Sofrendo por antecipação TEXTO E ENTREVISTAS GIOVANE ROCHA/COLABORADOR DESIGN JOSEMARA NASCIMENTO A ansiedade é um dos males do século, atingindo pessoas de todas as classes sociais. Veja como ela pode afetar sua vida e saiba lidar com esse transtorno E m grandes quantidades, até uma bebida energética, como o café, que serve para deixar o corpo disposto, pode fazer mal ao organismo. O mesmo ocorre com a ansiedade. Em um nível regulado, esse sentimento serve como um combustível para o corpo, que a partir dela vai impulsionar você para a frente em atividades do dia a dia. 12 | Segredos da Mente Ela também pode ajudar em casos que seja necessária uma ação mais imediata, como reagir a um acidente de carro iminente. Essa, na verdade, é uma herança dos nossos ancestrais, de tempos em que a luta e a fuga eram habilidades essenciais para a sobrevivência, sendo justamente a ansiedade a responsável por essas reações. No entanto, em níveis desregulados, esse sentimento pode mais atrapalhar do que ajudar, dando origem aos transtornos ansiosos. Descontrole total Já imaginou ficar nervoso a todo momento, com uma situação que nem aconteceu ainda e pode nem vir a ocorrer? Como consequências, sono deixa de ficar regulado, o desespero por não sentir que está no controle aumenta gradativamente, a paciência se esgota facilmente e, mais que sintomas psicológicos, o corpo começa a sentir os efeitos — taquicardia, respiração desregulada, sudorese, tremedeira — tudo isso por momentos em que não justificam tal esforço mental e físico. Claramente, a ansiedade em níveis desproporcionais pode causar diversos prejuízos à saúde, mas como a psicóloga e psicoterapeuta Andreia Calçada explica, “é uma emoção normal, na verdade ela é positiva, até um determinado limite, um combustível para que a gente se mexa, para que a gente cresça e busque pelo necessário para cumprir as nossas necessidades”. Sistema nervoso e ansioso O cérebro é o órgão à frente do funcionamento do corpo humano, influenciando na liberação de substâncias que acabam causando alguns sintomas quando ocorre uma reação ansiosa mais extrema. O psicólogo Odair Comin comenta que, em casos nos quais a pessoa passa por uma ansiedade mais generalizada, um estresse intenso toma conta do corpo. “Isso produz uma descarga elevada de cortisol, fazendo com que o fígado secrete mais glicose, aumentando os níveis de açúcar no sangue. Há um enrijecimento muscular, além de a garganta ficar mais seca. O próprio sangue acaba por fluir muito mais rápido pelo corpo, o que, por vezes, produz palidez”, completa o profissional. No dia a dia Não é por menos que a ansiedade é considerada um dos males do século atualmente. Isso porque vivemos em uma sociedade em que o lema é produtividade, sendo cada vez mais exigida junto com essa eficiência uma boa qualidade. Mas, segundo Andreia Calçada, “tudo depende da personalidade de cada um, do nivel de exigência individual e do perfeccionismo. A combinação desses fatores, quando em excesso, pode desencadear algum transtorno ansioso”. No entanto, não se deve colocar essas situações estressoras como únicas causadoras dos distúrbios de ansiedade. Pois, como indica a psiquiatra Julieta Guevara, não há condições externas que originam por si só a patologia. Ou seja, o que deve ser levado em conta no diagnóstico é o encontro de experiências extremas com a vulnerabilidade para o quadro ansioso, como em casos de transtornos de estresse pós-traumático. Já em casos de síndrome do pânico, Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), entre outros marcados pelos sinais da ansiedade, ocorre justamente o oposto. O distúrbio faz “a pessoa reagir exageradamente a estímulos que não justificam essa resposta. Isto pode produzir a falsa impressão de que alguns estímulos irrelevantes deflagram o transtorno. Mas, para o adoecimento, é preciso que a susceptibilidade abra espaço para a patologia se instalar”, conclui Julieta. Regulando o alarme No momento em que a ansiedade passa a apresentar um mal funcionamento e causa muitos prejuízos na rotina da pessoa, é a hora de procurar ajuda de especialistas — psicólogos e psiquiatras. A partir do diagnóstico realizado pelos profissionais, a próxima etapa é definir o melhor caminho para buscar o controle dos sintomas e, desse modo, garantir uma melhor qualidade de vida ao paciente. E, nessa parte, são mostradas algumas soluções, dividindo-se, basicamente, em duas vertentes: o tratamento medicamentoso e as terapias alternativas. Andreia ressalta que a utilização de remédios para controlar os sinais da ansiedade só se faz necessário quando eles excedem os limites do indivíduo, ou seja, no momento em que seu corpo está tão acelerado a ponto de afetar a qualidade do sono, promovendo uma reação em cadeia de outros sintomas. Essas substâncias, que só podem ser utilizadas sob prescrição médica, são drogas que trabalham o humor do paciente, como antidepressivos, ansiolíticos (tranquilizantes), benzodiazepínicos (com resultados mais imediatos contra os sintomas) e os inibidores de recaptação de serotonina (neurotransmissor responsável pela regulação do humor e do sono). Mas, “dependendo do grau de ansiedade, se for um quadro em que seja possível manejar através de relaxamento, respiração, terapia ou psicoterapia, podemos agir com tratamentos trabalhando a respiração e o relaxamento”, indica a psicoterapeuta. “Ansiedade é uma emoção normal; na verdade ela é positiva, até um determinado limite, um combustível para que a gente se mexa, para que a gente cresça e busque pelo necessário para cumprir as nossas necessidades” Andreia Calçada, psicóloga Segredos da Mente | 13 Caminhos alternativos Visto que recorrer ao tratamento medicamentoso só é preciso em casos mais graves de transtornos de ansiedade e que os remédios utilizados não são substâncias consideradas leves, buscar o controle por meios alternativos pode ser a melhor opção. Confira as três soluções mais eficazes indicadas pelo psicólogo Odair Comin. 1 - Hipnose clínica Mesmo ainda sendo uma técnica que encontra preconceitos, a hipnoterapia já ganhou bastante crédito na ciência quando o assunto é o tratamento de distúrbios mentais. Com propósitos totalmente diferentes da hipnose de entretenimento, o objetivo do método, segundo Comin, “é munir o indivíduo com diferentes ferramentas internas para que possa aprender a lidar com a ansiedade, com moderação e equilíbrio”. O psicólogo explica que é preciso compreender os gatilhos que ativam os sintomas de ansiedade em determinados momentos e o motivo de tal descontrole. “Desta forma, mune-se o paciente com instrumentos para lidar melhor com a ansiedade, libertando-se desta dor”, finaliza. 2 - Meditação Como a ansiedade está diretamente ligada com preocupações futuras, a meditação é uma ótima alternativa, de manter a mente do paciente focada no presente. “Manter o foco no que realmente importa, ao mesmo tempo que conduz para uma conexão profunda com pensamentos que produzem uma harmonização do mundo interno”, resume Odair. Além disso, com a prática da meditação, é possível aprender a controlar melhor a respiração, uma dificuldade para quem sofre com distúrbios de ansiedade. 3 - Psicoterapia Esta é uma possibilidade de tratamento bastante recomendada entre os especialistas da área. De acordo com Odair Comin, a principal meta da psicoterapia é “preparar o paciente com diferentes linhas de pensamento, conteúdos mentais para que, com isso, consiga lidar com as diferentes questões do dia a dia de forma mais tranquila”. Dessa maneira, a pessoa poderá aprender a lidar com eventuais frustrações e expectativas, seja no ambiente familiar ou profissional, além de administrar a necessidade de controlar o futuro com mais razão e equilíbrio. Imagens: Shutterstock Images CONSULTORIAS 14 | Segredos da Mente Andreia Calçada, psicóloga, psicoterapeuta e especialista em neuropsicologia; Julieta Guevara, psiquiatra e diretora da Neurohealth ó Centro de Métodos Biológicos em Psiquiatra, no Rio de Janeiro (RJ); Odair Comin, psicólogo e especialista em hipnoterapia.