Fármacos Ansiolíticos Elisa M Kawamoto Objetivos da aula • Visão geral da natureza da ansiedade e dos testes para medir a atividade ansiolítica • Classificação de fármacos ansiolíticos • Antidepressivos (inibidores da recaptura seletiva de 5HT, inibidores da recaptura de 5HT e NOR) • Benzodiazepínicos: ansiedade aguda • buspirona • Anticonvulsivantes, adrenérgicos antipsicóticos, antagonistas Beta- Fármacos Ansiolíticos e Hipnóticos Fármaco para tratar de ansiedade: ansiolítico Fármaco para tratar de insônia: hipnótico Ansiedade Estado emocional de desconforto desencadeado por situações potencialmente ameaçadoras A natureza da ansiedade A resposta normal ao medo: Comportamento defensivo Reflexos autonômicos Excitação e estado de alerta Secreção de corticoesteróide Emoções negativas Ansiedade: reações antecipadas A Natureza da Ansiedade “ Estado emocional onde a pessoa se sente inquieta, apreensiva ou assustada (….) diante de situações desconhecidas, das quais não detêm controle, ou ainda, diante de situações ameaçadoras e perigosas. (…) sensação de vulnerabilidade (...)”. Ronald J. Kulich, PhD A natureza da ansiedade Transtornos da ansiedade Medo (ataques de pânico e fobias) Sentimento mais geral de ansiedade A natureza da ansiedade Transtornos da ansiedade Transtorno de ansiedade generalizada (ansiedade excessiva sem razão clara) Ansiedade social (medo de estar/interagir com pessoas) Síndrome do Pânico (ataques repentinos de grande medo) Medos, fobias Transtorno de estresse pós-traumático Transtorno obsessivo-compulsivo (comportamento ritualístico, irracional; medo de contaminação) Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) • Preocupação persistente, excessiva e irreal com as coisas do cotidiano. • Afeta 6,8 milhões de americanos, as mulheres parecem ser duas vezes mais afetadas. Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) • Pensamentos intrusivos, indesejados e que permanecem constantemente na mente (obsessão), compelindo o indivíduo a realizar comportamentos ritualísticos, rotineiros e repetitivos (compulsão) para tentar aliviar a ansiedade. TOC “Não podia fazer nada sem executar um ritual. Quando ajustava o despertador à noite, tinha que marcar um número que não fosse “mau”. Quando minha irmã tinha 33 anos e eu 24, não podia sintonizar os canais de televisão 33 ou 24. Lavava meu cabelo 3 vezes, em vez de uma, porque 3 era um número de sorte e um não. Levava muito tempo para ler porque tinha que contar as linhas de cada parágrafo”. Síndrome de Pânico Medo intenso de início abrupto, que alcança seu auge em poucos minutos e apresenta pelo menos 4 dos sintomas listados: - sensação iminente de perigo e morte; - necessidade de fuga e taquicardia; - sudorese e tremor; - sensação de asfixia, respiração curta; - dores no peito, náusea e desconforto abdominal; - tontura e vertigem; - sentimento de perda de controle ou enlouquecimento; - sensação de formigamento, calor ou calafrios. Síndrome do Pânico “De repente, eu senti uma terrível onda de medo, sem nenhum motivo. Meu coração disparou, tive dor no peito e dificuldade para respirar. Pensei que fosse morrer. " “Eu voltava de carro para casa após um dia exaustivo. O trânsito estava engarrafado, de repente senti um desconforto abdominal seguido de um calafrio por todo o corpo, meu coração disparou, minha respiração ficou ofegante. Senti que estava tendo um ataque do coração. Comecei a buzinar e entrei em pânico. Nunca havia sentido isso em minha vida. Um guarda de trânsito socorreu-me e levou-me ao pronto-socorro. O trajeto durou 20 minutos e quando cheguei ao pronto-socorro, todos os sintomas haviam desaparecido. O médico examinou-me e nada constatou. Dias após, os sintomas voltaram e sucessivamente foram acontecendo. Dois anos depois tive o diagnóstico: Síndrome do Pânico” Agorafobia ansiedade que se sente em locais ou situações onde possa ser difícil ou embaraçoso escapar Agorafobia “Estou presa em casa, não tenho coragem de passar do portão, já tentei, mas logo começo a suar frio e meu coração dispara. Tomo medicamentos há 2 anos e também não consigo ficar sem eles. Abandonei minha profissão de professora. O mundo parece que acabou para mim.” Fobia simples - acrofobia, claustrofobia,… Fobia social - medo intenso de se expor. Transtorno de Estresse pós-traumático Memórias de uma situação traumática recorrentes Estima-se que ao redor do mundo, 20% das pessoas que tem acesso a assistência básica de saúde, apresentam distúrbios da ansiedade ou depressão; 18% da população americana sofre de Síndrome do Pânico, ou seja, 40 milhões de adultos. Dados de 2010: -Instituto Nacional de Saúde Mental: www.nimh.nih.gov; -Associação Psiquiátrica Americana: www.healthminds.org; -Associação Americana de Distúrbios da Ansiedade: www.adaa.org Kessler RC, Berglund PA, Demler O, Jin R, Walters EE. Lifetime prevalence and age-of-onset distributions of DSM-IV disorders in the National Comorbidity Survey Replication (NCS-R). Archives of General Psychiatry. 2005 Jun;62(6):593-602. NIMH 20% das pessoas que vivem em São Paulo convivem com ou tiveram algum transtorno ansioso nos últimos 12 meses. O índice mais elevado em São Paulo. Medida da atividade ansiolítica Modelo animal Labirinto em cruz elevado Controle: braço fechado (medo de cair, ou de ser atacado) Com ansiolítico (BZD): braço aberto Medida da atividade ansiolítica Modelo animal Campo aberto Controle: imóvel (comportamento de inibição), na periferia Com ansiolítico (BZD): move-se mais, centro/periferia Medida da atividade ansiolítica Modelo animal Controle: pressiona alavanca (comida). Choque inibe (supressão do comportamento, comportamento de inibição) Com ansiolítico (BZD): pressiona alavanca (comida) mesmo na presença de choque Medida da atividade ansiolítica Testes em humanos Testes subjetivos de “escala de ansiedade” (questionários) Resposta cutânea galvânica Diazepam: pressiona alavanca mesmo com choque Tratamentos Disponíveis 1. Terapia Psicológica; 2. Tratamentos Alternativos: massagem, exercícios físicos regulares, yoga, meditação, mudança de hábitos alimentares e etc. 3. Terapia Medicamentosa Tratamento farmacológico Passado • Barbitúricos e BZDs Presente • Antidepressivos, anticonvulsivantes, antipsicóticos, buspirona Tratamento farmacológico BZDs • Ansiolítico (ansiedade aguda, efeito em ~30 min), amnésia, tolerância, dependência. Não são eficazes na depressão. Antidepressivos e buspirona • Requerem ±3 semanas para efeito. • Buspirona: não tem efeito hipnótico Fármacos para tratar a ansiedade Antidepressivos Antagonistas β adrenérgicos (propranolo) redução de sintomas físicos (suor, tremor, taquicardia). (Fluoxetina) ansiedade generalizada, fobia, ansiedade social e estresse póstraumático BZD (diazepam) ansiedade aguda ansiedade Antipsicótico atípico (risperidona): ansiedade generalizada e estresse póstraumático Buspirona ansiedade generalizada Anticonvulsivante (valproato) ansiedade generalizada BZD e fármacos relacionados Indicações Clínicas * • Mais usados como ansiolíticos: diazepam (protótipo), alprazolam, bromazepam • Mais usados como hipnóticos: nitrazepam, flurazepam, midazolam, flunitrazepam, temazepam, triazolam, estazolam. * baseia-se principalmente nas características farmacocinéticas ! Na prática, todos os BZD são usados como hipnóticos. BZDs USADOS NA CLÍNICA Indicações Clínicas BZD GABA Cl- αβγ extracelular BZD intracelular Receptor GABAA Transmissão sináptica inibitória Cl- GABA BZ Cl- Receptor GABAA ClStahl S M, Essential Psychopharmacology (2000) GABA BZ Cl- GABA BZ Receptor GABAA ClHIPERPOLARIZAÇÃO BZD Liga-se na interface α e γ γ2, α1, α2, α3, α5 α1: sedativo α2, α3: ansiolítico Fármacos seletivos BZD – Efeitos farmacológicos Redução ansiedade e agressão Indução de sono e sedação Redução do tônus muscular e coordenação Efeito anticonvulsivante Amnésia anterógrada BZD – redução da ansiedade e agressão • Efeito ansiolítico • Em geral sem efeito antidepressivo • Irritabilidade e agressão (ação ultra-curta e curta): síndrome de abstinência • Hoje: usados para tratar ansiedade aguda BZD – indução do sono e sedação Diminui tempo para dormir Aumenta tempo total de sono (< 6h) Afeta menos o sono REM Curta duração (zolpidem): menos ressaca Tratamento por curto prazo da insônia BZD – indução do sono e sedação Tolerância com uso contínuo Na interrupção: insônia de rebote e síndrome de abstinência BZD: pré-medicação na cirurgia (efeitos ansiolíticos, sedativos e amnésicos) BZD – redução do tônus muscular Diminui tônus muscular: ação central nos GABAA (medula espinhal) Aumento do tônus: característico ansiedade, pode contribuir para dores (dor-de-cabeça), efeito relaxante do BZD pode ser benéfico BZD – efeitos anticonvulsivantes BZDs: efeito anticonvulsivante Diazepam, clonazepam: tratamento da epilepsia Tolerância BZD – amnésia anterógrada BZD: previne memória durante seu efeito Benéfico em pequenas cirurgias Flunitrazepam: usada em encontros com estupros e vítima não se recorda (“estupro marcado” - Boa noite Cinderela) Ligação na α5. Knockout de α5: aprendizado e memória aumentados BZD – farmacocinética Bem absorvidos, administração oral Ligação forte a proteínas plasmáticas, acúmulo na gordura (lipossolubilidade) Administrado pela boca ou iv Metabolizados e excretados na urina Ação curta (hipnótico, sem ressaca), médio e longo (ansiolítico, anticonvulsivante) Metabólitos ativos: efeitos cumulativos e ressaca prolongada (uso contínuo) BZD – efeitos adversos Efeitos tóxicos por overdose Efeitos adversos no uso terapêutico Tolerância e dependência: todos BZDs BZD – toxicidade aguda Overdose: menos perigosos Tentativas de suicídio Overdose: sono prolongado, sem depressão cárdio-respiratória. Na presença de outros depressores (álcool): depressão cárdiorespiratória BZD – efeitos adversos durante uso terapêutico Sonolência, confusão, amnésia, coordenação prejudicada (dirigir carro) Aumenta efeito depressor compostos como álcool de outros Lorazepam (efeito curto) pode ter efeitos prejudicados no trabalho e dirigir carro no dia seguinte BZD – tolerância e dependência Tolerância: aumento gradual da dose para ter efeito. Alterações em receptor: número de receptores ocupados e duração da ocupação. Uso contínuo (epilepsia). Tolerância para efeitos hipnóticos menor. Tolerância aos efeitos dos BZD • tolerância diferencial: rápida: efeito sedativo intermediária: efeito anticonvulsivante praticamente inexistente: efeito ansiolítico • funcional (farmacodinâmica) - envolve alteração no n° ou na sensibilidade dos receptores,ou mudanças na neurotransmissão Nor ou 5-HT. BZD – tolerância e dependência Dependência: interrupção abrupta: síndrome de abstinência: ansiedade intensificada, tremor, tontura, zumbido nos ouvidos, perda de peso, distúrbio do sono, nervosismo, perda de apetite, convulsões. Estes efeitos demoram para aparecer (1/2 vida longa) Retirada gradual Sem craving (fissura, desejo) Manejo da dependência/ abstinência dos BZD – Tratamento farmacológico • redução gradual da dose (dias a semanas, dependendo da dose e duração do uso continuado); • substituição do BZD de meia-vida curta por outro de meia-vida longa (ex. diazepam); • outros: propranolol, clonidina, carbamazepina; • cuidado com antidepressivos e neurolépticos durante abstinência a BZD: diminuição do limiar convulsivo. Toxicidade - aguda - superdosagem (suicídio): sono prolongado sem profunda depressão respiratória ou do sistema cardiovascular. - tratamento: antagonista flumazenil • casos fatais são raros com BZD; • depressão respiratória grave em combinação com álcool e outras drogas ! Interações Medicamentosas • os BZD efeitos sedativos dos antipsicóticos, antidepressivos, anti-histamínicos e hipnoanalgésicos; • potencializam os efeitos do álcool; • Cimetidina (bloqueador H2), inibe a atividade do citocromo P450, atrasando desta forma a biotransformação de vários fármacos que são substratos das oxidases hepáticas, inclusive os BDZ; • anticoncepcionais esteróides podem taxa de depuração - efeito clínico; • barbitúricos - indução enzimática - efeito • eritromicina, claritromicina, ritonavir, itroconazol, cetoconazol e grape fruit são inibidores de CYP3A4, afetando o metabolismo dos BDZ. Antagonistas de BZD e agonistas inversos Antagonista de BZD Flumazenil Ação rápida, 2h Usado para reverter overdose (coma) Usado para reverter midazolam (pequenas cirurgias) Agonistas inversos Ligam-se a receptores BZD, efeito oposto (ansiedade e convulsão): agonista inverso Beta-carbolinas, análogos de BZD: agonista inverso Agonistas inversos Receptor: 2 conformações: A (GABA liga) e B (GABA não liga). BZD liga-se a A preferencialmente e aumenta sinalização pelo GABA Agonista inverso liga-se opostos a B e tem efeitos Antagonista competitivo liga-se nos dois e antagoniza efeito dos dois Ações dos agonistas inversos • Reduzem a ligação entre o GABA e seu receptor, diminuindo a abertura dos canais de cloro; • não têm uso clínico; • utilizados como instrumento de pesquisa da neuroquímica da ansiedade. Agonistas inversos parciais • Substâncias com baixa atividade intrínseca negativa: sarmazenil, FG 7142, S-8510, Ro 15-4513, cujos efeitos também são revertidos pelos agonistas e pelos antagonistas; • Eles podem induzir fenômenos de ansiedade, agitação, alterações das sensações e percepções, excitação mental e irritabilidade; • pesquisados quanto à sua potencial utilidade na terapêutica de distúrbios associados com disfunções cognitivas, melhora da memória e atenção. Buspirona Buspirona Ansiedade generalizada (ineficaz para ataques de pânico ou ansiedades graves) Agonista parcial 5HT1A, pode ligar-se a receptor de dopamina Efeitos ansiolíticos demoram para aparecer: sugere mecanismo de ação mais complexo. Inibidores seletivos da recaptura de 5HT também tem efeito ansiolítico tardio Buspirona 5HT1A: pré-sináptico inibitório. Em alguns neurônios pode ser pós-sináptico (circuito cortico-límbico, comportamento emocional) Teoria sobre efeito tardio: indução de dessensibilização de 5HT1A pré-sinápticos: excitação de neurônios 5HT e liberação aumentada de 5HT. No início piora a ansiedade porque diminui liberação de 5HT por efeito na 5HT1A pré-sináptico Buspirona Inibe neurônios noradrenérgicos do locus coeruleus: interfere reações de despertar. Efeitos adversos diferentes dos BZDs. Principais efeitos adversos: náusea, tontura, dor-decabeça, inquietação. Não causa sedação ou incoordenação motora. Buspirona Tolerância e dependência não tem sido relatados Buspirona não suprime síndrome de abstinência de BZD (mecanismos diferentes). Na troca de BZD por buspirona: retirada gradual de BZD Barbitúricos Até 1960: bastante empregados na clínica Causam morte por parada cardiorrespiratória em altas doses (uso limitado hoje) Pentobarbital e barbitúricos similares: muito ocasionalmente usados como pílulas para dormir e ansiolíticos. Outros em uso clínico: fenobarbital (epilepsia) e tiopental (anestesia) Barbitúricos Ligam-se ao GABAA, sítio diferente dos BZDs. Ação menos específica Perigoso em altas doses Tolerância e dependência Induz síntese de enzimas CYP e enzimas de conjugação: aumenta metabolismo de fármacos Barbitúricos GABA Cl- BZD barbitúrico Receptor GABAA Cl- Barbitúricos Com exceção de fenobarbital, fração insignificante excretada inalterada na urina. Metabolismo costuma ser lento, administração de múltiplas doses, efeitos acumulativos. Antagonistas de receptores -adrenérgicos • Propanolol, Atenolol; • Diminuem os sintomas autonômicos associados as situações especificas de fobias; • Promove bradicardia, redução dos tremores e da sudorese; • Não trata a ansiedade e a fobia social !!!! Ansiedade X Efeito dos -bloqueadores Usos terapêuticos na odontologia Pré-medicação paciente apreensivo, criança que não coopera Midazolam e diazepam (iv): adjuvantes da anestesia local Midazolam: hidrossolúvel, não observado em geral efeito de depressão residual do SNC Diazepam: ação curta, mas o metabólito demora dias para ser eliminado (efeito residual do fármaco) Buspirona: uso limitado na odontologia (início de ação tardio) Uso clínico de hipnóticos Causa da insônia: estabelecer primeiro (causas comuns: álcool, mal uso de outros fármacos, desordem física ou psiquiátrica (depressão) Uso clínico de hipnóticos Tratamento ótimo da insônia: alteração de comportamento (exercício físico, estar acordado durante o dia) do que com fármacos BZD: por curto tempo, insônia grave Fármacos para tratar a insônia BZD curta duração: lorazepam Antihistamínicos (prometazina): causa sonolência, causa dano na performance no dia seguinte Zolpidem e zopiclone (curta ação, ~ ao BZD) Outros fármacos: hidrato de cloral, meprobamato, metaqualona Perspectivas futuras Bloqueio receptor 5HT2: efeito ansiolítico Antagonistas 5HT2 e 5HT3: em desenvolvimento Outros neurotransmissores além de 5HT e GABA podem estar envolvidos. Fármacos que almejam isso estão em desenvolvimento. Referências bibliográficas Rang HP, Dale MM, Ritther JM, Flower RJ. Rang and Dale´s Pharmacology. Seventh edition. Katzung BG, Masters SB, Trevor AJ – Basic and Clinical Pharmacology. 12th edition. McGraw Hill-Lange, NY, 2011. Stahl, SM. Essential psychopharmacology, 2000.