José Henrique de Faria Economia Política do Poder-Vol. 2 cessas se ampliaram". Desta forma, as "novas" condições de trabalho são determi- tarefas, (vi) as medidas de aferição da capacidade profissional de cada indivíduo e nadas: do grupo e (víi) os procedimentos necessários ao estabelecimento de padrões abso- 28 (i) pelo estudo dos movimentos e das operações complementares: neste caso, tendo sido dado o quadro de operações, os gestores decompõem o trabalho em operações complementares, analisam cada mo- vimento e suprimem os que julgam supérfluos. O trabalho é regulamentado através de normas e planos rigorosos, cujo acompanlia- mento indica as alterações necessárias ao seu funcionamento; (ii) pelo estudo de tempos elementares: a determinação dos tempos ele- 29 lutos e relativos de desempenho. A racionalização organizacional, nos moldes da OCT, impõe, desta forma, um esquema de controle, mais propriamente de controle da organização dos trabalhadores nos locais de trabalho com a finalidade de subtraí-la, e que se fuca, ainda de acordo com Oliveira (1986), nos seguintes pontos: (i) na qualificação do trabalhador (vale acrescentar, segundo a ótica do capital); (ii) em suas aptidões; (iii) na capacidade de manuseio e/ou operações de equipamentos, máqumas, ferramentas mentares constitui-se em uma operação essencial no esquema da OCT. O trabalhador deve executar um certo número de gestos, sempré mais ou menos os mesmos para o mesmo trabalho, os quais devem ser passíveis de serem contados e cuja rapidez pode ser avaliada e instrumentos; (iv) na quantidade, qualidade e ritmo de trabalho (em termos de sobrecarga ou ociosidade); (v) na distribuição dos produtos por postos de trabalho em fases cíclicas de ociosidade: (vi) no estabelecimento de prioridades e no domínio das pêlos gestores. A cada categoria de trabalho, repetitivo livre ou misto, correspondem, segundo Palewski (1954, p. 37), condições diferentes de ajustes de tempo. Assim, a determinação dos procedimentos da execução do trabalho é previamente fornecida; No plano do arranjo físico da produção (layout), o objetivo da OCT é aumentar a eficiência do fluxo de trabalho, otimizar o uso de espaço disponível, melhorar o controle sobre o processo de fabricação, aumentar a produtividade (diminuindo o tempo de nao-trabalho através de sua intensificação) e proporcionar flexibilidade (iii) pelo estudo do controle: a base física do controle, na OCT, é a eliminação, pêlos gestores, das falhas do processo de trabalho, visando reduzir o tempo de operação, melhorar a qualidade, aproveitar os resíduos de matéria-prima e de compostos excedentes. Isto é realizado através de mecanismos tais como cartões ou fichas, relatórios, boletins, análises estatísticas (tabelas, gráficos etc.), entre outros. As consequências, do ponto de vista do trabalhador, são bastante eviden- relações informais. em caso de variações com operações relacionadas ou com modificações de proces- sós. Um estudo do programa de produção, incluindo a relação de materiais e componentes, as operações necessárias, as máquinas e equipamentos e o fluxo de opera- coes, é realizado na área de planejamento operacional: o arranjo físico é, neste sentido, o desenho concreto das fases do processo de trabalho e de produção. A análise da concepção original de cada um dos fundadores da OCT significa compreender não apenas este sistema como o que pretensamente o sucede (a administração flexível). tes. Para a organização produtiva, o que se busca com o emprego da OÇT é uma rígida disciplina na execução do trabalho, de acordo com padrões definidos na cúpula, a qual é conseguida pelo acionamento de todos os níveis hierárquicos envolvidos no processo produtivo. Toda a definição sobre o trabalho, todo o processo de- cisório e todos os padrões de desempenho são definidos pela hierarquia superior, o que significa que 6 trabalhador não cria seu trabalho, mas adapta-se a um trabalho determinado, concebido em outra esfera da divisão parcelar. Como sugere Fuiïmann (1975), o saber operário é menosprezado, diante do saber da cúpula. Na OCT, as tarefas são descritas em minúcias nos planos de cargos e nos manuais de organização e métodos (O&M), sendo a racionalização a palavra-chave deste sistema, pois as tarefas, as responsabil idades, a autoridade, as cargas de trabalho, o arranjo físico e as normas disciplinares encontram-se a ela submetidos. Com efeito, o estudo do trabalho, na ótica de O&M, segundo Oliveira (1986, p. 320), 1 A CONCEPÇÃO DE FREDERICK W. TAYLOR O ambiente organizacional no qual Taylor vai basear seus estudos refere- se a empresas de produção de peças que exigiam dos trabalhadores ritmos de trabalho cuja execução era extenuante e nas quais o desperdício era significativo. Seu estudo mais importante, que trata dos princípios da gerência científica (TAYLOR, 1911), decorre em grande medida de sua experiência em uma empresa de produção de lingotes de aço, especialmente no processo de carregamento destes lingotes em vagões. TaylorJá havia sido empregado de outras empresas e sua dedicação aos estudos o levou a formar-se em engenharia. Vindo de uma família quacker, protestan- tes de rígidos conceitos acerca da importância da disciplina e do trabalho, Frederick Winslon Taylor encarava o trabalho como uma obrigação a que todos deviam concorrer e a disciplina como um valor que todos os trabalhadores deviam seguir. O significa "-distribuir deforma criteriosa e racional as tarefas que já vêm sendo realizaâas pela empresa" è "funciona como instrumento de estudo da situação existente e de mudança para a situação desejada, quando da racionalização orgamzacional . Todas as tarefas são, neste processo de racionalização, descritas detalhadamente, a partir de entrevistas e observações, mdicando-se o tempo de execução e o volume suporte para seus estudos está baseado na ideia de que quanto mais o indivíduo trabalha, mais o mesmo faz por merecer recompensas espirituais, de que o trabalho disciplinado colabora para aumentar a potência da soma dos trabalhos individuais e total de trabalho executado. As tarefas individuais são agrupadas em atividades, de onde emerge o Quaà-o de Distribuição do Trabalho, instrumento gerencial que possibilita o controle sobre (i) o conjunto das operações do processo de trabalho, (h) o tempo de trabalho de cada unidade, (Íü) a sequência do processo, (iv) a necessidade de matéria-prima ou de estoques, (v) os instrumentos de análise comparativa das mento de lingotes de aço em vagões e tendo percebido, através do controle do paga- de que alguns são possuidores da dádiva de pensar e devem fazê-lo para comandar os que receberam a graça de executar. Observando os trabalhadores da American Steel Company no carregamento que era efetuado por peça, que alguns operários produziam mais do que outros, Taylor decide aplicar e testar seu método nesta empresa. Para tanto, escolheu 30 José Henrique de Faria Economia Política do Poder-Vol. 2 um trabalhador imigrante de forte compleíção física e de baixo nível de inteligência (TRAGTENBERG, 1977, p. 76) Convém observar, no entanto, que Tayïor pretende negar o antagonismo entre o capital e o trabalho, tirando do trabalhador a liberdade de organizar a própria atividade. Isto é possível porque o trabalhador, tendo perdido a possibilidade de agir sobre o preço do seu trabalho no momento em que o executa, para servir ao seu experimento, ou seja, escolheu o que deveria ser, em sua concepçao, o trabalhador ideal, o seu padrão de operário: fisicamente forte, pouco in- teligente, submisso e dependente do emprego. Estando em situação irregular nos USA e tendo apenas a garantia de sua produção como forma de sobrevivência, este trabalhador necessitava garantir seu emprego, o que colaborou para que aceitasse participar do teste. Taylor dividiu o trabalho em várias operações, que correspondiam aos movimentos mais económicos, e treinou o trabalhador, medindo a quanti- dade produzida de cada peça em termos de tempo de produção, até que ele as execu" tasse no limite de suas possibilidades, isto é, a máxima produção no mmimo tempo. Tendo alcançado este limite, Taylor defme o que seria a produção de um operário padrão tendo em vista seu padrão de operário. Este padrão deveria se estender a toda a fábrica. Embora este seja o método pelo qual ficou conhecido, ou seja, a decomposição do trabalho e sua cronometragem de maneira a reduzir tempo e movimento, de imediato é conveniente esclarecer que um esboço do taylorismo deve superar esta leitura banal, pois, "'além dessas trivialidades reside uma teoria que nada mais é que a explícita verbalização do modo capitalista de produção'". (BRAVERMAN, 1977, p. 83) De fato, Taylor iniciou seus estudos sobre a análise e a simplificação do trabalho a partir de um método empÍrico-experimental, por ele chamado de científïco, em 1893, embora seu principal livro tenha sido publicado em 1911, Seu objetivo era obter a melhoria na execução do trabalho e sua intensificação através da automatizaçao. Neste sentido, sugeria, como princípios: (i) definir o trabalho a ser executado, analisando-o e determinando seu processo ótimo; (ii) adaptar o operário à técnica, através da qualificação e treinamento dos executantes das tarefas; (iii) separar a concepção da execução no desenvolvimento e na realização do processo de trabalho, de modo que o trabalhador conheça suas funções e empregue nelas os melhores metodos definidos pela gerência; (iv) especializar as funções de direçâo ou gestão, es- 31 não tem outro recurso para ganhar mais além do recurso, muito mecânico, de traba- Ihar mais. Sendo assim, o taylorismo somente consegue aliar prosperidade, harmotua, eficiência e maior carga de trabalho para o operário, porque se constitui na tttraduçào administrativa da lógica e dos interesses da burguesia, num momento dado de seu desenvolvimento histórico". (TRAGTENBERG, 1977, p. 76) Nos fundamentos de sua gerência científica, Taylor vai mais além na dêsvalorização do homem, ao traduzir a alienação do trabalhador do processo de trabalho através de uma interpretação primária de seu comportamento. De fato, TayÍor (1911) traduz a alienação por vadiagem e, como um profeta secular assevera: como engenheiros e administradores, nós conhecemos mais de perto esses fatos (vaâiagem) que quaisquer outros e estamos mais bem aparelhados para dirigir um movimento contra as ideias falsas, esclarecendo não só os trabalhadores, como todos os cidadãos a respeito da verdade. Sua concepção acerca da natureza dos fenómenos sociais aproxima-o de uma análise de natureza maniqueísta. Assim, o taylorismo, tratado como uma ciência do trabalho, tem, na realidade, a pretensão de ser uma ciência do trabalho dos outros, nas condições do capitalismo. "Não é a melhor maneira de trabalhar em geral, que Taylor busca, mas um resposta ao problema espe- cifico de como controlar melhor o trabalho alienado - isto é, a força do trabalho comprada e vendida". (BRAVERMAN, 1977, p. 85-6) Este controle do trabalho alienado é viabilizado na medida em que a alienação é tratada por vadiagem (indolência natural e sistemática), de forma a que o esquema teórico taylorista seja facilmente aceito. chamam a atenção de Elton Mayo, como se verá mais adiante. Apoiado em tais bases, Taylor apresenta a verdadeira razão de sua gerência científica: a divisão de trabalho entre a gerência e os trabalhadores, ou seja, a separação fundamental de cérebro e mão. Com efeito, a finalidade do estudo do trabalho, por Taylor, não é a de fornecer ao trabalhador maior conhecimento científico, tampouco fortalecer sua capacidade para o trabalho, de modo que melhorando as técnicas os trabalhadores sejam com eles elevados. Antes, o objetivo é o de baratear a força de trabalho do trabalhador diminuindo o seu preparo e aumentando a sua Adotando o discurso do capitalismo industrial, Taylor propõe o máximo de prosperidade ao capitalista e ao assalariado. Por trás desta aparente boa intenção, produção. Para tal fim, os estudos dos processos de trabalho são reservados à gerência, ao mesmo tempo em que são obstados aos trabalhadores. A estes, os resultados no entanto, esconde-se o aproveitamento total do homem, ou seja, a exploração ra- são comunicados apenas sob a forma de funções simplificadas, orientadas por instruções precisas, as quais os trabalhadores devem apenas seguir, pois não precisam pecialmente no que se refere aos estudos para a fabricação e a coordenação das ati- vidades funcionais (TAYLOR, 1911). As consequências imediatas do sistema taylorista foram a fadiga, a monotonia, a sujeição do trabalhador a uma tarefa predeterminada para a qual não agregava nenhuma iniciativa, fenómenos estes que, aliás, cional do trabalhador pela extração da mais-valia. A prosperidade generalizada trata somente de uma prosperidade unilateral, porquanto não é dada ao trabalhador senão uma pequena parcela dos resultados, tendo em vista sua colaboração. Taylor somente pode fazer tal proposta partindo de um pressuposto igualmente falso, qual seja, o de que existe uma identidade de interesses entre trabalhadores e capitalistas. Para firmar as bases ideológicas de sua pregação messiânica, "Taylor parte cio ponto de vista segundo o qual o interesse dos trabalhadores é o da administração, desconhecendo as tensões entre a personalidade e a estrutura da organização formal. O termo "colaborador" em substituição a trabalhador, tão em moda atualmente e que pretende ter um significado mais "corporativo", já aparece em Taylor com a mesma intenção: a identidade de interesses, Como se verá, adiante, H. Ford também o utilizará. compreender os raciocínios técnicos ou dados subjacentes, A gerência científica de Taylor, portanto, cria o monopólio do conhecimento, através do que controla cada uma das fases do processo de trabalho e os modos como o trabalho é executado. Para Taylor (1911), mesmo o mais competente dos operários é incapaz de compreender a gerência científica sem uma orientação de seus superiores, quer por falta de instrução, quer por capacidade mental insuficiente. Em vista disto, cabe à administração planejar o ofício dos operários, bem como dirigir seus atos para um trabalho mais rápido e melhor. Assim, "a capacidade do operário tem um valor secimdário, o essencial é a tarefa de planejamento. Â especialização extrema do ope- rário, no esquema de Taylor, torna supérflua sua qualificação". (TRAGTENBERG, 1977, p. 72) Cabe à gerência, na concepção de Taylor (1911), a função de reunir 32 José Henrique de Faria Economia Política do Poder - Voi. 2 todos os conhecimentos tradicionais que no passado possuíram os trabalhadores e então classificá-los, tabulá-los, reduzi-los a normas, leis ou fórmulas. Em conseqüência, na medida em que preconiza a apropriação e fonnalização de todo o conhe- trolando-o, Taylor lança os termos básicos das funções administrativas, que até hoje cimento possuído pêlos trabalhadores, Taylor promulga o princípio da dissociação do processo de trabalho das especialidades dos trabalhadores. Assim, o processo de trabalho irá depender não absolutamente das capacidades destes, mas inteiramente das políticas industriais, pois, da mesma forma como o capital possui os meios físicos de produção (máquinas e equipamentos), também possui os meios mtangíveis (estudos, técnicas etc.), já que não apenas o capital é propriedade do capitalista, mas o próprio trabalho tomou-se parte do capital. Os trabalhadores não apenas perdem o controle sobre os instrumentos de proàução como também devem perder o controle até de seu trabalho e do modo como o executam. Este controle pertence agora àqueles que podem 'arcar' com o es- tudo dele afim de conhecê-lo melhor do que os próprios trabalhadores conhecem sua atívidade viva. (BRAVERMAN, 1977, p. 103-6) Apropriando-se dos conhecimentos do trabalhador e reservando-os para a gerência, o taylorismo concorre para o estabelecimento de relações sociais anta- gônicas e de trabalho alienado, na medida em que não só separa mão e cérebro, mas os divide e os toma hostis. A separação entre a concepção e a execução resulta, entre outras, em uma desumanização do processo de trabalho, na medida em que os trabalhadores ficam reduzidos ao nível de trabalho em sua "forma animal". Nesta medida, é possível entender que, para a administração da força de trabalho comprada, a ciência do trabalho de Taylor nunca pode ser desenvolvida pelo trabalhador, mas sempre pela gerência, de maneira que o capital possa impor ao trabalho a eficiência metodológica e o ritmo das tarefas. Fica evidenciado, também, que o núcleo do quadro teórico taylorista é a distinção nítida entre a concepção e a execução. "Depois de estabelecida, essa dicotomia passa a ser a forma a priori de todo enfoque das realidades da empresa. Torna-se prescrüiva . (MOTTEZ, 1973, p. 13) No esquema teórico taylorÍsta o trabalho do operário, completamente planejado pela direção, é transmitido através de instruções escritas completas que minudenciam não só a tarefa como os meios usados para realizá-la. Sendo assim, "no plano de sua Teoria da Administração, Taylor define a burocracia como emergente das condições teóricas de trabalho, predominando a organização sobre o homem, acentuando como fator motivador único, o monetário . (TRAGTENBERG, 1977,p.76) 33 permanecem em essência inalteradas. Com a administração apropriando-se das funções intelectuais, Taylor somente poderia requerer, para o êxito de sua gerência, trabalhadores obedientes e com reduzida capacidade mental. De fato, na concepção de Taylor (1911), um operário classificado faz justamente o que se lhe manda e não reclama, pois sua maior virtude é a de ser tão estúpido e fleumáïico que mais se assemelha em sua constituição mental a um boi. E preciso considerar que, com a grande imigração de estrangeiros em situação ilegal nos EUA à época, acompanhada da baixa organizacão política dos mesmos, aos trabalhadores somente restava ser obedientes. Taylor, percebendo que a consciência do trabalhador de sua alienação provém de experiências e contatos inter-relacíonais e que sua força estaria na ação coletiva, propõe como regra infíexível, falar e tratar com um trabalhador de cada vez. Todas estas considerações, encobertas pêlos discursos da "eficiência" e da amistosa cooperação da gerência", têm como fim a sistemática apropriação de valor excedente. As contradições do sistema Taylor não são simplesmente contradições teóricas, senão um reflexo do caráter antagônico das relações de produção capiía- listas. Os métodos tayloristas são um aperfeiçoamento dos métodos capitalistas de 'exploração , ao passo que a colaboração do trabalhador acaba por ser uma colaboração forçada, "durante a qual a administração toma conta de todo o componente pensador da atividade do trabalhador, enquanto que este só deve obedecer e cum- prir as indicações de seu 'dirigente mais capaz"'. (GVISHIANI, 1977, p. 197-9) Com o trabalho dependente do capital, o "Sistema Taylor" conseguiu obter consideráveis resultados económicos para o capital, já que as vantagens salariais dos trabalhadores desaparecem na medida em que o nível de produção mais elevado toma-se generalizado. No exemplo de seus resultados económicos, Taylor apresenta as vantagens do novo sistema, deixando claro que: (i) o número de trabalhadores é reduzido, para a mesma tarefa; (ii) a média da remuneração para os trabalhadores cresce em 63%; (iii) o custo médio diminui em 54%; (iv) a média de execução de tarefa (produção) aumenta em 269%. Não é difícil perceber que a empresa é a maior beneficiária de tal sistema, pois o trabalhador, para aumentar sua remuneração em 63%, deve produzir mais 269% do que o fazia. O custo da empresa decresce não só em função do menor O apanágio imediato da apropriação, pela gerência, das atividades in- número de trabalhadores, mas principalmente tendo em vista o mcremento de tra- telectuais, é a criação de instrumentos de controle. No relato de Taylor sobre o manejo de ferro-gusa por tarefa, por exemplo, fica ilustrado de forma clara o eixo sobre o qual gira toda a gerência moderna: o controle do trabalho através das âe- balho não pago. A empresa, que pagava um salário total de US$ 690,00 pelo velho cisões que são tornadas no curso do trabalho'". (BRAVERMANN, 1977, p. 68) prosperidade para o capitalista no "Sistema Taylor", mas é insustentável a argu- Através da história, o controle caracterizou-se como o principal aspecto da gerência. Com Taylor, no entanto, o controle adquiriu dimensões sem precedentes, na medida mentação de igual prosperidade ao empregado, por dois lógicos e simples motivos: (i) 460 trabalhadores deixaram de trabalhar; (ií) o incremento relativo da produção é em que para a gerência é essencial impor ao trabalhador a maneira pela qual o tra- de 4,27 vezes maior do que o incremento relativo da remuneração. balho deve ser executado. Planejando o trabalho, organizando-o, dirigindo-o e con- sistema, passou a pagar um total de US$ 263,20 no novo sistema, reduzindo suas despesas com o pagamento da força de trabalho em 62%. Não há dúvida quanto à Não há, como Taylor quer fazer crer em suas argumentações, uma dis- tribuição igualitária dos resultados de um processo mais eficiente de trabalho. Antes, Convém observar cuidadosamente esta questão, na medida em que este é o cerne não apenas do íayiorismo, mas da teoria gerência!. acentua-se a apropriação de valor excedente: não é sem razão que a cooperação cientifica de Taylor (1911) vá requerer uma transformação na atitude mental dos 34 José Henrique de Faria Economia Política do Poder - Vol. 2 trabalhadores com relação ao seu trabalho e ao seu patrão. Embora em seu discurso Taylor busque desenvolver uma verdadeira ciência, sob o aparato de uma cooperação íntima e cordial entre a direção e os trabalhadores, ele vai ocupar-se, de definição e nos processos de organização das atividades, não interfere na superpo- fato, em desenvolver métodos e formas de organização do trabalho e não em desenvolver tecnologia, onde sua atuação é ínfima. Á gerência cientifica significa um empenho no sentido de aplicar os métodos da ciência aos problemas complexos e crescentes do controle do trabalho nas empre- sãs capitalistas em rápida expansão. Faltam-lhe as características de uma verdadeira ciência porque suas pressuposições refletem nada mais que a perspectiva do capitalismo com respeito às condições da produção. Ela parte não do ponto de vista humano, mas do ponto de vista do capitalista, do ponto de vista da gerência de uma força de trabalho refratária no quadro das relações sociais antagônicas. 35 siçao complexa dos fins e dos meios e não contesta determinados objetivos, pois são estes fatores que possibilitam a dicotomia dirigente-dirigido. A administração científica apresenta uma face de implacável evidência racional, acossando todas as fontes de incerteza e esmiuçando cada pormenor, apenas porque entende que os ob- jetivos são fornecidos antecipadamente e sem ambiguidades. Como bem aponta GvishianÍ (1977), em nome de sua estmtura bem mais elaborada, a racionalização restritiva taylorista não deixa, fora de si mesma, nenhum lugar para a inovação mas aparece como uma existência imperativa. tirn dado inexorável, uma condição natural. Investiga não o trabalho em geral, mas a adaptação do trabalho às necessidades do capital. Entra na oficina não A heterogestão taylorista traz em seus fundamentos a palavra reificada do trabalho homogéneo, em que é invocado o génio das chefias e a ignorância dos trabalhadores, reforçando a ordem capitalista e seu domínio, sob a proteção das relacoes autoritárias. Ao operário, instrumento eficiente da serventia especializada, resta a subordinação total aos "alíruistics managers'\ seguindo rigidamente o ritmo dos como representante da ciência, mas como representante de uma caricatura da ''''mestres cronometristas , condutores dos processos de trabalho. Não procura descobrir e confrontar a causa dessa condição, mas a aceita como gerência nas armadilhas da ciência. (BRAVERMANN, 1977, p. 82-3) No esquema íeórico de Taylor, como bem aponta Tragtenberg (1977), paralelamente à desqualificação do trabalho e à crescente alienação do sujeito dividido, é dada ênfase à estrutura monocrática da organização, na qual prevalece a racionalização. Taylor encara a organização social da produção como uma organizacão estritamente formai, em que é valorizada a obediência e em que são recusadas todas as relações não prescritas no conteúdo funcional. Taylor valoriza o elitismo intelectual da administração, a serviço do capitalismo, ao mesmo tempo em que propõe o controle cerrado e rigoroso sobre o trabalhador. Colocando o lucro como razão de ser da gerência, projeta a ciência da administração sobre uma base racional e próspera. A síntese do controie sobre os trabalhadores, alienando-os do processo de escolha e tolhendo-lhes a liberdade individual, resulta do fato de que a gerência taylorista não só exige que o trabalhador faça o que tem a fazer, como o impede de fazer outra coisa. A racionalidade dá à obrigação um caráter místico, legitimando-a, ao mesmo tempo em que se encontra delimitada, segundo interesses autoritários. A gestão taylorista domina amplamente o campo das experiências interindíviduais, de forma que aos operários são impingidos todos os atos, dentro ou fora do âmbito do trabalho, institucionalizando a relação de submissão. Tal relação permite institucionalizar a obediência em nome da autoridade necessária. Isto implica exprimir a autoridade racional mascarando o poder, em seu aspecto coercitivo e ma- nipulador, encobrindo a luta pelo reconhecimento, os conflitos e seu resultado mais imediato: a vitória de uma categoria de chefes que se julga possuidora da organizacão porque define suas orientações, canalizando os esforços individuais no trabalho organizativo. Como as tarefas são fragmentadas e o trabalhador deixa de ser utilizado como ser humano, pois importam mais suas qualidades bovinas, a gerência recorre à criatividade e à capacidade do operário em proporções insignificantes. Com isto, a organização científica do trabalho reforça a divisão entre uma elite administrativa e uma massa de trabalhadores: à primeira, apta ao comando, é dada a inteligência e, quem sabe, a bondade de simplificar o trabalho; à segunda, inapta à inteligência, é oferecida a liberdade de trabalhar ou não naquelas condições. A racionalização taylorista, com efeito, na medida em que não acarreta grandes consequências, não modifica a ordem das coisas, não implica alteração na 2 A CONCEPÇÃO DE HENRY FORD Henry Ford foi ao mesmo tempo um visionário e um empresário industrial que se assemelha ao modelo de capitalista descrito por Marx. Suas concepções acerca da integração produtiva, do sistema em escala da produção (linha de montagem) ou produção em massa, da redução dos tempos mortos, do gerenciamento do processo de produção (especialmente do sistema de aquisição, distribuição e emprego de matéria-prima, peças e componentes), da gestão do desperdício e do sistema geral da produção e da realização do valor excedente, antecede toda a atual formulação do chamado modelo toyotista de produção. H. Ford tem uma concepção pioneira sobre o que hoje se chama de just-in-time, kanban e produção integrada, terminologia atribuída a um novo modelo ou processo de gestão mas cuja operacionalidadejá se encontrava por ele explicitada. (FORD, 1922; 1926a; 1929) Não formula princípios de produção flexível, talvez até porque a mesma, em qualquer circunstância, seria impossível à época. Mas, uma leitura de suas reflexões e de sua visão da indústria permitem reassegurar (FARIA, 1992), sem qualquer dúvida, que o chamado modelo toyotista não é senão um taylorismo-fordismo de base microeleïrônica, um taylorismo-fordismo computadorizado, um taylorismo-fordismo enver- nizado, acrescido de um modo de gestão dos empregados sustentado nas ideias de Douglas McGregor (1960), as quais incentivam os teamwork e permitem que se operacionalize a concepção de trabalhador flexível em lugar do trabalhador especializado, típico do fordismo. E, de qualquer modo, bastante estranho que alguns pesquisadores que se debruçaram sobre esta questão não tenham considerado em suas análises os fundamentos da concepção de H. Ford e de McGregor e insistam em considerar o modelo japonês como sendo original (KAPLINSKY, 1988; KENNEY ana FLORIDA, 1988; SCHONBERGER, 1982; SUG1MORI et aüi, 1977), enquanto o próprio proponente do just-in-time reconhece a influência de H. Ford. (OHNO, 1987) Diferentemente do taylorismo, que se concentra nos modos de operacionalizar a produção em termos de unidades produtivas, o fordismo tem um alcance que ultrapassa a fábrica, tomando-se a expressão política da acumulação capitalista,