Enviado por perlanutri

CNS - Ebook - 1ª Edição

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COMO FAZER SEU PACIENTE
DORMIR MELHOR
FUNDAMENTOS DA MEDICINA DO SONO
PARA PROFISSIONAIS DA SAÚDE
CAIO BONADIO
PSI QUI ATRA E MÉDI CO DO SONO
SUMÁRIO
01
BOAS-VINDAS
34
COMO INVESTIGAR UMA
QUEIXA DE SONO?
06
INTRODUÇÃO
41
QUAIS OS PRINCIPAIS
DISTÚRBIOS DO SONO?
13
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
61
CONSIDERAÇÕES FINAIS
21
O QUE É O SONO NORMAL E
COMO ELE FUNCIONA?
64
SOBRE O AUTOR
BOAS-VINDAS
BOAS-VINDAS
Dormir é um comportamento tão primitivo quanto comer ou fugir de
predadores. É um ato de sobrevivência.
Nos primórdios da nossa espécie, convivíamos com escassez de
alimentos, ameaça constante de predadores, brigas por territórios e
temperaturas extremas...
Nossa vida estava sempre por um fio... Mas os tempos são outros!
Por que raios temos vivido como se estivéssemos em guerra diária
pela sobrevivência?
1. os alimentos estão mais disponíveis.
2. temos aquecedores, ar condicionado e roupas sintéticas que nos
protegem das variações climáticas.
3. há regras, leis e forças policiais que regem a convivência entre
indivíduos e Estados.
4. a tecnologia proporciona conforto e velocidade de comunicação, bem
como acesso facilitado a novos conhecimentos e menores barreiras
sociais.
Dormir mal pode acontecer. Afinal todos temos problemas e
preocupações que tiram o sono...
Mas isso não pode definitivamente ser uma regra.
É nosso papel como profissionais da saúde promovermos essa
consciência.
Ignorar, relevar ou tratar incorretamente as queixas de sono de seus
pacientes têm consequências perigosas para a saúde física e mental
deles; para a sua atuação profissional e para a saúde pública do Brasil.
02
BOAS-VINDAS
Sem falar nos efeitos nocivos para a produtividade no trabalho, para as
relações familiares e amorosas, para o bem estar geral da sociedade e
até para o PIB.
Quem dorme mal morre mais cedo e vive com menos qualidade de
vida.
Saúde mental e boas noites de sono são minhas especialidades e é por
isso que escrevo este eBook:
Chegou sua hora de aprender a fazer o seu paciente reestabelecer uma
relação saudável com o travesseiro.
Sabia que o tempo médio de diagnóstico dos distúrbios do sono é
inacreditavelmente alto? A hipersonia, por exemplo, demora mais ou
menos 10 anos para ser identificada.
Com frequência, atendo pacientes que já passaram por 5, 6, 7 até 10
profissionais da saúde diferentes!
SENTA QUE LÁ VEM HISTÓRIA...
Ao desconfiar que suas noites de sono precisam de intervenção médica,
o indivíduo vai ao Médico de Família.
Ele relata que faz 4 anos que não dorme direito e é encaminhado ao
endocrinologista.
Além do tratamento hormonal, o profissional sugere consultar um
educador físico e um nutricionista.
Ao falhar na construção de bons hábitos, as noites de sono pioram e o
ronco torna-se insuportável para o parceiro ou a parceira de cama, que
o obriga a ir ao fonoaudiólogo.
03
BOAS-VINDAS
Sem paciência para os exercícios, desenvolve ansiedade, compulsão
alimentar, torna-se estressado e é demitido do emprego.
Hora de buscar um psicólogo!
Depois de 2 anos de psicoterapia, entre idas e vindas, é convencido
pelos seus familiares a consultar um psiquiatra.
Já com a consulta agendada, resolve passar o final de semana em um
retiro espiritual.
Então, depois de 3 anos da primeira ida ao Médico de Família, o
indivíduo chega no consultório psiquiátrico.
Além de insone, obeso, estressado, ansioso e sedentário, ele toma
diariamente 10mg de melatonina que consegue comprar em qualquer
farmácia.
Para a sorte de nosso herói, o psiquiatra é espectador assíduo do
DormeCast, o podcast semanal sobre sono e saúde mental deste
médico que vos escreve, e resolve enviar um direct para debater o caso.
Enfim, após 7 anos de guerra com seu relógio biológico, o paciente
chega ao meu consultório:
"Doutor, eu sequer lembro da última noite que dormi direito!"
Legal, mas e daí? Qual a razão de eu contar essa história?
Esta janela tem que ser encurtada. Com urgência!
Todos os profissionais da saúde mencionados acima precisam e
merecem ter acesso aos fundamentos da Medicina do Sono.
O paciente ganha. A sua carreira ganha. A saúde pública ganha.
04
BOAS-VINDAS
O meu objetivo com as próximas páginas é criar consciência sobre o
funcionamento do sono e seu papel na saúde física, mental e emocional
de seus pacientes.
Quero que ao final do eBook você se sinta mais preparado para lidar
com os tão frequentes relatos de noites mal dormidas.
Afinal, um dos maiores prazeres da vida é acordar com a sensação de
que dormiu bem, cheio de energia, disposição e clareza mental para
enfrentar os desafios do dia.
Você pode proporcionar isso ao seu paciente!
Muitas vezes, o sono é aquela pecinha de dominó que falta para todas
as outras caírem em sintonia.
A jornada é longa, exige dedicação e muito estudo, mas eu garanto que
é compensadora.
Portanto, peço que esteja presente na leitura. Ative sua curiosidade,
grife os trechos favoritos e anote suas dúvidas.
Sou apaixonado por falar sobre esse assunto e faço questão de
responder ao seu feedback. Seja bem-vindo!
Caio Bonadio
pra
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n
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p
acom
05
INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
O QUE É A MEDICINA DO SONO?
Imagine um interruptor de luz, daqueles bem simples: ON ou OFF.
Ao invés de iluminar seu quarto, ele serve para ligar ou desligar o seu
cérebro, fazendo você acordar ou cair no sono.
Agora pense em dedicar a vida para estudar este único interruptor
durante longos anos em uma subespecialidade médica.
Acredita que há centenas de médicos e cientistas pelos 5 continentes
que vivem para isso?
Então chegou a hora de parar de acreditar! O seu cérebro não desliga
para você dormir.
Ele trabalha de forma árdua para PRODUZIR o sono, ao ligar,
desligar, pausar e religar milhares de interruptores.
A Medicina do Sono, como diz um grande professor meu, é uma
supraespecialidade, e não uma subespecialidade, porque estudar sono
significa ir além de uma só parte do corpo...
É mergulhar nos mistérios do cérebro quando dormimos e entender as
entrelinhas da influência desta intensa atividade cerebral nos diversos
sistemas do nosso organismo.
Fique tranquilo se não sabia de nada disso, porque a descoberta da
complexidade do funcionamento do sono é recente na história da
Humanidade.
Somente em 2011 o Conselho Federal de Medicina do Brasil a
reconheceu como uma área de atuação.
No resto do mundo não foi muito diferente.
07
INTRODUÇÃO
A primeira pessoa que percebeu que o sono poderia ter relação com
alguma atividade cerebral foi o neurologista romeno Constantin Von
Economo, no início do século XX.
Depois, na década de 30, dois cientistas americanos, Nathaniel
Kleitman e Eugene Aserinsky, descobriram que o cérebro é capaz de
gerar um ritmo biológico.
Ambos passaram 40 dias em uma caverna sem estímulo luminoso e
notaram que sentiam sono no mesmo horário que em condições
normais.
Vinte anos depois, o mesmo Aserinsky descobriu o sono REM ao
realizar um polissonografia em seu próprio filho e verificar que os olhos
do menino mexiam-se rapidamente de um lado para o outro por baixo
das pálpebras.
A partir daí, descobriu-se que o sono não era uma coisa só, que
tinha várias fases e que diversos fenômenos ocorriam
sincronicamente.
Nos anos seguintes, diversos pesquisadores começaram a estudar o
sono, motivados principalmente por descobertas em relação a uma só
pergunta:
"Por que dormimos?"
Nas últimas décadas, importantes estudos foram publicados sobre o
sono e preservação da memória, os efeitos maléficos da privação de
sono, a relação da apneia do sono com o câncer e com as demências,
as funções cognitivas, a produtividade no trabalho, a longevidade, entre
outros.
Quero que entenda que estudar o sono não é só aprender sobre
insônia. Existem por volta de 50 transtornos do sono documentados!
08
INTRODUÇÃO
Basicamente, dividimos a Medicina do Sono em dois:
1. distúrbios respiratórios do sono
2. doenças que englobam questões neuropsiquiátricas
Além disso, entender como é o sono normal, quais são os bons hábitos
de sono e como prevenir as doenças do sono são pontos chave na
formação de qualquer profissional de saúde.
Mas não se assuste!
É um conhecimento fascinante que tenho certeza que você vai gostar de
conhecer.
Espero que aproveite o conteúdo.
09
INTRODUÇÃO
COMO OS PROFISSIONAIS DE SAÚDE PODEM ATUAR?
"Nossa, nem sabia que isso existia!"
Você não foi o primeiro e, certamente, não será o último a pensar isso.
Não te culpo!
O espanto é compreensível porque a Medicina do Sono como ciência é
muito nova e ainda falta divulgação, especialmente nos cursos de
graduação.
Como pode um comportamento que é comum a TODOS os seres
humanos ser tão desvalorizado na nossa formação?
Esse é um paradoxo que deve deixar de existir.
Entre nós, em 6 anos da graduação em Medicina, eu tive apenas uma
aula de 45 minutos sobre Sono - e eu faltei.
Este eBook é para você, profissional da saúde que já desconfia que
entender a fundo sobre o Sono pode transformar a sua atuação e a vida
de seus pacientes.
Você está no lugar certo!
Além do médico do sono, existem diversos outros profissionais que
podem atuar nessa área.
Os meus pacientes ainda ficam surpresos quando menciono os
Dentistas do Sono, Fonoaudiólogos do Sono, Psicólogos do Sono
ou Fisioterapeutas do Sono.
Ou então quando recomendo passarem em Nutricionistas e
Educadores Físicos.
10
INTRODUÇÃO
Acredite: em muitos casos,
os profissionais não médicos
são até mais atuantes do
que o próprio médico,
exercendo uma grande
importância no cuidado de
doenças do sono.
Para sanar sua curiosidade:
PSICÓLOGOS
Lidam com a terapia cognitica comportamental (TCC) para insônia, o
tratamento mais eficaz conhecido até o momento. Além disso, ajudam
nos casos de ansiedade e depressão que contribuem para a
perpetuação da insônia.
FONOAUDIÓLOGOS
Aplicam a terapia miofuncional, uma espécie de musculação da via
aérea superior, extremamente eficaz na diminuição do ronco.
FISIOTERAPEUTAS
Atuam na reabilitação pulmonar de pacientes com doenças pulmonares
e apneia do sono, na adaptação do aparelho de CPAP para tratamento
de apneia e hipoventilação obesidade, dentre outros.
11
INTRODUÇÃO
DENTISTAS
São responsáveis por confeccionar o aparelho intra oral de avanço
mandibular, indicado para pacientes com apneia leve a moderada. Além
disso, acompanham e tratam pacientes com bruxismo do sono.
NUTRICIONISTAS E EDUCADORES FÍSICOS
Trabalham na mudança de mentalidade sobre escolhas alimentares e
atividades físicas, uma vez que o estilo de vida e hábitos de sono são
fundamentais para o sucesso terapêutico.
Gostou? Ainda vai além disso!
Dormir bem é tão essencial na construção de saúde, prevenção de
doenças, longevidade e produtividade no trabalho, que eu tenho
convicção:
A saúde no Brasil será transformada no dia em que todo
profissional de saúde dominar os conceitos básicos sobre o
funcionamento e as doenças do sono.
Nas próximas páginas, darei a minha contribuição pra esse processo.
Boa leitura!
Caio Bonadio
CRM-SP 157283
RQE 68077/68077-1
12
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
AUMENTO RECENTE DE TRANSTORNOS DE SONO
Quem acostuma-se a dormir mal, além de viver pior, morre mais cedo.
Doenças do coração, diminuição de expectativa de vida e obesidade,
por exemplo, são altamente associadas à privação de sono.
A vasta quantidade de estudos publicados sobre as consequências de
noites mal dormidas para a saúde não nos deixa mais espaço para
dúvidas.
Está mais do que na hora de olharmos com o devido cuidado para o
nosso sono. Pense na sua prática clínica:
Qual porcentagem dos seus pacientes afirmam estarem satisfeitos
com a qualidade de suas noites?
Agora lembre de seus familiares, colegas de trabalho e amigos... Está
todo mundo dormindo mal, ou estou com mania de perseguição?
Apneia Obstrutiva do Sono:
Estimativa de prevalência
Insônia: Queixa espontânea
33%
CIDADE
DE SP
50%
CIDADE
DE SP
50%
67%
Sim, é isso mesmo! Na maior cidade da América Latina, 4 milhões de
habitantes (33%) tem apneia e 6 milhões (50%) se queixam de insônia.
14
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
"Ahh! Mas, Caio, será que isso é fruto de uma maior consciência acerca
do papel do sono em nossas vidas, ou só reflexo da maior capacidade
de diagnosticar as doenças do sono?"
Obrigado, ótima pergunta! Creio que as duas coisas influenciam, mas
vamos deixar as crenças para outra ocasião.
Por ora, tenha certeza: se o seu paciente luta com o travesseiro,
você precisa saber como interferir.
AUMENTO DA OBESIDADE
Não é novidade que a obesidade é uma bomba relógio para a saúde do
paciente. Hoje, sabemos que ela também diz muito sobre a qualidade
do sono.
A doença está intimamente relacionada com a apneia obstrutiva do
sono, com a sonolência excessiva diurna e com transtornos
psiquiátricos.
A ansiedade e a depressão, que tem como sintomas insônia ou
hipersonia, são bastante comuns em quem está acima do peso.
O brasileiro está alcançando nossos amigos norte americanos, tão
conhecidos pela quantidade enorme de obesos. Dados apresentados
pelo Ministério da Saúde em 2016:
54%
TÊM SOBREPESO
19%
ESTÃO OBESOS
É um problema de saúde pública gravíssimo que precisa ser combatido
por cada um de nós, profissionais da saúde.
Anote aí: o argumento de que irão voltar a ter ótimas noites de sono é
excelente para inspirar o paciente obeso a dar o pontapé inicial na sua
15
transformação.
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
TRANSTORNOS DO SONO E AS DOENÇAS CRÔNICAS
Você certamente sabe que as doenças crônicas são as causas de morte
mais comuns no Brasil.
Doenças cardiovasculares, câncer, diabetes e doenças respiratórias são
as campeãs deste ranking.
Talvez ainda não saiba que a qualidade do sono diminuída
cronicamente está associada ao surgimento de todas essas
enfermidades.
Já falei e reforço: quem dorme mal por muito tempo tem a expectativa
de vida reduzida.
Aqui é importante esclarecer que:
1. Nem todo mundo que dorme mal tem alguma doença do sono.
Falarei mais para frente sobre higiene do sono e controle de
estímulos.
2. Quase todas as doenças do sono levam a noites mal dormidas.
A apneia obstrutiva do sono, uma das mais frequentes, é fator de risco
para várias doenças crônicas e, nos últimos anos, as evidências de sua
associação com o câncer tem aumentado, principalmente em
populações mais jovens.
Por sua vez, os sintomas de insônia,
quando cronicamente mantidos, podem
resultar em obesidade e até rinite crônica.
Mas o ser humano tem suas esquisitices,
e não é raro encontrarmos pacientes que
decidem assumir o risco de morrer cedo.
16
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
Nesses casos, recomendo que você os oriente sobre os prejuízos na
capacidade de trabalhar e de se relacionar:
Dificuldades de concentração, de atenção e na linguagem
Falhas de memória, de planejamento e nas tomadas de decisões
Raciocínio lento e irritabilidade
Sim, as funções cognitivas ficam prejudicadas e, no longo prazo, o
caminho pode não ter volta e um estado demencial surgir.
PREVENÇÃO DE DOENÇAS E A QUALIDADE DO SONO
Fortalecer a função do sistema imunológico;
Limpar substâncias nocivas acumuladas no cérebro;
Renovar as energias;
Preservar a memória.
É por isso que não tem coisa melhor do que acordar e perceber que
dormiu bem. O sono desempenha papéis centrais na nossa saúde
física, mental e emocional.
A sociedade está esquecendo disso e as consequências são graves.
JÁ NOTOU QUE UM DOS MAIORES VEÍCULOS DE COMUNICAÇÃO DO
PAÍS TEM COMO SLOGAN "NUNCA DESLIGA"?
DIZ MUITO SOBRE A CULTURA NOCIVA 24 / 7* QUE ESTÁ
SENDO CONSTRUÍDA
*24 horas por dia, 7 dias por semana
17
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
Convido você, meu colega profissional de saúde, a atuar comigo nesse
resgate da consciência sobre a importância de dormir bem.
O seu paciente precisa entender que agir contra comportamentos
primitivos que nos são naturais é inútil.
O sono está no nosso DNA, literalmente... é um jogo de cartas
marcadas!
Além de não ter chances de vitória, o seu paciente sofrerá na jornada e
terá mais chances de desenvolver doenças crônicas. Além disso, as
suas capacidades intelectuais estarão sempre abaixo do esperado.
Dormir bem melhora as nossas relações sociais, nos torna mais bem
humorados, produtivos e felizes.
Indivíduos com mais felicidade, resiliência, relações sociais preservadas
e energia têm menos chances de adoecerem.
Cuidar do sono é cuidar da saúde mental!
TRABALHO, PRODUTIVIDADE E O IMPACTO COLETIVO DE
DORMIR MAL
Privar-se de sono porque a carga de tarefas está alta é algo que todos
iremos fazer um dia. Faz parte!
A grande armadilha está em fazer disso um padrão.
"Dormir é para os fracos! Durmo muito pouco e estou ótimo. A vida é
agora, temos que aproveitar!"
Já ouviu algo parecido no consultório?
18
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
Tal discurso é perigoso e deve ligar um alerta em qualquer profissional
de saúde que se preze.
Por décadas, setores econômicos altamente competitivos estimularam
essa cultura tóxica de "performance custe o que custar".
Ao exigirem jornadas inflexíveis, 24h por dia e 7 dias por semana,
criaram ambientes e relações profissionais contraproducentes, com
reflexos na saúde coletiva:
A saúde do trabalhador está indo de mal a pior em pleno século XXI.
Os índices de incidência de doenças psiquiátricas (como depressão,
ansiedade, burn out), bem como absenteísmo e presenteísmo (estar
fisicamente no seu trabalho mas incapaz de produzir, pois a sua mente
está fora do ar) têm assustado gestores em todo o mundo.
Abaixo, listo dados de estudo de 2017 sobre o impacto econômico da
privação de sono em países da OCDE.
-> 680 BILHÕES DE DÓLARES SÃO PERDIDOS A CADA ANO NOS
PAÍSES DA OCDE DEVIDO À PRIVAÇÃO DE SONO
-> O JAPÃO PERDE CERCA DE 3% DO PIB, SEGUIDO PELOS EUA,
QUE TEM PREJUÍZO ANUAL DE 2,28%
-> DORMINDO MENOS DE 6H POR DIA, OS AMERICANOS PERDEM
CERCA DE 18% DO TEMPO TOTAL DE TRABALHO POR ANO,
SEGUIDO PELOS INGLESES E JAPONESES (16%)
Felizmente, há sinais de que as empresas estão percebendo que essa
conta não fecha!
19
POR QUE ISSO É IMPORTANTE?
Ou elas dão um giro de 180º em direção à valorização e à promoção da
saúde mental como pilares de sua política de recursos humanos, ou vão
pagar um preço altíssimo por insistir na negligência.
Enquanto isso, o que nós, profissionais da saúde, podemos fazer no dia
a dia da prática clínica?
Na minha visão, a nossa ferramenta número 01 é fazer o paciente
acreditar que ele é o protagonista de sua própria saúde.
Claro que os empregadores tem parcela de culpa, mas, em última
instância, a decisão de buscar mais qualidade de vida e propósito
naquilo que faz é do indivíduo.
Autorresponsabilidade e construção de saúde são conceitos
inseparáveis.
20
O QUE É O SONO NORMAL E COMO FUNCIONA?
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
BASES NEURAIS DA FISIOLOGIA DO SONO
Você já sabe que o cérebro tem inúmeros interruptores que controlam
nosso ciclo sono/vigília.
A combinação do ligar e do desligar deles é quem produz o sono.
Este processo ativo precisa de combustível para ocorrer com eficiência,
e aqui destaco a importância dos neurotransmissores:
Histamina, dopamina, acetilcolina, noradrenalina, orexina/hipocretina,
GABA, serotonina, adenosina.
São eles os responsáveis por transmitir mensagens e passar diversos
comandos para que o sono seja produzido pelo cérebro.
Você certamente já conhece a maioria deles, né? Então se prepare:
Núcleo supraquiasmático,
Prosencéfalo basal,
Núcleo túbero mamilar do hipotálamo,
Núcleo pré óptico ventro lateral do hipotálamo
Esses são alguns outros interruptores do sono.
Não se assuste!
Toda essa salada de
palavras tem uma lógica e
eu vou apresentá-la no
decorrer dos próximos
capítulos.
22
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
"Ué, Caio, e a melatonina?"
Verdade, obrigado mais uma vez!
A melatonina é nosso hormônio do sono, produzido na glândula pineal,
que fica bem no meio do cérebro.
Ela regula nosso relógio biológico, sobre o qual falarei mais para frente.
Por enquanto, já fica o registro:
A popularização do uso de melatonina é gravíssima e você deve
parar de orientar seus pacientes a consumí-la imediatamente!
Trata-se de um tratamento hormonal com
indicações bem específicas, e adivinhe?
Insônia não é uma delas.
BASES NEURAIS DA FISIOLOGIA DO SONO
Repita em voz alta:
Sono REM não é sono profundo
Sono REM não é sono profundo.
Sono REM não é sono profundo.
A partir de agora, você se junta a mim na luta por derrubar este mito,
talvez o mais frequente erro sobre sono difundido por aí.
Dito isso, vamos à estrutura básica?
23
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
O sono é dividido em dois: REM e Não REM.
Cada um tem suas particularidades em relação à frequência cardíaca,
ondas cerebrais, movimentos dos músculos, respiração, facilidade para
despertar e lembrança de sonhos.
Um sono normal no adulto é aquele em que alternamos Não REM e
REM, por cerca de 4 a 5 ciclos.
Cada ciclo tem sono REM e Não REM, com duração média de 60 a 120
minutos.
A seguir, descrevo características gerais e disponibilizo uma tabela
especial que recomendo que você imprima.
SONO REM (sigla em inglês para movimento rápido dos olhos)
Tem ondas cerebrais bem parecidas com as da vigília, mas neste sono
nós não mexemos nada de músculo, com exceção dos músculos
responsáveis pela respiração e pelo movimento dos olhos.
A respiração fica bem irregular, assim como os batimentos cardíacos.
SONO NÃO REM
Divide-se em três estágios, que chamamos de 1, 2 e 3.
Quanto maior o número, mais profundo é o sono. Nosso sono mais
profundo, aquele do qual é mais difícil nós despertarmos, é o estágio 3.
De 1 para 3, as ondas cerebrais vão ficando cada vez mais lentas,
vamos relaxando mais os músculos, respirando mais regularmente e o
coração bate de forma bem regular também.
24
RATREPSED
LICÁF
EDADILICAF
SIAM MOC
ARBMEL
ODAXALER
OTIUM
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RALUGERRI
RALUGER
A AÇEMOC
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A AÇEMOC
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E OÃÇARIPSER ETNELAVIUQE
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A AÇEMOC
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RALUGER
A AÇEMOC
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ADAREDOM
EDADICOLEV EDADIRALUGER
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RALUGER
OTIUM
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1 - MER OÃN
2 - MER OÃN
3 - MER OÃN
SOTUNIM
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LICÍFID OTIUM
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EUGESNOC Ñ
RARBMEL
EUGESNOC Ñ
RARBMEL
EUGESNOC
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sohlo sod odipár otnemivom*
sohnos :OS
solucsúm sod otnemivom :MM
siarberec sadno :CO
acaídrac aicnêeuqerf :CF
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
BASES BIOLÓGICAS DOS SONHOS
Os sonhos talvez sejam o maior mistério da Medicina do Sono.
Hoje sabe-se que todos sonhamos, durante toda a noite, e não só
durante o sono REM.
Também é certo que várias estruturas cerebrais estão envolvidas na
geração dos sonhos, especialmente o sistema límbico, relacionado com
a nossa memória.
Por sua vez, o neurotransmissor mais importante na geração dos
sonhos é a acetilcolina. A dopamina e a serotonina têm a sua função.
Além disso, já são identificadas algumas diferenças entre os sonhos do
sono REM e do sono Não REM.
Por exemplo, se acordamos de um sonho no sono REM, é mais fácil de
lembrar deles e, geralmente, ele é mais vívido e tem uma história.
Já o do Não REM é mais improvável de conseguirmos nos lembrar,
além de ter imagens desconexas.
Mas por que sonhamos? Qual é a relação dos sonhos com os
acontecimentos da vigília?
Muitos estudos têm sido realizados, mas com poucas conclusões
satisfatórias.
Ainda temos muito o que descobrir sobre este fenômeno que intriga a
humanidade há séculos.
Recomende a seus pacientes que criem o hábito de escrever sobre
os seus sonhos logo ao acordar.
É um ótimo exercício de autoconhecimento!
26
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
CRONOBIOLOGIA E FISIOLOGIA DA MELATONINA
Você nunca mais vai falar para o seu paciente que ele precisa dormir 8
horas, ok?
A individualidade bioquímica do ser humano é impressionante e age
também na nossa necessidade de sono.
Cada indivíduo possui o seu ritmo, controlado por uma região localizada
bem no centro do cérebro. De lá partem vários comandos para o
funcionamento corporal no ciclo de 24 horas.
É o famoso relógio biológico!
Ele determina em seu paciente, dentre outras coisas:
1. horário que vai adormecer,
2. momento do despertar
3. necessidade de sono
É o que chamamos de cronotipo: uns dormem tarde e acordam tarde,
outros dormem cedo
e acordam cedo.
Há quem durma pouco e também
quem precise de 10h diárias.
Quem precisa de menos
horas não se torna um gênio
da produtividade por isso, assim
como quem precisa de mais
horas não é preguiçoso.
Estes estigmas são nocivos
e não podem ser perpetuados.
27
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
Claro que isto não é uma carta branca para deixar que seu paciente
faça o que bem entender com sua rotina de sono, sob o pretexto: "Mas,
Doutor, este é o meu ritmo!"
A sua missão como profissional de saúde é orientá-lo a descobrir e
respeitar o seu ritmo biológico, uma vez que viver fora de sintonia dele é
muito prejudicial à saúde física e mental.
Nesse sentido, as pistas ambientais são super importantes para
sincronizar o relógio biológico com o ambiente:
1. quantidade de exposição à luz solar e à luz artificial,
2. horário de comer, horário de se exercitar,
3. rotina das relações sociais e de trabalho
Atenção redobrada a esses pontos, porque é aqui que grande parte dos
seus pacientes estará errando.
Ao dar pistas falsas para o cérebro, eles tornam-se incapazes de avaliar
corretamente como são o seu ritmo ideal e as suas necessidades.
Em outras palavras, é preciso ajudar o cérebro a compreender que
a hora de adormecer está chegando.
Por exemplo, o hormônio do sono (melatonina), é produzido pela
glândula pineal na ausência de luz, começando no pôr do sol. Utilizar
celulares e tablets (que emitem luz artificial em suas telas) à noite inibe
essa produção porque é uma pista falsa.
Portanto, o ritmo biológico é geneticamente determinado, mas a
interação harmônica com ele depende das ações do indivíduo.
Esses fenômenos são objetos de estudo da Cronobiologia, que é uma
parte da Medicina do Sono.
28
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
SONO E ENVELHECIMENTO
O sono não é igual durante a vida toda. O seu paciente precisa saber
disso!
A idade é um parâmetro importantíssimo.
O recém nascido, por exemplo, dorme em vários blocos durante o dia.
Conforme cresce, o sono vai se consolidando.
Ao chegar na adolescência, a tendência é precisar dormir por períodos
mais longos, além de sugir o atraso de fase, caracterizado por sentir
sono mais tarde e acordar mais tarde.
Quando adulto, espera-se mais uniformidade na
distribuição da necessidade de sono, bem
como mais regularidade nos horários
de adormecer e despertar.
As mulheres na pós
menopausa, por sua vez,
começam a ficar vulneráveis
aos transtornos de sono,
muito por conta da queda
dos hormônios.
Insônia e apneia obstrutiva
são frequentes neste grupo.
29
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
Já se o seu paciente for idoso, é esperado que as fases do sono não
sejam perfeitamente distribuídas.
É comum na 3ª idade haver menos sono de ondas lentas (estágio 3 do
Não REM) e menos sono REM.
Além disso, a tendência é dormir menos, sentindo sono mais cedo e
acordando mais cedo.
O sono volta a ficar mais fragmentado e a sensação de que está
dormindo pouco aumenta.
Idosos que tem demência tendem a perder a sincronização do relógio
biológico com o ambiente, o que leva a um ritmo de sono muito irregular.
Percebe que o envelhecimento não facilita o sono?
Informar ao paciente que
isso é um processo natural
é o primeiro passo para juntos
viabilizarem um sono de
qualidade.
Só assim ele estará preparado
para contar com ajuda multiprofissional e para colocar em
prática as medidas
comportamentais
que transformarão
suas noites.
30
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
PSICOFARMACOLOGIA DO SONO
A mudança no estilo de vida e de maus hábitos de sono são pílulas
poderosas para tratar grande parte dos pacientes que dormem mal.
Ao contrário de outras especialidades médicas, são poucas as
medicações que usamos em Medicina do Sono.
Basicamente, os remédios neste capítulo têm as funções básicas:
1. induzir ou manter o sono
2. diminuir comportamentos anormais durante a noite
3. ressincronizar o relógio biológico
4. controlar a sonolência excessiva diurna
A intenção aqui não é aprofundar neste tema, então vou tentar ser
breve.
A sopa de letrinhas a seguir engloba mecanismos de ação e
neurotransmissores e é bem complexa. Muitas vias neuroquímicas
ainda são teóricas e não completamente elucidadas.
BENZODIAZEPÍNICOS E DROGAS Z
As medicações que induzem e/ou mantem o sono, da classe dos
benzodiazepínicos e drogas Z, tem potencial de abuso e de
dependência química e psicológica, e portanto não devem ser utilizadas
por mais que 4 semanas.
A abordagem medicamentosa, por exemplo, nunca deve ser a
primeira escolha para o tratamento da insônia crônica.
Essas drogas atuam no neurotransmissor GABA, que é inibitório,
provocando sonolência. As principais comercializadas no Brasil são:
clonazepam, zolpidem, zopiclona e diazepam.
31
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
Os benzodiazepínicos também podem ser utilizados no tratamento de
algumas parassonias, como o transtorno comportamental do sono REM
e o transtorno de pesadelo.
AGONISTAS DOPAMINÉRGICOS
A síndrome das pernas inquietas, o principal transtorno de movimento
em Medicina do Sono, é tratada com medicações que atuam em
receptores de dopamina, regularizando a neurotransmissão desta
substância. Pramipexol e levodopa são as mais utilizadas.
A pregabalina e a gabapentina* são medicações que atuam em canais
de cálcio e são análogas ao GABA. Elas também podem ser utilizadas
nesta doença.
OPIOIDES
Os opioides podem ser uma opção em pacientes refratários durante o
tratamento de síndrome de pernas inquietas. Os principais utilizados são
a metadona, morfina e a oxicodona. Essas medicações também tem
potencial de abuso e de dependência.
ANTIDEPRESSIVOS
Os antidepressivos sedativos mais usados na Medicina do Sono são a
trazodona, mirtazapina, doxepina e amitriptilina. Em doses baixas, o que
predomina é o efeito anti histamínico e, como a histamina é um
neurotransmissor excitatório cortical, o efeito anti histamínico provoca
sonolência.
*não são agonistas dopaminérgicos
32
O QUE É O SONO NORMAL E COMO
FUNCIONA?
CRONOBIOLÓGICOS
A melatonina sintética pode ser utilizada no transtorno comportamental
do sono REM e nos transtornos de ritmo circadiano. Nestes últimos, ela
ajuda a ressincronizar o relógio biológico do paciente com a sua rotina e
atua no núcleo supraquiasmático em receptores específicos.
PSICOESTIMULANTES
Por fim, os psicoestimulantes são utilizados para controlar a sonolência
excessiva diurna das hipersonias. Essas medicações aumentam a
disponibilidade dos neurotransmissores dopamina e noradrenalina, que
são altamente excitatórios.
Atenção, pois também têm um potencial de abuso e de dependência e o
seu uso deve ser muito bem indicado. São elas: modafinila,
metilfenidato, lisdexanfetamina, dentre outros.
Ufa! Espero que ainda esteja comigo. Vamos tratar de anamnese e
exames físicos e laboratoriais?
33
COMO INVESTIGAR UMA QUEIXA DE SONO?
COMO INVESTIGAR UMA QUEIXA
DE SONO?
ANAMNESE EM MEDICINA DO SONO
Em termos gerais, tem a mesma estrutura da anamnese convencional.
É claro que, com a prática clínica, você deve naturalmente direcionar a
avaliação a fim de maior eficiência, sem esquecer que todos os
elementos da entrevista têm a sua importância.
A começar pela identificação do seu paciente: idade, sexo, escolaridade,
local de nascimento e de procedência, estado civil, local de moradia e
profissão.
Depois, você deve identificar:
1. qual é a queixa de sono,
2. há quanto tempo ela está presente,
3. se houve evento que causou o sintoma
A seguir, pedir a ele que detalhe seu padrão de sono atual:
1. rotina de horários de sono
2. atividades diárias
Também é fundamental questionar sobre o padrão de sono do paciente
antes do aparecimento da queixa.
Enfim, hora de investigar os sintomas, que gosto de dividir em 2 etapas:
primeiro, os distúrbios respiratórios do sono e, depois, os distúrbios
neuropsiquiátricos:
RESPIRATÓRIOS
- ronco
- apneias presenciadas
- despertares por engasgo
- sonolência excessiva diurna
- sensação de sono insuficiente
- alterações de humor
- falta de memória e de
concentração
- perda ou ganho de peso
- diagnóstico recente de diabetes,
hipertensão arterial sistêmica ou
arritimias
COMO INVESTIGAR UMA QUEIXA
DE SONO?
NEUROPSIQUIÁTRICOS
- dificuldade em iniciar ou manter o sono, ou despertar
precocemente
- ansiedade noturna
- cansaço diurno
- dificuldade em cochilar ou relaxar durante o dia
- ataques de sono repentinos durante o dia
- perda de tônus muscular repentino durante o dia
- necessidade urgente de mexer as pernas enquanto está parado
ou deitado na cama antes de dormir
- sono agitado: sonhos de conteúdo agressivo, mexer muito à noite,
como se estivesse no sonho, chutar, gritar, bater no parceiro ou
parceira de cama
- episódios de sonambulismo ao longo da vida
- uso de álcool, drogas ilícitas e estimulantes, principalmente
cafeína e nicotina
- uso de medicações para dormir
- irritabilidade diurna
- tristeza, falta de disposição ou falta de prazer em atividades
diárias
- prejuízo de memória
- compulsão alimentar
- alucinações hípnicas
- paralisia do sono
A presença e evolução ao longo do tempo dos transtornos de sono
também devem ser abordados.
O preenchimento de um diário de sono, por pelo menos 15 dias, é um
instrumento importante na avaliação do padrão de sono e pode ajudar
no diagnóstico e no tratamento das doenças do sono.
Por último, investigue os antecedentes familiares de seu paciente de
forma ativa, principalmente os parentes de 1º grau.
36
COMO INVESTIGAR UMA QUEIXA
DE SONO?
EXAME FÍSICO EM MEDICINA DO SONO
O exame físico básico deve conter as auscultas
pulmonar e cardíaca.
Os sinais vitais são de extrema importância,
principalmente a pressão arterial e a
saturação de oxihemoglobina em ar ambiente.
Deve-se calcular o IMC do paciente, bem como as cinturas abdominal e
cervical. A via aérea deve ser inspecionada por meio do índice de
Mallampatti modificado, com a língua para dentro da cavidade oral.
A mordida do paciente, a dentição e a morfologia do palato duro
também devem ser avaliadas. Pacientes que têm retrognatia têm maior
risco para o desenvolvimento de apneia obstrutiva do sono.
Geralmente, o paciente com queixas de sono não tem nenhuma
alteração em seu exame físico.
Já nos pacientes com apneia obstrutiva do sono, é comum
encontrarmos indivíduos acima do peso, com cinturas abdominal e
cervical aumentadas.
É importante lembrar que nem todo paciente com apneia está acima do
peso! Cuidado com generalizações.
Classificação de Mallampatti
37
COMO INVESTIGAR UMA QUEIXA
DE SONO?
QUAIS SÃO OS EXAMES DISPONÍVEIS?
POLISSONOGRAFIA
É o principal exame que podemos solicitar na Medicina do Sono. Ao
contrário do que muitos pensam, sua indicação é restrita!
Em pacientes com suspeita de distúrbio respiratório do sono,
narcolepsia, transtorno comportamental do sono REM e outras
hipersonias, ela deve ser solicitada.
Não são todos casos que exigem que se durma no laboratório do sono.
Existem 4 formas de se montar um exame de polissonografia e hoje o
paciente pode fazer o exame em casa, dependendo da suspeita.
ACTIGRAFIA
Pode ser solicitado quando se suspeita de
distúrbios do ritmo circadiano e hipersonias,
além do seu uso na investigação da insônia.
Trata-se de um relógio que contém um
acelerômetro, um sensor de luz e um sensor
de temperatura.
Por meio desses dados, nos fornece dados relevantes a
respeito do padrão de sono do paciente.
TESTE DE LATÊNCIAS MÚLTIPLAS
Serve para medir a propensão para o sono do paciente e é solicitado
quando se tem suspeita de narcolepsia e hipersonia idiopática.
38
COMO INVESTIGAR UMA QUEIXA
DE SONO?
TESTE DE MANUTENÇÃO DE VIGÍLIA
Mede a capacidade do paciente
permanecer acordado em
situações que normalmente
levariam ao sono.
Serve mais como um
acompanhamento do tratamento
das hipersonias.
POLISSONOGRAFIA COM TITULAÇÃO DE CPAP
Exame que é feito com o aparelho de CPAP, usado para tratar apneia
do sono. Ele é solicitado quando o paciente já tem o diagnóstico de
apneia e serve para determinar a pressão de CPAP que o aparelho
fornece.
Hoje em dia, o racional é que se peça cada vez menos este exame, uma
vez que os aparelhos de CPAP permitem uma titulação automática.
Em algumas situações específicas, ele é fundamental, porém com
menos frequência do que no passado.
POLISSONOGRAFIA SPLIT-NIGHT
É um exame em que na primeira metade da noite o paciente realiza a
polissonografia usual e, na segunda metade, a titulação com o CPAP.
Indica-se para pacientes com altas chances de terem apneia do sono,
porém sua realização é extremamente trabalhosa e tem custo alto,
tendo caído em desuso.
39
COMO INVESTIGAR UMA QUEIXA
DE SONO?
Além dos exames que estão diretamente relacionados ao sono, os
exames laboratoriais abaixo também devem ser solicitados:
1. glicemia de jejum,
2. hemograma,
3. eletrólitos,
4. lipidograma e
5. perfil tireoideano
Em pacientes com hipersonia ou com sintomas de sono que surgiram
após trauma de crânio, é prudente que se peça um exame de imagem
do sistema nervoso central.
Nos casos de suspeita de epilepsia noturna, o eletroencefalograma é de
fundamental importância.
Por fim, prova de função pulmonar, radiografia de tórax e gasometria
arterial são fundamentais na investigação do paciente com obesidade e
suspeita de hipoventilação.
40
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS DO SONO?
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
Há cerca de 50 distúrbios conhecidos na ICSD3 (Classificação
Internacional dos Distúrbios de Sono). A seguir, listo os mais frequentes,
para que você possa reconhecer as queixas de sono mais comuns do
dia a dia da prática clínica.
"DURMO POUCO..."
1. PRIVAÇÃO DE SONO
Obesidade, depressão ou ansiedade: qual dos
3 transtornos é o verdadeiro "Mal do Século"?
Para mim, nenhum deles... mas sim a privação de sono.
Colocar o sono em segundo (terceiro, quarto, quinto...) plano já está
refletindo em graves consequências para a saúde coletiva da nossa
espécie.
Ainda fico assustado como pessoas voluntariamente dormem menos do
que precisam e sequer percebem.
Ou, quando percebem, optam deliberadamente por trocas nocivas e
muito pouco inteligentes, como jornadas improdutivas de trabalho ou
noites de lazer destrutivas.
Quem afirma que abrir mão de sono para produzir melhor vale a
pena está mentindo. Não deixe que o seu paciente acredite nisso!
Os estudos são sólidos sobre perda de produtividade e os malefícios
para a saúde, tanto no curto quanto no longo prazo!
Cansaço físico e mental, indisposição, irritação, sonolência, menor
capacidade de tomar decisões, dificuldades de concentração e de
memorização são algumas das consequências imediatas da privação.
42
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
Sem falar no aumento dos riscos de acidentes de trânsito e nas relações
pessoais indo por água abaixo...
Cronicamente, noites mal dormidas contribuem para o aumento de
peso, para o surgimento de pressão alta e diversas doenças crônicas.
É fundamental a investigação da rotina de sono e dos hábitos
noturnos dos pacientes.
Com frequência, queixas de insônia podem ser, na verdade, privação de
sono, e são resolvidas com boas orientações de comportamento e de
controle de estímulos.
2. PERNAS INQUIETAS
A síndrome das pernas inquietas é uma doença neurológica que
influencia diretamente o sono. Os sintomas aparecem quando o
paciente está parado, se preparando para dormir.
Formigamento, incômodo, dor, sensação de calor ou de frio são
algumas das sensações descritas para os sintomas que surgem nas
pernas.
Por conta disso, existe uma urgência de mexer as pernas e é
justamente o movimento que melhora os sintomas.
Então, o paciente fica nessa bola de neve durante horas e isso aumenta
a latência para o sono, que é o tempo que demoramos para adormecer
a partir do momento em que deitamos.
Com isso, o tempo total de sono é diminuído e o paciente tem
repercussões no dia seguinte.
O tratamento é feito com medicações que atuam no neurotransmissor
dopamina e no GABA, além de medidas comportamentais de higiene do
43
sono e controle de estímulos.
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
3. INSÔNIA
Caracterizada pela dificuldade de iniciar ou de manter o sono, ou
despertar precocemente, antes do horário habitual.
O paciente tem repercussões no seu dia, como alterações de humor,
falhas de memória e de concentração, e sonolência diurna.
Isso evolui até que as preocupações com o próprio sono transformam o
ato de dormir em um sofrimento para si, os familiares, os colegas de
trabalho e todos que o cercam.
Muita atenção para não confundí-la com maus hábitos de sono ou
com falta de acesso a condições ideais para dormir.
A causa da insônia ainda não foi descoberta, mas se acredita que esses
pacientes têm um estado de hiperalerta que é promovido pela ativação
inadequada do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal.
O tratamento que tem mais evidência para ser aplicado no insone é a
terapia cognitiva comportamental (TCC) para insônia, uma técnica que
abrange 5 pilares fundamentais, a saber:
TERAPIA COGNITIVA
HIGIENE
DO SONO
RESTRIÇÃO
DE SONO
TCC P/ INSÔNIA
CONTROLE
DE ESTÍMULOS
RELAXAMENTO
MUSCULAR
44
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
As medicações benzodiazepínicos e drogas Z podem ser utilizadas, mas
nunca devem ser a primeira opção de tratamento, devido ao risco de
abuso e de dependência química e psicológica.
Não devem ser utilizadas por mais de 4 semanas.
Os antidepressivos sedativos doxepina, trazodona, amitriptilina e
mirtazapina também podem ser utilizados, mas as evidências são fracas
e mais estudos são necessários para comprovar sua eficácia.
O mesmo se aplica para os antipsicóticos quetiapina, clorpromazina,
levomepromazina, e os anti histamínicos, como a prometazina,
amplamente utilizados de forma "off label".
Recentemente, foram lançados os antagonistas de orexina/hipocretina,
ainda não disponíveis no Brasil.
Suas vantagens seriam o baixo risco de abuso e de dependência, bem
como o perfil restrito de efeitos colaterais.
Para finalizar e reforçar o que já
mencionei anteriormente:
Melatonina NÃO é indicada
para a insônia !
A prescrição indiscriminada
é prejudicial à saúde.
45
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
"DURMO DEMAIS..."
NARCOLEPSIA
É uma doença rara e muitas vezes diagnosticada tardiamente, porque é
confundida com outras condições clínicas.
Caracteriza-se por ser uma hipersonia de origem central, causada pela
lesão dos neurônios produtores de orexina/hipocretina, um dos
neurotransmissores responsáveis por nos manterem alertas.
Acredita-se que essa lesão tenha natureza auto imune, ou seja, algo
acontece em nosso corpo que ele mesmo ataca suas próprias células.
A doença costuma se manifestar na infância ou no início da idade
adulta, e infelizmente ainda não tem cura.
A narcolepsia é caracterizada por ataques de sono durante o dia e uma
vontade irrepreensível de dormir. Durante os ataques de sono,
elementos do sono REM entram na vigília, como paralisia do sono,
alucinações hípnicas, sonhos e a atonia muscular.
Ao contrário do que muitos pensam, a narcolepsia, apesar de ser uma
hipersonia, não cursa com um sono noturno uniforme: os narcolépticos
geralmente tem uma noite fragmentada e sono noturno não reparador.
Existem 2 tipos de narcolepsia:
Tipo I: os níveis de hipocretina no líquor estão baixos
Tipo II: níveis estão normais.
Na narcolepsia do tipo I, uma perda súbita do tônus muscular pode
ocorrer: é a cataplexia.
Esse sintoma pode ser potencialmente perigoso, pois pode levar a
acidentes.
46
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
O diagnóstico da narcolepsia é feito com o teste de latências múltiplas
de sono e o tratamento é feito com estimulantes, como a modafinila e o
metilfenidato.
Medidas comportamentais são extremamente importantes, como os
cochilos programados durante o dia.
A cataplexia pode ser controlada com antidepressivos, como a
venlafaxina, e o oxibato de sódio, ainda não disponível no Brasil.
HIPERSONIA IDIOPÁTICA
É caracterizada por sonolência excessiva diurna
e uma vontade irrepreensível de dormir, mesmo
com longos períodos de sono noturno,
geralmente mais do que 10 horas.
Ao contrário da narcolepsia, os cochilos diurnos
desses pacientes não são reparadores e são
mais longos.
O diagnóstico também é feito por meio do teste de
latências múltiplas de sono. A polissonografia de 24h
também pode ser solicitada, bem como a actigrafia,
para auxiliar na investigação diagnóstica.
Não existe uma causa definida para esta doença
e o tratamento é feito com psicoestimulantes
e medidas comportamentais.
47
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
SÍNDROME DE KLEINE LEVIN
A hipersonia recorrente, mais conhecida como Síndrome de Kleine
Levin (a "doença da Bela Adormecida"), é uma hipersonia
extremamente rara, com cerca de mil casos descritos no mundo todo.
É caracterizada por longos períodos de sono, algo em torno de 20 horas
diárias, que se repetem por dias seguidos, e desaparecem subitamente.
Esse ciclo volta a acontecer depois de meses, sem causa aparente.
Nos períodos de sonolência, o paciente costuma acordar somente para
comer ou ir ao banheiro, porém, quando acorda, seu humor está
alterado, geralmente irritado. Pode ocorrer comportamentos de
inadequação social e hiperssexualização, além de compulsão alimentar.
Entre os períodos de crise, o paciente tem o comportamento normal e
geralmente não se lembra muito bem do que aconteceu.
A síndrome tipicamente se manifesta na infância e adolescência.
Misteriosamente, os sintomas desaparecem na vida adulta.
Ainda não existe um tratamento específico, mas o carbonato de lítio
mostrou-se eficaz em alguns casos.
48
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
"RONCO MUITO..."
APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO
Nada mais é do que a interrupção do fluxo de ar pela via aérea superior
que ocorre durante o sono.
É uma doença extremamente comum e, mesmo assim, ainda é
subdiagnosticada. O seu tempo médio de diagnóstico pode chegar a 10
anos.
Em estudo publicado em 2011, estimou-se que a prevalência na cidade
de São Paulo chegava a 33%. Em outro, de 2019, publicado na revista
científica Lancet, os pesquisadores concluíram algo assustador:
1 BILHÃO
DE PESSOAS TEM APNEIA
Nossa garganta naturalmente é muito estreita, tanto é que é aceitável
termos até 5 apneias por hora de sono. Enquanto dormimos, ocorre um
relaxamento muscular, inclusive da musculatura da via aérea superior.
Se as forças que mantem a via aérea aberta forem menores do que as
forças externas, que contribuem para o seu fechamento, nós
engasgamos e o fluxo de ar é interrompido.
Como o ar não chega no pulmão, o oxigênio no sangue diminui.
Toda vez que ocorre essa queda, o cérebro recebe uma mensagem
para despertar. É como se fosse um sistema de defesa.
O paciente não percebe a maioria desses despertares e o cérebro não
descansa, consequentemente o corpo também não!
Isso pode acontecer durante toda a noite e o resultado é uma perigosa
49
fragmentação do sono.
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
"Mas quais são as forças que contribuem para o fechamento da via
aérea?"
A principal causa da apneia é a obesidade. O acúmulo de gordura na
região cervical e dentro da própria língua contribui para o surgimento da
doença.
Características anatômicas da região também podem ser a causa: não é
toda pessoa que está acima do peso que tem apneia; pessoas magras
também podem ter!
Os principais sintomas são ronco, sonolência excessiva diurna,
dificuldades de memória e de concentração, alterações de humor,
apneias presenciadas pelo parceiro ou parceira de cama, despertares
por engasgo (acordar com o próprio ronco) e sensação de sono
insuficiente.
A ampla gama de sintomas faz com que a apneia muitas vezes seja
confundida com depressão, insônia e até preguiça.
Quem teve diagnóstico recente de pressão alta, diabetes tipo 2 ou
alguma arritimia precisa fazer a polissonografia para investigação de
apneia: a doença pode estar envolvida na causa de todas essas
enfermidades.
Quem tem apneia tem mais chance de ter um derrame ou infartar. Ela
também está relacionada com o prejuízo de funções cognitivas e com o
câncer.
A confirmação do diagnóstico é dada pela polissonografia. E a primeira
medida que deve ser tomada no tratamento é a mudança do estilo de
vida:
Prática regular de atividade física, educação nutricional, higiene do
sono e controle de estímulos.
50
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
O tratamento mais eficaz é o uso do aparelho de CPAP (continuous
positive airway pressure). Ele é um pressurizador de ar que capta o ar
do ambiente e joga sob pressão na via aérea superior através de uma
traqueia conectada em uma máscara.
O aparelho deve ser usado durante toda a noite de sono e mantém a via
aérea aberta. A participação do fisioterapeuta do sono na adaptação de
CPAP é fundamental para o sucesso terapêutico.
Para apneias leves e moderadas, o aparelho intra oral de avanço
mandibular pode ser utilizado. Ele é confeccionado pelo dentista do
sono e provoca uma protrusão da mandíbula, abrindo a via aérea.
A terapia miofuncional, uma espécie de musculação da via aérea
superior, realizada pelo fonoaudiólogo do sono, também é uma
modalidade terapêutica eficaz e contribui muito para a diminuição do
ronco.
O tratamento cirúrgico é indicado quando
questões anatômicas são muito evidentes
no curso da apneia e quando há dificuldade
na adaptação aos tratamentos citados
anteriormente.
É de extrema importância a avaliação
minuciosa de um otorrinolaringologista
especialista em Medicina do Sono para
a indicação da cirurgia.
Hoje em dia, as mais realizadas são a
uvulopalatofaringoplastia e a
faringoplastia lateral.
51
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
APNEIA CENTRAL
É bem menos comum do que a apneia obstrutiva, mas também pode ter
consequencias nocivas para o organismo.
Ela ocorre quando há interrupção do fluxo de ar na via aérea superior e
não ocorre esforço respiratório torácico e nem abdominal durante o
evento de apneia.
É como se o cérebro perdesse a conexão com o corpo e não mandasse
a mensagem para os músculos se mexerem.
Diversas doenças podem estar relacionadas com a apneia central do
sono, principalmente a insuficiência cardíaca congestiva, doenças
neuromusculares e algumas síndromes genéticas. Porém, ela também
pode não ter causa definida.
O tratamento é realizado com o controle das doenças de base
envolvidas e com ventilação não invasiva: CPAP, BiPAP ou
servoventilador. A escolha da modalidade terapêutica depende da
avaliação criteriosa do médico do sono.
HIPOVENTILAÇÃO OBESIDADE
É um distúrbio respiratório do sono e um diagnóstico de exclusão, ou
seja, diversos outros distúrbios tem que ser descartados antes de fechar
esse diagnóstico.
Se o paciente tem alguma doença pulmonar, deformidade torácica,
doença neurológica que pode levar à hipoventilação, fraqueza muscular,
usa alguma medicação que pode provocar depressão respiratória e
hipoventilação, ele não pode ser classificado como hipoventilação
obesidade.
52
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
Duas características fundamentais devem estar presentes para
fecharmos esse diagnóstico: pressão arterial de gás carbônico acima de
45mmHg, detectada pelo exame de gasometria arterial, e IMC acima de
30Kg/m2.
O tratamento é bastante parecido com o da apneia obstrutiva do sono,
com mudança de estilo de vida, ventilação não invasiva e perda de
peso.
A indicação de oxigenioterapia suplementar está sujeita ao julgamento
clínico.
53
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
"ME MEXO DEMAIS..."
Parassonia é qualquer evento anormal e indesejado que ocorre na
transição sono vigília e/ou durante o sono.
Ela consiste em movimentos complexos, comportamentos, sonhos,
emoções, percepções e atividade do nosso sistema nervoso autônomo.
As parassonias podem afetar a saúde física e mental do paciente e do
seu parceiro ou parceira de cama, bem como provocar fragmentação do
sono com consequentes sintomas diurnos.
São basicamente divididas em 2 grupos: as parassonias do sono Não
REM e as parassonias do sono REM.
PARASSONIAS DO SONO NÃO-REM
1. DESPERTAR CONFUSIONAL: ocorre quando o paciente tem um
despertar incompleto do sono Não REM, seus olhos estão abertos, há
um estreitamento do nível de consciência, o paciente permanece na
cama e sua aparência é a de alguém que acordou e não está
entendendo nada do que acontece em sua volta.
2. SONAMBULISMO: assim como o despertar confusional, ocorre
quando há um despertar incompleto do sono Não REM.
Obrigatoriamente, o paciente assume um comportamento de
deambulação, sua interação com o ambiente em volta é desordenada,
os olhos estão abertos, e na grande maioria
das vezes o paciente não se lembra de
nada do que ocorreu.
O sonambulismo pode expor o paciente
a situações potencialmente fatais.
54
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
3. TERROR NOTURNO: caracteriza-se por um evento em que ocorre
um choro e/ou um grito muito fortes, após o despertar incompleto do
sono Não REM.
A postura do paciente é de medo intenso e há grande instabilidade
autonômica (sudorese, alterações de pressão arterial e de frequências
cardíaca e respiratória).
É bastante comum em crianças, mas também pode ocorrer em adultos.
4. TRANSTORNO ALIMENTAR RELACIONADO AO SONO: não está
formalmente classificado como um parassonia do sono Não REM, mas
possui características clínicas bem parecidas:
Falta de memória do ocorrido, despertar incompleto do sono Não REM,
estreitamento do nível de consciência, deambulação e atitudes
inadequadas em relação ao ambiente em volta, principalmente em
relação ao ato de comer.
O que o paciente come geralmente não tem muito sentido, podendo
ocorrer a ingestão de produtos de limpeza e alimentos combinados que
naturalmente a pessoa não comeria se estivesse em vigília (misturas
como sorvete e feijão, por exemplo).
O transtorno pode estar
relacionado a desordens
circadianas hormonais dos
hormônios do apetite
grelina e leptina, bem
como do GH e da insulina.
55
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
PARASSONIAS DO SONO REM:
1. TRANSTORNO DE PESADELO: são eventos recorrentes de
pesadelos muito ameaçadores, de conteúdo envolvendo morte e/ou
ameaça, dos quais o paciente se lembra quando acorda.
Ao acordar, o paciente está completamente orientado e lúcido, ao
contrário do que ocorre nas parassonias do sono Não REM.
O transtorno de pesadelo pode provocar preocupações com o próprio
ato de dormir, e consequencias físicas e psicológicas graves, se não
tratado.
2. TRANSTORNO COMPORTAMENTAL DO SONO REM: mais comum
em idosos, o transtorno se caracteriza por atuação dos sonhos, que
geralmente envolvem perigo extremo, morte, ameaça ou agressões.
O paciente age como se estivesse no sonho, podendo machucar o
parceiro ou parceira de cama, bem como a si mesmo. Ao acordar, se
lembra do que ocorreu e está completamente orientado.
O transtorno comportamental do sono REM pode ser um dos primeiros
sinais clínicos da Doença de Parkinson e cerca de 90% dos pacientes
que o tem irão desenvolver Parkinson.
3. PARALISIA DO SONO RECORRENTE: imagine você acordado, com
plena consciência de si, mas não consegue abrir os olhos e nem se
mexer. Desesperador, não? Isso se chama paralisia do sono.
Ela nada mais é do que a preservação de algumas características do
sono REM, especialmente a atonia muscular, dentro da vigília.
56
QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
Pode ter uma causa genética, mas está muito relacionada também à
privação de sono. O paciente tem a perfeita memória do ocorrido e, ao
acordar, está orientado.
TRATAMENTO DAS PARASSONIAS
Em primeiro lugar, o ambiente de sono deve ser protegido para evitar
que o paciente (ou parceiro(a) de cama) se machuque.
Fatores que podem estar fragmentando o sono devem sempre ser
investigados, principalmente distúrbios respiratórios do sono e privação
do sono.
Higiene do sono e controle de estímulos devem ser orientados para
todos os pacientes.
No caso das parassonias do sono Não REM, o tratamento
medicamentoso ainda tem pouca evidência que funcione, mas alguns
antidepressivos e benzodiazepínicos podem ajudar e nunca devem ser
prescritos antes de uma avaliação do médico do sono.
No transtorno comportamental do sono REM, a melatonina é bastante
utilizada, bem como o benzodiazepínico clonazepam.
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QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
"ESTOU EM OUTRO FUSO..."
Todos temos um relógio biológico dentro do nosso cérebro, composto
por um grupo de células que comandam absolutamente tudo o que
ocorre em nosso corpo que obedece um ciclo de 24 horas.
É o tão falado ritmo circadiano.
Muitos genes estão envolvidos nesse funcionamento e a melatonina
também exerce um papel fundamental nessas células.
Os transtornos de ritmo circadiano podem acontecer quando ocorrem
desalinhamentos no funcionamento deste relógio com a rotina do
indivíduo.
1. JET LAG: existe queixa de insônia ou sonolência
excessiva diurna, acompanhadas de redução do
tempo total de sono, quando o paciente viaja
por pelo menos 2 fusos horários.
O distúrbio é temporário e os sintomas desaparecem ao longo dos dias.
Porém, em pacientes que viajam frequentemente, intervenções mais
incisivas precisam ocorrer, como o uso de melatonina em horários
adequados, para ressincronizar o relógio biológico com o ambiente
durante as viagens.
2. ATRASO DE FASE: neste transtorno, a pessoa sente sono mais
tarde e acorda mais tarde do que o habitual. Muito comum em
adolescentes, fazendo parte do desenvolvimento do sistema nervoso
central.
É a famosa dificuldade de dormir cedo e de acordar cedo para ir à aula.
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QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
Mas pode ocorrer em todas as faixas etárias.
Geralmente, resolvem o problema:
Mudança de rotina, orientações
comportamentais para atraso de fase,
como evitar a exposição à luz artificial
no período noturno, e o uso de
melatonina para avançar a fase de sono.
3. AVANÇO DE FASE: ocorre dificuldade em permanecer acordado
durante o horário habitual de vigília. Ocorre um despertar precoce,
geralmente no meio da madrugada, e o paciente não consegue dormir
mais.
Ele sente sono mais cedo e acorda mais cedo. Bastante comum em
pessoas idosas e, normalmente, nesta fase o transtorno é
confundido com insônia.
Orientações comportamentais para avanço de fase, fototerapia e o uso
de melatonina costumam melhorar os sintomas.
4. TRABALHADOR DE TURNO: existe queixa de insônia ou sonolência
excessiva diurna, acompanhadas de redução do tempo total de sono,
quando o paciente tem horários de trabalho que se sobrepõem aos
horários habituais de sono.
O trabalhador de turno tem mais chances de doenças cardiovasculares
por adotar esta rotina.
Orientação comportamental, uso de óculos laranja e de melatonina, bem
como o planejamento de mudança de emprego, em funções que
respeitam os horários de sono do paciente, fazem parte da abordagem
deste tipo de transtorno.
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QUAIS OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS
DO SONO?
5. SONO IRREGULAR: comum em idosos ou pacientes
institucionalizados. Caracterizado por vários blocos de sono ao longo
das 24h, ou seja, o período de sono principal é totalmente fragmentado
e, usualmente, o paciente dorme vários períodos de dia e não consegue
conciliar o sono à noite.
Estímulos ambientais bem determinados, orientação comportamental e
o uso de melatonina podem resolver o problema.
6. SONO EM LIVRE CURSO: muito comum em pacientes cegos, este
transtorno representa um desalinhamento entre o relógio biológico do
paciente e o ciclo claro-escuro do ambiente.
A cada dia, detecta-se um atraso no ritmo interno do paciente, é como
se ele sentisse sono mais tarde e acordasse mais tarde a cada dia que
passa.
As queixas são de insônia ou sonolência excessiva diurna, intercaladas
por períodos assintomáticos.
PARA DIAGNOSTICAR ESSAS DOENÇAS DO RELÓGIO BIOLÓGICO,
SÃO FUNDAMENTAIS:
O PREENCHIMENTO DE UM DIÁRIO DE SONO, UMA BOA HISTÓRIA
CLÍNICA E O USO DA ACTIGRAFIA POR PELO MENOS 2 SEMANAS.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Espero que ainda esteja acordado!
Confesso que não estava em meu planejamento
escrever tantas páginas, mas sou fascinado
pela Medicina do Sono e a empolgação tomou
conta.
Quero agradecer profundamente a você que
chegou até aqui pela confiança em
meu trabalho.
E parabenizá-lo pela dedicação na busca de se tornar um profissional
de saúde mais completo e atualizado.
Do ponto de vista do mercado brasileiro de saúde, essa via bidirecional
de sono e comportamento é muito fértil e ainda inexplorada.
As oportunidades para você transformar sua atuação são grandes
e é por isso que desenvolvi o "Programa Caio no Sono", o meu
curso online de aprofundamento em Medicina do Sono para
profissionais da saúde.
A 1ª turma terá número de vagas limitadas e uma entrevista comigo
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No mais, reforço que vou adorar ler o seu feedback e responder as suas
dúvidas, que podem ser enviadas:
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
1. por email para [email protected]
2. por direct no Instagram @caionosono
Peço também que ao compartilhar este material, sempre o faça através
do link do site (www.caionosono.com/ebook), e não do encaminhamento
do pdf.
Para agendamento de consulta médica, ligue no (11) 3042 1390
Foi uma honra falar com você e espero vê-lo novamente.
Este é só o começo,
Abraço,
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SOBRE O AUTOR
SOBRE O AUTOR
Caio Macedo Athayde Bonadio é paulista de Ituverava, apaixonado por
Rock'n'Roll, por gastronomia e pela arte de comunicar.
Tem 31 anos de idade, muitos deles dedicados ao estudo e ao exercício
da Medicina - e uns poucos à guitarra.
Fez a graduação na Faculdade de Medicina do ABC e a sua 1ª
residência em Psiquiatria na Santa Casa de São Paulo.
A 2ª, em Medicina do Sono, foi na Universidade de São Paulo. Ficou
mais um ano por lá, no Instituto do Coração, onde fez a complementação
especializada em distúrbios respiratórios do sono.
Também concluiu estágio internacional no Laboratório de Distúrbios do
Sono da University of Michigan e é aluno do MBA em Gestão de Saúde
do INSPER/Hospital Israelita Albert Einstein.
É primeiro tenente médico da reserva da Marinha Brasileira, palestrante
e apresentador do DormeCast, podcast semanal sobre sono e saúde
mental que acontece, ao vivo, toda quarta-feira às 21h 30 no Instagram.
Em 2019, tornou-se co-responsável
pela pós graduação lato sensu em
Medicina do Sono da Santa Casa de
São Paulo e Professor Conteudista do
Curso de Clínica Psiquiátrica do IPQHCFMUSP.
Participa, com frequência, de quadros
na televisão aberta, onde difunde sua
visão de saúde focada em prevenção,
na construção de bons hábitos e no
protagonismo do indivíduo.
Acredita que a transformação urgente da saúde pública do Brasil precisa
ser impulsionada, entre outras coisas, pelo profundo conhecimento
técnico e pela capacitação de seus profissionais.
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