A PALAVRA E AS COISAS Michel Foucault escreveu a respeito das diferenças radicais a seu ver existentes entre as formas de pensar do mundo antigo e moderno. Esse autor observou que, enquanto o pensamento antigo se pautava nitididamente pela busca de similitudes entre as coisas e os fenômenos do mundo, o pensamento ocidental moderno procurou sempre estabelecer entre elas as identidades e as diferenças. Todo racionalismo desenvolvido na Europa no século XVII, em vez de aproximar as coisas e os fenômenos entre si, tratou de separá-los, analisa-los discernindo suas identidades próprias e até o grau de suas diferenças. . Essa tendência resultou três séculos de pensamento, na qual se buscou diferenciar as formas que o homem tem de conhecer e explicar o mundo O século XVII já anuncia uma nova maneira de pensar. Para ilustrar essa questão, Foucault cita a influência de Francis Bacon, com sua visão de um futuro científico já desligando-se das formas da similitude, e Descartes, inaugurador da era do sujeito e, portanto, da era do método e da análise na história da filosofia, nas modificações do pensar ocidental. Passa-se de uma mentalidade da similitude para a mentalidade da diferença: “A atividade do espírito […] já não consistirá portanto em aproximar as coisas […] mas em discernir […]. Nesse sentido, o discernimento impõe à comparação a procura primitiva e fundamental da diferença” (FOUCAULT, 1967, p. 82) Até o fim do século XVI, a semelhança desempenhou um papel construtor no saber da cultura ocidental. “No começo do século XVII, nesse período que, com razão ou não, se chamou barroco, o pensamento cessa de se mover no elemento semelhança. A similitude não é mais a forma do saber, mas antes a ocasião do erro, o perigo ao qual nos expomos quando examinamos o lugar mal esclarecido das confusões” (p. 70). “Encontra-se, já em Bacon uma crítica da semelhança” “A atividade do espirito – e este é o quato ponto – não mais consistirá, pois, em aproximar as coisas entre si, em partir em busca de tudo o que nelas possa revelar como que um parentesco, uma atração ou uma natureza secretamente partilhada, mas ao contrário, em discernir: isto é, em estabelecer as identidades, depois a necessidade da passagem a todos os graus que delas se afastam. Nesse sentido, o discernimento impõe à comparação a busca primeira e fundamental da diferença: obter pela intuição um representação distinta das coisas e apreender claramente a passagem necessária de um elemento da série àquele que se lhe sucede imediatamente. Enfim, última consequência, já que conhecer é discenir, a história e a ciência vão se achar separadas uma da outra” (p. 76) MODERNIDADE EM FOUCAULT Modernidade corresponde a um determinado éthos, a ―uma maneira de pensar e de sentir, e também uma maneira de agir e de se conduzir que, ao mesmo tempo, marca um pertencimento e se apresenta como uma tarefa‖ (FOUCAULT, 2006b, p. 568). ______. Qu'est-ce que les Lumières? In: ______. Dits et écrits IV (1980-1988). Paris: Gallimard, 2006b. p. 562-578.