, poderemos utilizar a seguinte metáfora; Pensemos na nossa essência, na forma como nos estruturamos, como se fosse um armário, com três grandes portas. Por trás de cada porta está um estado eu (Pai, Criança ou Adulto) e, tal como fazemos com as próprias peças de vestuário ou calçado que tipicamente podemos guardar nos nossos armários, vamos abrindo a porta do estado do eu que validamos para cada uma das circunstâncias com que nos vamos deparando. A questão é: Escolhemos a porta? Sim. Porque se trata dos nossos comportamentos e somos inteiramente responsáveis por eles, por reagir ou comunicar de determinada forma. É importante referir que todos nós, sem excepção, possuimos e adoptamos comportamentos provenientes dos três estados do eu. Veremos agora os traços mais marcantes de cada deles. Eu Pai Ao abrirmos a porta do Eu Pai estamos a falar do reservatório dos comportamentos que têm a ver com o conceito de vida ensinado. Na presença deste estado do eu podemos comportar-nos de forma controlada, por vezes até crítica e autoritária mas também de uma forma mais protectora e até carinhosa. Respondemos aos estímulos do ambiente que nos rodeia como se existisse um gravador na nossa mente que reproduz algumas das frases típicas dos nossos pais ou de outras figuras de autoridade. É este estado do eu que nos faz: estabelecer limites, julgar, criticar, manter tradições, criar regras e normas de vida mas também nos faz proteger, aconselhar e orientar. Eu Criança Atrás desta porta reside o conjunto dos nossos comportamentos que são semelhantes aos da nossa infância; é o centro dos nossos sentimentos, energia, emoções e motivações, e é a fonte da nossa criatividade, curiosidade e intuição. Traduz-se no conceito de vida sentido. Quando agimos neste estado do eu podemos comportar-nos quer de forma mais adaptada, e por vezes conformista, quer de uma forma mais livre, e por vezes rebelde. O Estado do Eu Criança é o centro dos nossos sentimentos, da nossa energia, fonte da nossa criatividade, curiosidade e intuição. É também o espaço das nossas experiências de infância, incluindo as formas que escolhemos para obter a atenção ou lidar com figuras de autoridade. Eu Adulto Abrimos caminho à raiz dos nossos comportamentos de natureza racional e que se relacionam com a obtenção de informação, a análise de situações, estimativa de probabilidades e com o processo de tomada de decisão. É o conceito de vida pensado. Quando agimos no Estado do Eu Adulto recolhemos informação do mundo exterior e de nós próprios, e tratamo-la no sentido de orientar os nossos comportamentos numa perspectiva de cariz essencialmente racional. Alguns exemplos da utilização e identificação dos Estados do Eu nas transacções humanas: Ana para o marido: “Já substituíste a lâmpada da cozinha conforme tua obrigação e como já te pedi por 6 vezes?” (Eu Pai) Resposta do João, marido da Ana: “Deixa-me acabar de ver este filme que é mesmo espectacular e depois trato disso ok querida? (Eu Criança) A Joana e o marido Pedro estão a pensar comprar uma nova casa, eis um excerto da conversa entre eles a propósito deste assunto: Joana: “Após selecionarmos 2 ou 3 casas com as características que procuramos temos de ir ao banco falar com o nosso gestor de conta para perceber que opções de financiamento temos” (Eu Adulto) Pedro: “Claro, para mim está tudo bem desde que a nova casa tenha piscina e jardim” (Eu Criança) A transaccção de comportamentos oriundos dos diferentes 3 estados eu produz assim determinados impactos, resultados e consequências. O grande desafio é termos a autoconsciência do que está em jogo em cada transacção estabelecida: Que porta do meu armário estou a abrir? Que porta do armário o outro abriu? Que resultado gostaria eu de obter? É papel do coach apoiar esta descodificação para si e para o seu coachee. A exploração da análise transacional como mecanismo importante de auto-análise e de descodificação “do que está em causa” é algo a ter em conta nas transacções realizadas em contexto de coaching. Tal como escolhemos retirar um casaco do armário num dia mais frio também escolhemos adoptar um dado comportamento em função de um determinado objectivo, pessoa e contexto. Afinal, e como já referido anteriormente, somos o comportamento que assumimos e podemos sempre escolhe-lho e controlá-lo no sentido de alimentarmos interacções mais positivas, alinhando o nosso estado do eu com o do outro procurando comunicar de modo mais autoconsciente e eficaz. Sobre a autora: pós graduação em Gestão de RH pela Universidade Católica Portuguesa, tenho vindo a desenvolver a minha carreira profissional no âmbito da Gestão de Recursos Humanos tanto na área da formação, consultoria de RH como na Direcção de Recursos Humanos de empresas de média/grande dimensão, passando pelo coaching de equipas e indivíduos. Actualmente desempenho a função de Directora de RH no Grupo MSF Engenharia. Domínios de especialização: Perfil Profissional (resumo): Licenciada em Sociologia do Trabalho pela Universidade Autónoma de Lisboa, e uma Gestão e implementação de processos de mudança/transformação organizacional, formação e desenvolvimento, sistemas de compensação e benefícios, gestão de expatriados, planeamento de RH, surveys de RH, recrutamento, formação, avaliação de desempenho, técnicas de engagement, scorecard de RH, legislação laboral e formadora no domínio comportamental. Coach com formação Nível ACTP pela Variations/Activision, membro do Chapter Português do ICF - International Coaching Federation.