análise dos acidentes de trabalho com fluidos - PRAC

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TÍTULO: ANÁLISE DOS ACIDENTES DE TRABALHO COM FLUIDOS BIOLÓGICOS
OCORRIDOS COM ESTUDANTES DE NÍVEL MÉDIO E SUPERIOR NOS HOSPITAL DOS
SERVIDORES DO ESTADO (HSE), DE 1999 A 2001.
AUTORES: Nogueira, Daniele R.; Chaves, Sonia; Toledo, Ana Lucia A.; Silva, A.P.
e-mail: [email protected]
ÁREA TEMÁTICA: Trabalho
1- INTRODUÇÃO
O surgimento e a disseminação do vírus HIV acrescentou mais um risco para os profissionais de
saúde no exercício de suas atividades: o risco de contrair a infecção pela exposição acidental a materiais
potencialmente contaminados seja pelo contato de pele e/ou mucosas com fluidos biológicos (sangue ou
secreções) ou através de instrumentos que furam ou cortam, capazes de inocular o vírus mais
profundamente.
Com isso, tanto os Serviços de Saúde e/ou seus profissionais passaram a se preocupar com os
aspectos da biossegurança, que consiste num conjunto de medidas adotadas com a finalidade de formar
uma barreira que impeça a disseminação de agentes infecciosos de um indivíduo ao outro e ao meio
ambiente.
O medo e o preconceito, somados à falta de conhecimento sobre a AIDS, motivaram a adoção de
medidas que diminuíssem o risco ocupacional em ambientes hospitalares. Dentre as medidas que
promovem a biossegurança individual que devem ser adotadas, destacam-se: 1) o uso de equipamentos
de proteção individual (EPI); 2) a lavagem das mãos e 3) a higiene pessoal.
O risco médio de se adquirir o HIV é de, aproximadamente, 0,3% após exposição percutânea, e de
0,09 % após exposição mucocutânea. Esse risco foi avaliado em situações de exposição a sangue; o risco
de infecção associado a outros materiais biológicos (qualquer fluido orgânico contendo sangue, secreção
vaginal, sêmen) é inferior, ainda que não seja definido.
A probabilidade de infecção pelo vírus da hepatite B após exposição, podendo atingir até 40%. No
Brasil, a utilização da vacina para hepatite B é recomendada para todos os profissionais de saúde. Após
exposição ocupacional a material biológico, o uso da vacina é uma medida extremamente eficaz .
Para o vírus da hepatite C, o risco médio é de 1,8%. É importante ressaltar que não existe
intervenção específica para prevenir a transmissão do vírus da hepatite C após exposição ocupacional.
Em decorrência desses riscos, a linha de controle e prevenção de acidentes nas unidades de saúde
ganhou maior atenção e vem sendo uma atividade cada vez mais presente no cotidiano do HSE.
O Hospital dos Servidores do Estado é um hospital geral de rede pública de saúde, que funciona
atualmente com cerca de 400 leitos, situado na zona portuária, centro da cidade do Rio de Janeiro. O HSE foi
um dos primeiros hospitais no Brasil a prover cuidados de emergência para trabalhadores expostos a sangue e
fluidos biológicos, inclusive trabalhadores de outras instituições.
Nesse hospital, as ações de controle e prevenção de acidentes são desenvolvidas de modo setorial,
pela Comissão de Saúde do Trabalhador (CST), e Serviço de Doenças Infecciosas e Parasitárias (DIP).
No DIP, os acidentes de trabalho com sangue e outros fluidos potencialmente contaminados são
tratados como casos de emergência médica. Recomenda-se cuidados na área exposta, recomendações
específicas para imunização contra tétano, e medidas de quimioprofilaxia da infecção pelo HIV e hepatite
B que necessitam ser iniciadas logo após a ocorrência do acidente, para sua maior eficácia.
O sangue do paciente-fonte é colhido após o acidente para a realização do teste rápido para HIV com
comprovação pelo teste de ELISA Este sangue é guardado para a realização de sorologia para HIV,
Hepatite B e C. Para os profissionais com vacinação prévia para hepatite B é solicitado o anti-HBs, caso
esse resultado seja positivo, não há necessidade de acompanhamento sorológico deste profissional. Já para
os profissionais de saúde vacinados, com anti-HBs negativo e para os não-vacinados solicita-se HBsAg e
anti-HBc. No caso de não imunizados eles serão submetidos a vacinação, e as sorologias repetidas após 6
meses em exposições com paciente-fonte HBsAg positivo ou paciente-fonte desconhecido.
O funcionário acidentado deve receber a medicação anti-retroviral, quando indicada, idealmente
dentro de 1 a 2 horas após o acidente e orientação detalhada sobre o uso dos medicamentos.
A indicação do uso de anti-retrovirais deve ser baseada em uma avaliação criteriosa do risco de
transmissão do HIV em função do tipo de acidente ocorrido e a toxicidade dessas medicações.
Em acidentes em que a quimioprofilaxia anti-retroviral foi iniciada, o acompanhamento clínico
deve ser realizado semanalmente para avaliação de sinais de intolerância medicamentosa. Além disso,
exames laboratoriais (hemograma completo, transaminases, provas de função renal) devem ser realizados
para avaliação de efeitos adversos.
O profissional acidentado é então encaminhado a CST que notifica o acidente à Secretaria
Municipal de Saúde (SMS), faz o registro na Comunicação Interna de Acidentes (CIAT), oferece
aconselhamento legal e ainda faz a vigilância epidemiológica do acidente, o estudo de situações de risco
e do processo de trabalho.
A CST também realiza a busca ativa desses acidentes no arquivo da DIP e se necessário, faz
também a busca ativa do profissional acidentado, a fim de obter informações mais detalhadas sobre o
acidente. Essa comissão também faz visita regularmente a todas os setores do Hospital para supervisão
quanto ao cumprimento das normas de biossegurança.
Os estudantes de nível superior e nível médio são um dos principais responsáveis pela maioria dos
acidentes com fluidos biológicos notificados pela Comissão de Saúde do Trabalhador do HSE por isso,
eles são o foco da nossa pesquisa.
O objetivo deste trabalho foi analisar os acidentes de trabalho com fluidos biológicos ocorridos
com estudantes de nível médio e de nível superior do HSE, no período de 1999 a 2001.
2 – METODOLOGIA
Este trabalho foi realizado através da análise dos dados contidos no programa EPIINFO 6 que
armazena informações referentes aos acidentes de trabalho notificados pela Comissão de Saúde do
Trabalhador (CST) do HSE.
Estes dados constam de identificação do profissional acidentado (nome, endereço, telefone, função
e lotação); informações sobre o acidente (data, horário, local, condição e uso de EPI); sobre o pacientefonte (nome, idade, diagnóstico e resultado de sorologia, se estiver disponível) e a conduta médica
(profilaxia para HIV, hepatite B e tétano).
As informações sobre a profilaxia para HIV, hepatite B e tétano não foram analisadas, pois
existiam muitos dados incompletos comprometendo assim, a fidedignidade dos resultados da nossa
pesquisa.
3 – RESULTADOS
Do total de notificações, o total de acidentes com fluidos biológicos ocorridos com estudantes no
HSE e notificados pela CST no período de 1999 a 2001 foram 143 acidentes, sendo que destes 28%
foram com estudantes de nível médio e 72% com estudantes de nível superior.
Analisando os acidentes ao longo dos anos, observamos que a notificação dos acidentes com
estudantes de nível superior tiveram um aumento significativo ao longo dos anos. Em 1999, foram
notificados 23 acidentes; no ano 2000, 32 acidentes e no ano de 2001, 48 acidentes. Enquanto que nos
estudantes de nível médio, observou-se uma redução dos acidentes no ano de 2000 (9 acidentes)
comparado ao ano de 1999 (19 acidentes) mas, um leve aumento em 2001 (12 acidentes). Gráfico 1.
Gráfico 1- Acidentes com fluidos biológicos com estudantes de nível médio e superior no período de
1999 a 2001
50
40
30
20
10
0
N . M é d io
N . S u p e rio r
1999
2000
2001
Houve um predomínio do sexo feminino (71%) na notificação desses acidentes, em todos os anos e
em ambos os níveis médio e superior. Esse predomínio se torna maior quando analisamos os acidentes
com estudantes de nível médio: 87.5% do sexo feminino contra 12.5% do sexo masculino. Enquanto que
no nível superior essa diferença é um pouco menor, mas também significativa. 64% dos acidentes
ocorreram com estudantes do sexo feminino e 36% com o sexo masculino (Gráfico 2).
Gráfico 2- Acidentes com fluidos biológicos com estudantes de nível médio e superior segundo sexo
50
40
30
20
Fe m inino
10
M a sculino
0
NM
NS
1999
NM
NS
2000
NM
NS
2001
N M=nível m édio
N S= nível s uperior
Assinalamos o fato de que a Clínica Cirúrgica (60.8%) foi a que mais notificou acidentes com
fluidos biológicos em todos os anos e em ambos os níveis médio e superior (tabelas 1 e 2). Seguindo
depois da Clínica Médica (26.6%), Laboratório (3.5%), Maternidade (3.5%), Odontologia (2.1%),
Unidade de Terapia Intensiva (1.4%), Emergência, Hemodiálise e Divisão de Enfermagem (0.7%).
(Tabelas 1 e 2).
Tabela 1- Notificações de Acidentes com Fluidos Biológicos em Estudantes de Nível Médio do
HSE segundo lotação
LOTAÇÃO
1999
2000
2001
CLÍNICA CIRÚRGICA
14
8
7
CLÍNICA MÉDICA
4
1
1
LABORATÓRIO
1
0
3
EMERGÊNCIA
0
0
1
Tabela 2- Notificações de Acidentes com Fluidos Biológicos em Estudantes de Nível Superior
do HSE segundo lotação
LOTAÇÃO
1999
2000
2001
CLÍNICA CIRÚRGICA
16
17
25
CLÍNICA MÉDICA
7
14
11
MATERNIDADE
0
1
4
ODONTOLOGIA
0
0
3
UTI
0
0
2
LABORATÓRIO
0
0
1
HEMODIÁLISE
0
0
1
DIV. DE ENFERMAGEM 0
0
1
Quando avaliamos a condição do acidente, observamos que grande parte dos acidentes com os
estudantes de nível médio deveu-se a: recapeamento de agulha (35%), cirurgias (35%), descarte do
material (5%), flebotomias (5%), material em local inadequado (2.5%) e outros (17.5%). Tabela 3
Quanto aos acidentes envolvendo estudantes de nível superior, constatamos que as cirurgias são as
condições mais freqüentes que levam aos acidentes, representando 43.5% dos acidentes notificados no
ano de 1999, 40.6% no ano de 2000 e 60.4% no ano de 2001. Tabela 4
Observamos que as flebotomias representaram 12.6% dos acidentes com estudantes de nível
superior, o recapeamento de agulha 9.7%, a aplicação de medicação 4.9% e o material em local
inadequado também 4.9% .
Tabela 3- Notificações de Acidentes com Fluidos Biológicos em Estudantes de Nível Médio
do HSE segundo a Condição do Acidente
CONDIÇÃO DO ACIDENTE
1999
2000
2001
RECAPEAMENTO DE AGULHA
7
3
4
CIRURGIAS
6
3
5
DESCARTANDO MATERIAL
2
0
0
FLEBOTOMIA
0
0
2
MATERIAL EM LOCAL INADEQUADO
0
0
1
OUTROS
4
3
0
Outros: Manuseio de material cirúrgico pós uso, desconectando tubo sangue/ soro e
desconectando agulha.
Tabela 4- Notificações de Acidentes com Fluidos Biológicos em Estudantes de Nível Superior do
HSE segundo a Condição do Acidente
CONDIÇÃO DO ACIDENTE
1999
2000
2001
CIRURGIAS
10
13
29
PUNÇÃO VENOSA/ ARTERIAL
3
5
5
RECAPEAMENTO DE AGULHA
3
2
5
APLICAÇÃO DE MEDICAÇÃO
0
2
3
MATERIAL EM LOCAL INADEQUADO
1
3
1
DESCARTE DO MATERIAL
0
0
2
PREPARO PEÇA ANATOMIA PATOL
0
1
0
CATETERISMO UMBILICAL
0
0
1
IGNORADO
0
2
0
OUTROS
6
4
2
Outros: Manuseio de material cirúrgico pós uso, endoscopia digestiva alta, fazendo hemoglucotest,
desconectando agulha, desobstruindo tubo traqueal e manipulação de equipamento com material
biológico.
Do total de acidentes notificados envolvendo estudantes de nível médio podemos constatar que
42.5% dos acidentes eram considerados como facilmente evitáveis (recapeamento de agulha, material em
local inadequado e descartando material). Enquanto que no nível superior, esse percentual fica em torno
de 16.5%.
Houve um aumento gradativo ao longo dos anos (47.8% / 53.0%/ 66.7%) do número de estudantes
de nível superior que usavam EPI no momento do acidente. Em relação ao nível médio, houve um
aumento significativo dos estudantes que usavam EPI no ano de 2000 (89%) comparado ao de 1999
(68%), mas no ano de 2001 (84%) houve uma pequena redução desse valor.
Gráfico 3 – Acidentes com Fluidos Biológicos com Estudantes de Nível Médio e Superior segundo o
Uso de EPI
50
40
30
20
Ig n o ra d o
10
N ão
0
S im
NM
NS
NM
1999
NS
2000
NM
2001
NS
N M = n íve l m é d i o
N S = n íve l s u p e r i o r
Total de Acidentes: NM (1999) = 19, (2000) = 9 e (2001) = 12 NS (1999) = 23, (2000) = 32 e
(2001) = 48
4 – DISCUSSÃO
Neste trabalho, observamos que o número de acidentes notificados pela CST envolvendo
estudantes de nível superior em número absoluto foi maior (72%) que o número de acidentes com
estudantes de nível médio (28%), isto se deve, provavelmente, ao fato do quantitativo de estudantes de
nível superior ser aproximadamente 4 vezes maior que o quantitativo de estudantes de nível médio.
Podemos observar que ao longo dos anos o número de notificações vem aumentando
consideravelmente, principalmente no que diz respeito aos estudantes de nível superior (23 /32/48). Isso
mostra que o nosso trabalho em conjunto com o DIP está sensibilizando os estudantes a procurarem
auxílio no momento do acidente.
Em relação ao maior número de notificações de acidentes com fluidos biológicos pertencerem ao
sexo feminino era esperado, até porque, o quantitativo de mulheres no hospital é superior ao dos homens,
principalmente tomando como base o nível médio. O setor que apresentou o maior número de
notificações de acidentes com estudantes foi a Clínica Cirúrgica (60.8%), o que era de se esperar já que é
o setor onde envolve maior risco de acidentes com fluidos biológicos.
Quando analisamos as condições dos acidentes nos três anos, observamos que as cirurgias são as
situações que envolvem um maior número de acidentes notificados, tanto com estudantes de nível médio
como estudantes de nível superior, perfazendo um percentual de 35% e 50.5% respectivamente.
Constatamos que 42.5% dos acidentes notificados envolvendo estudantes do nível médio e 16.5%
com estudantes de nível superior eram facilmente evitáveis (recapeamento de agulha, material em local
inadequado e descartando material). Isso demonstra a importância de se realizar periodicamente o
treinamento em biossegurança desses estudantes, de discutir o processo de trabalho com eles, a fim de
reduzir a ocorrência desses acidentes facilmente evitáveis.
Ainda que a grande maioria dos estudantes acidentados usassem EPI no momento do acidente e
que ao longo desses 3 anos analisados esse número aumentou ainda mais, o número de jovens que não
usavam EPI era superior ao esperado. Isso significa que o treinamento em biossegurança no ambiente de
trabalho foi importante, mas que ele deve ser intensificado, com a finalidade de reduzir ainda mais a
exposição destes estudantes aos fluidos biológicos.
Apesar de atualmente termos disponíveis as medidas quimioprofiláticas nos casos de pósexposição, é importante ressaltar também que essas medidas não são totalmente eficazes, enfatizando a
necessidade de se discutir estratégias para a implementação de ações educativas permanentes, que
familiarizem os profissionais de saúde com as precauções universais e os conscientizem da necessidade
de empregá-las adequadamente, como medida mais eficaz para a redução do risco de infecção pelo HIV
ou hepatite em ambiente ocupacional.
5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
! BRASIL.MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Saúde. Coordenação Nacional de DST e
AIDS. Manual de Condutas em Exposição Ocupacional a Material Biológico, 1998.
! CHAVES, S.M.C. et al. Exposição Ocupacional a Sangue e Fluido em um Hospital Geral. IV
Conferência Internacional de Saúde Ocupacional dos Trabalhadores de Saúde. Montreal –
Canadá, 1999.
! CHAVES, S.M.C. et al. Acidentes com Fluido Biológico no HSE: Atendimento Integrado. XVI
Semana Científica do HSE, 2000.
! FERREIRA FILHO, F.S. & LOULA, I.G. Residência Médica. Ministério da Saúde, 2000.
! HINRICHSEN, S.L. A Biossegurança dos Profissionais de Saúde: Um Grande Desafio. Prática
Hospitalar. Ano III. No 14, 2001.
! HINRICHSEN, S.L. et al. Biossegurança para Profissionais de Saúde em Hospital Universitário
de Pernambuco. Prática Hospitalar. Ano IV. No 20, 2002.
! MORÍNIGO, F.C. & LOULA, I.G. Residência Médica. Rev Méd.HSE. Vol 34. No 2, 2000.
! RACHID, M. & SCHECHTER, M. Acidentes Ocupacionais e Profilaxia Anti- Retroviral Após
Exposição ao HIV. Prática Hospitalar. Ano IV. No 19, 2002.
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