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Catabolismo dos aminoácidos; Rui Fontes
Catabolismo dos aminoácidos1
1- No decurso do seu catabolismo os aminoácidos perdem os seus átomos de azoto que, na sua maioria, são
incorporados na ureia e excretados na urina. (i) A porção não azotada das moléculas dos aminoácidos (os
esqueletos carbonados) pode, em certos casos (a maioria), gerar intermediários do ciclo de Krebs ou da
glicólise. Nestes casos, os aminoácidos dizem-se glicogénicos porque, administrados a um animal em
jejum, podem, via gliconeogénese, formar glicose e aumentar a glicemia. Quando se diz que um
determinado aminoácido é glicogénico quer-se dizer que, potencialmente, o esqueleto carbonado deste
aminoácido pode, convertendo-se em glicose no fígado (e rim), ser indirectamente oxidado pelos tecidos do
organismo que consomem glicose. (ii) No caso da leucina os produtos do catabolismo são o acetoacetato e
o acetil-CoA e não se geram intermediários do ciclo de Krebs ou da glicólise; a leucina não é um
aminoácido glicogénico porque nenhum dos produtos formados a partir dela é substrato da gliconeogénese
e diz-se cetogénica porque o acetoacetato é um corpo cetónico e o acetil-CoA é o precursor dos corpos
cetónicos. O outro exemplo de aminoácido cetogénico é a lisina. Quando se diz que um determinado
aminoácido é cetogénico quer-se dizer que, potencialmente, o esqueleto carbonado deste aminoácido pode,
convertendo-se em acetoacetato e β-hidroxibutitato no fígado, ser indirectamente oxidado pelos tecidos do
organismo que consomem corpos cetónicos. (iii) Os aminoácidos que, no decurso do seu catabolismo, se
desdobram de tal forma que parte da molécula forma acetoacetato ou acetil-CoA e a outra parte
intermediários do ciclo de Krebs ou da glicólise costumam ser classificados como simultaneamente
glicogénicos e cetogénicos.
2- Os intermediários do ciclo de Krebs podem (via fosfoenolpiruvato) gerar piruvato e este pode, por acção da
desidrogénase do piruvato, gerar acetil-CoA que é oxidado a CO2. O facto de os aminoácidos poderem, no
seu metabolismo, gerar piruvato, intermediários do ciclo de Krebs, acetoacetato e/ou acetil-CoA permite
compreender que, sendo oxidados a CO2, podem contribuir para a síntese de ATP sendo a par com os
glicídeos e os lipídeos "compostos energéticos". Nas dietas habituais na nossa cultura o valor calórico das
proteínas representa cerca de 15% do valor calórico total. Assim, embora a importância “energética” dos
aminoácidos seja menor que a dos glicídeos e lipídeos, o seu valor energético não é negligenciável. É de
notar que, embora os esqueletos carbonados dos aminoácidos sejam completamente oxidados gerando CO2,
o processo pode ser indirecto: a maioria dos aminoácidos sofre catabolismo no fígado onde o seu azoto
origina ureia e o seu esqueleto carbonado acaba por originar glicose ou glicogénio (a maioria dos
aminoácidos são glicogénicos). Para além do seu papel na síntese de (praticamente) toda a ureia sintetizada
no organismo, o fígado tem um importante papel no catabolismo do esqueleto carbonado da maior parte
dos aminoácidos estimando-se que metade da energia libertada nos processos oxidativos que decorrem no
fígado durante um dia tenha origem na oxidação de aminoácidos [1]. Uma parte da importância do fígado
nos processos oxidativos dos aminoácidos decorre do facto de este órgão receber directamente os
aminoácidos da dieta (via veia porta) captando e oxidando os que estão em excesso relativamente às
necessidades. O fígado, quer quando oxida glicose (e o seu próprio glicogénio) para fazer face às suas
necessidades energéticas, quer quando liberta glicose para o plasma (via gliconeogénese e via
glicogenólise), uma parte desta glicose teve origem no esqueleto carbonado dos aminoácidos. A ulterior
oxidação da glicose libertada pelo fígado nos diversos tecidos do organismo é também, em última análise,
uma das componentes do processo oxidativo dos aminoácidos. Em termos médios, 1g de proteína, pode
originar 0,6 g de glicose; se considerarmos que o cérebro consome cerca de 100-120 g de glicose por dia,
deve conclui-se que a ingestão de 100g de proteína (a ingestão “típica” diária numa dieta ocidental) pode
contribuir para metade do consumo de glicose pelo cérebro [1].
3- Embora a ureia e o amónio não resultem da oxidação dos esqueletos carbonados dos aminoácidos o
processo de conversão dos aminoácidos em CO2 ou em glicose ou em corpos cetónicos é concomitante com
a formação daqueles compostos de excreção. Por isso, a velocidade de degradação dos aminoácidos no seu
todo pode ser medida, medindo a velocidade de excreção dos compostos azotados na urina. O azoto da
ureia pode constituir entre 60% e 90% (a percentagem aumenta quando dieta é rica em proteínas) do azoto
1
Foi acordado que, ao discutir-se o catabolismo dos aminoácidos, se devia dar especial atenção à alanina, glutamina,
glutamato, asparagina, aspartato, glicina, serina, fenilalanina, tirosina, metionina, cisteína, leucina, isoleucina e valina. Os
outros aminoácidos só seriam discutidos num contexto genérico.
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urinário; a ureia, o amónio, a creatinina e o ácido úrico2 contêm mais de 95% do azoto urinário. Se se
considerarem períodos de tempo longos (vários dias) [2], o valor do azoto urinário presente na ureia e no
amónio é uma medida da velocidade de oxidação dos aminoácidos e pode servir para estimar o valor
energético dos aminoácidos que estão a ser oxidados.
4- O catabolismo da alanina (3C,1N) é muito simples e envolve apenas a acção da transamínase da alanina
(ver equação 1) que dá origem ao α-cetoácido correspondente, o piruvato (3C). O piruvato é substrato da
gliconeogénese e pode, portanto, originar glicose. A alanina (cujo azoto constitui quase 10% do azoto
aminoacídico do plasma) é um veículo de transporte de azoto no plasma. No ciclo da alanina, o piruvato
formado na glicólise muscular aceita grupos amina de outros aminoácidos (ver equação 1) convertendo-se
em alanina; a alanina sai dos músculos para o plasma sanguíneo; no fígado é captada e reconvertida em
piruvato (ver equação 1); o piruvato, via gliconeogénese, gera glicose que pode voltar a ser oxidada no
músculo. O ciclo da alanina permite (via enzimas da gliconeogénese hepática, glicólise muscular e
transamínase da alanina nos dois tecidos) o transporte de azoto dos músculos para o fígado (onde contribui
para a formação de ureia) mas também permitir que a glicose que, no músculo, foi apenas foi oxidada a
piruvato possa ser regenerada no fígado. Do ponto de energético o ciclo da alanina, considerado como um
todo, consome ATP (consumo de 6 ligações ricas em energia e 2 NADH no fígado/molécula de glicose
formada e formação de 2 ligações ricas em energia e 2 NADH no músculo) mas permite poupar glicose que
é um importante substrato nos processos oxidativos cerebrais3: tal como o ciclo do lactato, o ciclo da
alanina também pode ser entendido como um processo de transferência de energia do fígado para o
músculo; as substâncias que estão a ser oxidadas no fígado permitem a formação de glicose, cuja oxidação
nos músculos, gera ATP.
alanina + α-cetoglutarato ↔ piruvato + glutamato
(1)
5- A asparagina (4C,2N), por acção da asparagínase, é hidrolisada gerando aspartato (4C,1N) e amoníaco
(ver equação 2). O aspartato por transaminação (ver equação 3) gera oxalacetato (4C) que é um
intermediário do ciclo de Krebs. No ciclo da ureia, o aspartato reage com a citrulina (sintétase do argininosuccinato) originando arginino-succinato. Nesta via metabólica o azoto do aspartato incorpora-se na ureia e
o esqueleto carbonato sai como fumarato (4C) que é também intermediário do ciclo de Krebs. Daqui se
pode concluir que a asparagina e o aspartato são aminoácidos glicogénicos.
asparagina + H2O → aspartato + NH3
aspartato + α-cetoglutarato ↔ oxalacetato + glutamato
(2)
(3)
6- De forma semelhante ao caso da asparagina, a glutamina (5C,2N), por acção da glutamínase, dá origem a
glutamato (ver equação 4) e o glutamato (5C,1N), por transaminação, gera o intermediário do ciclo de
Krebs α-cetoglutarato (ver equação 5). No caso do glutamato a formação do α-cetoglutarato (5C) também
pode ser o resultado da acção da desidrogénase do glutamato (ver equação 6). Os processos de hidrólise
do grupo amida da glutamina (ver equação 4) e da asparagina (ver equação 2) chamam-se, frequentemente,
de processos de desamidação. Os enterócitos têm particular importância no catabolismo da glutamina
(quer a que se forma a partir da hidrólise das proteínas da dieta quer a que se forma endogenamente). Nos
enterócitos, uma parte da glutamina converte-se (via glutamato) em α-cetoglutarato e depois em piruvato
que, por transaminação, gera alanina4 que passa para a veia porta e é posteriormente transformada em
glicose (e ureia) no fígado. Os enterócitos são células com uma taxa de multiplicação muito elevada (a vida
média dos enterócitos é de 2-5 dias) e a glutamina é também consumida na síntese das purinas e
pirimidinas necessárias para a síntese dos ácidos nucleicos.
2
A creatinina forma-se a partir da creatina e fosfocreatina que, por sua vez, se forma a partir da glicina, da arginina e da
metionina. A molécula da creatinina contém 3 átomos de azoto sendo que 1 provém directamente da glicina e 2 da
arginina. O ácido úrico forma-se no catabolismo das purinas e a sua molécula contém 4 átomos de azoto: 2 provêm
directamente da glutamina, 1 da glicina e o outro do aspartato.
3
É de notar que os ciclos da alanina e do lactato não permitem formar glicose de novo mas apenas recuperar como glicose
a glicose que foi oxidada a piruvato (no músculo) ou cindida a lactato (nos eritrócitos). No cérebro, a glicose é oxidada a
CO2 e, num indivíduo em jejum total, esta glicose só pode provir da conversão líquida dos aminoácidos endógenos em
glicose.
4
Esta conversão poderá ocorrer via glutamina → glutamato → α-cetoglutarato → succinil-CoA → succinato → fumarato
→ malato → oxalacetato → fosfoenolpiruvato → piruvato → alanina.
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glutamina + H2O → glutamato + NH3
glutamato + α-cetoácido ↔ α-cetoglutarato + α-aminoácido
glutamato + NAD+ + H2O → α-cetoglutarato + NADH + NH3
(4)
(5)
(6)
7- Numa reacção fisiologicamente reversível a hidroxi-metil-transférase da serina pode catalisar a
interconversão da serina (3C,1N) e da glicina (2C,1N); na reacção também ocorre a interconversão do H4folato e do N5,N10-metileno H4-folato (ver equação 7). A glicina pode ser oxidada pela acção catalítica
do complexo de clivagem de glicina; este complexo usa como aceitador de metilo o H4-folato e na
reacção forma-se CO2, NH3 e também N5,N10-metileno H4-folato (ver equação 8). Assim, por acção
sequenciada da hidroxi-metil-transférase da serina e do complexo de clivagem de glicina, a serina pode ser
completamente oxidada formando CO2 e dois equivalentes de N5,N10-metileno H4-folato. Se atentarmos
neste processo notaremos que a glicina (e indirectamente a serina) são aminoácidos que podem ser
oxidados a CO2 sem a intervenção de enzimas do ciclo de Krebs constituindo, por isso, excepções ao
processo oxidativo geral dos nutrientes.
serina + H4-folato ↔ glicina + N5,N10-metileno H4-folato + H2O
glicina + NAD+ + H4-folato → CO2 + NH3 + NADH + N5,N10-metileno H4-folato
(7)
(8)
8- A serina pode, por acção de outras enzimas, formar piruvato. Uma das vias metabólicas em que a serina
pode originar piruvato envolve, como primeiro passo, a acção de uma transamínase onde a serina perde o
grupo amina. Nesta via metabólica a serina origina, por transaminação, o 3-hidroxipiruvato (o α-cetoácido
correspondente à serina; ver equação 9) que através da acção de outras enzimas acaba por gerar
fosfoenolpiruvato. O fosfoenolpiruvato pode converter-se em glicose (gliconeogénese) ou originar piruvato
e ser oxidado. Um outro processo, mais simples, envolveria a acção da desidrátase da serina (ver equação
10). Por acção sequenciada da hidroxi-metil-transférase da serina (ver equação 7) e das enzimas que podem
converter a serina em fosfoenolpiruvato ou piruvato, a glicina pode também dar origem a piruvato.
serina + α-cetoglutarato ↔ 3-hidroxipiruvato + glutamato
serina → piruvato + NH3
(9)
(10)
9- A cisteína (3C,1N,1S) contém um grupo tiol e as suas vias catabólicas são diversas e complexas. O grupo
tiol é oxidado gerando, em última análise, sulfato que é excretado na urina. De notar que o sulfato se forma
juntamente com os respectivos protões e que, portanto, o catabolismo da cisteína (e da metionina) tende a
acidificar o meio interno. O grupo amina da cisteína pode perder-se em reacções de transaminação; neste
caso, o piruvato é também um dos produtos gerados no catabolismo da cisteína. Num outro processo
alternativo (quantitativamente menos relevante) forma-se taurina (C2,1N,1S) que, fazendo parte dos
ácidos biliares, é em última análise, excretada na urina. Na formação da taurina também ocorre oxidação do
grupo tiol mas, neste caso, o enxofre e o grupo amina mantêm-se ligados ao esqueleto carbonado.
10- No processo catabólico da metionina (5C,1N,1S) esta começa por reagir com o ATP gerando S-adenosilmetionina (ver equação 11). Um dos carbonos da metionina (o do metilo ligado ao enxofre) acaba
transferido para vários possíveis aceitadores (por acção de metil-transférases; ver equação 12) formandose um intermediário contendo adenosina e homocisteína: a S-adenosil-homocisteína. O átomo de enxofre
da homocisteína (4C,1N,1S) acaba transferido para a serina (3C,1N) que se converte em cisteína
(3C,1N,1S) enquanto o grupo azotado e os carbonos que pertenciam à homocisteína se libertam como NH3
e α-cetobutirato. Neste processo intervêm sequencialmente duas enzimas: a síntase da cistationina (ver
equação 14) e a líase da cistationina (ver equação 15). O α-cetobutirato formado pode gerar propionil-CoA
que, via metilmalonil-CoA, leva à formação de succinil-CoA que é um intermediário do ciclo de Krebs. A
homocisteína, que se gera quando a metionina cede o grupo metilo a outros compostos (ver equação 12), é
aceitadora do grupo metilo do N5-metil-H4-folato regenerando-se metionina (síntase da metionina; ver
equação 16). O N5-metil-H4-folato forma-se por redução (dependente do NADPH; acção da redútase do
N5,N10-metileno-H4-folato; ver equação 17) do N5,N10-metileno-H4-folato (maioritariamente gerado no
catabolismo da serina e glicina; ver equações 7 e 8). É de notar que durante o catabolismo da metionina o
seu átomo de enxofre se converte em enxofre da cisteína e que, portanto, este se perde maioritariamente
como sulfato na urina aquando do catabolismo da cisteína.
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Catabolismo dos aminoácidos; Rui Fontes
ATP + metionina → S-adenosil-metionina + Pi + PPi
S-adenosil-metionina + aceitador5 → S-adenosil-homocisteína + aceitador metilado
S-adenosil-homocisteína + H2O → homocisteína + adenosina
homocisteína + serina → cistationina
cistationina → cisteína + NH3+ α-cetobutirato
N5-metil-H4-folato + homocisteína → H4-folato + metionina
N5,N10-metileno-H4-folato + NADPH → N5-metil-H4-folato + NADP+
(11)
(12)
(13)
(14)
(15)
(16)
(17)
11- No catabolismo da tirosina (9C,1N) a primeira reacção é uma transaminação onde o grupo amina é
transferido para o α-cetoglutarato formando-se p-hidroxifenilpiruvato e glutamato (ver equação 18).
Numa sequência complexa de reacções o para-hidroxifenilpiruvato dá origem a um intermediário (fumarilacetoacetato) que é hidrolisado cindindo-se em fumarato (que é um intermediário do ciclo de Krebs) e
acetoacetato (que é um corpo cetónico). Os mesmos produtos também se formam no catabolismo da
fenilalanina (9C,1N) porque este aminoácido se converte em tirosina. A alcaptnúria é causada por uma
deficiência congénita de uma enzima envolvida no catabolismo da tirosina, a oxigénase do ácido
homogentísico. Nesta doença, que não põe em risco a vida, a acumulação de ácido homogentísico causa,
como sinal mais relevante, uma urina que escurece em contacto com o ar.
tirosina + α-cetoglutarato → p-hidroxifenilpiruvato + glutamato
(18)
12- A fenilalanina (9C,1N) converte-se em tirosina por acção de uma enzima hepática, a hidroxílase da
fenilalanina (directamente dependente da tetrahidrobiopterina; ver equação 19). Nesta reacção a
fenilalanina e a tetrahidrobiopterina são oxidadas pelo oxigénio molecular originando, respectivamente,
tirosina e dihidrobiopterina; a regeneração da tetrahidrobiopterina ocorre por acção de uma redútase
dependente do NADPH (redútase da dihidrobiopterina: ver equação 20). Quando uma destas enzimas está
deficiente ocorre a acumulação de fenilalanina que pode, por transaminação, gerar fenilpiruvato. Um dos
produtos a que o fenilpiruvato pode dar origem é o fenilacetato que surge na urina em quantidades
elevadas nesta situação patológica (designada de fenilcetonúria). Embora se desconheça a razão, a
fenilcetonúria provoca lesões no cérebro em desenvolvimento e, consequentemente, atraso mental grave. A
situação pode ser prevenida com uma dieta pobre em fenilalanina durante, pelo menos, os primeiros 6-8
anos de vida. Em Portugal colhe-se sangue a todos os bébés com o objectivo de detectar (e tratar)
precocemente esta doença. A doença é autossómica recessiva e tem uma incidência relativamente elevada
(1/13000 nascimentos). Desconhece-se o motivo da alta incidência do gene sendo legítimo especular que
poderá estar relacionado com selecção positiva dos heterozigotos em situações em que a fenilalanina
escasseia(va) na dieta.
fenilalanina + tetrahidrobiopterina + O2 → tirosina + dihidrobiopterina + H2O
dihidrobiopterina + NADPH → tetrahidrobiopterina + NADP+
(19)
(20)
13- O catabolismo dos aminoácidos ramificados valina (5C,1N), isoleucina (6C,1N), e leucina (6C,1N) iniciase com a perda dos grupos α-amina em reacções de transaminação (ver equações 21-23). Os esqueletos
carbonados correspondentes formados são α-cetoácidos ramificados que, pela acção catalítica de uma
desidrogénase com actividade semelhante à que catalisa a oxidação descarboxilativa do piruvato, αcetoglutarato e α-cetobutirato, originam acil-CoA ramificados distintos (ver equação 24).
Subsequentemente as vias metabólicas divergem. No catabolismo da valina o produto final é o succinilCoA. Um dos intermediários da via catabólica da isoleucina sofre cisão (neste caso tiolítica) originando
acetil-CoA e propionil-CoA; num processo já referido a propósito do catabolismo da metionina o
propionil-CoA gera succinil-CoA. Tal como no caso da isoleucina também um dos intermediários da via
catabólica da leucina (o hidroxi-metil-glutaril-CoA) sofre cisão (por acção da líase do hidroxi-metilglutaril-CoA) e, neste caso, os compostos gerados são o acetoacetato e a acetil-CoA. Ao contrário do que
acontece com a maioria dos outros aminoácidos que sofrem o seu catabolismo no fígado, no intestino ou no
rim, uma grande parte dos aminoácidos ramificados é oxidado nos músculos esqueléticos e cardíaco. O
5
Entre outros são aceitadores dos grupos metilo da S-adenosilmetionina a fosfatidil-etanolamina (formação de fosfatidilcolina), a noradrenalina (formação de adrenalina), o guanidoacetato (formação de creatina), resíduos de lisina e histidina
em proteínas e resíduos de nucleotídeos de ácidos nucleicos.
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Catabolismo dos aminoácidos; Rui Fontes
azoto do grupo amina destes aminoácidos sai dos músculos incorporado na alanina e na glutamina6. A
classificação da leucina como aminoácido cetogénico deriva do facto de um dos produtos do seu
catabolismo ser o acetoacetato (um corpo cetónico) e de a acetil-CoA (o outro produto), quando formado
no fígado, poder originar também (ciclo de Lynen) acetoacetato.
leucina + α-cetoglutarato ↔ α-ceto-isocaproato + glutamato
isoleucina + α-cetoglutarato ↔ α-ceto-metil-valerato + glutamato
valina + α-cetoglutarato ↔ α-ceto-isovalerato + glutamato
α-cetoácidos ramificado + CoA + NAD+ → acil-CoA ramificado + CO2 + NADH
(21)
(22)
(23)
(24)
14- De acordo com o critério referido no ponto 1 seriam classificados como aminoácidos cetogénicos a leucina
e a lisina. A tirosina e a fenilalanina (que originam fumarato e acetil-CoA), o triptofano (que origina
alanina e acetil-CoA) e a isoleucina (que origina succinil-CoA e acetil-CoA) seriam classificados como
simultaneamente cetogénicos e glicogénicos7. Seriam aminoácidos glicogénicos: a asparagina e o aspartato
(que originam oxalacetato ou fumarato), a glutamina, o glutamato, a arginina, a ornitina, a prolina e a
histidina (que originam α-cetoglutarato), a alanina, a serina, a glicina e a cisteína (que originam piruvato) e
a metionina e a valina (que originam succinil-CoA). De facto, mesmo durante o período absortivo, uma
parte dos hepatócitos (os hepatócitos peri-portais) continua a formar glicose-6-fosfato a partir dos
aminoácidos glicogénicos (e simultaneamente glicogénicos e cetogénicos) absorvidos, armazenando os
carbonos correspondentes a estes aminoácidos na forma de glicogénio [3]. Como já referido, este
glicogénio pode, via glicogenólise, fornecer glicose-6-fosfato para oxidação nas mesmas células ou, via
glicose-6-fosfátase, libertar glicose para o plasma sanguíneo.
15- Com excepção da glicina e da serina (via glicina) que podem ser completamente oxidados a CO2 pela acção
do complexo de clivagem da glicina, a oxidação completa dos aminoácidos implica, mesmo no caso dos
aminoácidos glicogénicos e dos simultaneamente glicogénicos e cetogénicos, a formação de acetil-CoA
e o envolvimento das enzimas do ciclo de Krebs. Quando um determinado aminoácido é oxidado de
forma completa num órgão em que não há gliconeogénese o intermediário do ciclo de Krebs formado no
catabolismo desse aminoácidos é oxidado via oxalacetato → fosfoenolpiruvato → piruvato → acetil-CoA.
16- No metabolismo da serina, da glicina, da histidina e da metionina intervém derivados do folato.
(a) No catabolismo da serina e da glicina o H4-folato é aceitador de unidades monocarbonadas formandose o N5,N10-metileno-H4-folato (ver equações 7 e 8) que, por sua vez, é dador de unidades
monocarbonadas à 2'-desoxi-uridina monofosfato (2'd-UMP) sintetizando-se timidina monofosfato (TMP);
ver equação 25). O dihidrofolato que se forma no processo é reduzido a H4folato pela redútase do
dihidrofolato (ver equação 26).
N5,N10-metileno-H4-folato + 2'-desoxi-uridina monofosfato → H2folato + timidina monofosfato
H2folato + NADPH → H4folato + NADP+
(25)
(26)
(b) O carbono do grupo metileno (N5 - CH2 – N10) do N5,N10-metileno-H4-folato tem número de oxidação
zero. Numa reacção de redução catalisada pela redútase do N5,N10-metileno-H4-folato este composto dá
origem ao N5-metil-H4-folato (ver equação 17) que é capaz de transferir o grupo metilo (N5-CH3; o
carbono tem número de oxidação –2) para a homocisteína e formar metionina (síntase da metionina: ver
equação 16; esta síntase tem como cofactor a vitamina B12). Assim, via metilação do H4-folato pela glicina
ou pela serina e subsequente redução do metileno-H4-folato a metil-H4-folato forma-se o dador de metilo
para a regeneração da metionina. A metionina “activada” (S-adenosil-metionina; ver equação 11) é dador
6
Embora seja controverso, admite-se que na formação do esqueleto carbonado da glutamina no músculo possam intervir
conjuntamente os produtos de todos os aminoácidos ramificados. No ciclo de Krebs, o succinato (formado a partir da
valina e isoleucina) pode gerar oxalacetato que, reagindo com a acetil-CoA (eventualmente proveniente do catabolismo da
isoleucina e leucina), pode formar citrato e sequencialmente α-cetoglutarato. O α-cetoglutarato poderá aceitar grupos
amina na primeira reacção do catabolismo dos aminoácidos ramificados (ver equações 21-23) formando glutamato. O
glutamato pode gerar glutamina (ver equação 4) incorporando NH3 formado no catabolismo de outros aminoácidos. A
glutamina é o aminoácido mais abundante no plasma sanguíneo constituindo por si só quase 1/3 do azoto aminoacídico do
plasma e, conjuntamente com a alanina (ciclo da alanina), um veículo de transporte de azoto dos músculos para o fígado.
7
Devido à existência de dúvidas no metabolismo da treonina esta é, às vezes, classificada como glicogénica e, outras,
como simultaneamente glicogénica e cetogénica.
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de metilos aquando da síntese de variados compostos como, por exemplo, a fosfatidil-colina a partir de
fosfatidil-etanolamina (ver equação 12). Nestas reacções, em que intervém como dador de metilo a Sadenosil-metionina, forma-se a S-adenosil-homocisteína que ao ser hidrolisada gera homocisteína (ver
equação 13). Como já referido, a homocisteína pode ser metilada pelo N5-metil-H4-folato regenerando a
metionina (ver equação 16).
(c) O N5,N10-metileno-H4-folato (formado no catabolismo da serina e glicina; ver equações 7 e 8) pode
ser oxidado por desidrogénases do N5,N10-metileno-H4-folato e gerar N5,N10-metenilo-H4-folato (ver
equação 27). O N5,N10-metenilo-H4-folato (assim como a sua forma hidratada N10-formil-H4-folato que
resulta de hidrólise intramolecular) é dador de unidades monocarbonadas durante o processo de síntese dos
nucleotídeos púricos. O carbono do grupo metenilo do N5,N10-metenilo-H4-folato (N5 – CH = N10) tem
número de oxidação +2. O carbono do grupo formimino do N5-formimino-H4-folato (N5 – CH = NH) e o
do grupo formilo do N10-formil-H4-folato (O = CH - N10) também têm número de oxidação +2. O N5formimino-H4-folato pode (por desaminação) dar origem ao N5,N10-metenilo-H4-folato e este (por
hidratação) pode originar o N10-formil-H4-folato. O N5-formimino-H4-folato forma-se durante o
catabolismo da histidina aquando da transferência do grupo formimino do formimino-glutamato para o H4folato.
N5,N10-metileno-H4-folato + NADP+ ou NAD+ ↔ N5,N10-metenilo-H4-folato + NADPH ou NADH (27)
17- No seu processo catabólico, a perda dos átomos de azoto dos aminoácidos pode ocorrer em diferentes tipos
de reacções. (1) Nos casos da glutamina e da asparagina o azoto do grupo amida sai como NH3 por
hidrólise e o processo chama-se desamidação (ver equações 2 e 4). (2) O grupo α-amina do glutamato e da
glicina pode perder-se por desaminação oxidativa formando-se também NH3. No primeiro caso está
envolvida a desidrogénase do glutamato e no segundo a enzima de clivagem da glicina (ver equações 6 e
8). (3) No caso do glutamato um processo alternativo para a perda do grupo α-amina é o envolvimento de
reacções de transaminação em que diversos α-cetoácidos podem funcionar como aceitadores do grupo
amina do glutamato. As reacções de transaminação são catalisadas por transamínases e a maioria dos
aminoácidos pode perder o grupo α-amina em reacções catalisadas por transamínases em que os
aminoácidos funcionam como dadores do grupo amina ao α-cetoglutarato. Para além do caso do glutamato
são especialmente relevantes para a perda do seu grupo amina os processos de transaminação da alanina
(ver equação 1), do aspartato (ver equação 3), da serina (ver equação 9), tirosina (ver equação 18) e dos
aminoácidos ramificados (ver equações 21-23). A transferência directa do grupo α-amina do aminoácido
não transformado em reacções catalisadas por transamínases não ocorre normalmente (ou não parece ter
importância fisiológica) no catabolismo da glicina, da treonina, da metionina, da lisina, da arginina, da
histidina, da prolina, da hidroxiprolina, do triptofano e da fenilalanina. Contudo, é de salientar, que a
análise das vias metabólicas permite compreender a importância deste tipo de reacções na perda dos grupos
α-amina de muitos dos aminoácidos acima referidos: nos casos da lisina, da arginina, da prolina, da
hidroxiprolina, do triptofano, da fenilalanina e cisteína são catabolitos α-aminados destes aminoácidos que
perdem o grupo amina em reacções de transaminação clássicas. Os grupos amina terminais da ornitina
(formada a partir da arginina) e da lisina também se perdem em reacções que se podem designar de
"transaminação": no caso da ornitina a transamínase envolvida na perda do grupo 5-amina é semelhante às
outras transamínases; no caso da lisina a reacção de transferência do grupo 6-amina para o α-cetoglutarato
envolve uma oxiredútase. (4) Nos casos da serina, da treonina e da histidina a perda do grupo amina pode
ser catalisado por líases (a desidrátase da serina é uma líase; ver equação 10). Um dos intermediários no
catabolismo da metionina, a cistationina, também perde o grupo α-amina por acção de uma líase (ver
equação 15). (5) A histidina contém, no anel imidazol, dois azotos sendo que um deles gera o grupo αamina do glutamato; o outro sai ligado a uma unidade monocarbonada gerando formimino-H4-folato que
por desaminação não hidrolítica (uma líase) dá origem a amoníaco. (6) A maior parte do azoto do anel
indole do triptofano perde-se como amoníaco por desaminação oxidativa de um intermediário do processo
catabólico. (7) A arginina contém quatro azotos; dois dos azotos perdem-se na forma de ureia por acção
hidrolítica da argínase.
1. Frayn, K. N. (2003) Metabolic regulation. A human perspective., 2nd edn, Blackwell Science, Oxford.
2. Matthews, D. E. (2006) Proteins and aminoacids in Modern Nutrition in Health and Disease (Shils, M. E., ed) pp. 23-61, Lippincott,
Phyladelphia.
3. Stipanuk, M. H. (2006) Biochemical, Physiological, Molecular Aspects of Human Nutrition, 2nd edn, Sunders, Elsevier., St. Louis.
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Catabolismo dos aminoácidos; Rui Fontes
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Catabolismo dos aminoácidos; Rui Fontes
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