Comunicação Integrada de Marketing – aspectos históricos e teóricos sobre um pretenso novo conceito. Autor: Luís Roberto Rossi Del Carratore Publicitário graduado pela CÁSPER LÍBERO (São Paulo-SP), mestre e doutor em Comunicação pela UNESP (Bauru-SP); professor adjunto da UFRN (Natal-RN); pesquisador nas áreas de Comunicação publicitária, Mídia e Marketing. Coordena o grupo de pesquisa ‘Imagem, Mercado e Tecnologia’ do Depto. de Comunicação da UFRN. Email: [email protected] Introdução: O tema que ora vamos analisar – comunicação integrada de marketing – pode ser enquadrado em mais um desses tópicos que, a exemplo de inúmeros outros assuntos mercadológicos, são apresentados como grandes novidades teóricas ou inovações conceituais, mas que, no fundo, são meras atualizações de conceitos já existentes, só que revestidos de uma nova roupagem. O mais interessante é notar que, de um dia para o outro, o tema tomou conta das pautas de reuniões dos profissionais, tornando-se assunto imprescindível nas monografias acadêmicas, sugestionando título de livros, teses e artigos, virando tema de seminário e palestras e por aí vai. Mas, afinal de contas, por que podemos afirmar, com alguma segurança, que a noção de comunicação integrada de marketing (CIM) é supostamente uma novidade não tão nova assim? Parte da resposta está no próprio entendimento da função da publicidade e de sua natureza essencialmente comunicacional. Em outras palavras, lidar com comunicação mercadológica é reconhecer a importância da tarefa de adequação de linguagem em benefício da construção de marcas. Nisso, aliás, não há nada de novo. O que mudou, então, se os mesmos pressupostos da teoria já existiam e eram difundidos, aqui mesmo no Brasil, desde os anos 70? O que fizeram com os ensinamentos de experientes profissionais como Ricardo Ramos, Roberto Simões, Sérgio Dias, Ivan S. Pinto e tantos outros? Vamos tentar esclarecer estas e outras questões, por meio de uma exposição histórica do tema, na visão de importantes teóricos e especialistas da área, pois é inegável que os limites entre os campos da publicidade e do marketing estão ficando cada vez mais tênues, se é que ainda existem. Diversos são os teóricos que defendem uma aproximação entre as funções da propaganda e as ações de marketing. Nessa linha de pensamento, a propaganda não pode mais ser vista como um mero instrumento ou ferramenta de marketing, com seus planos e diretrizes subordinados às decisões mercadológicas. Apesar disso, a proclamação – há muitos anos atrás – da necessidade de interação entre o marketing e a propaganda, pouco conseguiu em termos de solucionar a questão na prática das organizações. O que se apresenta, agora, de forma mais consistente e elaborada, é a noção da comunicação integrada de marketing, na qual a publicidade assume uma nova função e se integra com outras tarefas no claro propósito de garantir a prioridade e a sustentação das organizações e, especialmente, de suas marcas. As discussões que se seguem apresentam um pouco da trajetória histórica da propaganda1 no contexto de comunicação de marketing. Percurso histórico da relação entre Marketing e a Publicidade Ainda no início dos anos 70, Robert Leduc (1972, p. 219) ensinava que a “prática da propaganda deve seguir um processo ordenado”, advertindo também que ela deveria se adaptar constantemente à realidade do mercado, uma vez que as situações não são nunca as mesmas. Conforme Leduc, a ação publicitária é estudada na elaboração do plano de propaganda, que orienta a elaboração da campanha publicitária integrada em um orçamento definido. O plano, no entanto, deve ser entendido como a apresentação por escrito das etapas do planejamento, isto é, o documento repositório das informações contidas no planejamento. A elaboração do plano de propaganda se opera, na opinião de Leduc (1972, p. 220-221), em quatro fases: A primeira fase é consagrada à análise da situação comercial; a segunda, à consecução da estratégia publicitária; a terceira fase é a de preparação do plano detalhado de ação; e a quarta se refere à execução e ao controle da propaganda. Uma das considerações mais relevantes feitas por Leduc, no entanto, é sobre a integração da propaganda ao marketing, segundo a qual esse plano de propaganda faz parte de um plano mais amplo, o plano de marketing, que encerra ações comerciais como o programa de força de vendas, o de política de produtos, de preços, de distribuição, dentre outros. O livro “Comunicação Publicitária” (SIMÕES et al., 1972), um dos pioneiros no país e também um dos mais completos sobre propaganda, condensa de maneira organizada o pensamento e a experiência dos principais nomes da publicidade da época. É uma espécie de ‘radiografia’ da propaganda brasileira, do ponto de vista dos principais estudiosos e profissionais da área. Nele, encontramos capítulos específicos sobre cada etapa do trabalho de comunicação publicitária, sempre na visão de um especialista numa determinada área. Coube, assim, ao professor Francisco Gracioso a tarefa de comentar o planejamento de campanha, no qual procura elucidar as funções da propaganda no conjunto de esforços de marketing, acrescentando que os objetivos gerais de marketing jamais poderiam ser atingidos com o emprego unicamente da propaganda, pois “vendas e distribuição são fatores importantes, da mesma forma que a embalagem e as exposições no ponto de venda. O preço também é vital, sem falar naturalmente do próprio produto, do qual tudo depende, em última análise” (SIMÕES et al., 1972, p. 158). Mais adiante, Gracioso destaca a necessidade da integração das informações, comentando que o primeiro dado que o planejador de comunicação deve buscar são “os objetivos globais de mercado e a função reservada à propaganda, na estratégia de marketing do anunciante” (SIMÕES et al., 1972, p. 160). Noutro capítulo da mesma obra, temos Ivan S. Pinto abordando a propaganda como função de marketing, trazendo em seus comentários a relação entre ambos que, segundo ele, não é de 1 Para facilitar a compreensão do assunto, assumiremos os termos Publicidade e Propaganda como sinônimos, a despeito de suas diferenças etimológicas e conceituais. subordinação direta no sentido de dependência, mas de integração. Para Pinto, “propaganda e marketing são atividades exercidas em benefício de empresas e custeadas pelas empresas. Assim como não há muito sentido em abordar a propaganda fora do controle de marketing, não tem significado examinar a idéia de marketing desligado da noção de empresa”. (SIMÕES et al., 1972, p. 67). Admitindo que o conjunto de informações provindas do próprio produto e das forças mercadológicas da empresa contribui para compor um ‘conceito de marca’, autor desloca o ângulo da abordagem estratégica de marketing, enfocando-o como um problema de comunicação, do tipo comunicação persuasiva, que visa influenciar atitudes e mobilizar os comportamentos e condutas. Mas, segundo ele, se trata de comunicação e, portanto, tem também suas limitações: esbarra na afetividade e na complexidade de traços de personalidade que caracterizam cada consumidor e o torna ativo, a ponto de canalizar sua atenção para as informações que mais se ajustam à sua conveniência individual e interesses subjetivos. Além disso, Pinto reconhece que nem todas as informações formadoras da atitude mental para com a marca, ou conceito de marca, provêm da empresa. Ao contrário, sofrem incessantes influências do meio social mais amplo, onde o indivíduo constrói seu repertório, sua escala de valores, enfim, sua cultura. Somente após observar todos esses aspectos é que Pinto insere a propaganda no contexto de marketing, afirmando que o seu “papel no conjunto dos instrumentos estratégicos da empresa já pode ser isolado” (SIMÕES et al., 1972, p. 69), acrescentando que a eficiência da propaganda medese pela sua capacidade de conseguir um tipo de resultado; nesse sentido, não convém tentar relacioná-la diretamente com resultados de vendas. Finalizando suas considerações, Pinto concebe o marketing como a procura de oportunidades de comunicação e, especialmente no caso de bens de consumo indiferenciados, ou de qualidades equivalentes, a busca de oportunidades de propaganda, onde um produto de indústria passa a ser, inevitavelmente, um produto de comunicação publicitária. Nesse ponto, identifica-se a chave para o entendimento da relação entre marketing e propaganda: a integração. No início dos anos 80, outros profissionais e teóricos também discutiram a relação entre o plano de comunicação publicitária e o plano de marketing. Um deles é Plínio Cabral (1984), observando que o plano integrado de marketing se desdobra em plano de vendas, plano de propaganda, plano de promoções, dentre outros. Dessa forma, Cabral esclarece que a estratégia geral e as táticas de ações de comunicação decorrem das diretrizes do marketing. O planejamento publicitário deve, segundo ele, possuir as seguintes características; ser simples, sintético, ter objetividade, clareza e estruturação em etapas a serem cumpridas. Detalhando um pouco mais a questão, Cabral (1984, p. 36) explicita melhor a sua opinião sobre o assunto: Um plano de marketing deve ser objetivo, fixando metas a serem atingidas e meios para realizá-las. Pode ter cem páginas ou apenas uma página. Depende da empresa, depende do produto, depende do mercado. Na verdade, segundo conceito clássico, a função do marketing seria bastante simples: identificar as necessidades do cliente... O plano de propaganda decorre do plano de marketing e do plano de vendas. Do primeiro resulta a estratégia de comunicação; do segundo, as metas e objetivos [de mercado]... O planejamento publicitário não gravita propriamente em torno de anúncios. Ele é mais amplo, acompanhando o próprio planejamento da empresa. Cabral insere, portanto, a propaganda no plano de marketing e de vendas, considerando-a uma resposta aos problemas de comunicação mercadológica, reconhecendo que a característica essencial de uma campanha de propaganda não é a multiplicidade de peças ou anúncios ligados pelo mesmo tema, mas a “difusão de mensagens com o objetivo claro de alcançar determinadas metas, cumprindo as etapas do plano de vendas” (CABRAL, 1984, p. 38). Ele adota o conceito de ‘plataforma de comunicação’ para expressar sua noção de plano integrado que agrega os esforços de publicidade vinculados ao plano de marketing: Na propaganda não se vende nem se compra um anúncio, um comercial, uma campanha. Compra-se um conceito que será posto a funcionar e cujos resultados dependem de uma série de fatores que se devem conjugar (...) A propaganda, integrando o plano de marketing, faz a sua parte. Mas outros setores neste front devem, também, cumprir suas tarefas com eficiência no sentido de que a força de vendas atue como um todo. (CABRAL, 1984, p. 38). Ricardo Ramos talvez seja um dos mais enfáticos ao tratar da questão da integração entre a propaganda e o marketing. Há quase três décadas, Ramos escreveu: (...) Sendo assim tão remota e dominante, por que alguns teimam em achar a propaganda um trecho do tão recente marketing e a ele atrelada? Ora, sabemos que o marketing, por definição, compreende “as atividades que encaminham o fluxo de mercadorias e serviços, partindo do produtor até os consumidores finais”. Isso traz implícito o planejamento de ações, e nesse conjunto se insere naturalmente a propaganda. O fato dela ser parte do plano de marketing, entretanto, não a subordina. A propaganda é anterior, secularmente, a quaisquer formulações de marketing, aliás novíssimas, e se a elas preexiste independe. Pode inserir-se, obviamente, em dado esforço coordenado que se dirige ao mercado, como a ele correr paralela ou mesmo alheia. Para aceitarmos a procedência do marketing, seria preciso encará-lo não em seus limites reais de técnicas ou funções, mais no rumo da comercialização, e sim vermos nele uma verdadeira panacéia, admitir formulações tão abrangentes que chegam a ser ingênuas. (RAMOS, 1985, p.13). Mais adiante, na mesma obra, o teórico volta a falar do assunto, mas agora do ponto de vista do planejamento de ações: (...) Certamente o plano de propaganda se inscreve no planejamento geral de marketing, já que a publicidade é um trecho dos esforços de comercialização de um determinado produto. Sob esse aspecto, não há dúvida de que não apenas ela não pode divergir da orientação mercadológica da empresa, como deve apoiá-la e, se possível, reforçá-la. De que modo? Aqui precisamos esclarecer alguns pontos controversos e mesmo antagônicos. Os homens de marketing sempre gostam de falar em subordinação da propaganda, em atrelamento dela ao marketing, que a moldaria em todos os seus passos. Do prisma de planejamento, seria compreensível e até aceitável. Mas, reconheçamos, é uma visão formal e mecanicista da propaganda (...) Quando falamos de marketing, falamos de funções e atividades. As decisões de propaganda, tomadas pela empresa na sua comunicação com o mercado, de referem a vozes e imagens. São naturezas diferentes. Mesmo que se tome o planejamento global, a publicidade aparecerá dentro dele (decerto que acorde, em perfeita sintonia), não como o ângulo da empresa, nas suas obras, mas como o do consumidor, nas suas palavras, feito o seu reconhecimento e a sua representação. Desse modo, será tão estranho falar em subordinação, em atrelamento, como na supremacia do marketing. Ainda que a ele associada, a propaganda tem uma visível independência. (RAMOS, 1985, p.46). O fato é que Ramos, com sua postura crítica, traça um caminho daquilo que deveria ser prática comum no mercado profissional: a integração entre propaganda e marketing. O ideal por ele sugerido seria o de uma relação sem barreiras nem divisas, sem brigas orçamentárias e, tampouco, subordinação ou dependência. Ao contrário, o propósito seria atender aos interesses comuns, com objetivos sintonizados, estratégias e táticas harmoniosas e, finalmente, com uma visão orquestrada de funcionamento em conjunto. A oportunidade que se abriu ao marketing, na ocasião, foi a diferenciação e o posicionamento dos produtos e serviços, via comunicação integrada. Apesar disso, não foram todas as organizações e profissionais que levaram tais ideias adiante. Já adentrando nos anos 90, Don Schultz, Stanley Tannenbaum e Robert Lauterborn, especialistas em comunicação integrada, afirmaram que, num mercado de paridades, a única característica diferenciadora que uma empresa podia oferecer aos consumidores é o que esses consumidores acreditam a respeito da empresa, do produto ou do serviço e o relacionamento deles com a marca. “O único lugar em que existe o valor real do produto ou marca é dentro da mente dos clientes ativos ou potenciais. Todas as outras variáveis de marketing, tais como projetos de produto, formação de preços, distribuição e disponibilidade, podem ser copiadas, duplicadas ou superadas pelos concorrentes.” (SCHULTZ et al., 1998, p.49). Schultz e seus parceiros ensinam que o valor real de marketing está percepção da chamada ‘rede mental’ dos consumidores sobre a marca. É o que esses consumidores, de fato, acreditam e sonham. Diante dessa realidade, entendem que a única vantagem competitiva sustentável das empresas, no século XXI, é a integração das comunicações de marketing, assim definido: “todo o conceito das comunicações integradas de marketing está baseado no modo como os consumidores armazenam informações de categoria, produto e marca” (SCHULTZ et al., 1998, p.53). Nas considerações dos especialistas norte-americanos, é muito importante o entendimento das ‘redes mentais’ que os consumidores constroem em suas cabeças, pois a tarefa da comunicação é estabelecer contatos – de mão dupla, no sentido de troca de informações – com o objetivo de alterar ou reforçar os conceitos favoráveis armazenados, combatendo as mensagens dos concorrentes. Eles sugerem que modelo para o planejamento de comunicações integradas de marketing seja diferente das abordagens tradicionais, a começar pelo foco: a nova abordagem propõe que o ponto de partida seja o consumidor, o cliente ativo ou potencial, e não as metas de vendas e de lucro. A partir da segmentação do consumidor – com base em aspectos demográficos, psicográficos, de histórico de compras e de rede de categorias – as etapas subseqüentes do planejamento de comunicação integrada seriam (SCHULTZ et al., 1998, p. 69-74): - Gestão de contatos: baseada na idéia da necessidade de se encontrar um período, um lugar ou uma situação em que seja possível a comunicação com o cliente ativo ou potencial; - Elaboração da estratégia de comunicação: que envolve a definição dos objetivos de marketing e de comunicação a ser distribuídos conforme o contexto (gestão do contato) na qual ela aparecerá; - Definição das ferramentas de marketing: que consiste no selecionamento das ferramentas de comunicação que melhor se propõem a atender aos objetivos de marketing estabelecidos; - Definição das táticas de marketing: que é a escolha das técnicas que auxiliarão a cumprir as metas preestabelecidas nos objetivos de comunicação. Como conclusão do processo, os autores explicam que o real valor de seu modelo reside no fato de ter uma natureza circular, isto é, a empresa anunciante desenvolve os programas de comunicações, o cliente responde e, novamente, a empresa reelabora novas informações baseadas na resposta, num processo de contínua adaptação e relacionamento. Ressaltam, também, que o elemento fundamental da comunicação integrada de marketing é o banco de dados e as informações nele contidas sobre os consumidores e seu comportamento. Ele explica que o comportamento, em termos de comunicação integrada, “é qualquer atividade mensurável pelo cliente ativo ou potencial que: a) desloca essa pessoa para mais perto de uma decisão de compra a favor da marca visada ou; b) reforça os padrões de compra favoráveis existentes”. (SCHULTZ et al., 1998, p.119). “Deveria ficar claro, contudo, que o conceito de comunicação integrada de marketing está fundamentado num contínuo de formação de relacionamentos ao longo do qual clientes ativos e potenciais se movimentam à medida que os relacionamentos deles com as organizações se desenvolvem. E também deveria ser evidente que nessa abordagem deve ocorrer algum tipo de comportamento mensurável”, destacam Schultz, Tannenbaum e Lauterborn (1998, p.134), reconhecendo, finalmente, que cada organização deve construir a grade de medição ou o contínuo de medição que melhor se adapte a seu produto ou serviço e mercado. Nos EUA, aliás, a questão da comunicação integrada parece ter sido evidenciada há muito tempo, como pode ser observado nos comentários dos teóricos Lewis e Nelson (2001, p. 16): Um fato bastante agradável que vem ocorrendo desde 1985 é o desaparecimento da natureza competitiva que separava as várias disciplinas de propaganda e marketing. Não é preciso ter muita idade para lembrar o comportamento do tipo ‘não invada meu quintal’, as suspeitas e falatórios que surgiam quando um profissional de marketing resolvia utilizar anúncios veiculados na mídia, marketing direto, relações-públicas e promoções tais como em pontos de venda. Eles destacam que o fator determinante das mudanças nas relações entre a propaganda e o marketing foi a percepção de que as agências estavam perdendo o controle parcial ou total sobre campanhas de marketing. Como resultado do processo, houve as fusões entre agências de propaganda e empresas especializadas em outros aspectos de marketing, traduzindo-se em benefícios para todos os envolvidos - profissionais de marketing e publicitários. Nas palavras dos especialistas, “foi a integração incondicional das várias disciplinas sem animosidade, ciúme ou menosprezo por um caminho útil comum. No século XXI o termo agência de propaganda pode bem ser substituído por outro mais adequado e eficaz: agência de marketing”. (LEWIS e NELSON, 2001, p.17). Philip Kotler, por sua vez, reconhece que o marketing necessita de constantes atualizações. Dentre elas, destaca a importância do marketing holístico, em detrimento do marketing tático, conforme as seguintes orientações (KOTLER, 2000, p. 50): Participação nos clientes: deixar de se concentrar no ganho de participação de mercado e passar a se concentrar no aumento da participação em cada cliente. As empresas oferecem uma variedade maior de produtos aos clientes existentes. Elas treinam seus funcionários em vendas cruzadas (venda de produtos relacionados) e vendas de produtos mais sofisticados. Marketing para mercados-alvo: deixar de tentar vender para todos e procurar se tornar a empresa que melhor atende mercados-alvo bem definidos. O marketing para mercados-alvo está sendo facilitado pela proliferação de revistas, canais de TV e grupos de discussão na Internet, todos voltados para interesses específicos. Individualização: deixar de vender o mesmo produto da mesma maneira a todos no mercadoalvo e passar a individualizar e customizar mensagens e ofertas. Os clientes poderão escolher as características de seu produto nas páginas Web das empresas. Banco de dados de clientes: deixar de coletar dados de vendas e passar a elaborar um data warehouse rico em informações sobre compras, preferências, demografia e lucratividade de clientes individuais. As empresas podem 'garimpar dados' em seus bancos de dados para detectar diferentes agrupamentos de necessidades de clientes e fazer ofertas diferenciadas a cada agrupamento. Comunicação integrada de marketing: deixar de depender quase exclusivamente de uma só ferramenta de comunicação, como a publicidade ou a força de vendas, e passar a combinar várias ferramentas para proporcionar uma imagem de marca consistente aos clientes a cada contato que eles tiverem com a marca.2 Canais de distribuição como parceiros: deixar de tratar os intermediários como clientes e passar a tratá-los como parceiros na entrega de benefícios a clientes finais. Todo funcionário é um profissional de marketing: deixar de pensar que o marketing é realizado apenas pelas equipes de marketing, vendas e atendimento ao cliente e passar a reconhecer que todos os funcionários devem se concentrar no cliente. Tomada de decisões baseada em modelos: deixar de decidir com base em intuição ou a partir de dados inconsistentes e passar a embasar decisões em modelos e fatos relacionados ao modo como o mercado funciona. Kotler admite que, por meio da adoção dessas novas propostas, as empresas podem tornar-se mais competitivas. “Empresas bem-sucedidas serão as que puderem impor a suas estratégias de marketing o mesmo ritmo de mudança de seus mercados – e de seus espaços de mercado”. (KOTLER, 2000, p. 51). Comenta, também, que muitas empresas ainda confiam em apenas uma ou duas ferramentas para atingir seus objetivos de comunicação. Apesar da proliferação dos novos tipos de mídia, da crescente sofisticação tecnológica, do aumento das exigências dos consumidores e da segmentação dos mercados de massa em uma infinidade de microsegmentos, cada um deles exigindo uma abordagem específica, a prática do isolamento e da fragmentação ainda persiste. Ainda segundo o renomado autor, a ampla gama de ferramentas de comunicação, mensagens e públicos torna obrigatório que as empresas se encaminhem para uma comunicação integrada de marketing que, conforme a definição da American Association of Advertising Agencies, é (KOTLER, 2000, p. 582): Um conceito de planejamento de comunicação de marketing que reconhece o valor agregado de um plano abrangente que avalie os papéis estratégicos de uma série de disciplinas da comunicação – por exemplo, propaganda geral, resposta direta, promoção de vendas e relações públicas – e combine-as para oferecer clareza, coerência e impacto máximo nas comunicações por meio de mensagens discretas integradas de maneira coesa. A comunicação integrada de marketing, segundo Kotler, tem como benefício o fato de transmitir uma forte coerência da mensagem, que produz enorme impacto nas vendas. “Ela cria responsabilidades – onde antes não existiam – para unificar as mensagens e imagens de marca da empresa, à medida que liga milhares de atividades da empresa”, conclui Kotler (2000, p.589). 2 Grifo nosso, com o intuito de destacar a proposta de Kotler sobre comunicação integrada de marketing. Recorrendo novamente a Francisco Gracioso que escreveu, num artigo intitulado “A nova era da comunicação total”3 que, de fato “estamos apenas ingressando em uma nova era da comunicação com o mercado, que alguns chamam de comunicação total. Ela inclui a propaganda clássica, como é natural, mas vai muito além dela e poderá ter sérias conseqüências sobre a atual estrutura dos negócios publicitários” (GRACIOSO, 2003, p.42). Em síntese, Gracioso diz que a comunicação total ou comunicação integrada de marketing consiste no uso combinado de todas as formas de comunicação para atingir alvos de consumidores determinados. Destaca, inclusive, o uso combinado de mídia e entretenimento como forma de criar uma nova dimensão da comunicação. Entende que a propaganda, pouco a pouco, deixará de ser a principal forma de comunicação com o mercado. E as grandes decisões sobre o papel e forma de utilização da propaganda não serão mais tomadas nas agências de comunicação. Afirma, também, que as forças que interagem com o consumidor são, atualmente, mais difusas, variadas e sutis do que as técnicas promocionais do passado recente. A comunicação integrada, enfim, vai muito além das campanhas publicitárias e não se restringe às ações de promoção de vendas, de relações públicas ou de merchandising, pois seu escopo de atuação é mais abrangente e se apóia em dois recursos fundamentais: marcas globais e tecnologia de ponta. Atualmente, aceita-se que compete à comunicação integrada de marketing estudar o conceito do produto, compreender o que leva uma pessoa a comprá-lo e utilizar essas informações de forma coerente nas diversas ferramentas de comunicação. Esta seria, segundo o professor Gracioso, a maneira mais apropriada de espelhar na comunicação os desejos e necessidades do consumidor e obter eficácia no marketing para a organização. Rafael Sampaio, analisando a propaganda em função do branding isto é, do enfoque da gestão da marca, afirma que a comunicação integrada de marketing tem importância fundamental na construção e manutenção das marcas e no processo de branding, mas “não a comunicação parcial de uma ou outra de suas ferramentas, mas a comunicação total do conjunto de suas disciplinas e mensagens.” (SAMPAIO, 2002, p.101). Sampaio se refere a uma comunicação que precisa estar integrada à nova dinâmica do mercado, do marketing e das mídias, além de seguir uma série de características gerais para poder realizar com eficácia as tarefas comunicacionais específicas que lhes cabe no contexto de marketing e das marcas. A nova dinâmica do processo de comunicação a que o teórico se refere, na sociedade contemporânea, envolve alguns pontos fundamentais do panorama da comunicação, conforme o seguinte (SAMPAIO, 2002, p.102-103): - Menor controle sobre a recepção: a segmentação e fragmentação das fontes emissoras da comunicação estão inviabilizando o controle da recepção pelos consumidores, ao contrário do que aconteceu durante quase todo o século passado; - Tendência à entropia é mais forte: a tendência natural de entropia da mensagem – segundo a lei da Física, que estabelece que todas as emissões de energia tendem a entrar em processo de desordem – aumenta ainda mais que o natural. Nesse sentido, Sampaio acredita que mensagens comerciais pensadas para trafegarem em certa ordenação lógica e, por sua vez, 3 Artigo publicado na Revista Marketing, nº 340, Maio 2003, p.39-46. serem recebidas em determinado contexto e com certa predisposição do público, acabam chegando truncadas, sendo percebidas de forma distorcida e entendida em condições nem sempre favoráveis, quando não desfavoráveis, de exposição e entendimento; - Aumento do controle sobre a emissão: como única forma de reduzir um pouco a situação entrópica desfavorável para quem emite comunicação. Sampaio considera isto absolutamente lógico, pois, caso contrário, a comunicação resultaria numa ‘balbúrdia’, posto que já é emitida de forma um tanto desordenada, e além disso, enfrenta a entropia do meio ambiente e os ruídos inerentes ao processo e, finalmente, é recebida de forma desorganizada e absorvida de qualquer jeito; - Uso da força centrípeta da integração e da ação holística para atuar contra a entropia do conjunto: considerando-se que existe uma situação de entropia no conjunto do transmissão, recepção e absorção das mensagens, o controle desse processo tem sérias limitações e é fundamental que a emissão seja muito bem ordenada, para que a desordem total não se estabeleça no final do processo. Para controlar a entropia, utiliza-se a força centrípeta que, no caso da comunicação, se revela em duas fontes: a) a integração sinergética de cada mensagem de comunicação que complementa e reforça todas as demais da mesma marca ou empresa; b) a ação holística, de caráter mais amplo e geral, encontrada nos elementos integradores das diversas mensagens que criam uma unidade de comunicação, mesmo quando se utilizam formatos diferentes e conteúdos diversos; - A imagem de marca é formada na mente de cada consumidor: outra particularidade da dinâmica da comunicação é que a comunicação não é aquilo que se emite, mas o que se recebe, entende e percebe. Na situação de mercado atual, porém, não é sempre que aquilo que a empresa ou marca comunica é o mesmo que o consumidor entende. Como a imagem de marca real é aquela que é efetivamente formada na cabeça de cada consumidor, e não a que se estabeleceu nas estratégias de comunicação, é fundamental que se faça uma comunicação adequada que contemple, ao mesmo tempo, a intenção do anunciante e a verdade do consumidor; - A comunicação mais forte é a da ação: é preciso considerar que as ações comunicam mais que as palavras. De nada adianta campanhas e mensgens persuasivas e encantatórias se isso não corresponder à verdade de seus atos, nem se traduzir nas suas relações com seus colaboradores e outros públicos de interesse. Qualquer aparente contradição, por menor que seja, pode afetar as percepções da imagem da marca que se procura construir; - Segmentação e fragmentação: de um modo geral, a tendência que se observa é que a comunicação de massa segmenta-se e a comunicação segmentada fragmenta-se. Isso ocorre tanto no aspecto dos meios de comunicação em si e de seus veículos, como no caso da comunicação de marketing. Neste caso, o fenômeno atende duplamente ao movimento de segmentação e fragmentação do mercado (com reflexos diretos sobre os produtos, serviços e suas marcas) e das novas oportunidades de mídia.. Estas e outras circunstâncias estão envolvendo e intensificando decisivamente as relações entre organizações e seus mercados-alvo. Nesse sentido, Sampaio (2002, p. 108) expõe as cinco características fundamentais da comunicação integrada de marketing: 1- 2- 3- 4- 5- Aplicar a inteligência estratégica. É adotar o planejamento com base nos seguintes pontos: refletir a realidade da empresa, da marca, dos consumidores e do mercado; economia da criatividade; eficácia da interatividade; força da integração e prêmio da ousadia e inovação na comunicação. Seguir os princípios básicos da comunicação. É utilizar os mesmos princípios gerais da comunicação aplicados ao branding, tais como: relevância do target; pertinência à marca; princípio da tarefa dupla, isto é, a comunicação precisa cumprir os seus objetivos e, ao mesmo tempo, desempenhar sua tarefa no branding em favor da imagem da marca e, por fim, adequação entre meio e mensagem. Usar a linguagem do consumidor. Envolve, basicamente, questões como: considerar as variáveis pessoais e individuais dos segmentos; combinar razão e emoção e, finalmente, ouvir o consumidor. Usar a ferramenta certa na hora certa. Significa adotar todas as ferramentas mercadológicas que, cada qual em seu papel, garantam a construção da franquia das marcas; estabeleçam relacionamentos e impulsionem os negócios. Ser mensurável com precisão. É usar a pesquisa com propriedade e eficácia, admitindo que para medir objetivos diferentes, é necessário empregar medidas e procedimentos diferentes. James R. Ogden, autor da obra “Comunicação Integrada de Marketing: modelo prático para um plano criativo e inovador” (2002), afirma que, no mercado competitivo de hoje, empresas e profissionais de marketing devem certificar-se de que as mensagens de suas comunicações, que chegam aos consumidores, sobre produtos e serviços sejam claras, concisas e integradas. Em outras palavras, cada membro da organização envolvido no marketing e na comercialização de um produto ou serviço deve transmitir ao consumidor a mesma mensagem. Essa consistência de informações a que o teórico se refere pode ser ilustrada no seguinte exemplo: Imagine-se em um supermercado, procurando uma marca específica de molho de tomate. Ao passar pelas prateleiras, você pode ver muitos rótulos. O que faz com que você escolha uma marca em especial entre tantas outras? É a embalagem? Ou talvez seja por causa do próprio nome da marca? Ou, ainda, será devido à posição do produto de tal marca na prateleira? Quem sabe você leu sobre o produto no jornal? Ou será que o viu na televisão? Afinal, não foi um amigo que o recomendou? Ou na verdade o que aconteceu foi que aquele seu amigo disse não ter gostado de uma ou duas das outras marcas? O supermercado tem a marca que você está procurando? O preço lhe parece atraente? Não há apenas uma resposta certa. Uma ou todas essas razões fizeram com que você escolhesse aquela lata específica de molho de tomate. Na verdade, muitas outras variáveis podem ter influenciado sua decisão. No final das contas, é sua percepção geral em relação ao produto que o impele à decisão de compra. (...) Na posição de consumidor, você pensa em todos os elementos envolvidos na produção do molho de tomate, desde o proces samento até os recursos humanos? Do departamento jurídico ao de logística? Claro que não. Você não olha para aquela latinha e diz: ‘Uau, olha só que belo trabalho desses contadores!’, ou: ‘Rapaz, dessa vez o pessoal de treinamento pisou na bola!’. (OGDEN, 2002, p.10-11). Ogden entende que, quando os consumidores procuram um produto ou serviço, eles procuram apenas as qualidades que vão satisfazer uma necessidade ou um desejo que eles já sentiam. Todas as mensagens que eles receberam sobre o produto ou serviço, pelos veículos de comunicação ou por influência de terceiros, tornam-se importantes para a decisão de compra. Por essa razão, o teórico diz que “os empresários precisam ter certeza de que as mensagens que enviam a seus consumidores são precisas, concisas e consistentes. A mensagem enviada ao consumidor tem de ser uma comunicação integrada.” (OGDEN, 2002, p.11). Segundo ele, quando os consumidores recebem mensagens conflitantes, além de não ser fácil para eles escolher em qual acreditar, tem ainda mais dois problemas: ela custa tempo e dinheiro ao consumidor e, ainda, o deixa confuso, que é um tipo de custo psicológico. Recomenda, assim, que as empresas se conscientizem de que todas as suas variáveis de marketing e de comunicação afetam umas às outras, o consumidor e os comunicadores. Sendo assim, todas as variáveis de comunicação terão um efeito no marketing – é por esse motivo que todos os esforços de comunicação de uma organização devem ser integrados. O resultado da integração é a criação de uma sinergia. O conceito de sinergia, segundo ele, é que os esforços combinados de todas as unidades de negócios têm um efeito maior que a soma dos esforços individuais ou departamentais isoladamente. Ogden defende, então, a criação de um plano de comunicação integrada de marketing (CIM), reconhecendo que não existe uma única forma de estruturação, pois cada situação de mercado determina um modelo diferente para atingir os resultados desejados. A comunicação integrada de marketing seria, portanto, uma extensão do elemento ‘Promoção’ do composto mercadológico (também denominado ‘marketing-mix’ ou 4 Ps), que considera que todas as variáveis da CIM comunicam algo e que existe, também, uma sobreposição na comunicação que essas variáveis oferecem. As variáveis principais do planejamento da comunicação integrada de marketing, segundo Ogden, são a propaganda, a venda pessoal, as atividades de promoção de vendas, as ações de relações públicas e publicidade, o marketing direto e o marketing digital. Na obra intitulada “Gestão de Marketing”4, a comunicação integrada de marketing, é definida “o conjunto de ações integradas de comunicação e promoção, que têm como objetivos: fixar o produto na mente do consumidor; criar uma mensagem única, consistente, compreensível e crível sobre o produto; construir uma imagem de marca diferenciada e sustentável na mente do consumidor; oferecer informações e incentivos para o consumidor adquirir o produto ou serviço da empresa; e gerar atitude favorável dos diversos segmentos de público para as iniciativas da empresa.” (DIAS et al., 2003, p.272). O conceito de comunicação integrada, na opinião dos autores, resulta do reconhecimento de que os objetivos da comunicação de marketing só poderão ser eficazmente alcançados se todos os elementos do programa de comunicação forem coordenados e integrados, de modo a criarem uma posição, mensagem ou imagem únicas, diferenciadas e consistentes na mente do consumidor-alvo do produto. Eles reconhecem que o efeito da comunicação de marketing só poderá ser medido com base na impressão causada na mente do consumidor. Citando Al Ries e Jack Trout, criadores da teoria do posicionamento nos anos 80, relembram que "o posicionamento não é aquilo que você faz com um produto. Posicionamento é aquilo que você provoca na mente do cliente.” (DIAS et al., 2003, p.272). Em outras palavras, o posiconamento é um conceito importante para formulação e operacionalização do plano estratégico de comunicação, tendo em vista que a função da comunicação integrada de marketing é criar imagem única e exclusiva para um produto ou marca na mente do consumidor, a fim de se criar e consolidar uma imagem diferenciada para a marca, que venha a representar uma Desenvolvida por um grupo de docentes do Departamento de Mercadologia da Fundação Getúlio Vargas (FGV – EAESP), de São Paulo–SP. 4 vantagem competitiva sustentável. “A formação de imagem para a marca é uma das principais funções da comunicação de marketing. A imagem de marca pode ser entendida como o conjunto de percepções, crenças, idéias e associações cognitivas ou afetivas que uma pessoa tem sobre um produto e que condiciona suas atitudes e seu comportamento de consumo. A imagem de marca forte, consistente e favorável é uma força motivadora do comportamento de consumo”, (DIAS et al., 2003, p.273), afirmam os docentes, sugerindo que, de acordo com uma teoria da psicologia, o consumidor tende a se manifestar mais favoravelmente em relação a um produto ou serviço quando a imagem percebida da marca corresponde à imagem que tem de si próprio ou, então, que aspira para si ou, ainda, que deseja transmitir aos outros sobre si mesmo. Nesse sentido, as marcas conferem aos produtos e serviços uma dimensão simbólica, na medida em que transmitem e evocam significados e participam da definição da identidade e personalidade das pessoas. Esse seria, enfim, o objetivo último a ser almejado pela comunicação integrada de marketing, por meio da integração de inúmeras atividades, dentre as quais os teóricos destacam a propaganda; promoção de vendas; vendas; marketing direto, relações públicas, publicidade ou assessoria de imprensa; promoção de eventos; merchandising e comunicação no ponto-de-venda; atendimento ao cliente; comunicação pela Internet; embalagem e design; dentre outras. Conforme apresentado pelos docentes pesquisadores da FGV-SP, mesmo que inserida num contexto mais amplo, o de comunicação integrada de marketing, a publicidade desempenha seu papel estratégico na veiculação de mensagens condizentes com o conjunto das outras ações, em sintonia e convergência de conceito para a marca. Numa das obras mais recentes sobre o assunto, “Comunicação Mercadológica: uma visão multidisciplinar” (GALINDO, 2008), Victor Hugo Lima Alves assevera que o conceito de comunicação integrada de marketing (CIM), de certa forma, já traz em si uma indeterminação – a questão da integração. Em paralelo, reforça sua ideia com as indagações propostas por Trevisan 5: O questionamento da comunicação integrada vai além da definição do seu conceito e de como a agência executa as suas tarefas. É preciso perguntar-se: o que integra uma comunicação? Uma assinatura? Logotipo? Conjunto de cores? Rigidez nas diretrizes de uma marca global, que define um azul naquele tom específico? Exposição dos produtos naquela cor ou posição? Manual de identidade visual? Qual é o elemento integrador? É absolutamente discutível o que integra a comunicação de uma organização. Definir isto é papel do gestor da marca ou do dono da empresa. Alguns elementos podem ajudar: assinatura, embalagem, mas tudo é questionável. O que vai dar o traço de unicidade à comunicação da marca? Estas questões é que precisam ser estudadas e respondidas. Desse modo, as decisões relativas à comunicação integrada de marketing são coordenadas pelo composto de promoção do marketing-mix, por meio de decisões como: definição de objetivos promocionais; determinação dos tipos de ações promocionais a serem adotadas; criação dos temas e mensagens; mensuração da eficácia das campanhas de propaganda e a integração de todas as Artigo de Nanci Maziero Trevisan, intitulado “O mito da comunicação integrada”, in XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2003, Belo Horizonte-MG. Disponível em <http://reposcom. portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/4491/1/NP3TREVISAN.pdf> Acesso: 20.02.2008. 5 comunicações promocionais. É, portanto, inequívoca a subordinação dessa comunicação ao composto de promoção tendo em vista que o papel a ser cumprido por tal composto e, por conseqüência, pela comunicação, advém do ajustamento dos demais componentes do marketing-mix – os compostos de produto, preço e distribuição. Alves entende que o conceito de comunicação integrada de marketing tem sua gênese no mesmo prressuposto da comunicação mercadológica, quer seja, entender a comunicação pelos fatores do esforço promocional. A título de esclarecimento e reforço, recorre a Galindo (1986, p. 37), que afirma: Tal modalidade de comunicação compreenderia toda e qualquer manifestação comunicativa gerada a partir de um objetivo mercadológico, portanto, a comunicação mercadológica seria a produção simbólica resultante do plano mercadológico de uma empresa, constituindo-se em uma mensagem persuasiva elaborada a partir do quadro sócio-cultural do consumidor –alvo e dos canais que lhes servem de acesso, utilizando-se das mais variadas formas para atingir os objetivos sistematizados no plano. Após tal constatação, Alves (GALINDO, 2008) revela uma característica essencial que as diferencia: a unicidade da mensagem, salientando que o uso das várias competências ou recursos comunicacionais, por si só, não caracteriza a integração, mesmo considerando o objetivo comum de um plano mercadológico. Continuando as suas considerações, o autor denuncia uma inadequação quanto à nomenclatura ‘comunicação integrada de marketing’, pois esta seria apenas uma das modalidades de comunicação vinculadas ao planejamento estratégico da empresa devendo, portanto, todas as demais modalidades (comunicação interna; comunicação administrativa; comunicação institucional) também serem denominadas integradas, pois no conceito defendido por Kunsch (2003) é justamente a noção de integração das quatro modalidades que caracteriza a filosofia inovadora por ela proposta. Desse modo, argumenta que é “a modalidade comunicacional que se apresenta integrada – como adjetivo – e não a comunicação integrada que se qualifica em modalidade comunicacional” (GALINDO, 2008, p. 26). Além disso, Alves finaliza seu pensamento lembrando que, muito provavelmente: O termo CIM seja remanescente do conturbado momento vivido nos anos 90 pelas agências de propaganda, quando da necessidade de resposta aos clientes sobre as restrições de eficácia e financeira da propaganda em meio à proliferação de pontos de contato e resultados inatingidos; e, nessas circunstâncias adotaram-se vários conceitos com o intuito de expressar que a comunicação com o mercado se produzia por outros canais, além da habitual propaganda (GALINDO, 2008, p.25-26). A publicidade, agora inserida no contexto da comunicação integrada de marketing, com funções, características e responsabilidades ampliadas e compartilhadas, tem de ser repensada desde o seu planejamento até nos seus mecanismos de mensuração de resultados, para acompanhar as novas tendências e propostas teóricas e práticas. Considerações finais: Em termos conceituais, os aspectos inovadores, com algum impacto diferencial para o processo de comunicação mercadológica como um todo, são adaptações mínimas sobre os procedimentos, métodos e técnicas de pesquisa, criação, produção e mídia que se proclamava no passado. Fora isso, nada que se caracterize como uma verdadeira renovação de proposta. Em síntese, as discussões sobre a comunicação integrada de marketing, em geral, parecem não acompanhar as orientações mais amplas sobre o planejamento da comunicação no novo cenário mercadológico do branding. Dessas considerações decorrem, portanto, uma lógica que poderia ser assim sintetizada: - A imagem de marca é formada na mente de cada consumidor: uma particularidade da dinâmica da comunicação é que a comunicação não é aquilo que se emite, mas o que se recebe, entende e percebe. Na situação de mercado atual, porém, não é sempre que aquilo que a empresa ou marca comunica é o mesmo que o consumidor entende. Como a imagem de marca é aquela efetivamente formada na cabeça do consumidor, e não a que se estabeleceu nas estratégias de comunicação, é fundamental que se faça uma comunicação adequada que contemple, ao mesmo tempo, a intenção do anunciante e a verdade do consumidor; - O conceito de comunicação integrada de marketing resulta do reconhecimento de que os objetivos da comunicação só poderão ser eficazmente alcançados se todas as modalidades de comunicação (interna, administrativa, institucional e mercadológica) forem efetivamente coordenadas e integradas, de modo a criarem uma posição, mensagem ou imagem únicas, diferenciadas e consistentes na mente do consumidor do produto ou serviço; - A formação da identidade de marca é a principal função da comunicação integrada de marketing. A identidade de marca envolve o conjunto de elementos tangíveis e intangíveis que se tenciona associar à marca, incluindo a imagem que pode ser entendida como o conjunto de percepções, crenças, valores e vínculos cognitivos ou afetivos que uma pessoa tem sobre um produto ou serviço e que condiciona suas atitudes e seu comportamento de consumo. A imagem de marca forte, consistente e favorável é uma força motivadora do comportamento de consumo; - As marcas, nesse sentido, conferem aos produtos e serviços uma dimensão simbólica, na medida em que transmitem e evocam significados e participam da definição da identidade e personalidade das pessoas. Esse seria, enfim, o objetivo último a ser almejado pela comunicação integrada de marketing: o alinhamento conceitual em torno de um conceito de marca, independentemente das atividades, recursos e instrumentos disponíveis a serem utilizados. Hoje, praticamente ninguém mais discorda de que as relações das pessoas com as marcas são sensoriais, são experiências vivencidas, muito mais afetivas do que, propriamente, racionais. As marcas, portanto, pertencem aos consumidores e aos mercados, são parte de conceitos e padrões não convencionais – intangíveis – de análise. Na maioria das vezes, a continuidade das marcas também depende muito do que pensam os sistemas de comunicação, que, afinal, sustentam a imagem das marcas no mercado. Seria, então, um equívoco pensarmos que a publicidade, sozinha, consiga construir uma marca, uma vez que as marcas são edificadas de maneira holística, a partir de uma proposta comum de valores com os consumidores, levadas adiante por meio da orquestração de um conjunto de instrumentos mercadológicos, internos e externo à organização. Gerenciar uma marca seria, enfim, monitorar todos os contatos que ela estabelece com os seus mercados consumidores, em todas as situações e relacionamentos da organização e de seus colaboradores. Como uma das principais conclusões, podemos afirmar que, em grande medida, a dimensão e importância que a comunicação integrada de marketing vem tendo nos âmbitos acadêmico e profissional tem profundas ligações com o desenvolvimento do branding e os propósitos de gestão de marcas, como os atuais modelos de sistema de identidade, as associações com a imagem corporativa, o posicionamento e os atributos de personalidade e caráter de marca. O que, num passado não muito distante, o tempo e a credibilidade dos produtos e serviços, bem como a reputação das organizações se encarregava de construir, atualmente, é preciso muito esforço e envolvimento para se atingir e, por vezes, não surte o efeito desejado. Finalizando e tentando responder às questões inicialmente propostas, é preciso ressaltar o seguinte: os pressupostos teóricos sobre a comunicação publicitária e mercadológica permaneceram os mesmos, sempre evidenciando a importância de pensá-la como algo integrado às ações de marketing, sem subordinação ou fragmentação, tendo como alvo e enfoque o fortalecimento de um claro conceito da marca. A interpretação dessas noções, no entanto, é que realmente se apresenta como novidade. Faz muito mais sentido, portanto, propor uma releitura e recolocação das teorias, conceitos, ideias e definições já defendidas no passado, pois se trata de um novo mundo dos negócios, cuja dinâmica e contexto – marcado por mais tecnologia, mais competitividade, mais agilidade e mais globalização – exigem constantes atualizações em busca da conquista dos mercados e perpetuação das marcas. Referências: CABRAL, Plínio. Propaganda, técnica da comunicação industrial e comercial. 3.ed. São Paulo: Atlas, 1984. 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