Tese Doutorado ANA KEILA ENNES ANDRADE

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
ANA KEILA ENNES ANDRADE
VISÃO E PERSPECTIVA JURÍDICA NA EDUCAÇÃO DE
JOVENS E ADULTOS (PROEJA): DIREITO À
INTEGRALIDADE E A DINÂMICA DA ARTICULAÇÃO COM
ESPECIFICIDADE DO TRABALHO
Campinas/SP
2015
ANA KEILA ENNES ANDRADE
VISÃO E PERSPECTIVA JURÍDICA NA EDUCAÇÃO DE
JOVENS E ADULTOS (PROEJA): DIREITO À
INTEGRALIDADE E A DINÂMICA DA ARTICULAÇÃO COM
ESPECIFICIDADE DO TRABALHO
Tese de Doutorado apresentada ao Programa
de Pós- Graduação em Educação da Faculdade
de Educação da Universidade Estadual de
Campinas para obtenção do título de Doutor(a)
em Educação, na área de concentração em
Políticas,
Administração
e
Sistemas
Educacionais.
Supervisor/Orientador: Profª. Drª Débora Cristina Jeffrey
O ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À VERSÃO
FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA ANA KEILA
ENNES ANDRADE, E ORIENTADA PELA PROFª. DRª
DÉBORA CRISTINA JEFFREY
Campinas/SP
2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
TESE DE DOUTORADO
VISÃO E PERSPECTIVA JURÍDICA NA EDUCAÇÃO DE
JOVENS E ADULTOS (PROEJA): DIREITO À
INTEGRALIDADE E A DINÂMICA DA ARTICULAÇÃO COM
ESPECIFICIDADE DO TRABALHO
Autora: ANA KEILA ENNES ANDRADE
Orientadora: PROFª. DRª. DÉBORA CRISTINA JEFFREY
COMISSÃO JULGADORA:
Profª Doutora Débora Cristina Jeffrey
Prof. Doutor Luís Enrique Aguilar
Profª. Doutora Ana Elisa Spaolonize Queiroz Assis
Profª. Doutora Edite Maria da Silva Faria
Profª. Doutora Mara Pedrinho
A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do
aluno.
2015
Aos meus pais, Numa de Andrade e Meiga Ennes Andrade pelo exemplo de dignidade,
sabedoria e paixão pela vida.
À minha filha, Anna Maria Andrade Barbosa que é a mais extraordinária oportunidade de
amor que vivencio.
Esta tese é resultado da contribuição de várias pessoas, colegas, amigos e funcionários de diversos
órgãos e instituições que, com maior interesse e entusiasmo, colocaram-se a disposição durante o
processo de investigação, colaborando para a concretude deste trabalho, a todas essas pessoas meu
agradecimento e carinho.
À Universidade Estadual de Campinas pelo ambiente próprio e agradável para realização da
pesquisa.
À Professora Doutora Debora Cristina Jeffrey, brilhante docente e pensadora da educação, agradeço
a acolhida carinhosa, o interesse efetivo na realização desta pesquisa e, principalmente, os
ensinamentos transmitidos, o apoio, a paciência, incentivo e amizade nos momentos difíceis.
Agradeço, por tudo, Professora, sobretudo por me conceder a honra e a alegria de ser minha
orientadora neste trabalho.
Ao Professor Doutor Luís Enrique Aguilar, pelo exemplo vivo de caráter e de dignidade humana, pelo
carinho e incentivo; e a Professora Doutora Ana Elisa Spaolonize Queiroz Assis, amizade e
solidariedade permanentes, participantes da banca de defesa, na qual ao longo dessa jornada
contribuíram com acurados pensamentos filosóficos.
As professoras doutoras Edite Maria da Silva Faria e Mara Pedrinho pelo cuidado e a delicadeza nas
contribuições para enriquecimento do trabalho.
Aos professores das disciplinas cursadas durante o Doutorado José Roberto Montes Heloani, José
Roberto Reis Perez, Evaldo Piolli pelas contribuições à minha formação e demonstraram grande
apreço e carinho.
Ao Departamento de Direito da Universidade de Uberaba, em especial ao juiz estadual da Comarca
de Uberaba, professor Santo Aparecido Gutierrez, pela base da formação intelectual, sem as quais o
presente trabalho jamais teria sido possível.
Aos meus irmãos Maria Aparecida, Carlos Humberto, Teresa Cristina pelo incentivo e
companheirismo nesta jornada científica.
Aos meus colegas do IFTM (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo
Mineiro), especialmente a pedagoga Conceição Guedes pela amizade e companheirismo nas horas
difíceis.
Aos meus colegas da UNICAMP e a equipe administrativa pelo carinho e atenção nos momentos
difíceis, na acolhida fraterna e principalmente estímulo constante e credibilidade no trabalho
realizado.
Aos entrevistados E1 e E2 pela acolhida fraterna, pelo horário disponibilizado, e, as contribuições
para tratar de um tema político e, às vezes controverso.
Aos colegas das orações no Centro Espírita Francisco de Assis, pelo chá com sabor de amor de Jesus.
Enfim, meus agradecimentos a todos que, apesar de não mencionar, contribuíram de alguma forma à
tese.
“Os abolicionistas queriam que todos os brasileiros fossem livres da escravidão, nós
queremos que todos os brasileiros tenham acesso a uma escola de qualidade para serem
livres”.
Cristovam Buarque
Senador e ex-Ministro da Educação
RESUMO
A presente pesquisa tem o objetivo geral analisar o Programa de Integração da Educação
Profissional com a Educação Básica na modalidade de Educação Jovens (PROEJA) em
relação ao currículo, a partir de recontextualização da política, sob influência dos textos
políticos, tendo como base o levantamento documental da legislação produzida, na década de
2000. Pauta-se na análise do discurso da política mediante a utilização da Teoria
Tridimensional de Miguel Reale (REALE, 2003), como referencial teórico-metodológico.
Evidenciou-se que o currículo integrado proposto no PROEJA, representou uma possibilidade
de inovação, no que tange a formação integral dos estudantes, como forma de compreender e
se compreender no mundo. No entanto, não houve, com base na análise documental, a
incorporação de uma concepção de ensino médio integrado na perspectiva da formação
unilateral e politécnica. Ao contrário, a proposta de integração/articulação curricular
apresentada nos documentos oficiais reforçou o discurso de um ensino médio propedêutico,
no qual a profissionalização representou um processo específico e independente.
Palavras-chave: PROEJA. Política Educacional. Educação Profissional.
ABSTRACT
This research has the general objective to analyze the Vocational Education Integration
Program with the Basic Education in the form of Youth Education (PROEJA) regarding the
curriculum, from recontextualization of politics, under the influence of political texts, based
on the survey document the legislation produced, in the 2000s Tariff in the political discourse
analysis by using the Theory Three-dimensional Miguel Reale (REALE, 2003), as a
theoretical and methodological framework. It became clear that the integrated curriculum
proposed in PROEJA, represented a possibility for innovation, regarding the integral
formation of students as a way to understand and be understood in the world. However, there
were not based on document analysis, incorporating a high school design integrated the
perspective of unilateral and polytechnic training. On the contrary, the proposed integration /
joint curriculum presented in official documents reinforced the speech of a preparatory high
school, where the professional was a specific and independent process.
Keywords: PROEJA. Educational policy. Professional education.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Teoria Tridimensional do Direito ........................................................................... 23
Figura 2 – Três ordens de dialética ........................................................................................... 40
Figura 3 - Teoria Tridimensional do Direito ............................................................................ 41
Figura 4 – Organização da Sociedade Civil, atualmente. ......................................................... 47
Figura 5: As formas de comunicação e o discurso pedagógico em paralelo com ciclo de
políticas (BERNSTEIN, 1996) (VILLANUEVA, 2003) ......................................................... 64
Figura 6 - O Ciclo de Políticas e Programas Públicos............................................................ 121
Figura 7 – Rede Federal por Estado ....................................................................................... 123
Figura 8 – Organização dos níveis e etapas da educação brasileira em articulação com a
educação profissional e tecnológica ....................................................................................... 162
Figura 9 – Expansão da Rede Federal de Ensino Profissionalizante...................................... 166
Figura 10: Integração de informações de diferentes fontes na estruturação de um Sistema de
Indicadores de Monitoramento ............................................................................................... 168
Figura 11 – Organização do ciclo de matrícula no SISTEC................................................... 171
Figura 12 – Possibilidades de situação (status) de matrícula dos estudantes no SISTEC em um
ciclo. ....................................................................................................................................... 171
Figura 13 – Fluxograma ......................................................................................................... 180
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Distribuição Percentual da Matrícula por Etapa de Ensino e Dependência
Administrativa – Brasil 2013.................................................................................................... 86
Gráfico 2 – Distribuição do número de matrículas na Educação Profissional por Dependência
Administrativa – Brasil 2013.................................................................................................... 94
Gráfico 3 – Cenário da Rede Federal ..................................................................................... 122
Gráfico 4 - Distribuição de Carga Horária do núcleo comum definida pelo Parecer CFE
45/72. ...................................................................................................................................... 156
Gráfico 5 – Distribuição de matrículas em cursos ofertados pela Rede Federal de 2009 a 2013.
................................................................................................................................................ 163
Gráfico 6 – Distribuição da carga horária das disciplinas. ..................................................... 181
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Número de Matrículas de Educação Básica por Etapas e Modalidade de Ensino,
segundo a Dependência Administrativa - Brasil 2007 - 2013 .................................................. 85
Tabela 2 - Número de matriculas da Educação Profissional por Dependência Administrativa Brasil 2007 - 2013 .................................................................................................................... 95
Tabela 3 - Evolução da Taxa de Analfabetismo entre a população de 15 anos ou mais Brasil –
Ano 2000 e 2009 .................................................................................................................... 107
Tabela 4 - Sumário da avaliação de adequação das Metas do PPPA 2016-2019 com o PNE
2014-2024 ............................................................................................................................... 108
Tabela 5 - Documentos oficiais do MEC utilizados na análise documental .......................... 132
Tabela 6 - Documentos oficiais do IFTM utilizados na análise documental. ........................ 133
Tabela 7 – Legislação de Educação Profissional.................................................................... 134
Tabela 8 - Formato de identificação dos entrevistados .......................................................... 136
Tabela 9 – Distribuição de matérias e cargas horárias de um curso técnico. ......................... 155
Tabela 10 – Critérios de escolha dos lugares dos novos campi por fase da expansão. .......... 165
Tabela 11 – Quantitativo de campi da Rede Federal de Ensino Profissionalizante, por Região
e fase de expansão. ................................................................................................................. 165
Tabela 12 - Alunos Evadidos, Em Curso e Concluintes, por tipos de cursos, de ciclos de
matrícula iniciados a partir de 2004 e encerrados até dezembro de 2011. ............................. 172
Tabela 13 - Alunos em retenção por diferentes prazos e diferentes cursos, de ciclos de
matrícula encerrados até dezembro de 2011........................................................................... 173
Tabela 14 – Conjugação de indicadores para acompanhamento da Evasão........................... 173
Tabela 15 – Dados do PROEJA Agroindústria e PROEJA Contabilidade ............................ 180
Tabela 16 – Relação de trabalho e relação de emprego ......................................................... 195
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Portaria e Decretos do PROEJA ............................................................................ 52
Quadro 2 – Desenvolvimento da Educação Formal do Brasil – Período 1920 até 1990 ......... 68
Quadro 3 – Áreas Profissionais e Cargas Horárias Mínimas ................................................... 78
Quadro 4 – Resumo do Catálogo Nacional de Cursos Técnico de Nível Médio por Eixos
Tecnológicos conforme CNE/CEB nº 11/2008 ........................................................................ 82
Quadro 5 – CF/88 / LDB / EC 59/2009 ................................................................................... 90
Quadro 6 – CF/88 / LDB / EC14/1996 .................................................................................... 91
Quadro 7 – Comparativo CF/88 / LDB / Lei 11.741/2008....................................................... 93
Quadro 8 – Desenvolvimento da Educação Formal do Brasil 1990 até 2010 .......................... 97
Quadro 9 - Análise da LDB – 9.394/96 .................................................................................. 112
Quadro 10 - Análise Decreto .................................................................................................. 113
Quadro 11- Análise Decreto ................................................................................................... 114
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CAPES
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEB
Câmara de Educação Básica
CEE
Conselhos Estaduais de Educação
CEFET
Centro Federal de Educação Tecnológica
CEFET-MG
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais
CEFET-PR
Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (atual UTFPR)
CEFET-RJ
Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro
CEFET-RS
Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas
CF
Constituição Federal do Brasil
CFE
Conselho Federal de Educação
CHT
Ciências Humanas e suas Tecnologias
CNCT
Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos
CNE
Conselho Nacional de Educação
CODIR
Colégio de Dirigentes (do IFTMl)
CONCEFET
Conselho de Dirigentes dos CEFETs
CONIF
Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica
CONSUP
Conselho Superior (do IFSul)
CST
Curso Superior de Tecnologia
CT
Curso Técnico
DIN
CT em Desenho Industrial
DIREC
Diretoria de Relações Empresariais e Comunitárias
DIV-S
Classe da carreira docente
EAD
Educação na modalidade a Distância
EAF(s)
Escola(s) Agrotécnica(s) Federal(is)
EJA
Educação de Jovens e Adultos
EM
Ensino Médio
EPT
Educação Profissional e Tecnológica
E-Tec
Rede de educação profissional e tecnológica na modalidade de
educação a distância
ETF(s)
Escola(s) Técnica(s) Federal(is)
ETUF(s)
Escola(s) Técnica(s) vinculadas à(s) Universidade(s) Federal(is)
FAE
Faculdade de Educação
FHC
Fernando Henrique Cardoso (referente ao governo)
FUNDEB
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
HES
Hegemonia y Estrategía Socialista (livro)
IC
Iniciação Científica
IDEB
Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
IF(s)
Instituto(s) Federal(is) de Educação, Ciência e Tecnologia
IFET(s)
Instituto(s) Federal(is) de Educação, Ciência e Tecnologia (sigla inicial)
IFTM
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Triângulo Mineiro
INEP
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPCA
Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo
LC
Linguística de Corpus
LCT
Linguagem, códigos e suas tecnologias
LDBEN
Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional
ME
Microsoft Excel – Marca registrada
MEC
Ministério da Educação
NDE
Núcleo Docente Estruturante (previsto no SINAES)
OD
Organização Didática do IFTM
PAER
Pesquisa da Atividade Econômica Regional
PDI
Plano de Desenvolvimento Institucional
PDRAE
Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado
PL
Projeto de Lei
PPGE
Programa de Pós-graduação em Educação
PRDI
Pró-reitoria de Desenvolvimento Institucional
PROAP
Pró-Reitoria de Pesquisa, Inovação e Pós-graduação
PROEJA
Programa Integrado da Educação Profissional ao Ensino Médio na
Modalidade de Jovens e Adultos
PROEN
Pró-reitoria de Ensino
PROEX
Pró-reitoria de Extensão
PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego
ProPEd
Programa de Pós-graduação em Educação
PROPESP
Pró-Reitoria de Pesquisa, Inovação e Pós-graduação
PROTEC
Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Técnico
REUNI
Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das
Universidades Federais
RFEPT
Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica
SENAC
Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SENAT
Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte
SESC
Serviço Social do Comércio
SESI
Serviço Social da Indústria
SETEC
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
SIMEC
Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle do
Ministério da Educação
SINAES
Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior
SINASEFE
Sindicato Nacional dos Servidores Federais em Educação
TAE(s)
Técnico(s) Administrativo(s) em Educação
TCU
Tribunal de Contas da União
TD
Teoria do Discurso
UAB
Universidade Aberta do Brasil
UEP(s)
Unidade(s) de Educação Profissional
UERJ
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UFPel
Universidade Federal de Pelotas
UFRGS
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 18
CAPÍTULO 1 – FUNDAMENTALIZAÇÃO TEÓRICA E METODOLÓGICA ................... 27
1.1 ASPECTOS METODOLÓGICOS ..................................................................................... 27
1.2 ANÁLISE DE POLÍTICA.................................................................................................. 30
1.3 ANÁLISE JURÍDICA – TRIDIMENSIONALIDADE DE MIGUEL REALE ................ 37
1.4 FORMAÇÃO DA AGENDA ............................................................................................. 43
1.5 ANÁLISE DO DISCURSO ............................................................................................... 55
1.5.1 As contribuições teóricas de Basil Bernstein .............................................................. 55
1.5.2 A Noção de Recontextualização e a Análise de Políticas Educacionais e Curriculares
.............................................................................................................................................. 60
CAPÍTULO 2 – ANÁLISE DA TRAJETÓRIA DO ENSINO PROFISSIONALIZANTE .... 65
2.1 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO NO BRASIL A
PARTIR DE 1990 ..................................................................................................................... 70
2.2 O ENSINO PROFISSIONAL TÉCNICO DE NÍVEL MÉDIO – FORMAÇÃO - PROEJA
.................................................................................................................................................. 83
2.2.1 Legislação da Formação .............................................................................................. 83
3 TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO PROEJA .......................................................................... 98
3.1 ANÁLISE DO PROEJA - EJA INTEGRADA À EDUCAÇÃO PROFISSIONAL ESTRUTURA EDUCACIONAL BRASILEIRA .................................................................. 102
3.1.1 Análise da Lei 11.741/2006 e seus impactos na Constituição Federal de 1988 e na Lei
9.394/1996 - LDB ............................................................................................................... 110
3.1.2 Projeto de Lei 919 de 2007 ........................................................................................ 114
3.2.1 A construção do conhecimento na pesquisa ênfase as entrevistas ............................ 128
4 A CONSTRUÇÃO DAS POLÍTICAS CURRICULARES PARA A EDUCAÇÃO
PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA ................................................................................... 141
4.1 CONSTRUÇÕES TEÓRICAS: CICLO DE POLÍTICAS, TEORIA DO DISCURSO DE
BASIL BERNSTEIN, TRIDIMENSIONALIDADE DE MIGUEL REALE E A POLÍTICA
CURRICULAR PARA EPT................................................................................................... 142
4.1.1 A complexidade – Análise de política curricular na visão de Villanueva, Basil
Bernstein, Alice Lopes e Elizabeth Macedo ....................................................................... 142
4.1.2 Currículo e sua trajetória no contexto educacional ................................................... 144
4.1.3 A política curricular para educação profissionalizante na rede federal ..................... 150
4.2 PROEJA - POLÍTICA CURRICULAR NA REDE FEDERAL ...................................... 161
4.2.1 PROEJA dimensão curricular Rede Federal – Evasão e Repelência ........................ 167
4.2.1.1 Evasão dos Institutos Federais ................................................................................ 169
4.2.2 PROEJA: análise política curricular no IFTM .......................................................... 176
4.2.3 Currículo formador no PROEJA ............................................................................... 182
4.2.4 PROEJA – Na visão da tridimensionalidade de Miguel Reale ................................. 188
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 201
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................... 206
APÊNDICES .......................................................................................................................... 212
APÊNDICE 1 - RESUMO DO PROJETO DE PESQUISA .................................................. 212
APÊNDICE 2 - TERMO DE CONFIDENCIALIDADE ............................................................. 213
APÊNDICE 3 - ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA ANALISTAS POLÍTICOS .............. 214
APÊNDICE 4 – ORGANOGRAMA INSTITUCIONAL ......................................................... 216
APÊNDICE 5 – ORGANOGRAMA PRÓ REITORIA DE ENSINO ...................................... 217
APÊNDICE 6 – ORGANOGRAMA PRÓ REITORIA DE EXTENSÃO TECNOLÓGICA ... 218
APÊNDICE 7 – ORGANOGRAMA PRÓ REITORIA DE EXTENSÃO TECNOLÓGICA ... 219
18
INTRODUÇÃO
Na história se faz o que pode e o que gostaria de fazer. Uma das grandes tarefas
políticas que se deve observar é a perseguição constante de tornar possível amanhã,
o impossível de hoje. (PAULO FREIRE, 1992)
No momento atual, em que prevalece o pensamento tecnicista/utilitarista, atribuindo
à ciência apenas um caráter instrumental e produtivista realizar uma pesquisa na área de
educação se torna um esforço necessário para se buscar um conhecimento emancipatório e
libertador que considere o homem em toda sua dignidade. Diante deste fato, este trabalho tem
como campo investigativo a política educacional com ênfase na gênese da agenda de um
programa do governo federal que busca atender um segmento da sociedade, os jovens e
adultos que foram excluídos da escola.
Considerando que o Decreto nº 5.840 de 13 de junho de 2006 (PROEJA) é um
programa de integração da educação profissional, a presente pesquisa insere-se no debate das
políticas educacionais, mais especificamente das políticas de Educação Profissional e de
Educação de Jovens e Adultos (EJA), com foco na análise do programa PROEJA e suas
implicações para o currículo. E na busca da compreensão dos fenômenos que envolvem os
atores e os processos educacionais relativos à temática, algumas indagações foram articuladas
com o objetivo de conhecer os pressupostos teóricos e epistemológicos constitutivos dessas
representações, tais como: o PROEJA insere na política profissional? Quais os processos
históricos que incluíram os jovens e adultos na agenda política do governo? Este programa
educacional deve ser tratado como uma nova política ou um ajustamento? Há uma dualidade
entre a formal geral e a formação técnica? Existe uma proposta de articulação e/ou integração
entre os diferentes saberes na formação do trabalhador?
Estes questionamentos articulados no âmbito da pesquisa sintetizam sua justificativa
em compreender os aparatos políticos e legais na dualidade entre formação geral e a formação
técnica, no ensino profissionalizante, propondo ora a integração ou a articulação entre os
diferentes saberes na formação do trabalhador brasileiro.
Segundo dados da Pnad/IBGE 2009, o Brasil tem uma população de 57,7 milhões de
pessoas com mais de 18 anos que não frequentam escola e que não têm o ensino fundamental
completo. Esse contingente poderia ser considerado uma parcela da população a ser atendida
pela EJA. A educação de jovens e adultos (EJA) apresentou queda de 5,0% (374.098),
totalizando 4.234.956 matrículas em 2010. Desse total, 2.846.104 (67%) estão no ensino
fundamental e 1.388.852 (33%) no ensino médio. A maioria das matrículas de EJA está na
19
rede pública, distribuída da seguinte forma: 54,8% na rede estadual, 41,7% na rede municipal
e 0,4% na rede federal, cabendo à rede privada uma participação de 3,1%. Merece destaque
também a integração da EJA com a educação profissional. A educação de jovens e adultos de
ensino fundamental associada à formação profissional totaliza 14.126 matrículas, e as de
ensino médio 38.152. Esses números indicam que há espaço para ampliação da oferta de EJA
integrada a educação profissional. Os números são contundentes, ou seja, o atendimento de
EJA é muito aquém do que poderia ser. Essa questão precisa ser melhor analisada e os dados
do Censo podem contribuir para um diagnóstico e proposição de políticas de ampliação da
oferta dessa modalidade de ensino. É certo, porém, que tem reduzido o número de escolas que
oferecem EJA. Isso pode sinalizar um problema, sobretudo para o trabalhador que precisa de
motivação para voltar à escola. Menos escolas, mais dificuldades, sobretudo nos grandes
centros urbanos em que o deslocamento pode se tornar um impeditivo para acesso aos locais
de oferta. (INEP, 2010, p.17)
Entendemos que esses dados nos dão uma mostra da realidade educacional da
Educação de Jovens e Adultos (EJA) do país e o quanto são necessárias ações políticas que
encaminhem tais questões no sentido de se realizar o direito a educação para todos como
superação desse ordenamento societário. Não é razoável esperar que tais programas resolvam
a estrutura de classe preexistente na sociedade brasileira, mas analisar os currículos propostos
com intuito de verificar articulação e integração na proposta transdisciplinar e interdisciplinar,
com base nos valores propostos pelo programa na visão educacional, jurídica e social.
Assim sendo, nossa preocupação com esse tema se acentuou diante do quadro de
docentes para o ensino profissional, e do anúncio da implantação de uma nova política para o
ensino profissional, o PROEJA, visto que os professores da rede de instituições federais de
educação profissional e tecnológica seriam aqueles que, prioritariamente, efetivariam a
política. Nesse sentido, “[...] não se pode esquecer que a escola e, principalmente, a sala de
aula, são espaços em que se concretizam as definições sobre a política e o planejamento que
as sociedades estabelecem para si próprias, como projeto ou modelo educativo que se tenta
por em ação. ” (AZEVEDO, 1997, p.59) (Grifo nosso)
O PROEJA, programa criado pelo governo federal, tem como objetivo “atender a
demanda de jovens e adultos pela oferta de educação profissional técnica de nível médio, da
qual, em geral, são excluídos, como também do próprio ensino médio, em muitas situações”
(BRASIL, 2006b, p.05). Resguardando o mérito da iniciativa, preocupou-nos a forma como
tal programa vinha sendo implantado, sobretudo, no que concerne à formação curricular.
20
De início, destacamos que no próprio Documento Base do PROEJA (BRASIL,
2006b, p.43) fica instituído que as instituições proponentes – Instituições Federais de
Educação, Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e as Instituições Estaduais de
Ensino e Municipais Públicas – deverão ter experiência em EJA. Contraditoriamente, no
mesmo documento está posto que o governo federal, por meio do Ministério da Educação
(MEC), convoca a rede federal de educação profissional e tecnológica para atuar como
referência na oferta do ensino médio integrado à educação profissional na modalidade EJA,
sendo considerado o local privilegiado para o oferecimento desse ensino (BRASIL, 2006b,
p.23).
Ao mesmo tempo em que se pode considerar uma política inclusiva por acolher, nos
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia – IFs1 (antigos Centros Federais de
Educação Tecnológica – CFEETs – e nas Escolas Agrotécnicas Federais – EAFs) a EJA, por
acolher os jovens e adultos no resgate do direito à educação.
Os IFs têm sido, ao longo dos anos, referências no oferecimento da educação
profissional técnica de nível médio, porém as iniciativas na modalidade EJA, antes de criação
do PROEJA, são mínimas. Podemos citar algumas vivências de docentes da área técnica de
alguns IFs com pessoas jovens e adultas, como é o caso dos cursos técnicos sequenciais
(subsequentes)2 e dos cursos de qualificação profissional de nível básico (formação inicial e
continuada do trabalhador)3. No entanto, essas “experiências” não lhe dão a condição e a
“competência” para o desempenho (PPC4 integrados), já que a EJA tem se configurado como
um campo de conhecimento com posições teóricas e político-ideológicas próprias, exigindo
dos professores um preparo para o ensino, através de uma formação pedagógica específica,
que a considere.
Diante de tais propósitos para o campo, reconhecemos a complexidade dos currículos
para o PROEJA, já que segundo Kuenzer (2004, p.27):
O currículo, na perspectiva da politecnia, deriva princípio pedagógico que mostra a
ineficiência de ações meramente conteudistas, centradas na quantidade de
informação que não necessariamente se articulam para propor ações que levem os
alunos a uma relação com o conhecimento.
1
Entidade que representa professores e funcionários de 31 dos 34 CEFETs, das Escolas Agrotécnicas e do
Colégio Dom Pedro II.
2
Cursos técnicos oferecidos aos alunos que já haviam concluído o ensino médio.
3
Cursos de curta duração, em geral de 40h, oferecidos à comunidade, com vistas à inserção no mercado de
trabalho.
4
PPC – Projeto Político Pedagógico
21
Além disso, Kuenzer (2004), afirma que “uma nova forma de integração de vários
conhecimentos, através do estabelecimento de ricas e variadas relações que quebram os
bloqueios artificias que transformam as disciplinas em compartimentos específicos, expressão
da fragmentação da ciência”.
O documento base PROEJA aponta no artigo 1º §4º - Os cursos e programas do
PROEJA deverão ser oferecidos, em qualquer caso, a partir da construção prévia de projeto
pedagógico integrado único, inclusive quando envolve articulações interinstitucionais ou
intergovernamentais (Grifo nosso). Além disso, afirma que a formação de professores e
gestores objetiva a construção de um quadro de referência e a sistematização de concepções e
práticas político-pedagógicas e metodológicas que orientem a continuidade do processo.
Nesse sentido, várias são as questões que vêm nos inquietar com relação à qualidade
social do PROEJA, na perspectiva formativa de favorecer aprendizagens próprias para
propiciar a inclusão dos(as) alunos(as) que o procuram:
Como é visto o currículo em relação “integrar” e/ou “articular” dentro do
contexto da política do PROEJA?
Qual a concepção de “integrar” e/ou “articular” dentro do contexto jurídico e
pedagógico?
Assim sendo, para embasar nosso estudo e com o intuito de compreender, de modo
contextualizado, como estão se desenvolvendo a política do PROEJA nos currículos,
adotaremos o Ciclo de Políticas segundo Villanueva (2003), o caminho a um processo
político passa pelas seguintes fases:
a) de decisão-inicial (iniciación: planejamento, definição, opções e justificativa); da
estimativa (estimación: levantamento dos impactos positivos e negativos e escolha do
melhor programa), da seleção (seleción: escolha das opções possíveis pelas
negociações e definir quem executará);
b) de implementação (implementación);
c) de avaliação (evaluación)
d) de finalização política (terminacón: decisão sobre o futuro da política implantada e
avaliada).
Para este trabalho, o que nos interessa são as etapas do item a, que compreendem a
elaboração da agenda, com a tomada de decisões que decidirá se a questão entra para as
prioridades da agenda governamental e nela será incluída.
Por agenda de governo é entendido, na literatura, como o conjunto de problemas,
demandas, questões, assuntos que os governos selecionam e priorizam como objetos
22
de sua ação e, mais precisamente, como objetos sobre os quais decidem que vão agir
ou consideram que devem atuar5. (VILLANUEVA, 2003, p.29)
Além disso, para fundamentar e compreender será abordado “Fundamentos da
Política Jurídica” com base na tese da “Tridimensionalidade de Miguel Reale”.
Melo (1994, p.17) propõe o fortalecimento e autonomia da Política do Direito,
distinta da filosofia jurídica, destinada a tentar conciliar Política e o Direito, com o fim de
reaproximar a norma e o jurista axiológico do justo, ético, do legítimo e do útil. Assim, o
homem é um ser histórico social, cujos valores vão se formando e modificando ao longo de
suas vivências, desse modo, o Direito precisa acompanhar essas mudanças, não é possível um
Direito abstrato, distante da realidade social.
Osvaldo Ferreira de Melo corrobora com seguinte entendimento:
À Política do Direito cabe intercomunicar ambos os elementos, tornando-os
interdependentes, e examinar os âmbitos da Política e do Direito não como áreas
bastantes em si mesmas, mas como espaços suscetíveis de permanentes e desejáveis
influências recíprocas. O Direito necessita da Política para renovar-se continuamente
na fonte das mediações, e esta necessita daquele para objetivar em realidades e
valores a sua atividade quase sempre dispersiva e pragmática, ou seja, objetivá-la em
sistema de princípios e normas, formal e materialmente válidos. (MELO, 1994,
p.21)
E embasados na “Teoria Tridimensional do Direito” em que pese à norma ser o
objeto central do Direito, não há como se abandonar, para sua real interpretação e aplicação,
as questões fático-valorativas que antecedem a sua produção.
Diz textualmente o jurista Miguel Reale:
O direito é uma realidade trivalente, digamos assim, trivalente, ou, por outras
palavras, tridimensional. Ela tem três sabores que não podem ser separados um dos
outros. O direito é sempre fato6, valor7 e norma8, para quem quer que o estude,
havendo apenas variação no ângulo ou prisma de pesquisa. A diferença é, pois, de
ordem metodológica, segundo o alvo que se tenha em vista atingir, (...) de tal modo
que o discurso do jurista vai do fato ao valor e culmina na norma. (REALE, 2007,
p.121) (Grifo nosso)
5
“Por agenda de gobierno suele entenderse em la literatura el conjunto de problemas, demandas, cuestiones,
assuntos, que los governantes han selecionado y ordenados como objetos de su acción y, mas propriamente,
como objetos sobre los que han decidido que deben actuar o han considerado que tienem que actuar.”
(VILLANUEVA, 2003, p.29)
6
Fato: capaz de revelar as intencionalidades objetivas de um determinado lugar ou época, é compreendido não
como mero fato natural, mas sim imantado por um valor.
7
Valor: considerado não como objeto ideal, mas como deve ser, situado num plano prático e ligado a uma ação
8
Norma: descreve os valores que vão se concretizando na condicionalidade dos fatos sociais e históricos.
23
Assim os fatos e valores, dos quais a norma decorre, não se pode afastar as variáveis
que sobre elas incidem e influem, consistente na História e no Poder, pois “historiografia é o
espelho no qual temporalmente se contempla, adquirindo plena consequência de seu existir, se
seu atuar” (REALE, 2007, p.80)
Logo, graficamente9 acredita-se ser possível apresentar o seguinte esboço sobre a
teoria tridimensional do direito:
Figura 1 – Teoria Tridimensional do Direito
Fonte: REALE, 2007
Pelo gráfico e demais considerações, apresenta-se as categorias básicas da teoria
tridimensional (fato – valor – norma) e os seus elementos de variação (história e P(p)oder),
através dos quais se pretende a seguir fazer um estudo de percepção jurídica sobre a obra de
Osvaldo Ferreira de Melo, “Fundamentos da Política Jurídica”, a fim de responder aos
questionamentos levantados pela tese.
Nesse sentido, é mister destacar que o nosso objeto de estudo representa um recorte
na educação profissional, pois se trata da análise do “integrar” e/ou “articular” no PROEJA
em sua relação política, jurídica e pedagógica no currículo. Assim sendo, nossa categoria
teórica de pesquisa é o currículo.
O debate que está sendo proposto, no sentido de desenvolver a análise curricular no
processo de recontextualização do PROEJA, passa pela compreensão dos cenários sóciopolíticos-educacionais, focando nos princípios constitucionais de justiça, igualdade e
solidificando a importância dos processos de multiculturalidade, na perspectiva da inclusão
9
O gráfico foi elaborado a partir do esboço gráfico apresentado na obra: REALE, Miguel. Teoria Tridimensional
do Direito – situação atual. 2007, p. 124
24
social. E partindo do resgate do direito à educação, elegemos as seguintes subcategorias
teóricas: inclusão social e multiculturalismo.
Diante desse fato, o problema de pesquisa é definido, a partir do seguinte
questionamento: como os gestores educacionais estão recontextualizando a política do
PROEJA sob a influência do currículo partindo da análise “integrar” e/ou “articular”. Essa
recontextualização está (conduzindo) a processos de inclusão?
Dessa forma, elegemos como objetivo geral de pesquisa:
Analisar o programa de integração da Educação Profissional com a Educação Básica
na modalidade de Educação Jovens e Adultos/PROEJA em sua relação ao currículo a partir de
recontextualização da política, sob a influência dos textos políticos.
E como objetivos específicos:
Analisar elaboração da agenda, com a tomada de decisões que decidirá se a
questão entra para as prioridades da agenda governamental e nela será
incluída;
Analisar o PROEJA à Luz da Tridimensionalidade de Miguel Reale e que
interfere na interdisciplinaridade e transdisciplinaridade;
Identificar a relação entre “integrar” e/ou “articular” na proposta curricular nos
cursos do PROEJA na perspectiva formação dos alunos(as) no resgate do
direito à educação;
Com base nessa problematização inicial, o presente estudo é composto de três
capítulos.
O primeiro capítulo apresenta reflexões do campo teórico e metodológico sobre a
análise de política segundo Villanueva (2003) e a Luz da Teoria da “Tridimensionalidade de
Miguel Reale” (2007) no processo de interpretação da legalidade do PROEJA que irá orientar
a discussão, ao longo do trabalho. Das diversas etapas do processo de criação de políticas
públicas, toma-se a fase da elaboração de uma agenda governamental, com especial atenção
para o contexto social, econômico, político, educacional, junto com os atores sociais
administrativos, como categoria para explicar o PROEJA. Também expomos aqui os debates
sobre as políticas educacionais do Estado Brasileiro no governo Lula.
O segundo capítulo está dividido em três itens que estão relacionados com a
constituição do PROEJA. No item 2.1 faz-se um traçado da trajetória do ensino profissional
de nível médio no país, enfatizando as alterações na Lei 9.394 – Lei de Diretrizes e Bases da
Educação, decorrentes da Lei 11.741, de 16 de julho de 2008, fazendo uma relação entre estes
25
atos normativos e a redação do PROEJA. No item 2.2 analisa-se a trajetória da Educação de
Jovens e Adultos, institucional e formal. Em nossa pesquisa retrospectiva, encontra-se
experiências, ações e programas de educação de jovens e adultos no campo de alfabetização e
do ensino fundamental que forneceram subsídios práticos e teóricos para a noção do
PROEJA. Constatamos que o movimento de educadores, educandos, teóricos e pesquisadores
progressistas atuaram em prol do direito à educação e a preparação para o mundo do trabalho.
No item 2.3 apresentamos o ante projeto de lei e a publicação do PROEJA, resgatando as
mudanças formais e políticas para que avançasse a educação de jovens e adultos e a educação
profissionalizante no Estado Brasileiro, abordando as entrevistas E1 e E2 com objetivo de
fundamentar a visão da inclusão, ou não, de jovens e adultos na sociedade.
O objeto de análise, o PROEJA, será apresentado no capítulo três. Partindo da
legislação, o Programa é descrito, contextualizando com a conjuntura política, social,
econômica e educacional vigente no primeiro governo sob a presidência de Luís Inácio Lula
da Silva (2003-2006). Ao reconstituir a elaboração do programa, percebeu-se a sua
complexidade pelo fato de ser integrado com o ensino médio propedêutico, com o ensino
técnico profissional e com a educação de jovens e adultos enfatizando os currículos propostos.
Princípios e normas de cada uma dessas modalidades estão presentes no novo projeto.
Aqui, discute-se as políticas para o ensino profissional dos dois últimos partidos que
governaram o país, no que eles têm de permanência e de mudança. Também é apresentado a
relação do Programa com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia – IFTM.
Tomando como fonte o Decreto que instituiu o Programa e o Documento Base que definiu as
concepções e diretrizes, levantou-se as concepções políticas e educacionais que nortearam os
criadores da proposta. E finalizando apresentaremos o Programa Integrar realizado na
Confederação dos Sindicatos dos Metalúrgicos e sua comparação com “integrar” no Programa
PROEJA, fazendo uma comparação matriz pedagógica e metodológica pensada pela classe
trabalhadora
e
essa
matriz
nas
bases
educacionais
nos
IFs,
aprofundando
na
interdisciplinaridade e transdisciplinaridade.
Nas considerações finais, estabelecemos as relações do PROEJA com a educação
profissional, a Educação de Jovens e Adultos e com o Projeto Integrar. Procuramos esclarecer
porque um Programa com princípios antagônicos ao que o poder público vinha
desenvolvendo ao longo dos séculos consegue fazer parte da agenda do governo em 2005.
Segundo a disciplina “Análise de Política”, os atores políticos desempenham um papel
importante na formulação da agenda governamental. Em se tratando de políticas sociais,
como é a educação, os atores presentes na administração da coisa pública definem o
26
andamento de processos decisórios. Concordando com este ponto de vista é que foram
entrevistadas duas pessoas envolvidas, de forma ou de outra, com o PROEJA. A contribuição
das entrevistas foi no sentido de obter as impressões de quem participou da elaboração do
programa, de quem recebeu incumbência de implementá-lo e de um pesquisador que faz uma
análise crítica do projeto. A fala dos colaboradores indicou pontos relevantes que deviam ser
considerados nesta pesquisa.
Considerando que o entendimento da feitura de uma lei contribui para compreendê-la
e melhor interpretá-la, esperamos ter colaborado neste sentido. Ainda há que se destacar que a
análise de política e análise da lei na Tridimensionalidade de Miguel Reale contribuíram para
assegurar a democratização dos espaços de discussão, de elaboração e de acompanhamento de
políticas existentes e para se criar novos espaços de debate, ampliando a participação da
sociedade civil na discussão das questões nacionais sobre educação.
27
CAPÍTULO
1
–
FUNDAMENTALIZAÇÃO
TEÓRICA
E
METODOLÓGICA
1.1 ASPECTOS METODOLÓGICOS
O objeto de análise será o Programa Nacional da Educação Profissional com a
Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA, criado no
primeiro mandato do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003 a 2006).
A pesquisa consiste na realização de uma análise de política, adotando como
metodologia a concepção incremental, a qual possibilita estudar o contexto da conjuntura no
momento da formulação do Programa de Educação Profissional para jovens e adultos que
estão fora da escola. Esse caminho referencia o trabalho como análise e não como avaliação,
nem como defesa de política. Partimos da lógica dedutiva (do conceito para a análise) que
reconstrói o sentido e a direção do processo de formulação do Programa, identificando suas
origens conceituais, históricas, ideológicas e seus atores, apropriando do processo incremental
que se baseia em “caracterizar pela proximidade do real”, sendo um método descritivo que
parte situações existentes e se modifica para algo novo, Lindblom (1959)
O modelo incremental da elaboração de políticas significa a busca de solução para
problemas de maneira gradual sem provocar rupturas. Esta busca de modelos ou referenciais
analíticos com o objetivo de capturar os elementos essenciais do processo que levam a
compreensão de sua formulação e de sua institucionalização fundamentada pelo modelo
incremental.
O modelo incremental atribui ao ensino característica de bem público, classificado
pela teoria microeconômica e que o ensino tem característica de atendimento
constante e não exclusivo e de impactos de efeito social maior que a soma de
benefícios individuais sendo maior que a soma de natureza estatal (STOCO, 2006).
A educação brasileira envolve grupos de interesse com poder que interferem nas
questões educacionais. A esse respeito, Lindblom (1959) considera que o tomador de decisão,
mesmo de posse de um grupo de valores e objetivos amplamente aceitos e hierarquicamente
bem definidos, concentra em valores marginais. Logo, o tomador de decisões retorna
continuamente aos problemas e procura minorar estes problemas até atingir um estado ideal
futuro.
28
E vários fatores sociais e políticos passam a contribuir com o Decreto nº5.4781 de 24
de julho de 2005, posteriormente revogado pelo Decreto nº 5.8402 de 23 de julho de 2006
nasce o PROEJA. Assim, o modelo incremental, como forma de análise, permite captar os
movimentos de ajustes entre os grupos de interesse de negociação e barganha. Além disso, o
que garante o avanço das mudanças incrementais é um projeto de médio e longo prazo de um
governo.
No caso do Brasil, o governo atual não tem projetos de mudanças estruturais, o que
torna esse método adequado para analisar sua política educacional, pois de acordo com
Lindblom (1959), o incrementalismo é tanto uma boa descrição de como políticas são
realmente elaboradas quanto um modelo de como decisões deveriam ser tomadas. O ato de
tomar decisões incrementais evita que erros sérios venham a ocorrer e ainda possibilita
rápidas correções no processo. Logo, os governos procuram tornar mais racionais as suas
análises mediante processos de planejamentos formais, nos quais, muitas vezes, são
consideradas posições alheias ao governo em si. Os partidos políticos contrários ou de
oposição, procuram frequentemente promover o debate com base em fatos e dados. Segundo
Lindblom (1980), essas outras atividades não-governamentais contribuem para a formulação
das políticas governamentais.
Assim, o procedimento metodológico escolhido é a pesquisa bibliográfica, análise
documental e entrevistas. A análise documental toma por referência a legislação e os
documentos emitidos pelo governo federal, com destaque para a LDB/1996, os Decretos
5.154/2004, 5.840/2006, o Documento Base do PROEJA, Parecer CNE/CEB 11/2000, Lei
11.741/2008, dentre outros.
O levantamento de dados envolve documentação indireta, ou seja, o recolhimento de
informações por meio de fontes primárias, principalmente documentos oficiais que, para
Marconi e Lakatos (1996) constituem geralmente a fonte mais fidedigna de dados.
A pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo
assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a
conclusões inovadoras (MARCONI E LAKATOS, 1996). Este trabalho fez uso de
1
Decreto nº5.478 de 24 de julho de 2005 i O Proeja é o Programa âmbito das Instituições Federais de
Educação Tecnológica de integração da Educação Profissional com o Ensino Médio na modalidade de
educação jovens e adultos.
2
Decreto nº 5.840 de 23 de julho de 2006 O Proeja é o Programa Nacional de Integração da Educação
Profissional com a Educação Básica, na Modalidade de Jovens e Adultos, que tem por objetivo oferecer
oportunidade da conclusão da educação básica, juntamente com a formação profissional àqueles que não tiveram
acesso ao ensino médio na idade regular.
29
documentos escritos, envolvendo principalmente a Legislação que trata da Educação
Profissional, da Educação de Jovens e Adultos, do programa INTEGRAR, além de
documentos já divulgados em relação ao objeto de estudo, desde publicações avulsas,
boletins, revistas, livros, pesquisas, monografias, periódicos – revistas e jornais –
especializados, inclusive disponíveis em meios eletrônicos. É inegável o valor da legislação e
o contexto social presente no momento da construção de análise.
Os dados de resultados estatísticos foram encontrados nos órgãos oficiais de
pesquisa, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, o Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira – INEP, Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio –
PNAD.
É a análise dos dados quantitativos que expressará os desvios sociais e históricos
vividos pela sociedade que violam ou não o bem comum social.
Como busca de informações em fonte direta, entrevistou-se atores envolvidos no
Decreto do PROEJA que apresentou e justificou a concepção do programa. Estas entrevistas
tiveram como principal contribuição à pesquisa um caráter complementar da busca
documental e bibliográfica, indicando caminhos e tópicos a serem incorporados ao trabalho.
O entrevistado 1 (E1) atuou como professor titular da Faculdade de Educação da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), membro do Conselho Nacional de Educação
(CNE) na Câmara da Educação Básica (2009-2011) e atualmente membro do Conselho
Superior da Capes. Tem experiência na área de Direito à Educação, atuando principalmente
em temas como: lei de diretrizes e bases, política educacional, legislação educacional e
educação para jovens e adultos. Foi realizada uma entrevista semiestruturada com objetivo de
obter informações sobre o processo formulação do Decreto 5.840/2006 e o “integrar” e
“articular” dentro do contexto da legislação profissional, e educação de jovens e adultos.
O entrevistado 2 (E2) atua como Conselheiro do Conselho Nacional de Educação
licenciado em filosofia, Teologia e Pedagogia. Sociólogo e orientador social do SESC de São
Paulo, Conselheiro do Conselho Estadual de São Paulo, Conselheiro do Conselho Municipal
de Educação, Conselheiro Titular da Câmara de Educação Básica, Membro Diretor IPPH –
Instituto Paulista de Promoção Humana, Coordenador do Sub grupo “Educação TécnicoProfissional”, membro do Conselho Diretor do IQE – Instituto de Qualidade no Ensino,
vinculado à Câmara Americana de Comércio, Consultor do Programa “Aprendendo a
Aprender” da Secretaria Estadual Emprego e Relações do Trabalho de São Paulo, Membro do
Conselho Diretor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Esta entrevista
30
foi realizada para identificar o nível de participação do Conselho Nacional em relação ao
processo concretização do PROEJA e sua compreensão entre “articular” e o “integrar” no
contexto da legislação educacional jovens e adultos e da legislação profissional.
Este trabalho tem como característica ser uma “análise de política” na qual se
fundamenta em um conjunto de observações, de caráter descritivo, explicativo e normativo,
na política pública – o PROEJA.
De acordo com Lasswell (1958), a análise de política, trata-se de um campo de forte
caráter contextual (preocupado com as especificidades de cada contexto), multidisciplinar e
multimetódico e orientado por problemas. Wildavsky (1979) complementa essa leitura ao
afirmar que a análise de política representa um campo cujas fronteiras (interna e externa) de
investigação não obedece a limites rígidos, sendo estabelecido de acordo com a natureza do
problema a ser analisado.
E segundo Triviños (1990), a abordagem qualitativa tem como foco principal a
compreensão, descrição e interpretação de significados que as pessoas projetam do fenômeno
em estudo. O roteiro seguido por esta metodologia, de forma bem ampla, abrange a escolha
do assunto, a fundamentação por uma revisão teórica da literatura em torno do tema
escolhido, a coleta e análise de dados. Os dados interpretados pela análise são cruzados com a
teoria resultando em algumas conclusões.
Por sua vez, Sanches Gamboa (1987) argumenta que uma boa pesquisa faz uso de
dados qualitativos e quantitativos conforme a necessidade do objeto em estudo. Defende que
esta divisão entre método quantitativo e qualitativo deve ser superada, uma vez que elas se
completam para proporcionar um melhor conhecimento dos fenômenos analisados. Nesse
sentido, desaparece a radicalidade da dualidade quantitativo/qualitativo, admitindo a interrelação entre elas diante de uma visão dinâmica dos fenômenos. São apenas técnicas para
desenvolver o projeto dentro de um método que se enquadra na teoria escolhida pelo
pesquisador.
1.2 ANÁLISE DE POLÍTICA
A partir dos anos 1960, cresce o interesse pelo estudo em análises de políticas
públicas (public policy) nas sociedades industrializadas ocidentais, com estudos nos Estados
Unidos e Inglaterra, motivados pelo surgimento do Estado de Bem Estar Social (welfare state)
e pelas mudanças ocorridas na forma de se fazer política. Nesse sentido, a análise de política
foca no comportamento dos atores sociais e no processo de formulação da agenda e da
31
política, busca entender o porquê e para quem a política foi elaborada, e não só olha o
conteúdo da política pública em si. Segundo Oszlak (1997), a configuração particular (ou a
identidade) assumida pelo Estado em cada momento histórico depende da direção que é
conferida a agenda.
No Brasil, a análise de política se encontra em permanente construção e expansão,
devido ao conhecimento sobre o processo de apropriação do ato normativo e a identificação
de seus idealizadores, caracterizando o processo de formulação de políticas. A esse respeito,
Viana (1996) define que o momento da formulação envolve três subfases: primeira, quando
uma massa de dados transforma-se em informações relevantes; segunda, quando valores,
ideais, princípios e ideologias se combinam com informações factuais para produzir
conhecimento empírico e normativo é transformado em ações públicas.
Este trabalho situa-se na temática geral de natureza teórica, abrange as discussões
sobre o processo de formulação do programa PROEJA numa abordagem vinculada
ao contexto educacional, como desenhar a política PROEJA na sua integração e/ou
articulação (VIANA, p.13, 1996).
Mondragón (2006) identifica dois momentos relativos a formulação:
O primeiro é o processo decisório, no qual os atores políticos3, com base em
variáveis diversas (valores políticos, de organização, pessoais, governamentais e
ideológicos; projeção de resultados; recursos envolvidos; níveis de conflito; caráter
objetivo ou subjetivo da política; intensidade de capital ou recursos humanos
necessários à efetividade da política; dotação orçamentária4 etc.) influenciam,
consideravelmente, a escolha das alternativas e o esqueleto da política pública. O
segundo é o processo formal, em que se configura em política pública por meio de
medidas administrativas. Os espaços que legitimam e formalizam essas decisões
são: legislativo (leis); executivo (decretos, medidas provisórias e resoluções); e
judiciário (interpretam leis etc.).
Este trabalho situa-se na temática mais geral de natureza teórica, que abrange
discussões do processo de formulação de programas numa abordagem vinculada ao contexto
educacional do período. O objeto de análise política “é descobrir o que os governos fazem,
porque o fazem e que diferença isso faz. É a descrição das causas e consequências da ação do
governo” (DYE, 1976, apud HAM e HILL, p.7, 1993).
Também destaca-se o seu caráter interdisciplinar, fazendo uso de conceitos de outras
disciplinas, como sociologia, economia e direito. Para reduzir as possibilidades de desvios de
3
Neste momento, utilizamos a denominação de atores políticos para diferenciar de atores sociais, algo mais
amplo. No momento da formulação, compreendemos que, na sua maioria, a tomada de decisão se dá pelos atores
políticos, participantes do processo político.
4
A formalização da decisão, para esta virar um programa, é necessário haver dotação de recursos para
implementar a política pública. Não podemos nos esquecer que, também, há disputa entre órgãos do governo
pelos recursos financeiros.
32
interpretação, identifica-se como análise de política o método que descreve a natureza e
dinâmica das variáveis de determinada política, utilizando instrumental e conceitos que lhe
são pertinentes.
O intento de identificar e pesquisar variáveis da elaboração do programa classifica
este trabalho como uma “análise de política” e não como uma avaliação, nem como uma
defesa de política. (DYE, 1976, apud HAM; HILL, 1993, p.57).
A atividade política pode ser analisada em termos de um sistema contendo uma série
de processos que devem permanecer em equilíbrio, a fim de que a atividade sobreviva. Há
diversos modelos de análise de um sistema político com suas ações e tomadas de decisão: o
enfoque sistêmico esboçado por David Easton (1953) e Eastman (1965). Este modelo separa o
processo de políticas em vários estágios: a formulação, a implementação e a avaliação, cada
um composto por subdivisões que facilitam a análise. As demandas são as influências
externas e internas, incluindo os fazedores de política, que irão movimentar a formulação da
agenda. Este modelo também possibilita algo que qualquer teoria explicativa satisfatória de
políticas públicas deve ter, que é explicar as inter-relações entre o Estado, a política, a
economia e a sociedade (o ambiente).
Porém, das críticas a este modelo, destaca-se uma feita por Lindblon:
[...] a ideia de policy process geralmente incorpora o pressuposto ou sugere a
imagem de que a política seja um 'processo ordenado, racional, como um roteiro,
com sua introdução, desenvolvimento e conclusão, logicamente articulados'; a
política é, pelo contrário, um processo desalinhado, desorganizado (untidy process),
no qual se misturam e sobrepõem sem ordem nem clareza várias questões e
respostas, vários atores, a decisão e a imposição, a atividade intencional e a inércia
(LINDBLON, apud VILLANUEVA, 2003, p. 17)5.
Há necessidade de reconhecer que as redes sociais6 tem apresentado a diversidade
das organizações estatais, a pluralidade de interesses e as múltiplas formas de relacionamento
entre esses atores. E a quantidade dos programas públicos, a multiplicação dos atores com
valores e interesses heterogêneos, a erosão das fronteiras entre o público e o privado e a
transnacionalização das políticas públicas transcorrem em inter-relações (MARQUES, 2005
p.46)
5
Más aún, la idea de policy process suele incorporar el supuesto o sugerir la imagen de que la hechura de la
política sea un 'proceso ordenado, racional, a la manera de un escrito, con su prólogo, desarrollo y final,
lógicamente articulados'; la política es, en cambio un proceso desaliñado, desordenado (untidy process), en el
que se mezclan y sobreponen sin cuidado y claridad varios problemas y respuestas, varios actores, la decisión y
la imposición, la actividad intencional y la inercia”. (VILLANUEVA, 2003, p. 17).
6
Redes sociais: “o conjunto de relações entre atores estatais, e entre esses e atores externos ao Estado, mas a ele
ligados de inúmeras formas”. (MARQUES, p.4, 2005)
33
Todos os modelos têm vantagens e desvantagens dependendo do objeto da pesquisa,
por isso “é importante tentar desenvolver modelos do modo como decisões são tomadas e
compará-los a fim de perceber as diferentes formas em que eles nos ajudam a compreender o
processo” (HAM; HILL, 1993, p. 16). Nesse sentido, não pretendemos seguir um único
modelo de análise de decisões, apenas estabelecer alguns conceitos e estruturas que nos
permitam fazer uma análise da formulação do PROEJA.
Uma política pública geralmente envolve mais do que uma decisão e requer diversas
ações estrategicamente selecionadas para implementar as decisões tomadas. Uma decisão
política corresponde a uma escolha dentre um leque de alternativas. A sua dimensão pública é
dada não pelo tamanho do agregado social sobre o qual incidem, mas pelo seu caráter
“imperativo”. Isto significa que uma das características centrais é o fato de que são decisões e
ações revestidas de autoridade soberana do poder público (HAM; HILL, 1993, p. 76).
Assim, pode-se considerar que grande parte da atividade dos governos destina-se à
tentativa de satisfazer as demandas que são dirigidas pelos atores sociais7 ou aquelas
formuladas pelos agentes do sistema político. Na realidade, o próprio atendimento de
demandas é um fato gerador de apoio constituindo “procedimentos formais e informais de
resolução pacífica de conflitos”. E o PROEJA é uma demanda dos sujeitos merecedores do
direito à educação e de organizações civis que defendem a educação para todos de acordo
com o Princípio Constitucional elencado na Constituição Federal de 1988 – Princípio da
Dignidade8.
E o processo de formação de políticas segue as seguintes etapas: surge a demanda
expressa em aspirações quanto à solução de um problema (baixa escolaridade e carência de
qualificação técnica) - o problema entra na agenda (pressão externa e interna) – inicia a
7
Atores sociais: atores políticos que não mantém vínculo profissional com o Estado, para fazer valer o seu
interesse. É o caso das associações cidadãs, das Organizações não-governamentais (ONGs), dos grupos de
interesse, dos grupos de pressão e do cidadão comum. Não são menos importantes que os atores públicos,
embora estejam mais distantes das ferramentas de implementação das políticas públicas.
8
Nossa Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história constitucional brasileira, consagrou o
Princípio da Dignidade da pessoa humana, seguindo o movimento internacional de constitucionalização deste
princípio. Não só o consagrou, mas colocou-o como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil
constituída em Estado Democrático de Direito, nos termos do atr. 1º, inciso III. Além de abarcar o princípio da
dignidade da pessoa humana, a Constituição Federal de 1988 trouxe, também o mínimo existencial, ou piso
mínimo normativo, sendo o princípio da dignidade da pessoa humana uma norma jurídica constitucional, se
reveste do caráter da imperatividade que possui as normas jurídicas em geral. Sendo imperativo, esse princípio
precisa ser respeitado sob pena de acarretar consequências ao seu transgressor, e, se necessário também se faz
um meio capaz de tutelar este princípio na esfera judicial. Assim, a norma jurídica dotada de imperatividade que
veicula o princípio da dignidade da pessoa humana deve possuir aplicabilidade, na medida em que exista
consequência jurídica para seu transgressor e meios jurídicos de tutela jurisdicional da mesma. (José Afonso da
Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 109)
34
formulação de alternativas (programas para educação profissional) - aspirações se
transformam em expectativas - os atores se mobilizam (realização de conferências e
documentos) – processo decisório (aceita a reivindicação) – ação do governo (decreto do
PROEJA) – implementação (VILLANUEVA 2003). Assim, a questão educacional é uma
demanda recorrente9 que está em pauta.
Com essas considerações, é possível se aproximar de uma resposta para indagações,
quais sejam: como se forma uma agenda de governo e por que se forma desta maneira? Por
que alguns assuntos públicos chegam à agenda? Que lógica e dinâmica explica a inclusão ou
eliminação dos assuntos? Seus canais terminam por ser cooptados pelos assuntos privados dos
grupos políticos e eleitoreiros? Os canais dos partidos políticos são os únicos para canalizar os
interesses da comunidade ou concorre a atividade de outras formas de organização? Qual é o
impacto dos meios de comunicação de massa na configuração dos problemas e de sua
chegada a agenda?
No presente trabalho pretendemos indicar alguns grupos e organizações que
influenciaram na formulação da política do PROEJA, num cenário que tem elementos
nacionais e internacionais, econômicos, culturais e políticos, atuando no campo educacional
brasileiro.
E o que caracteriza um bom governo é sua ação em deliberar sobre questões que são
pertinentes, não decidir prematuramente, adotar decisões, pois, nem tudo é assunto público, e
há assunto público no exato momento não é urgente e há questões que são do público local
(estados, municípios, organizações). A filtragem se torna uma atividade estratégica na medida
em que decidir se uma questão merece ser objeto de ação governamental significa
comprometer-se e por em jogo os recursos financeiros do Estado (VILLANUEVA, 2003).
Portanto, a formação de uma agenda é uma filtragem; se uma questão merece ser objeto de
ação governamental. Isto é, nem todos os temas podem ir para a agenda.
Flexor e Leite (2007) corrobora com o seguinte entendimento:
Para que isso ocorra é necessário: 1) que o problema seja relacionado com o escopo
de atividades de uma autoridade; 2) que o problema seja capaz de ser traduzido na
linguagem da ação política; 3) a existência de uma situação problemática, i.e., a
presença de um hiato entre, por um lado, as expectativas e aspirações e, por outro
lado, os desejos e crenças do que deveria ser feito e realizado. (FLEXOR e LEITE,
2007, p. 9).
9
Para o governo existem, basicamente, três tipos de demandas: as demandas novas (aquelas que resultam do
surgimento de novos atores políticos ou de novos problemas); as demandas recorrentes (problemas não
resolvidos, ou mal resolvidos, e que estão sempre voltando a aparecer no debate político); e as demandas
reprimidas – são aquelas constituídas por estados de coisas (algo que incomoda, prejudica, gera insatisfação para
muitos indivíduos, mas não chega a constituir um item da agenda governamental impedido por interesse ou por
não-decisões) (HAM; HILL, 1993). (Grifo nosso)
35
Diante desse processo, o governo decide por uma ação adequada à escolha feita. Em
virtude disso, o pesquisador de análise de políticas deve levar em consideração vários
aspectos: a estrutura social; o contexto econômico e político; as forças políticas; e a rede de
influências que atuam no processo de formulação da agenda de uma política e da tomada de
decisões nas diferentes esferas.
O PROEJA tem um problema público que são os jovens e adultos sem escolarização,
portanto nasce de um grupo de agentes sociais e de gestores governamentais que têm uma
concepção de sociedade em que pauta a justiça e uma educação que valorize a formação
integral dos cidadãos.
A agenda sistêmica (do Estado) está relacionada com questões genéricas, abstratas e
globais e a agenda institucional (de organizações e setores governamentais) tende a ser mais
específica como a educação profissional de jovens e adultos.
Cobb e Elder (1972, 1976, 1983, apud VILLANUEVA, 2003), ressalta que o modelo
conflitos do grupo se estrutura em três requisitos básicos necessários para que um assunto se
torne uma questão pública e alcance a agenda governamental: que o tema seja objeto de
amplo conhecimento e atenção do público, e que tenha necessidade de ação e que, no
entendimento da comunidade política, a ação seja competência de algum órgão
governamental.
No caso do PROEJA, a iniciativa da proposta resultou da influência do grupo de
identificação10, formado pelos educadores envolvidos com a educação de jovens e adultos,
organizados em fóruns diversos e receberam apoio do novo governo, a partir de 2003.
E a capacidade de decisão do governo aumenta ou diminui com o volume da pressão
das forças sociais. No governo Lula, este quadro se altera, mas aparece as organizações do
capital e as organizações trabalhistas (centrais sindicais) na esfera de um triângulo de ferro11 e
tendo como partido político que abraça os jovens e adultos e a profissionalização – Partido
dos Trabalhadores (PT), ao contrário do governo, Fernando Henrique Cardoso, em que assiste
o desmantelamento da Educação Profissional. Oliveira (2009) observa que as políticas do
governo Lula caracterizam-se por:
[...] uma valorização da educação profissional, traduzida no expansionismo da Rede
Federal de Educação Profissional e Tecnológica; na implementação de Programas de
10
Grupo de identificação: formado pelo público diretamente afetado pela questão e/ou envolvido socialmente.
Triângulo de ferro: é a denominação dada pela tradição intelectual pluralista americana para designar o tipo de
relações de poder que ocorrem entre as organizações sociais corporativas e os poderes do Estado. Segundo esta
corrente os grupos de interesse são poderosos a ponto de sempre definir a agenda de governo. Negam a rede de
influências que atuam na arena política (VILANUEVA, p. 46). (Grifo nosso)
11
36
Educação Profissional que buscam promover a inserção de sujeitos de camadas
sociais menos favorecidas, nos setores societário e produtivo; na propositura de
garantir a qualidade da educação profissional, através, de uma infraestrutura
adequada; no resgate das bolsas destinadas aos alunos carentes; na realização de
concursos e de melhores condições salariais e de trabalho para os professores e
funcionários. (OLIVEIRA, 2009, p.6-7)
É nessa fase de restauração democrática que o Partido dos Trabalhadores (PT), sob o
comando do Presidente Lula, traz novos referenciais teóricos para a análise da realidade
brasileira. É nesse ambiente que a compreensão da escola, como um espaço de mera
reprodução da sociedade, passa a ser contestada, conforme assinalou Dore (1989):
Como o eixo de organização cultural dos trabalhadores – assim como o sindicato o é
no plano econômico e o partido no plano político – adquirindo uma importância que
nunca desfrutara nas teorias revolucionárias da esquerda. A partir dessa nova
posição teórica frente à questão cultural, o movimento popular moderno apresentou
a proposta de “escola unitária” como perspectiva capaz de se contrapor à hegemonia
da “escola nova” proposta escolar das forças dominantes. (DORE, 1989, p.14)
Assim, em defesa da escola pública, a esquerda assume a proposta de uma “escola
unitária” defendida por Gramsci. A ideia de escola unitária12 apresentada por Gramsci
representa um horizonte conceitual e político na luta contra o dualismo escolar. Dore (1999a,
p.111), dispõe que o dualismo escolar é um produto da estrutura social classista do sistema
capitalista, ou seja, organização dual da escola.
Tendo a igualdade social como horizonte, a proposta do PT é a defesa da ideia de
escola unitária, rejeitando a dualidade da formação dos cidadãos que reproduz a divisão entre
governados e governantes e fundamenta-se na unidade das formações gerais e profissionais.
Desse modo, o PROEJA marca o início deste novo olhar dos fazedores de política do PT sob
a tutela do Presidente Lula, fundamentados no conceito de escola unitária de Gramsci, no qual
defende a necessidade de criação de uma escola preparatória que conduza todos os jovens até
a escola profissional, sendo esses jovens capazes de pensar, estudar, dirigir e controlar quem
dirige, não exercendo apenas o trabalho manual. O operário que, democraticamente, teve as
condições necessárias de se qualificar e de exercer uma função de direção, constrói para si a
oportunidade de tornar-se um “governante”. O envolvimento teórico e prático com a
organização da sociedade poderá proporcionar as efetivas condições para que a
governabilidade se exerça. (AMORIM et al., 2011, p.12) dispõe que:
Para Gramsci, a escola deveria ser única, no sentido de dar a todos oportunidades
iguais de formação, e diversa no sentido de propiciar diferentes possibilidades de
12
Escola unitária trata-se de uma proposta apresentada por esse filósofo italiano nos anos 30 e divulgada no
Brasil nos anos 80 como “estratégia para superar a dualidade da escola, dividida em escola formação humanida e
de formação profissional”. (DORE SOARES, R. Escola média no Brasil por que não unitária? Site:
<http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=168> Acesso em: 24 fev 2015)
37
formação. Trata-se da unidade na diversidade, um dos princípios dialéticos mais
caros do pensamento de Marx. A unicidade, como igualdade, não significa a
supressão do diverso de multiplicidade, e sim a supressão das desigualdades.
Significa adquirir uma formação que propicie a todos alcançar o nível mais elevado
do pensamento humano, conquistando capacidades para exercer a crítica do mundo
em que vivem e ao mesmo tempo serem capazes de dirigir de governar. (AMORIM
et al., 2011, p.12)
Porém, o entendimento da escola unitária parece equivocada, por parte dos
formuladores da medida, pois conforme assinalou Soares (2000, p. 34):
A realização da “escola unitária” não está condicionada à derrocada imediata do
estado burguês porque, para Gramsci, a construção de uma nova sociedade se dá no
processo de luta pela destruição da ordem social capitalista. Examinando nessa
perspectiva a “escola unitária”, ele afirma que um dos meios para conquistá-la seria
o desenvolvimento dos elementos racionais da “escola nova” e a luta contra seus
aspectos conservadores e elitistas, até que a organização escolar se tornasse
efetivamente democrática (SOARES, 2000, p.34).
No momento atual, a análise de política do PROEJA se torna um esforço necessário
para se buscar um conhecimento emancipatório e libertador que considere o homem em toda
sua dignidade. Apple, Girox e Maclaren (1989), com corroboram a respeito que:
Nossos debates sobre o papel da educação na distribuição e na produção do poder
econômico, político e cultural desenvolveram-se demasiadamente em um nível
muito abstrato, em vez de pegar os instrumentos e aplicá-los à história e à realidade
concretas das políticas e das práticas envolvidas na organização do ensino e do
currículo.
Imbernón, p.81 resgata as vicissitudes sociais e educacionais segundo os passos de
Paulo Freire:
É preciso desenvolver novas formas de linguagem crítica que permitam, por um
lado, desvelar o currículo oculto e, por outro, descobrir outras maneiras de ver o
mundo e a educação. Nesse mesmo sentido, precisamos analisar o progresso de
maneira não linear, nem monolítica, mas integrando outras identidades sociais,
outras manifestações culturais da vida cotidiana e outras secularmente
marginalizadas.
Com base nos referidos autores e conceitos anteriormente mencionados, o próximo
item contextualiza o PROEJA na análise jurídica focado na Teoria Tridimensional de Reale
que se estrutura no fato, valor e norma para análise deste programa.
1.3 ANÁLISE JURÍDICA – TRIDIMENSIONALIDADE DE MIGUEL REALE
A nomogênese jurídica (analise jurídica) corresponde ao processo de nascimento de
uma norma jurídica, processo esse intimamente ligado com o poder. Não se trata aqui de
analisar tecnicamente as várias etapas do processo legislativo, mas sim de como os políticos
38
selecionam os assuntos a serem objeto de deliberação no Congresso Nacional e como esses
assuntos serão colocados no papel, à luz do entendimento de Reale.
Qualquer lei equivale ao instante culminante de uma gama respeitável de
fatores, que podem ser agrupados em dois tipos: os de cunho axiológico e os de cunho fático.
Todavia, há de chegar um momento no qual os negociadores optam por uma das alternativas
que têm a seu dispor. Importante, portanto, os ensinamentos de Miguel Reale (1999, p. 193):
“nada mais incompatível com o direito do que a incerteza, a carência de uma diretriz insegura:
o direito responde, de maneira primordial, ao desejo espontâneo que o homem tem de fugir à
dúvida, mais pungente no plano moral da ação do que no plano intelectual da especulação
pura”. Prosseguindo, ensina o citado autor que “uma opção se impõe, e toda vez que se
escolhe uma via, sacrificam-se todos os demais caminhos possíveis. Dentre os vários projetos
de lei em debate em um parlamento, por exemplo, a respeito de um dado assunto, por mais
que se procrastine, chega o momento do fiat lex, átimo culminante de uma decisão. É este o
momento decisório e decisivo do Poder” (REALE, 1999, p. 194).
Abordaremos o pensamento filosófico de Miguel Reale para construir o mundo
ideológico do jurista, pois o ato de filosofar brota de uma constante inquietação humana com
seus problemas e questões mais essenciais, restando ser a busca de significações e princípios,
representando “perene esforço de sondagem nas raízes dos problemas” (REALE, 2002, p.7),
como forma de compreender a Teoria Tridimensional do Reale.
Para a teoria de Miguel Reale, essa filosofia do Direito não é específica, porém
presente na obra de inúmeros filósofos podendo ser classificada implícita, marcando a fase da
justilosofia, a qual se estende dos pré-socráticos até Kant. A partir do criticismo kantiano,
inaugura-se uma Filosofia do Direito explícita, adquirindo a condição de disciplina autônoma,
através da passagem do jusnaturalismo para a experiência jurídica crítica (REALE, 2002, p.
288).
Inspirando-se em Stammler, 1925, neste momento em que demonstra explicitamente
suas relações com o neokantismo:
O pensamento stammleriano, que alcançou ampla ressonância, merece ser
examinado de maneira especial, por sua inegável atualidade, ao pôr em realce o
problema do Direito como estimativa, e ao conceber a regra ou norma de Direito
como norma de cultura, reconhecendo a importância dos problemas dos valores para
a Jurisprudência, embora fazendo-o, repetimos, de um modo excessivamente lógicoformal em harmonia com os esquemas aprioristas da Escola neokantista de
Marburgo. (REALE, 2002, p. 305)
Assim propõe que a Filosofia do Direito se divida em uma parte geral e outra
especial, resumindo-se a primeira à ontognoseologia jurídica. Já na parte especial, adota três
39
componentes, a epistemologia jurídica, ou doutrina das ciências do Direito (entendida como a
preocupação com o “o problema da vigência e dos valores lógicos do Direito”); a deontologia
jurídica, ou doutrina dos valores éticos do Direito (preocupada com “o problema do
fundamento do Direito”); e, por fim, a culturologia jurídica, ou doutrina do sentido histórico
do Direito (tratando do “problema da eficácia social do Direito”) (REALE, 2002, p. 305).
Dentro dessa Filosofia do Direito, alinhada com o criticismo próprio de Kant, surge a
questão primordial e típica do culturalismo dos valores, ou seja o ser e o deve ser. (REALE,
2002, p.324)
Toda regra jurídica traduz um imperativo de conduta, a obrigatoriedade de um
comportamento, uma exigência de ação ou de omissão. Quando se fala em lei
jurídica, fala-se na obrigatoriedade de um comportamento possível. A lei físiconatural, como já dissemos, é, em sua essência, uma súmula estatística dos fatos. O
cientista, nos domínios da Física, procura refletir o fato na sua objetividade,
expressando-o em fórmulas possivelmente quantitativas e matemáticas. [...] As leis
físico matemáticas não possuem sanção, porque a sanção é algo de extrínseco à
regra, algo que se acrescenta à lei, para garantia de sua obrigatoriedade. (REALE,
2002, p.324)
Portanto, a ideia realeana sobre a Filosofia do Direito está diretamente vinculada à
cultura e aos valores relacionados com os fatos (fenômenos) verificados na sociedade,
interpretados conjunta e complementarmente, se desvelando tal articulação através da
tridimensionalidade do direito.
Pode-se perceber que essa colocação do problema corresponde à teoria
tridimensional do Direito, o qual é, ao mesmo tempo e dialeticamente, fato, valor e
norma. Dava-se, desse modo, o superamento da redução do Direito ao mundo
empírico dos fatos (realismo ou positivismo jurídicos) ou das normas (normativismo
puro kelseniano) ou dos valores (Direito Natural), para passar a ser visto como
integração normativa de fatos segundo valores (REALE, 2004, p. 6).
Frente as desconstruções e construções de velhos e novos paradigmas, constitui-se a
teoria da “Tridimensionalidade de Miguel Reale” que coincidiram com as pesquisas Wilhelm
Sauer, na Alemanha.
Se perguntassem a Kelsen13 o que é Direito, este responderia: “direito é a norma
jurídica e não é mais do que a norma”, mas para Miguel Reale14, a esse respeito desconsidera
e dispõe que:
13
Hans Kelsen, em 1940, era conhecido sobretudo como jurista da norma, do normatismo hierárquico, da
pirâmide da norma, conforme expõe em sua Teoria Pura do Direito.
14
Miguel Reale foi um filósofo, jurista, educador e poeta brasileiro. Foi um dos maiores expositores da filosofia
do direito dos séculos XX e XXI. Com sua tese “Fundamentos do Direito”, 1940, lançou as bases de sua “Teoria
Tridimensional do Direito”, que se tornou mundialmente conhecida.
40
[...] a norma jurídica é a indicação de um caminho, porém, para percorrer um
caminho, eu devo partir de determinado ponto e ser guiado por certa direção: o
ponto de partida da norma é o fato, rumo a determinado valor. ” Assim, Direito não
é só norma, como disse Kelsen, Direito não é só fato como rezam os marxistas, o
Direito não é só valor, como pensam os adeptos do Direito Natural15 porque o
Direito ao mesmo é norma, é fato e é valor. (Relato na homenagem 25 de março de
1992 na USP – Linha Evolutiva da Tridimensionalidade Miguel Reale, p.303)
A noção da estrutura tridimensional se fundamenta na dialeticidade dos três
elementos. Há uma dinamicidade integrante e convergente entre o fato, valor e a norma, de tal
maneira que há três ordens de dialética, conforme o seu sentido dominante, abaixo transcrito
no quadro direcional:
Ciência Direito
Sociologia Direito
Filosofia Direito
Figura 2 – Três ordens de dialética
Fonte: REALE, 1993
No primeiro caso, a ciência do direito objetiva atingir a norma, para interpretá-la e
aplicá-la, a Dogmática Jurídica16, ou a Jurisprudência; já a sociologia jurídica tem com o
objeto o fato social, sendo um fato jurídico, que não se compreende sem referir-se a uma
norma e ao valor que se veja realizar. E a filosofia do direito tem como o objetivo o valor
disposto na norma e fato que é valor do “justo”.
Além disso, os fatos e os valores, cuja implicação resultam as normas, precisam ser
analisados de acordo com o contexto histórico vivido pelo homem, pois o ser humano é um
ser tipicamente histórico, de modo que analisá-lo fora da cronologia é afastar-se de sua real
compreensão. Daí Miguel Reale (2007) dispõe que:
A historiografia é o espelho no qual o homem temporalmente se contempla,
adquirindo plena consequência de seu existir, de seu atuar. Qualquer conhecimento
do homem, por conseguinte, desprovido da dimensão histórica, seria equívoco e
mutilado. O mesmo se diga do conhecimento do direito, que é uma expressão do
viver, do conviver do homem. (REALE, 2007, p.80)
15
Direito natural tem como pontos principais em sua doutrina a ideia de que existe um direito comum a todos os
homens e que o mesmo é universal. Este direito é anterior ao direito positivo, que é fixado pelo Estado. Segundo
Norberto Bobbio, são a universalidade, a imutabilidade e o seu conhecimento através da própria razão do
homem.
16
Dogmática jurídica é a teoria positiva do Decreto Positivo, e este termo não significa, absolutamente, “algo
que é imposto”, mas tão somente algo que é posto. (REALE, 1992)
41
Desse modo, o historicismo cultural, a partir da abordagem da tridimensionalidade de
Reale (2007), o Poder tem influência sobre o processus factual-axiológico17 gerando a norma
jurídica. E esse “Poder”, não é apenas governamental, existe a figura do “poder”,
propositalmente nominado com “p” minúsculo, que se refere às outras formas de poder não
estatais (utopias decorrentes das ideologias dos grupos sociais, contratos, ONGs, dentre
outros).
Dessa afirmação, apresentamos o esboço sobre a teoria tridimensional do direito:
Figura 3 - Teoria Tridimensional do Direito
Fonte: REALE, 2007, p.124
O que conclui Reale (2007), destarte, é que o papel da norma é de relacionar o fato e
valor, ou seja, é o ponto de referência entre o que existe na realidade social, e a mesma
necessidade de se medir no âmbito do comportamento social e da atividade juridicante, quais
são as consequências a se atribuir a este ou a aquele fato.
Disso, obviamente, resulta um direito cujo processo trata-se de algo dinâmico por
excelência, em que interagem e se implicam três elementos básicos (fato-valor-norma) que
não se excluem, mas se exigem mutuamente entre si, processo este que não pode ser
concebido nos moldes tradicionais da dialética dos opostos, que terminaria por identificar ou
excluir um dos termos da relação de conhecimento. Assim, o direito deve ser tratado como um
processo cujo enfoque é dado, a partir de uma dialética de implicação e polaridade, em que os
termos não se excluem nem se identificam, mas se exigem e são irredutíveis um ao outro.
[...] complementaridade, dá-se a implicação dos opostos na medida em que se
desoculta e se revela a aparência da contradição, sem que com este desocultamento
os termos cessem de ser contraditórios, cada qual idêntico a si mesmo e ambos em
mútua e necessária correlação. (REALE, 2003, p. 71)
Na teoria realeana, é exatamente esta irredutibilidade e implicação do processo
dialético da complementaridade a que o fenômeno jurídico se submete, garantindo-lhe o
17
processus factual-axiológico – processo que deriva do fato, valor constituindo a norma
42
constante “transmutar-se, numa incansável dinâmica, que não se esgota, em sua síntese
integradora, na norma jurídica” (COELHO, 2003, p. 88).
Portanto, é importante que haja uma proximidade entre as questões axiológicas e as
questões normativas, a fim de que o Direito tenha não apenas uma validade formal, mas
validade material, provindas dos desejos da sociedade com respostas efetivas e eficazes
através da política. Esse entendimento é corroborado por Oswaldo Ferreira de Melo (1994):
À Política do Direito cabe intercomunicar ambos os elementos, tornando-os
interdependentes, e examinar os âmbitos da Política e do Direito não como áreas
bastantes em si mesmas, mas como espaços suscetíveis de permanentes e desejáveis
influências recíprocas. O Direito necessita da Política para renovar-se continuamente
na fonte das mediações, e esta necessita daquele para objetivar em realidades e
valores a sua atividade quase sempre dispersiva e pragmática, ou seja, objetivá-la em
sistema de princípios e normas, formal e materialmente válidos. (MELO, 1994,
p.21)
Assim, percepção jurídica a primeira análise são as questões de fato (e de contexto
histórico) que conduzirá o pesquisador à compreensão da teoria do Direito aos valores sociais.
Logo “o objeto da Política Jurídica deve ser considerado no universo de grandes reflexões e
das grandes decisões18”.
Alguns questionamentos são formulados: Como deve ser o Direito? Fruto retórico da
dominação ou instrumento estratégico de mudanças? (...) O Direito deve ter compromisso
apenas com o presente ou deverá estar empenhando na construção ética do devir? O PROEJA
é visto como um programa ou ajustamento? “Articular” e “integrar” são termos jurídicos que
reestruturam a visão jurídica? Como o aplicador do direito conceitua estes termos? E que
maneira altera a interpretação jurídica? O Integrar no PROEJA é distinto do Integrar em
outros atos normativos? Que serão analisados no capítulo 3. Assim, deparamos que o
PROEJA vem elencado no princípio maior do homem – Princípio da Dignidade da Pessoa
Humana, traz a questão do mínimo existencial ou piso mínimo normativo19 no qual reveste de
caráter imperatividade, sendo que precisa ser respeitado sob pena de acarretar consequências
ao seu transgressor, art. 1º da CF/8820. E finalizando, a dialética para Reale (2007), trata de
governar o mundo da cultura, como teoria e prática de tal forma que possibilita a
compreensão do conjunto a partir de sua composição como unidade múltipla e aberta.
18
MELO, Oswaldo Ferreira. Fundamentos da Política Jurídica. 1994, p. 38
19
Mínimo existencial ou piso mínimo normativo: segundo Celso Antônio Pacheco Fiorilo para referir-se às
condições sem as quais o homem não pode viver com dignidade e que tais condições estão elencadas no artigo 6º
Constituição Federal de 1988.
20
art. 1º da CF/88 – A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Munícipios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento: [III]
A dignidade da pessoa humana.
43
1.4 FORMAÇÃO DA AGENDA
Ao mencionar o termo “políticas públicas”, sabe-se que estas constituem um campo de
atuação vinculada ao Estado. Segundo Pinheiro (2010), política pública é um conjunto de
ações coletivas voltadas para garantir os direitos sociais de um cidadão, como saúde,
educação, segurança e outros expressa a transformação daquilo que é do âmbito particular em
ações coletivas no espaço público. Para Guareschi et al. (2004), a política pública pauta-se em
marcos jurídicos específicos e contempla a questão dos recursos financeiros, da gestão e
controle social.
Assim, toda a pressão leva a acordos que, às vezes, descaracteriza o projeto inicial. E
tendo por referência o pensamento de Villanueva (2003), atores importantes estiveram
presentes na formulação do PROEJA.
Na arena da política, o documento que norteou a implantação das políticas para a
educação profissional no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006),
denominado Proposta de Políticas Públicas para a Educação Profissional e Tecnológica
(BRASIL, 2003), dentre os princípios gerais, destacou:
[...] comprometer-se com a redução das desigualdades sociais e incorporar a
educação básica como direito e dentre os pressupostos específicos da educação
profissional e tecnológica: articular a educação profissional e tecnológica com a
educação básica, integrar a educação profissional e tecnológica ao mundo do
trabalho, promover a interação da educação profissional e tecnológica com outras
políticas públicas.
No ano de 2005, a exposição de motivos do referido Decreto, encaminhada ao
Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006) pelo Ministro da Educação
Tarso Genro, destacou que o Decreto nº 5.154/2004 apontava para a necessidade de que a
formação profissional estivesse em constante articulação com as estratégias de educação de
jovens e adultos, promovendo, simultaneamente, a qualificação profissional e elevação da
escolaridade do trabalhador brasileiro.
Outra estratégia do governo que se fez presente no cenário da formulação do Proeja
foi uma pesquisa21 denominada Experiências atuais de Educação Básica de nível médio com
formação profissional realizada pela SEMTEC/MEC que teve como objetivo identificar as
experiências de ensino médio fora dos sistemas educacionais que estavam associadas à
21
O relatório parcial da pesquisa realizada pela Semtec/UNESCO, com a coordenação do IIEP (Intercâmbio,
Informações, Estudos e Pesquisas) que levantou um banco de dados e um cadastro completo das instituições
atuantes em 2004 na educação básica. Esta pesquisa teve seu início organizado em novembro de 2003, com a
participação de pesquisadores, organizados em coordenações regionais e uma coordenação nacional, coordenada
pela Diretoria de Ensino médio da Semtec, tendo, à época, Marise Ramos como diretora. Julho, 2005. Mimeo.
44
formação profissional, de modo a subsidiar a definição de prioridade junto às ações de
Educação Profissional e de Educação de Jovens e Adultos.
Na arena dos burocratas, conforme a auditoria realizada na Secretaria de Educação
Profissional e Tecnológica/MEC, no ano de 2005, o relator Benjamin Zymler do Tribunal de
Contas da União – TCU em 27 de abril, mediante o Acórdão submetido ao Plenário do TCU22
destacou: “Vale registrar, também, a sugestão de que seja aquela Secretaria o incentivo às
Ifets de práticas que favoreçam a permanência, nessas instituições, de indivíduos socialmente
desfavorecidos”, acolhendo integralmente as propostas da Unidade Técnica, alicerçadas no
contexto que se segue:
Apesar da intenção original de democratizar o acesso aos cursos técnicos, atraindo
somente os alunos realmente interessados na formação profissional para ingresso no
mercado de trabalho, o Decreto nº 2.208/97, que separou o ensino técnico do médio, não
atingiu esse objetivo [...] Além disso, as formas com que os cursos técnicos eram
oferecidos não se adequavam à realidade dos estudantes. Para o aluno que precisava
trabalhar – situação muito comum nas classes menos privilegiadas – a forma
concomitante era inviável, já que exigia do estudante dedicação aos estudos em tempo
integral: o ensino médio em um período do dia e o técnico, em outro [...] Conforme
relatado, a natureza das reformas na educação profissional nos últimos dez anos encerra
potencial de ter dificultado o ingresso, nas Ifets, dos candidatos provenientes de grupos
socialmente desfavorecidos. Nesse contexto, torna-se ainda mais necessária a existência
de mecanismo para beneficiar o acesso à educação profissional de grupos socialmente
desfavorecidos e/ou de baixa renda e garantir sua permanência. [...] Essas ações de
iniciativa das Ifets são financiadas com recursos das próprias instituições e muitas delas
carecem de formalização e de regularidade no seu oferecimento [...] Além disso, como
projetos isolados, os mecanismos utilizados são muitos variados. As ações mais
comumente adotadas para favorecer o acesso dessa parcela da população são a isenção
de taxa de inscrição, o sistema de cotas, os critérios de preferências, os cursos
desenvolvidos especialmente para o público jovem adulto, como Emjat do Cefet Espírito
Santo, Unidade Pelotas do Cefet Rio Grande do Sul.
Na arena dos trabalhadores, representado pela sociedade civil organizada em fóruns e
sindicatos. Estudos realizados por Carvalho (1999), que tomaram como universo de
investigação entidades de trabalhadores, como: organização Internacional do Trabalho – OIT,
Central Sindical, Central Única dos Trabalhadores, CUT, Força Sindical – FORÇA,
Confederação dos Trabalhadores em Educação – CNTE, Sindicato Nacional dos Servidores
Federais da Educação Profissional – Sinasefe e Movimento dos Trabalhadores Rurais sem
Terra – MST, revelaram que, à época, os trabalhadores defenderam uma educação
profissional integrada à educação básica “pressupõe, de um lado, a defesa do acesso e
22
Por meio de requerimento apresentado pelo Ministro Guilherme Palmeira e aprovada pelo Plenário deste
tribunal em 01/10/2003 (Ata nº 38), foi solicitada esta auditoria na área de educação profissional, abrangendo a
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica/Setec/MEC e Instituições Federais de Educação
Tecnológica/Ifets, para, inclusive, avaliar as conseqüências das mudanças implementadas com a edição do
Decreto nº 2.208/97, especialmente em relação ao atendimento de estudantes de baixa renda, como instrumento
de inclusão social. Neste sentido, o presente trabalho teve como objetivo avaliar aspectos de natureza
operacional e de legalidade do programa de educação profissional a cargo da Setec/MEC (TC–004.550/2004-0).
45
permanência na escola, para todos, e, de outro lado, implica na defesa de uma educação
profissional que integre a prática do trabalho e a aprendizagem do trabalho” (CARVALHO,
2000, p.12).
Na proposta da educação do trabalho das entidades pesquisadas, observa-se que a
educação profissional “deve orientar-se em princípios de educação continuada e permanente,
constituindo tema para uma agenda de participação dos trabalhadores e a luta pela
democratização do Ensino médio para os jovens e da Educação Profissional a ele vinculada”
(CARVALHO, 2000, p.18).
Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005) no período de transição para o governo
de Luiz Inácio Lula da Silva, a sociedade civil23 debateu e avaliou as ações desenvolvidas e
aquelas que estavam em desenvolvimento na área da formação profissional que tinham
relação com a educação escolar, com o objetivo de gerar subsídios para as políticas públicas
do novo governo.
O documento afirmou a necessidade da educação profissional,
Em todos os seus níveis, estar integrada à educação básica de forma a complementála e nunca substituí-la, considerando a situação dos trabalhadores brasileiros, jovens
e adultos, que apresentam, em sua maioria, baixos índices de escolaridade formal e
desempenho escolar [...] e promover, simultaneamente, a elevação de escolaridade
dos trabalhadores (idem, p.39).
A proposta elaborada como subsídio ao governo que ora se iniciava trouxe uma
indicação relevante para a política pública a ser implementada: a necessidade de que as estas
políticas de “formação profissional superem o viés assistencialista/compensatório” (idem,
ibidem) e promovam a inclusão social. Para isto, foi reafirmada a indicação de que os cursos
sejam organizados em itinerários formativos e superem o caráter fragmentado e descontínuo
que não permite o prosseguimento dos estudos.
Os integrantes da rede de interesse, incluem os ativistas que lutam por políticas,
como fóruns da EJA, organizações internacionais, e agências não governamentais (ONGs),
exigindo por parte do governo que tenham equipes de especialistas para interagir no mesmo
nível teórico e técnico (VILLANUEVA, 2003) acrescenta outra representação da sociedade
23
“Um grupo de trabalhadores, gestores de políticas públicas de trabalho, educação e formação profissional de
governos estaduais e municipais, pesquisadores de universidades e coordenadores de programas de
educação/formação profissional vinculados a entidades da sociedade civil” (FRIGOTTO, CIAVATTA, RAMOS,
2005, p. 38) reuniu-se na cidade de Santo André/SP, nos dias 5 e 6 de dezembro de 2002, para participarem da
oficina sobre qualificação profissional como política pública. Nesta reunião foi elaborado o documento
“Propostas para a organização da política pública de formação profissional” (idem, ibidem).
46
civil no tocante à EJA são os Fóruns EJA24 e Enejas. O Relatório síntese do IV Encontro
Nacional de Educação de Jovens e Adultos (IV Eneja) realizado na cidade de Belo Horizonte,
em agosto de 2002, deliberou as diretrizes para a EJA num contexto de mudanças políticas no
Brasil, em razão das eleições presidenciais daquele ano. Entre elas, destaca-se:
Propostas curriculares que contemplem o estabelecimento de relações com o mundo
do trabalho, com os saberes produzidos nas práticas sociais e cotidianas e o
envolvimento de todos com esse mundo e seus saberes formais, sejam como
trabalhadores, como empregados ou como desempregados (BRASIL, 2004, p.131).
E os fóruns tornam-se possíveis nos espaços onde a sociedade local se mobiliza, se
reafirmam e se consolidam as identidades coletivas e o sentimento de pertencimento, a ideia
de unidade na diversidade e os projetos e utopias que sustentam o movimento. Nesse lugar,
onde o fórum pode se localizar, é que se constroem, de forma sistemática, propostas e a
transformação da sociedade, bem como os instrumentos de negociação com o Estado e o
mercado. (SCHERER-WARREN, 2006, p.124).
Estudos e pesquisas têm destacado a importância dos fóruns e plenárias.
Estudos e pesquisas têm destacado a importância dos fóruns, plenárias, audiências
públicas, mesas de concertação, redes e outras formas de articulação enquanto
espaços políticos estratégicos para a ampliação da participação e democratização da
informação, bem como mecanismos de ativação e dinamização dos próprios
conselhos. [...] A gestão das políticas públicas poderá ser mais ou menos cidadã, ou
seja, influenciada pela sociedade civil. Isto dependerá das relações de força ou das
possibilidades de convergência entre representantes das redes de movimentos, da
esfera estatal e do mercado nos conselhos setoriais e nas conferências de promoção
de direitos da cidadania; bem como das possibilidades e efetivo empoderamento e
democratização no interior das próprias redes de movimento, na direção do
desenvolvimento de sujeitos com relativa autonomia na construção de seus destinos
pessoais e coletivos. (RAICHELIS apud SCHERER-WARREN,2006, p.126).
Avritzer e Pereira (2005) mencionam que o novo conjunto de formas ampliadas de
participação política é híbrido, visto que este modelo de participação envolve atores sociais e
estatais, em um mesmo espaço, dividindo os processos deliberativos. Nestes espaços a ação,
os debates e o ajuste das estratégias acontecem, levando-se em conta uma ação coletiva e
negociada.
O local se torna o lugar da elaboração de políticas públicas, de tomada de decisão
discutidas e compartilhadas sob a forma de orçamentos participativos, de fóruns e
arenas público-privadas e projetos participativos, seja através de novas relações
jurídico-institucionais entre as instâncias federal, estadual, municipal, seja através da
construção de um novo espaço democrático com as comunidades locais e suas
representações sociais e políticas. (AVRITZER; PEREIRA, 2005, p. 17).
24
“O movimento dos fóruns de educação de jovens e adultos, conformando espaços públicos de expressão e
legitimação de reivindicações, diálogo e negociação” (DI PIERRO, 2005, p. 1122-1123). Para Paiva (2009) a
característica fundamental dos fóruns é seu “caráter informal, não institucionalizado, não submetido a nenhuma
instância de poder formal, embora alguns apresentem coordenações mais ou menos estruturadas” (p.29).
47
Os fóruns ganharam importância, nos últimos anos, por se constituírem em uma
instância de articulação entre várias ações coletivas, que trabalham em prol da cidadania e na
construção de políticas públicas. Eles servem como elementos de mediação entre a sociedade
de base local e o Estado.
Na sociedade das redes (para usar uma terminologia de Manuel Castells), o
associativismo localizado (ONGs comunitárias e associações locais) ou setorizado
(ONGs feministas, ecologistas, étnicas, e outras) ou, ainda, os movimentos sociais
de base locais (de moradores, sem teto, sem-terra, etc.) percebem cada vez mais a
necessidade de se articularem com outros grupos com a mesma identidade social ou
política, a fim de ganhar visibilidade, produzir impacto na esfera pública e obter
conquistas para a cidadania. Nesse processo articulatório, atribuem, portanto,
legitimidade às esferas de mediação (fóruns e redes) entre os movimentos
localizados e o Estado, por um lado, e buscam construir redes de movimento com
relativa autonomia, por outro. (SCHERER-WARREN, 2006, p.114).
Figura 4 – Organização da Sociedade Civil, atualmente.
Fonte: Scherer-Warren, 2006, p.114
A sociedade se vê obrigada a adotar estratégias de articulação descentralizadas, com
o intuito de permitir a discussão da gestão e o controle das políticas educacionais. Esta
articulação tinha como característica a criação de espaços públicos e sem marcas de
institucionalidade. Nestes, as representações governamentais e não-governamentais poderiam
se reunir com a perspectiva de se informar, formar, mobilizar e intervir. (DI PIERRO, 2005,
p. 1130-1131).
Constitui-se, então, “um movimento nacional de continuidade da V CONFINTEA,
que se materializa na criação de fóruns estaduais de EJA”. (SOARES, 2002, p.9).
O primeiro deles, o Fórum de Educação de Jovens e Adultos do Rio de Janeiro foi
uma estratégia de trabalho que:
48
[...] contribuiu para a desconstrução de posturas e atitudes centralizadoras,
adquiridas ao longo de muitos anos na sociedade, possibilitando o estabelecimento
de relações mais igualitárias, fator decisivo para um processo de democratização da
educação nas esferas locais, como preconiza a LDB, ao mesmo tempo que
representava um grupo de pressão organizada e permanente, em defesa dos
interesses da educação de jovens e adultos. (PAIVA, 2004, p.36).
Já Dantas (2005), por sua vez, define o Fórum do Rio de Janeiro como:
[...] uma articulação informal de diversos segmentos da sociedade civil na luta pelo
direito à educação. [...] uma nova institucionalidade, pois é palco de uma forma
particular de ação política. Sua pretensão não é somente cobrar e exigir, mas é
construir coletivamente, junto aos que atuam na EJA e, principalmente, com os que
formulam as políticas para este segmento. (DANTAS, 2005, p.7).
Para Paiva (2000), o papel desses fóruns é a:
[...] articulação informal de educadores e educadoras, que somam suas experiências
em movimentos da sociedade civil, ONGs, Prefeituras, Secretaria de Estado da
Educação, Universidades, pelo interesse em discutir, fortalecer e propor caminhos
para a educação de jovens e adultos... (PAIVA, 2000, pág. 2).
O Relatório síntese do V Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos (V
Eneja) definiu as diretrizes básicas para pensar políticas públicas para jovens e adultos e
destacou a necessidade de “integração de programas de EJA com o mundo do trabalho,
sustentação e renda” (BRASIL, 2004, p.143).
Os representantes dos segmentos reunidos no Eneja ainda apontaram a necessidade
de estreitar os vínculos entre a educação profissional e a EJA, “o que requer do MEC uma
aproximação frutífera com o MTE, rediscutindo as políticas e recursos dissociados e
pulverizados” (BRASIL, 2004, p.147).
O sistema federal de educação profissional, aqui representado pela Rede Federal, é
um dos atores da formulação da política pública, ao sofrer pressões da população local e do
setor empresarial, mas também exerce o papel de implementador, no âmbito da escola, onde,
a partir da sua realidade, configura a política no seu cotidiano.
E na conquista dos direitos educacionais pelos cidadãos, concretiza nos marcos da
Constituição de 1988 e das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei n. 9.394/96). A
pressão social dá - se por diversos movimentos da sociedade civil, movimentos sociais e
sindicais, pressões de redes de atores comunitários e de famílias. Tais pressões, algumas
vezes, foram canalizadas por meio de mecanismos participativos que ampliaram as formas de
democracia representativa vigentes no país. Isso ocorreu, por exemplo, no caso da demanda
por EJA contemplada no contexto do orçamento participativo em Porto Alegre (PONTUAL,
2000).
49
Outro dado relevante é a pequena participação das universidades na elaboração dos
projetos, com presença apenas em 6% no total (HADDAD, 2002) Esses dados confirmam
outros estudos (evasão, repetência), programas implantados já realizados, que demonstram
ainda pequena presença das instituições de ensino superior na EJA, tanto em pesquisas quanto
em extensão e ensino25 (HADDAD, 1987, 2002).
O Fórum MOVA era o conselho popular da alfabetização de adultos (GADOTTI,
2000). O projeto residia em criar um movimento de educação popular que ultrapassasse o
sentido das campanhas contra o analfabetismo promovidas pelo
Estado,
tornando-se
um movimento organizado e autônomo da sociedade civil capaz de sobreviver às mudanças
do poder institucional e continuar lutando pela educação básica. O MOVA
não
era
concebido, portanto, apenas como um programa educacional de combate ao analfabetismo,
mas como um movimento de eminente caráter político, na medida em que,
concomitantemente e por meio da alfabetização, procurava desenvolver um processo de
conscientização dos envolvidos que incorresse num incremento da luta popular (FREIRE,
2000).
Recentemente, o programa Alfabetização Solidária vem envolvendo as instituições
de ensino superior em processos de formação e avaliação, produzindo como consequência
uma aproximação sobre o tema. Programas como o Movimento de Alfabetização (MOVA),
modelo de programa oriundo na gestão de Paulo Freire (1989-1992), espalhou-se por todo o
país, em governos municipais e estaduais de diversos partidos, mas principalmente nas
gestões do Partido dos Trabalhadores. O modelo implementado, ao envolver entidades e
movimentos sociais, acabou por fortalecer no âmbito da sociedade civil a demanda por EJA e
experiências educacionais nessa área.
25
SÉRGIO HADDAD, doutor em história e sociologia da educação pela Universidade de São Paulo, foi
professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e
atualmente é pesquisador e coordenador geral da Ação Educativa, em São Paulo. Publicações mais importantes:
Education of youth, human rights and human development (Convergence, Toronto, v. XXXIX, p. 131-146,
2006); com Maria Clara Di Pierro: A historical overview of adult formal education in Brazil (In: CASTRO, Rui
Vieira de; SANCHO, Amélia Vitória; GUIMARÃES, P AULA (Orgs.). Adult education: new routes in a new
landscape. Braga: University of Minho, 2006, v. 1, p. 231-270); com Maria Machado Malta Campos: O direito
humano à educação escolar pública de qualidade (In: HADDAD, Sérgio; GRACIANO, Mariângela (Orgs.). A
educação entre os direitos humanos. Campinas: Autores Associados, 2006, v. 1, p. 95-126); The World Social
Fórum as a place for learning (Convergence, Quebec, v. XXXVI, n. 3-4, p. 3-5, 2003); com Maria Clara Di
Pierro: Escolarização de jovens e adultos (Revista Brasileira de Educação, n. 14, maio/agosto, p. 108-130,
2000); Educação de jovens e adultos no Brasil – 1986-1998 (Brasília: MEC/INEP, 2002); Adult education: the
legislative and policy environment (Hamburg: UNESCO Institute for Education, 1996, v. 1); Ensino supletivo no
Brasil: estado da arte (Brasília: MEC/ INEP, 1987). É também pesquisador do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), atualmente desenvolvendo a pesquisa: “Um balanço da
produção de conhecimentos sobre educação não escolar de adultos no Brasil”.
50
A conquista do direito à EJA, assim como a mobilização por sua implementação,
inseridas no processo de redemocratização do sistema político nas décadas de 1980 e 1990,
foram marcadas pela forte presença da sociedade civil na reivindicação de direitos e pressão
por mais participação nos rumos da gestão pública. Esse movimento, principalmente por meio
de pressões municipais, fóruns estaduais e encontros nacionais, resultou em novas ofertas de
serviços de atendimento e em novas formas de pensar e fazer a EJA, assim como na
necessidade de buscar regulamentá-lo.
Entre os vários subsídios para esse debate, há o parecer do Conselho Nacional da
Educação de nº 11/2000, relatado por Carlos Roberto Jamil Cury, que incorporou a nova
concepção de EJA às normas e diretrizes nacionais da educação básica a qual, ao tomar como
referência o Parecer CNE/CEB 11/2000 homologado pelo Ministro da Educação em 07 de
julho de 2000, instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA e a Resolução
CNE/CEB 1/2000, em seus 25 artigos, normatiza a educação de pessoas jovens e adultas em
todas as suas modalidades, definindo diretrizes nacionais que de vem, obrigatoriamente, ser
observadas na oferta da EJA, nas etapas fundamental e média, em instituições que integrem a
organização da educação nacional, considerando o caráter próprio desta modalidade de
educação. Além disso, a EJA, segundo o Parecer 11/2000, tem como funções a reparação, a
equalização e a qualificação. A primeira, a função reparadora, é justificada, no Parecer
CNE/CEB 11/2000, pelo alto número de analfabetos existente no Brasil. Considera o
documento em questão que a focalização das políticas públicas no ensino fundamental teve
como resultado a ampliação do número de crianças na escola. Aponta que, nos últimos anos,
foram grandes os avanços quanto à universalização do Ensino Fundamental, em obediência ao
princípio da obrigatoriedade escolar. Argumenta, contudo, que condições sociais adversas e as
sequelas de um passado ainda mais perverso, associadas a inadequados fatores
administrativos e de planejamento e dimensões qualitativas internas à escolarização têm
condicionado o insucesso de muitos alunos (BRASIL, 2000, p.30)
E a educação de jovens e adultos sendo uma “bandeira do partido dos trabalhadores”
sob a tutela do presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva, para que o programa
PROEJA tornasse uma realidade foram necessários a formação de alianças com os
“conservadores”.
Discurso do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, proferido em 1º de
setembro de 2007, Grifos nosso durante 3º Congresso Nacional do PT enfatiza a importância
das coligações para a educação tivesse o crescimento necessário trazer jovens e adultos com
51
também a juventude excluída para uma sociedade mais justa e equilibrada. E passa a discorrer
sobre os pontos fortes do seu governo:
Prestem atenção no número que eu vou dar agora, que é motivo de orgulho, meu
caro João Felício, para qualquer professor deste País. Em toda a história republicana
foram criadas no Brasil, desde 1909, quando Nilo Peçanha fez a primeira, 140
escolas técnicas federais. Em oito anos criaremos 214 novas escolas técnicas e já
contratamos, por concurso, 10 mil professores para as universidades federais
brasileiras. Prestem atenção: somente o ProUni beneficiará, até o fim do governo,
cerca de 1 milhão de jovens das camadas populares, vindos das escolas públicas,
com alta porcentagem de negros e índios. Além disso, os elevados investimentos do
Fundeb, 10 bilhões de reais até 2010, contribuirão para que, finalmente, tenhamos
uma educação pública de qualidade neste País. Essa verdadeira revolução
educacional, consolidada no PDE, será decisiva para a ampliação da cidadania e
para o aprofundamento da nossa democracia, mas o projeto nacional de
desenvolvimento está também integrado pelas ações do Ministério da Saúde, pelo
Plano Nacional de Ciência e Tecnologia, pelo Programa Nacional de Segurança,
pelo Programa para a Juventude, que anunciaremos nos próximos dias, e por um
conjunto articulado de novos programas na área social. (Discurso do presidente da
República, Luiz Inácio Lula da Silva, proferido em 1º de setembro de 2007, Grifos
nosso durante 3º Congresso Nacional do PT)
Além disso, no Programa Brasil Que Queremos – Partido Trabalhadores, p.70;
dispõe posicionamento do Presidente Lula:
[...] A necessária expansão da educação profissional de nível técnico e tecnológico
deve ser acompanhada por medidas que superem a concepção produtivista e
mercadológica, voltada exclusivamente para a empregabilidade, ainda hegemônica
no país. Currículos integrados (a exemplo do PROEJA, Saberes da Terra,
PROJOVEM e Trabalho Doméstico Cidadão), formação de educadores de educação
profissional, reformulação das diretrizes da educação profissional baseada no
Decreto 5.154, participação dos atores sociais na gestão de programas e ações são
questões centrais que devem merecer prioridade.
Quanto à formação inicial e continuada de trabalhadores (FICT), é fundamental a
sua regulação, abrangendo não apenas as ações do governo federal, estadual e
municipal, como as ações do Sistema S e a formação nas empresas (“educação
corporativa”).
No Brasil, a busca do consenso “nunca foi um arranjo de iguais, mas o
reconhecimento, por parte de um polo social ou político menor, da primazia de outro polo,
mediante algumas benesses e sobre o pano de fundo constituído pela exclusão da grande
massa da população” (DEBRUN, 1983, p.13)
A partir das Deliberações na agenda política, o Proeja foi institucionalizado na Rede
Federal conforme o quadro 1 Portaria, Decretos do PROEJA
52
ATOS
NORMATIVOS
DATA
13 de
junho de
2005
Portaria 2080
Decreto Nº5478
Decreto Nº5840
24 de
junho de
2005
13 de
julho de
2006
FORMULADOR
Ementa elaborada
pelo Centro de
Documentação e
Informação –
CEDI/Ministro
Estado de Educação
Poder Executivo
Poder Executivo
PREÂMBULO
Estabelece, no âmbito dos Centros Federais de
Educação Tecnológica, Escolas Técnicas
Federais, Escolas Agrotécnicas Federais e
Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades
Federais, as diretrizes para a oferta de cursos de
educação profissional de forma integrada aos
cursos de ensino médio, na modalidade de
educação de jovens e adultos.
Institui, no âmbito das instituições federais de
educação tecnológica, o Programa de Integração
da Educação Profissional ao Ensino Médio na
Modalidade de Educação de Jovens e Adultos –
PROEJA
Institui, no âmbito federal, o Programa Nacional
de Integração da Educação Profissional com a
Educação Básica na Modalidade de Educação de
Jovens e Adultos - PROEJA, e dá outras
providências
Quadro 1 – Portaria e Decretos do PROEJA
Segundo os documentos oficiais (BRASIL, 2006a), o PROEJA surge, então, com
uma dupla finalidade. A primeira é enfrentar as descontinuidades e o voluntarismo que
marcam a modalidade EJA no Brasil, e, a segunda, integrar à educação básica uma formação
profissional que contribua para a integração socioeconômica de qualidade do coletivo de
jovens e adultos. As intenções explicitadas no PROEJA são coerentes com as políticas
públicas para a educação profissional e tecnológica definidas pelo atual governo federal
(BRASIL, 2004), as quais apontam para a necessidade de a EPT articular-se com a educação
básica e com o mundo do trabalho.
Apesar dessas intenções explícitas no Programa e das potencialidades da Rede
Federal de EPT em contribuir com seu êxito, alguns equívocos importantes marcam a gênese
dessa iniciativa governamental. Em primeiro lugar, tem-se a instituição da Portaria Nº.
2.080/2005-MEC, de junho de 2005, que deu materialidade ao tema. Esse dispositivo
determinava que todas as instituições federais de EPT oferecessem, a partir de 2006, cursos
técnicos integrados ao ensino médio na modalidade EJA, estipulando, inclusive, um
percentual mínimo de vagas que deveriam ser destinadas à nova oferta.
Entretanto, legalmente uma portaria não pode ferir um decreto, que tem maior
hierarquia e havia o Decreto Nº. 5.224/2004, que dispõe sobre a organização dos CEFETs que
os centros federais de educação tecnológica – CEFETs –, criados mediante transformação das
53
escolas técnicas federais e escolas agrotécnicas federais, [...] constituem-se em autarquias
federais, vinculadas ao Ministério da Educação, detentoras de autonomia administrativa,
patrimonial, financeira, didático pedagógica e disciplinar. (BRASIL, 2004a, p. 1, grifo nosso).
Dessa forma, a Portaria Nº. 2.080/2005-MEC carecia de legalidade.
Apesar das críticas veementes a diversos aspectos da supramencionada Portaria (Nº.
2.080/2005-MEC), após poucos dias de vigência, o seu conteúdo foi ratificado, quase
integralmente, pelo Decreto Nº. 5.478/2005, que instituiu, no âmbito da Rede Federal de EPT,
o PROEJA. Essa parece ter sido uma tentativa de resolver o problema de hierarquia das
normas, mas o objetivo não foi alcançado, pois o Decreto Nº. 5.224/2004, mais antigo,
permanece em pleno vigor.
O primeiro passo equacionar o vício formal que é a falta de legitimidade foi a
constituição de um grupo cuja função era elaborar um Documento Base (BRASIL, 2006a) de
concepções e princípios do Programa, e cujo resultado aponta na direção de transformar esse
Programa em política pública educacional. Posteriormente, a partir das diretrizes apontadas
por esse Documento Base, o Decreto Nº 5.478/2005 foi substituído pelo Decreto 5.840/2006
(BRASIL, 2006b), atual instrumento legal regulador do PROEJA. Esse Decreto traz
mudanças significativas em relação ao primeiro. Dentre elas destacam-se:
a) a ampliação das cargas horárias;
b) a ampliação dos espaços educacionais em que o PROEJA pode ser oferecido (o
Decreto Nº 5.478/2005 limitava a oferta à Rede Federal de EPT, ao passo que o
Decreto Nº 5.840/2006 incluiu as instituições públicas estaduais e municipais de
educação também como espaço para as ofertas do PROEJA);
c) a ampliação da abrangência do Programa (o Decreto Nº 5.478/2005 limitava o
PROEJA ao ensino médio, enquanto o Decreto Nº 5.840/2006 incluiu o ensino
fundamental), englobando toda a educação básica.
Na arena das Agências Internacionais, em âmbito internacional, a Convenção26
relativa à luta contra as discriminações na esfera do ensino (1960), o Pacto Internacional27
26
A Convenção relativa à luta contra as discriminações na esfera do ensino
A convenção contra discriminações na esfera do ensino define o conceito de discriminação e enfatiza ser uma
atitude discriminatória “a exclusão de uma pessoa ou um grupo de pessoas a determinado grau ou tipo de
ensino em função da idade” (art. 1º, §1º, “a” e “b”). Além disso, a convenção estabelece compromissos aos
Estados signatários de eliminar disposições legislativas e administrativas que sejam discriminatórias na esfera do
ensino (art. 3º, §1º, “a”), bem como a promoção e intensificação da educação de jovens e adultos que não o
receberam em sua totalidade (art. 4º, §1º, “c”). E dispõe, no artigo 5º, que a educação “deve atender ao pleno
desenvolvimento da personalidade humana e reforçar o respeito aos direitos humanos e das liberdades
fundamentais”.
27
O Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
O artigo 13, inciso 1, “d” do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Assembleia
Geral da ONU (PIDESC), de 16.12.66, estabelece o dever do Estado em “fomentar e intensificar na medida do
possível, a educação de base para aquelas pessoas que não receberam educação primária ou não concluíram
o ciclo completo da educação primária”.
54
sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) e a Declaração de Hamburgo28 (1997)
são importantes instrumentos que garantem o direito à educação de jovens e adultos, no qual
contribuíram para pressionar a criação do projeto PROEJA integrador.
Diante dos fatos expostos, necessários para contextualização e justificativa da
discussão aqui pretendida – formulação do Programa PROEJA - ilustram as dificuldades ou
deficiências do sistema político no acompanhamento deste programa governamental. Muitos
são os exemplos de pesquisas de avaliação que, mesmo motivadas por preocupação legítima e
meritória com a eficácia e efetividade do gasto público, revelam, infelizmente, resultados
triviais, metodologicamente questionáveis ou com baixa apropriação para reformulação dos
programas.
Equacionar tal situação requer, ademais de decisões políticas e administrativas,
aprofundar o conhecimento sobre aspectos técnicos e legais. Vale formalizar dois termos
correntemente citados no texto – políticas públicas e programas. Isso é importante para
circunstanciar os limites do campo de diálogo estabelecido neste texto, já que a formulação de
políticas públicas e formulação de programas públicos são termos muito imbricados, mas
referem-se a contextos muito diferentes (em amplitude) da análise da intervenção estatal.
Ao contrário da Declaração Universal de 1948, que proclama a instrução gratuita, pelo menos nos graus
elementares e fundamentais, sem fazer distinção de idade, o PIDESC aborda diferenciadamente o direito à
educação de jovens e adultos do direito dos educandos em idade própria, garantindo a estes que “a educação
primária deverá ser obrigatória e acessível gratuitamente a todos”(art. 13, inc. 2, “a”) e à EJA, a
implementação será feita “na medida do possível”, o que deixa margens para um tratamento discriminatório da
EJA nos ordenamentos jurídicos internos de cada país.
28
A Declaração de Hamburgo sobre educação de adultos
No contexto da Declaração de Hamburgo a educação de adultos é afirmada como um direito humano
fundamental e um direito chave para o século XXI, sendo tanto uma “consequência do exercício da cidadania
como condição para a plena participação na sociedade”. Assumiu-se o compromisso de “oferecer a homens e
mulheres as oportunidades de educação continuada ao longo de suas vidas” (...) e construir “amplas alianças
para mobilizar e compartilhar recursos, de forma a fazer da educação de adultos um prazer, uma ferramenta,
um direito e uma responsabilidade compartilhada”.
No âmbito desta Declaração foi adotada a Agenda para o Futuro, que estabeleceu metas específicas para que os
objetivos proclamados na Declaração (melhoria das condições e qualidade da educação de adultos; garantir a
alfabetização e a educação básica; promover o fortalecimento das mulheres através da educação de jovens e
adultos; entre outros) fossem atingidos. Os signatários, entre os quais o Brasil, que subscreveram a Declaração
de Hamburgo (1997) comprometeram-se, entre outras ações, a:
31. Promover o direito ao trabalho e o direito à educação de adultos relacionada com
o trabalho: b) fazendo com que a educação de adultos, com objetivo profissional,
desenvolva competências e habilidades específicas que permitam a inserção e a
mobilidade profissionais, e melhore a capacidade dos indivíduos para exercer tipos
diversificados de empregados; [...] e) insistimos sobre o papel capital que a
educação profissional dos adultos exerce no processo de aprendizagem, ao longo da
vida; [...] 33. Diversificar o conteúdo da educação de adultos com objetivo
profissional: c) estimulando o espírito empreendedor por meio da educação de
adultos (BRASIL, 2004, p.67-68).
55
Evitando entrar em discussão muito extensa sobre os diferentes significados do termo
– sistematizados em Villanueva (2006) – política pública é, na definição de Nascimento
(1991), o conjunto de decisões tomadas por aqueles que detêm competência legal para
deliberar em nome da coletividade – as instituições de Estado – visando à solução de um
problema ou ao redirecionamento de tendência, com a intenção de orientar sua evolução para
um fim estabelecido como desejável. Assim, as decisões que conformam tal política –
distributiva, redistributiva ou regulatória, universal ou focalizada – assumem diferentes
formatos: podem se enunciados de diretrizes estratégicas de governo, leis e decretos, criação
de organizações ou programas que vão conferir operacionalidade às diretrizes, leis e normas
(VILLANUEVA, 2006).
Por outro lado, o programa público é, pois, um dos instrumentos operacionais das
políticas públicas, mais especificadamente, trata-se de conjunto sistêmico de ações programas
e articuladas entre si, com o objetivo de atender uma demanda pública específica, encampada
na agenda de prioridades de políticas públicas do Estado ou governo (ROSSI et al., 2004).
Neste viés, a tese, apropria-se ciclo de políticas (VILLANUEVA, 2006),
tridimensionalidade de Miguel Reale e os conceitos de recontextualização do discurso
(BERNSTEIN, 1996) que passa a permitir o entendimento das políticas em constante
articulação do contexto macroestrutural e o do micro contexto com fulcro de análise da
formulação do Proeja no seu integrar ou articular dentro do contexto curricular.
1.5 ANÁLISE DO DISCURSO
1.5.1 As contribuições teóricas de Basil Bernstein
A partir do conceito de recontextualização do discurso de Basil Bernstein que vem
sendo associado à abordagem do ciclo de políticas constituindo fonte de metodologia para as
pesquisas de análises das políticas, pois é a partir das reinterpretações dos textos das políticas,
produzidos nos contextos macros, que podemos identificar como se estabelecem as relações
entre processos de reprodução, resistência e mudança nos contextos micro.
Outro fator, o princípio de recontextualização, as contribuições e conceitos de
Bernstein, auxiliam na análise das políticas educacionais como, por exemplo: o Discurso
Pedagógico com suas regras distributivas, recontextualizadoras e avaliativas; as regras de
reconhecimento e realização, nos campos recontextualizadores oficial e pedagógico
(BERNSTEIN, 1996).
56
Bernstein, preocupa-se com as questões macro da educação, as relações que se
estabelecem com os sistemas político, econômico e cultural; e de outro lado, com as questões
micro, as relações que se estabelecem no âmbito das escolas, das salas de aula, mais ainda
com aspectos intrínsecos ao processo de transmissão do que é transportado do exterior para o
interior da escola (códigos), a partir de dados posicionamentos, numa relação determinada
entre os sujeitos, como uma criação de regulações específicas no interior dos contextos
(BERNSTEIN, 1996).
Segundo Lopes (2003, p. 23), para Bernstein, a escola deve garantir três direitos nos
níveis individual, social e político:
O primeiro deles se refere ao desenvolvimento pessoal, à formação dos sujeitos e
opera no nível individual. O segundo, que opera no nível social, diz respeito ao
direito de ser incluído, que é diferente de ser absorvido, pois inclui autonomia. O
terceiro, que opera no nível político, é o direito à participação, que inclui a
possibilidade de participar na construção, manutenção ou mudança de ordem social.
Tratar da inclusão social como efeito de segunda ordem na análise de uma política
requer que nos apropriemos de conceitos tais como igualdade e diferença, compreendendo as
articulações existentes entre eles, principalmente no que se refere à exigência de
reconhecimento da diferença e de uma redistribuição que permita a realização da igualdade
(BERNSTEIN, 1996; SANTOS, B.; NUNES, 2003).
Essa discussão remete à ultrapassagem da compreensão do multiculturalismo que
apenas “aceita, tolera ou reconhece a existência de outras culturas no espaço cultural onde
domina” para o conceito de interculturalidade, que “pressupõe a existência, o reconhecimento
recíproco e a disponibilidade para o enriquecimento mútuo entre várias culturas que partilham
um dado espaço cultural” (SANTOS; MENEZES, 2009, p. 09).
Segundo Apple (1999), as reflexões de Bernstein se iniciaram através da relação
entre cultura e poder, ou para melhor dizer, das ligações entre escola, economia, cultura de
classe e suas práticas significativas. Para Bernstein, é através das relações de classe que o
poder se reproduz. Assim, sua “[...] categoria central de análise é o poder, e o assunto
preponderante é como as relações sociais constituem relações de poder [...]”
(APPLE, 1999, p. 167).
Segundo Cohen & Franco (1999, p.104) a eficiência é: “...a relação existente entre os
produtos e os custos dos insumos, portanto, o resultado será sempre o custo de uma unidade de
produto final por um beneficiário em uma certa unidade de tempo”.
Figueiredo & Figueiredo (1986) também apontam para a definição do critério de
eficiência. Para esses autores, existem dois tipos de eficiência que podem ser distribuídos a uma
57
política ou programa de cunho social: a eficiência instrumental e a eficiência política.
Em relação ao primeiro tipo de eficiência, os autores afirmam que “esta é definida pela
relação estrita entre os custos econômicos e os benefícios que são, em geral, tangíveis e
divisíveis”. Já em relação à eficiência política, “esta é definida pela relação entre os custos,
sociais ou políticos, e os benefícios derivados” (FIGUEIREDO &FIGUEIREDO, 1986, p.114).
Para Tenório (2000, p.76) a eficiência é a definida como o “cumprimento de normas e
redução de custos”. Portanto, avaliar a eficiência de um projeto é averiguar a relação entre custo e
resultado obtido. Para tanto, é necessário analisar o custo-resultado e o insumo/produto do
projeto. Um projeto é considerado eficiente quando seus resultados são alcançados dentro do
menor custo possível. Neste ato, pontua a necessidade contextualiza o currículo dentro da política
PROEJA, verificando sua aplicabilidade no contexto escolar integrando e articulando dentro do
universo ensino aprendizagem.
Lopes, 2005, corrobora que a compreensão das reinterpretações que sofrem os textos que
circulam no meio educacional, desde o contexto de influência até o contexto da prática nesse
âmbito, há espaço para se pensar o entendimento dos processos de aquisição/comunicação/troca
simbólica (códigos elaborados/restritos), pelas interações entre classe social e cultura, pelos
processos de recontextualização de conhecimentos e práticas, mediados pelos processos
pedagógicos e interculturais, em que se articulam processos instrucionais (competências
especializadas) e educativos de humanização. Ou seja, a partir do contexto influência a prática, há
discricionariedade na interpretação dos textos educativos, em foco. Este entendimento é disposto
por Lopes, 2005:
[...] São orientações de agências multilaterais que se modificam ao serem inseridas
nos contextos de Estados-nação; são orientações curriculares nacionais que são
modificadas pela mediação de esferas governamentais intermediárias e das escolas;
são políticas dirigidas pelo poder central de um país que influenciam políticas de
outros países; são ainda os múltiplos textos de apoio ao trabalho de ensino que se
modificam nos disciplinares (LOPES, 2005, p.53).
Assim, o PROEJA, destinado a um grupo específico (jovens e adultos marcados
historicamente pela exclusão educacional e social) com fins de concretização de um direito que já
lhes fora negado em idade própria, sofre aquelas influências e passa por transformações desde a
sua definição e durante o desenvolvimento contínuo, entre a prática da política governamental e a
prática institucional educativa, na concretização dos seus efeitos, quer político-sociais, quer
pedagógicos. Dessa maneira, Bernstein nos auxiliou tanto em relação à compreensão do discurso
pedagógico que se produz nessa relação política/prática como também na análise dos efeitos da
política do PROEJA.
58
De influência durkheimiana e marxista, a teoria de Bernstein representa o mundo
simbólico e do significado por um lado, e, por outro, o mundo do poder diferencial das classes.
Então não vislumbra somente as questões econômicas, mas também as questões culturais.
[ ... ] Bernstein permite-nos ver a classe como uma categoria cultural e como
uma categoria econômica. Neste processo, apresenta-nos uma imagem das
fracções de classe agindo não só no seio da economia como também no
centro das instituições políticas e culturais. Estas acções não se podem
reduzir facilmente de acordo com as necessidades e os interesses do capital
nem são mecanicamente determinadas pela economia. [ ... ]
[ ... ] Nunca nos devemos esquecer que o seu destaque principal é consistentemente
a (re)produção cultural. [ ... ] (APPLE, 1999, p. 166-167)
O conhecimento educacional e, com ele, as relações de dominação, para Bernstein,
realizam-se. através de três sistemas de mensagem: o currículo, a pedagogia e a avaliação.
Apesar dos seus escritos iniciais terem se concentrado no currículo (o que conta como
conhecimento válido), posteriormente passou a dar mais atenção às relações estruturais entre
os conhecimentos e suas relações com os princípios de poder e controle - relações de
dominação. Depois se preocupou mais com a pedagogia (o que conta como transmissão válida
do conhecimento) e com a avaliação (o que conta como realização válida desse
conhecimento) (SILVA, 2009a).
Dessa forma, Bernstein passa a dar centralidade ao processo de comunicação
pedagógica para, através das práticas discursivas, entender como a aprendizagem se
desenvolve de forma seletiva e, em consequência disso, como as desigualdades educacionais
são produzidas e justificadas. Pretende, assim, em sua teoria, compreender como a estrutura e
a lógica do discurso fornecem os meios que transportam as relações externas de poder.
Com isso, o referido autor introduz o dispositivo pedagógico destacando que não
basta compreender as mensagens pedagógicas do ponto de vista institucional e ideológico,
mas, sobretudo, do ponto de vista da gramática social subjacente à pedagogização do
conhecimento; e entre o conhecimento e formas de consciência (BERNSTEIN, 1996, p.225).
Assim, o dispositivo pedagógico, para Bernstein, constitui-se de três tipos de regras:
distributiva29, recontextualizadora30 e avaliativa31.
29
As regras distributivas regulam, controlam, ou, melhor dizendo, nos termos de Bernstein, marcam e
especializam o que pode ser pensável ou impensável. Ou seja, essas regras regulam a especialização diferenciada
da consciência para os diferentes grupos.
30
As regras recontextualizadoras - o discurso pedagógico - consistem nas regras de comunicação especializada
através das quais os sujeitos pedagógicos são seletivamente criados. "O discurso pedagógico é a comunicação
especializada pela qual a transmissão/aquisição diferencial é efetuada." É “[...] a regra que embute um discurso
de competência (destrezas de vários tipos) num discurso de ordem social, de uma forma tal que o último sempre
domina o primeiro" (BERNSTEIN, 1996, p. 258).
59
[...] As regras distributivas regulam a relação fundamental entre poder,
grupos sociais, formas de consciência e prática e suas reproduções e
produções. As regras recontextualizadoras regulam a constituição do
discurso pedagógico específico. As regras de avaliação são constituídas na
prática pedagógica. [...] (BERNSTEIN, 1996, p. 254).
Sendo que o princípio que rege o discurso pedagógico é o princípio
recontextualizadora que,
Seletivamente, apropria, reloca, refocaliza e relaciona outros discursos, para
constituir sua própria ordem e seus próprios ordenamentos. Neste sentido, o discurso
pedagógico não pode ser identificado com quaisquer dos discursos que ele
recontextualiza. Ele não tem qualquer discurso próprio que não seja um discurso
recontextualizadora (BERNSTEIN, 1996, p. 259).
Bernstein define os campos recontextualizadores como sendo o campo e o
subconjunto
estruturados.
Afirma
que
as
principais
atividades
dos
campos
recontextualizadores são criar, manter, mudar e legitimar: o discurso, a transmissão e as
práticas organizacionais que regulam os ordenamentos internos do discurso pedagógico. O
Campo Recontextualizador Oficial (CRO) é aquele dominado pelo Estado e seus agentes,
política e administrativamente; e o Campo Recontextualizador Pedagógico (CRP) é
constituído pelos educadores, departamentos de educação nas universidades, pelos periódicos
especializados e fundações de pesquisa (MAINARDES, 2007; SANTOS, L., 2003).
Na mesma lógica, Bernstein (1996, p. 272) divide o discurso pedagógico em:
Discurso Pedagógico Oficial (DPO) - "as regras oficiais que regulam a produção, a
distribuição, a reprodução, a inter-relação e a mudança dos textos pedagógicos legítimos
(discurso), suas relações sociais de transmissão e aquisição (prática) e a organização de seus
contextos (organização)"; e Discurso Pedagógico Local (DPL) - "regula o processo de
reprodução cultural ao nível da contextualização inicial da cultura, essencialmente na família
e nas relações entre grupos de colegas".
As regras de avaliação estão relacionadas à prática pedagógica. Bernstein considera
que a prática pedagógica não reproduz necessariamente o discurso pedagógico; aquilo que é
adquirido não é necessariamente aquilo que é transmitido. Elas avaliam "os discursos gerados
pelas práticas manuais juntamente com os executores dessas práticas e os grupos sociais que
elas pressupõem." (BERNSTEIN, 1996, p. 284).
Diante do exposto, é importante atentarmos para as formas distintivas de
31
As regras avaliativas – avaliação relação com termo eficiência fazendo uma distinção entre dois termos
eficácia e efetividade (SIEMPRO, 1999, p.104). a avaliação da eficiência “mide los resultados alcanzados em
relación com los custos y tempos previstos”. Estas estão relacionadas com a prática pedagógica (BERNSTEIN,
1996, p. 284).
60
comunicação, as quais são reguladas pela prática pedagógica, pois
As relações sociais regulam a forma de prática pedagógica e, assim, a categoria
mensagem específica. A mensagem fundamental de uma prática pedagógica é a
regra para a comunicação legítima. Assim, as relações sociais no interior da
reprodução controlam os princípios de comunicação e, ao fazê-lo, regulam aquilo
que chamaremos de contexto comunicativo (BERNSTEIN, 1996, p. 55-56).
Em virtude da consistência da teoria de Bernstein, o pesquisador de políticas
educacionais e curriculares poderia expandir o seu espectro de análise quando conhece os
diversos aspectos dos trabalhos de Bernstein e o sentido da teoria (ou teorias) por ele
formulada. O trabalho de Bernstein sobre o discurso pedagógico busca compreender a
produção, distribuição e reprodução do conhecimento oficial e como este conhecimento
articula-se com as relações de estruturalmente determinadas. Um aspecto essencial da teoria
de Bernstein é que ele estava preocupado não apenas em descrever os processos de
transmissão e aquisição de conhecimentos, mas também e com as suas consequências para
diferentes grupos sociais (SADOVNIK, 2006).
Singh (2002) relata que nos trabalhos de Bernstein percebe-se a preocupação com a
classe operária e com os direitos dos estudantes que se encontravam em desvantagens sociais
e educacionais.
1.5.2 A Noção de Recontextualização e a Análise de Políticas Educacionais e
Curriculares
Conforme já exposto – contribuições teóricas de Bernstein, a teoria do dispositivo
pedagógico constitui-se um modelo teórico que permite a análise das políticas tanto no nível
macro da sua formulação e influências até o nível dos micro processos de sua realização. A
teoria de Bernstein mostra como a distribuição do poder na sociedade e seus princípios de
controle social podem afetar o “o quê” e o “como” do texto político produzido e a sua
reprodução (AL-HAMAHI; DAVIES, 2002). Em toda a sua obra, Bernstein procurou
estabelecer uma ligação entre os micros processos (linguagem, transmissão e pedagogia) e as
questões macro contextuais (como os códigos culturais e o conteúdo e os processos
educativos estão relacionados com as relações de poder e às classes sociais (MAINARDES,
apud BERNSTEIN, 2010, p.45).
As pesquisas sobre políticas educacionais e políticas curriculares que se baseiam nos
trabalhos de Bernstein, em geral, têm explorado o conceito de recontextualização do discurso
das políticas, discutindo aspectos do discurso oficial, do discurso pedagógico e do campo
61
recontextualizador local (família e comunidade). Além disso, outros conceitos da teoria de
Bernstein têm sido empregados nas análises, a saber: conceitos como pedagogias visíveis e
invisíveis32, modelo pedagógico de competência e de desempenho, discurso instrucional33 e
discurso regulador34, classificação e enquadradamento, currículo de coleção e de integração,
código restrito e código elaborado, discurso vertical e discurso horizontal, autonomia relativa
da educação, recontextualização e reprodução do discurso pedagógico, educação e classe
social, etc. Esses conceitos apresentam estrutura conceitual forte que os colocam no âmbito
das “estruturas horizontais de conhecimento de gramática forte e mesmo, poder-se-ia dizer,
em muitos aspectos, no âmbito de estruturas hierárquicas de conhecimento” (MORAIS, 2004,
p. 74).
O conceito de recontextualização permite a análise da emergência e desenvolvimento
dos discursos de políticas específicas ao longo do tempo,35 Em Pedagogy, control and identity
(publicada originalmente em 1996) Bernstein relacionou o conceito de dispositivo pedagógico
com a teoria da mudança educacional. Com base nesse dispositivo, Bernstein argumentou que
a recontextualização do conhecimento a partir dos anos 1960 vem mudando de um modelo de
competência para um modelo de desempenho, por meio da proposição de um currículo
nacional e da criação de um sofisticado sistema de avaliação nacional. Nesse processo de
mudança observa-se um aumento no poder do Estado na recontextualização do conhecimento.
Bernstein explica que o campo recontextualizador oficial e o campo recontextualizador
pedagógico são relativamente autônomos, mas inter-relacionados com o campo da produção
dentro da economia.
32
Pedagogia visíveis e invisíveis, segundo Bernstein (1996) no texto “Classe Social e Práticas Pedagógicas”,
analisou a diferença entre dois tipos de transmissão educacional a classes sociais e pressupostos da família,
representa-as como modelos pedagógicos de competência e desempenho (reedição de 2000 com edição de novos
capítulos faz estas distinções) (BERNSTEIN, 1996)
33
Discurso instrumental: discurso de análise do programa. (NEVES, et al., 2000)
34
Discurso regulador: o texto oficial produzido pelo Ministério da Educação, que caracteriza um determinado
contexto. (NEVES, et al., 2000)
35
Bernstein não nega a existência de uma base linguística nos processos discursivos. No entanto, em sua teoria,
ele procura considerar as condições sociais (relações de poder) que controlam a produção e a reprodução do
discurso e reconhecer as relações de poder e controle que regulam a sua existência. Segundo Bernstein, o
discurso é uma categoria abstrata, é resultado de uma construção, de uma produção. O discurso não pode ser
reduzido a uma simples realização de linguagem. Cada processo discursivo pode ser considerado como produto
de uma rede complexa de relações sociais. Também, o discurso é uma categoria na qual os sujeitos e objetos se
constituem e essa constituição de sujeitos e objetos está articulada a relações de poder e controle (BERNSTEIN e
DÍAZ, 1984). O poder está presente em cada discurso e, por sua vez, cada discurso é um mecanismo de poder.
Assim, discurso não diz respeito apenas à linguagem, mas aos tipos de ideologias e valores que estão por trás dos
discursos.
62
O trabalho de Bernstein vem sendo empregado como referencial teórico para a
análise de políticas curriculares (NASCIMENTO, 1998; NEVES et al., 2000; ROSE, 2004;
LOPES, 2005; NEVES; MORAIS, 2006; CALADO, 2007; entre outros). Para Lopes (2005),
o conceito de recontextualização tem se evidenciado como produtivo para o entendimento das
reinterpretações que sofrem os diferentes textos na sua circulação pelo meio educacional. A
autora menciona que:
São orientações de agências multilaterais que se modificam ao serem inseridas nos
contextos dos Estados-nação; são orientações curriculares nacionais que são
modificadas pela mediação de esferas governamentais intermediárias e das escolas;
são políticas dirigidas pelo poder central de um país que influenciam políticas de
outros países; são ainda os múltiplos textos de apoio ao trabalho de ensino que se
modificam nos contextos disciplinares (BALL, 1992, 1994, 1998, 2001; BONAL &
RAMBLA, 1999; EVANS & PENNEY, 1995; JONES & MOORE, 1993;
MULLER, 1998; NEVES e MORAIS, 2001; WHITTY et al., 1994a e 1994b) (p.
53).
A referida autora defende que por intermédio desse conceito, é possível “marcar as
reinterpretações como inerentes aos processos de circulação de textos, articular a ação de
múltiplos contextos nessa reinterpretação, identificando as relações entre processos de
reprodução, reinterpretação, resistência e mudança, nos mais diferentes níveis” (p. 55). Além
disso, a autora destaca que a centralidade das questões discursivas e textuais como
constitutivas de identidades pedagógicas é também um aspecto produtivo, por articular o
discurso.
Neste viés da recontextualização será analisado o PROEJA sob a ótica das agências
multiculturalismo, orientações curriculares governamentais intermediárias e das escolas,
internacionalização (pactos internacionais).
Outro fator preponderante é que as formas de comunicação e o discurso pedagógico
nas práticas pedagógicas transmitem os códigos elaborados e os artigos restritos
respectivamente universalistas e particularistas.
Conclui-se que através dos códigos36 que: [...] a relação de poder mantém, reproduz e
legitima as posições no interior de qualquer divisão social do trabalho: do modo de produção,
da modalidade de educação, da família ou do gênero”. (BERNSTEIN, 1996, p.139)
Os códigos regulam as relações entre os contextos (classificação) e no interior dos
contextos (enquadramento).
Bernstein, baseando-se em investigação empírica, estabeleceu as diferenças entre o
código restrito da classe trabalhadora e o código elaborado da classe média. Os
códigos restritos dependem do contexto e são particularistas enquanto que os
36
Código: “um código é um princípio regulativo tacitamente adquirido, que seleciona e integra significados
relevantes, formas de realização e contextos evocadores (Bernstein, 1996, p.143).
63
códigos elaborados não dependem do contexto e são universalistas (MAINARDES;
STREMEL, 2010, p.137).
Neste ponto, a tese busca as contribuições da teoria de Bernstein para analisar a
política educacional PROEJA e curriculares, com especial referência a recontextualização.
Assim, a pesquisa das políticas educacionais e curriculares demanda um esforço para
apreender as influências internacionais por meio de processos de globalização e disseminação
de ideias e discursos e os processos de recontextualização do contexto nacional e local. A
teoria de Bernstein representa uma forma de pensamento mais próxima das estruturas
hierárquicas em que foram socializadas (MORAIS e NEVES, 2007).
Neste próximo item, será abordado o PROEJA, política pública de inclusão de jovens
e adultos, analisando sua historicidade e seu currículo integrador – Decreto 5.840 de junho de
2006 e as alterações decorrentes da Lei 11.741 de 16 de julho de 2008 – Parâmetros
(VILLANUEVA, 2003), Ciclo de Políticas / Formulação – (BERNSTEIN, 1996), Análise do
Discurso / Currículo.
A figura 5 aponta para sua construção com espectro de análise tendo por base a
metodologia proposta na tese: Visão e Perspectiva Jurídica na Educação de Jovens e Adultos
(PROEJA): Direito à Integralidade e a Dinâmica da Articulação com Especificidade do
Trabalho.
64
Objeto: Aplicação
da Lei
Objeto:
Currículo
Teoria
Tridimensiona
l de Reale
Objeto:
Lei
Práticas
Pedagógicas
VILLANUEVA (2003 – 2006)
Contexto
comunicação
CICLO DE POLÍTICA
Códigos
dominantes e
dominados
ANÁLISE DO DISCURSO
BERNSTEIN (1996)
Avaliação
Implementação
Formulação
Base Comum
Relações Sociais
Figura 5: As formas de comunicação e o discurso pedagógico em paralelo com ciclo de políticas
(BERNSTEIN, 1996) (VILLANUEVA, 2003)
Fonte: Elaboração própria
65
CAPÍTULO
2
–
ANÁLISE
DA
TRAJETÓRIA
DO
ENSINO
PROFISSIONALIZANTE
A evolução do trabalho relaciona-se à estrutura socioeconômica e cultural e
desempenha papel importante na construção das etapas do desenvolvimento das sociedades,
na concepção das organizações produtivas que determinam o seu modo de vida e no
estabelecimento de parâmetros de diferenciação entre elas.
Ao abordar o tema trabalho, empregabilidade, emprego e (re)colocação profissional
sempre surge, na sociedade globalizada, o contraponto ao assunto - a formação
profissional, que de acordo com Leite (1996):
Sob a égide da "acumulação flexível", o velho modelo taylorista/fordista estaria
sendo substituído por um "novo" modelo de organização do trabalho cujas
características principais seriam a produção em pequenos lotes, a reintegração das
atividades de execução e planejamento, e ainda o emprego de trabalhadores mais
qualificados para o desenvolvimento de um trabalho mais variado (LEITE, 1996).
Neste patamar, de (re)-construções sociais a educação, se apropria destas ansiedades
sociais e busca as transformações das políticas públicas para garantir ao trabalhador condições
no mercado de trabalho como também seu crescimento como cidadão que constrói sua
identidade. A cada momento histórico, o Brasil se apropria de sua realidade e faz as mudanças
necessárias para cada período histórico, até o início do século XX, o ensino profissional era
um ensino de traço assistencialista, herdado do período imperial e voltado para os menos
favorecidos socialmente.
Em 1909, foram criadas dezenove escolas de aprendizes e artífices em várias regiões
do país, pelo então Presidente da República Nilo Peçanha (Decreto Lei nº 7.566 de
23/09/1909) e instaladas a partir de 1910, (UTFPR, 2011), visando à formação de mão obra
melhor qualificada.
Entre 1942 e 1946, o governo central estabeleceu normas para a educação
profissional visando qualificar a mão de obra para a indústria e o comércio. Surgem assim
iniciativas voltadas para oferecer formação profissional e educação voltada aos aspectos
sociais,
a
qualificação
oferecida
por
essas
instituições
não
previsse
e
nem
possibilitasse a progressão escolar a níveis superiores, elas focavam a formação profissional
no nível educacional básico, com vista a proporcionar a ascensão social, para os participantes
dos setores econômicos (SENAI1, SESI2, SENAC3, SESC4).
1
SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial - (jan/1942): atender à necessidade
premente do país na formação de mão de obra para a indústria de base que começava a se
66
Crescia os anseios de um país mais justo, então o Brasil introduziu mudanças
significativas com a promulgação da Lei Federal nº 1.076/50 de 31 de março de 1950, pelo
Presidente da República Eurico Gaspar Outra, oficializando a equivalência entre o ensino
acadêmico e o profissionalizante, corroborada pelo presidente Getúlio Vargas, em seu
segundo mandato, que, por meio da Lei Federal 1.821/53 de 12 de março de 1953, promulgou
e formalizou legalmente a equivalência entre o ensino propedêutico e o profissional, criou-se
o possibilidade de o aluno cursar o ensino básico profissional e, quando o desejasse, poderia
progredir. No nível médio nos cursos científico ou clássico (cursos que correspondiam ao
atual ensino médio) por meio de prova avaliativa específica e, sendo aprovado, migrar para
esse nível escolar e, quando concluído o ensino médio, candidatar-se ao ensino superior.
Na década de 1960, o Brasil formulou novas políticas de educação (Lei Federal nº
4.024 de 20/12/1961) que estabeleceu as diretrizes e bases para a educação do país,
definindo a abrangência dos diversos níveis educacionais e a equivalência entre o ensino
médio (secundário) e o ensino profissional (técnico).
Na década de 1970, sob o regime militar, desenvolveu e normatizou leis voltadas ao
ensino dos 1º e 2º graus (fundamental e médio) e, em especial, educação profissional (Lei nº
5.692 de 11/08/1971 e Lei nº 7.044 de 18/10/1982).
Para ilustrar a legislação educacional, Quadro 1, adiante mostra as principais
características do Sistema Educacional Brasileiro (fundamental e Médio) entre 1920 e o final
1990, mostrando os principais pontos de transformação da Educação Profissional Técnica de
nível médio desse período.
desenvolver.
Na
ocasião,
estava
claro
que
sem
educação
profissional
não
haveria
desenvolvimento industrial para o País. A criação do SENAI foi inspirada na experiência do
Centro Ferroviário de Ensino e Seleção Profissional.
2
SESI - Serviço Social da Indústria - (juI/1946): melhorar a qualidade de vida do industriário
e de seus dependentes. Em suas atividades incluía a prestação de serviços em saúde,
educação, lazer, cultura, nutrição e promoção da cidadania.
3
SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial- (jan/1946): manter cursos práticos
ou de continuação e de especialização em escolas de aprendizagem comercial para os
empregados adultos do comércio, não incluídos na aprendizagem formal. Deveria também
ter a finalidade de contribuir com a difusão e aperfeiçoamento do ensino comercial de
formação e do ensino imediato que com ele se relaciona diretamente, promovendo para tal
os
acordos
necessários,
especialmente
com
estabelecimentos
de
ensino
comercial
reconhecidos pelo Governo Federal
4
SESC - Serviço Social do Comercio - (set/1946): planejar e executar medidas que
contribuíssem para o bem-estar e a melhoria do padrão de vida dos comerciários e suas
famílias. O SESC resultou de uma perspectiva de construção do bem-estar social, para além
da necessidade de estabelecer uma legislação trabalhista, e propunha uma sociedade mais
igualitária e pacífica.
67
Ação Educacional Implementada ou
Modificada Brasil
Criação do Ensino Comercial
Muda a denominação das Escolas de
Aprendizes e Artífices para Liceu
Industrial – Transformação em Escola
Técnica
Cria o SENAI – Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial – organiza e
administra as escolas de aprendizagem
para os industriários.
Estabelece as bases da organização e de
regime do ensino industrial – Ensino de
nível básico. – Não dava direito à
progressão ao nível médio.
Cria o SENAC – Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial – organiza e
administra as escolas de aprendizagem
para os industriários.
Cria o SESI – Serviço Social da
Indústria – voltado para a melhoria da
qualidade de vida do industriário e seus
dependentes.
Cria o SESC – Serviço Social do
Comércio – voltado para o bem-estar e a
melhoria do padrão de vida dos
comerciários e suas famílias.
Flexibiliza a progressão ao nível médio
mediante prova avaliativa para os alunos
dos cursos de primeiro ciclo do ensino
comercial; ensino industrial ou agrícola.
Possibilitava progressão após prova
avaliativa.
Regulamentava a Lei 1.821 e dá Nova
flexibilização ao ensino – Permitida a
matrícula na primeira série do curso
clássico ou científico dos alunos dos
cursos técnicos comerciais, industriais e
agrícolas mediante adaptação ao
Situação
Legal
Não
integrava o
sistema
educacional
regular
Não
integrava o
sistema
educacional
regular
Não
integrava o
sistema
educacional
regular
Integrava o
sistema
educacional
regular
Integrava o
sistema
educacional
regular
Não
integrava o
sistema
educacional
regular
Não
integrava o
sistema
educacional
regular
Implantada
Lei /Decreto
Data
Sim
Reforma
Francisco
Campos
1932
Sim
Não disponível
1941
Sim
Decreto Lei nº
4.048
22/01/1942
Sim
Decreto Lei nº
4.073
30/01/1942
Sim
Decreto Lei nº
8.621
10/01/1946
Sim
Decreto Lei nº
9.403
25/06/1946
Sim
Decreto Lei nº
9.853
13/09/1946
Integrava o
sistema
educacional
regular
Sim
Lei nº 1.076
30/03/1950
Integrava o
sistema
educacional
regular
Sim
Decreto Lei nº
34.330
21/10/1953
68
currículo dos cursos.
Define abrangência e diretrizes para a
educação no Brasil, fixando as
Diretrizes e Bases da Educação
Nacional. Possibilita a progressão após
adaptação.
Define abrangência, estabelece nova
estrutura à educação definindo níveis
educacionais para Educação Infantil,
Educação Básica para os dois ciclos (1ª
a 4ª série e 5ª a 8ª série), Educação
Média e Educação Superior
Alteração do Dispositivo da Lei nº 5.692
de 11/08/1971 referente à
profissionalização do ensino 2º grau.
Ênfase na ligação entre a educação
formal e a educação profissional
Integrava o
sistema
educacional
regular
Sim
Lei nº 4.025
20/12/1961
Integrava o
sistema
educacional
regular
Sim
Lei nº 5.692
11/08/1971
Integrava o
sistema
educacional
regular
Sim
Lei nº 7.044
18/10/1982
Quadro 2 – Desenvolvimento da Educação Formal do Brasil – Período 1920 até 1990
Fonte: ALMEIDA, 2010
Esta retrospectiva legal demostra claramente que no lapso temporal 1920 a 1990 a
preocupação das agendas políticas era incrementar a educação profissional – nível médio,
apenas, para capacitar com o foro único e exclusivo para capacitação para o mercado de
trabalho. Foram 06 decretos-lei5 e 04 leis6 dentre este apenas integravam ao sistema regular
(Decreto-lei nº 4.073/1942; Decreto-lei nº 8.621/46; Lei 1.076/50; Decreto-lei 34.330/53, Lei
nº 4.025/01, Lei nº 5692/71 e Lei nº 7.044/82), excetos os demais atos normativos.
A lei 7.044 de 18/10/1982 marca um olhar diferenciado, propondo uma ligação entre
educação formal e a educação profissional iniciando os primeiros passos ao integrar e/ou
articular, porém não se concretizou, estruturou-se no “nível de competência”.
No mercado de trabalho do modelo de acumulação flexível, o conceito que norteia
a qualificação profissional é o de competências, segundo Hirata (1994).
A noção de competência é ainda imprecisa e decorre da necessidade de se avaliar e
5
Decreto-Lei não mais existe em nosso ordenamento jurídico. É espécie de ato normativo que foi substituído na
Constituição de 1988 pela Medida Provisória. De acordo com o artigo 55, da Constituição Federal de 1967, com
redação dada pela EC nº 1/69, "o Presidente da República, em casos de urgência ou de interesse público
relevante, e desde que não haja aumento de despesa, poderá expedir decretos-leis sobre as seguintes matérias: I segurança nacional; II - finanças públicas, inclusive normas tributárias; e III - criação de cargos públicos e
fixação de vencimentos". Hoje prevê a Constituição Federal, em seu artigo 62, que "em caso de relevância e
urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las
de imediato ao Congresso Nacional".
Decreto serve para regulamentar uma lei (caso de decreto regulamentar do art 84, IV da CF) é privativo do
chefe do poder executivo (Presidente da República, Governador e Prefeito).
6
Lei é espécie normativa constante do art 59 da CF. De uso exclusivo do Poder Legislativo, tem a característica
de generalidade e abstração. Ela inova a ordem jurídica e possui o poder de obrigar a todos (erga omnes).
69
classificar conhecimentos e habilidades a partir das novas exigências de trabalho,
associando-as aos novos modelos de produção e gerenciamento.
Este Quadro 2, nos informa sobre a caminhada da política educacional brasileira,
conclui-se que no período entre 1950 e 1960 a qualificação profissional era adequada a
formação escolar, às demandas dos contratantes e mão-de-obra, esse conceito está baseado na
Teoria do Capital Humano.
Nessa teoria, a educação é fundamental para “criar e aumentar” o capital humano. É
o processo educativo que produzirá algumas atitudes e conhecimentos para capacitar para o
trabalho. Assim sendo, neste ponto de vista, a educação é tida como um dos fatores que
auxiliam no desenvolvimento e na distribuição social de renda. No entanto, as questões
relacionadas às diferenças de classes são deixadas de lado, pois quem não conseguiu uma
posição social melhor deve ser auto responsabilizado, pois não teve méritos. Com relação a
este ponto Frigotto (1993) expõe que:
O investimento no “fator humano” passa a significar um dos determinantes básicos
para o aumento da produtividade e elemento de superação do atraso econômico. Do
ponto de vista macroeconômico, constitui-se no fator explicativo das diferenças
individuais de produtividade e de renda e, consequentemente, de mobilidade social.
(1993, p.41).
Durante a década de 1960, no auge da Teoria do Capital Humano, passou-se a
postular que deveria privilegiar e investir mais em “capital humano” do que em recursos
físicos para se alcançar uma maior renda nacional. Levando-se a concluir que esta teoria
relacionava o crescimento e o aumento da renda ao grau de escolarização. E assim sendo,
Cunha (1980, p.16) nos lembra que, “a educação é reconhecida como uma variável, política
estratégica capaz de intensificar o crescimento da renda, produzir a modernização ou construir
uma sociedade justa”.
A partir deste momento, a questão da desigualdade social é colocada como
responsabilidade individual, causada por que alguns tiveram mais méritos do que os outros.
Isso explica a estratificação social. A sociedade se divide em estratos, pois, os indivíduos que
mais merecem por seu esforço e maior escolaridade devem assumir o topo da hierarquia
social e ter melhor situação econômica e política. Ocorre a relação direta entre melhor
qualificação profissional e maior escolarização de uma pessoa com a diminuição de sua
pobreza.
Oliveira (1997) nos lembra o grande peso colocado na educação, mostra também que
a educação acaba convergindo com a lógica do capital ao preparar pessoas que sirvam aos
interesses deste, reafirmando a Teoria do Capital Humano no seu ato de esconder as
70
verdadeiras relações sociais existentes.
O próximo tópico deste capítulo versa sobre a Educação profissional técnica de nível
médio a partir recorte estabelecido para presente pesquisa, os seja, a partir dos anos de 1990
até 2009.
2.1 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO NO BRASIL A
PARTIR DE 1990
Até meados dos anos de 1990, a Educação no Brasil seguiu a mesma estrutura e
modo de funcionamento do período acadêmico e propedêutico.
Assim, a promulgação da Lei nº 7.044 de 18 de outubro de 1982 resultou de uma
variação da Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971 sobre a profissionalização do ensino de 2º
grau, e vigorou até o final de 1996, quando ocorreu a promulgação da nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação - LDB (Lei nº 9.394 de 20/12/1996, BRASIL, 1996), trazendo mudanças
substanciais nas políticas educacionais, estabelecendo as diretrizes e bases da educação
nacional e, em especial, do ensino médio e ensino profissional técnico que passavam a ter
uma concepção profissionalizante.
A nova LDB, encaminha com fulcro expansão da educação para atender uma
demanda maior até atingir a universalização, torna o ensino fundamental e médio gratuito EC
59/2009. Neste sentido, Cunha (2000) ressalta que o ensino médio definido pela LDB trazia
uma concepção marcadamente profissionalizante ao afirmar que as finalidades incluíam:
[...]a preparação para o trabalho de cada aluno, para que ele seja “capaz de se
adaptar com flexibilidade as novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores e as formas de avaliação serão organizadas de tal forma que, ao final do
ensino médio, o educando demonstre “domínio dos princípios científicos e
tecnológicos que presidem a produção (CUNHA, 2000, p. 56)
Um fato importante da realidade do Brasil é que a juventude brasileira sempre foi e
permanece sendo uma juventude trabalhadora. O trabalho faz parte da maioria dos jovens que
por pertencerem a famílias de baixa renda têm seu ingresso antecipado no mercado de
trabalho, às vezes, antes da idade legal (16 anos) e sem concluir o ensino fundamental. E,
além disso, os jovens de baixa renda insere-se de forma precária e/ou informal, enquanto os
de alta renda ingressa aos 18 anos em sua grande maioria, alcançam trabalhos protegidos pela
lei (MTE, 2010).
Para compreender a amplitude do termo trabalho, torna-se necessário conceituá-lo,
pois acredita-se ser ele o alicerce essencial para qualquer discussão sobre Educação
71
Profissional, que, na essência educação para o trabalho. A reflexão aqui realizada toma por
base as concepções – derivadas do pensamento marxista que o trabalho ao mesmo tempo em
que é constitutivo da identidade humana, é também o cerne da alienação do homem que o
realiza. Em sentido amplo e dialético.
Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza, um processo
em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo
com a Natureza. [...] Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua
corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria
natural numa forma útil para sua própria vida. (MARX, 2004, p.29)
Para Antunes (2000, p.143), a movimentação laboral que extrapola a necessidade de
substência material, traz consequência à busca de uma vida cheia de “sentido”, que encontra
no trabalho seu locus primeiro de realização e “é socialmente empreendida pelos seres sociais
para auto realização individual e coletiva”.
Enxergar o trabalho por este ângulo revela uma posição diante da Educação
Profissional, que conforme assinalou Antunes (2000, p.136), o trabalho constitui-se como
categoria intermediária que possibilita o salto ontológico das formas pré-humanas para o
social.
Na concepção sociológica do trabalho, considera-se o trabalho como elemento
central da identidade de cada pessoa tendo por principal pressuposto: o reconhecimento do
trabalho, levando em conta o momento histórico e configurações organizacionais, com um
dos pilares na constituição do sujeito. Cada sujeito raramente consegue afastar-se do trabalho
“sem perder o sentimento de utilidade social a ele vinculado, sentimento vital de contribuir
para essa perenidade, em nível pessoal”. (CLOT, 2006, p.69)
Faz necessário conceituar os termos adolescência e juventude, para a UNICEF e o
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, adolescência é delimitada etariamente entre 12
e 18 anos; por sua vez, juventude é faixa etária entre 15 e 29 anos e representa fase final do
amadurecimento físico e social que se conclui com a inserção no mundo adulto. Diversos
estudos já apontaram que entre as maiores preocupações que afligem os jovens estão a falta de
perspectivas de emprego e a constituição de uma carreira profissional. Na opinião dos jovens
entrevistados pela Pesquisa do Projeto Juventude, os Principais motivos associados ao anseio
de trabalho são a necessidade econômica (64%), desejo de independência (55%), busca de
crescimento (47%) e auto realização (25%) (NOVAES E VANUCCI, 2004).
A Ação Educativa (2011, p.14) – uma nova pesquisa, em 2011, vem corrobar que:
“O principal motivo que levou o jovem a procurar se inserir no mercado de trabalho
por meio da Lei de Aprendizagem foi a vontade de trabalhar seguido de perto pelo
desejo de aprender uma profissão e pelo desejo de ter o próprio dinheiro. Em quarto
72
lugar aparece a necessidade de trabalhar”.
E a noção de jovem como sujeito de direito continua consolidando-se. Em 2010
houve aprovação da Emenda Constitucional 65, que inseriu o termo jovem no capítulo de
Direito e Garantias Fundamentais da Constituição Federal de 1988.
E focalizando no novo panorama do mundo do trabalho e o impacto na Educação
Profissional, a crise instalada e as consequentes mudanças vêm sendo enfrentadas, além do
choque no próprio cotidiano do processo produtivo, e na vida do trabalhador, significativas
transformações ocorridas colocam em jogo as discussões do mundo do trabalho na Educação
Profissional, isto é, na forma de qualificação do trabalhador e preparação do jovem para o
trabalho e pensada e realizada.
Em contrapartida, as políticas públicas necessitam orientar o desenvolvimento de
atividades educativas apoiadas em pressupostos epistemológicos que caminhem para uma
visão teórica de unidade, respeitando as dimensões sociais, econômicas, étnicas, cognitivas e
da personalidade do jovem e do adulto no momento da aprendizagem escolar.
Ao debater os direitos à educação profissional atrelada a compromissos éticos que
busquem consolidar o direito a um trabalho digno para todos os brasileiros, Paiva (2006, p.24)
esclarece que:
Os acontecimentos do mundo, antes insuspeitados, que nos causam horror e
insegurança, abalando em grande parte nossas convicções na humanidade, e
acirrando intolerâncias e ódios, colocam em xeque não só os direitos sociais, mas a
perspectiva mesma de direito humano. Cotidianamente, a própria condição de vida
que as opressões produzidas pelo sistema econômico mundial vêm determinando, as
populações veem-se atravessadas pela possibilidade de novas ameaças, em tempos
inimagináveis.
Nesse sentido, ao reescrever a história, pelo direito a educação, desafia-se os
profissionais da educação, para abrir caminhos de forma que a educação, categoria direito
fundamental subjetivo, que tem por finalidade assegurar interesses e necessidades
identificadas como vitais, caracteriza por ser fundamental. E modo geral, o reconhecimento
constitucional de um direito fundamental como subjetivo significar conferir-lhe maior grau de
realização, executividade e imprime ao Poder Público o dever de avançar em nível político,
administrativo, social. E, principalmente, as políticas públicas que resgate os jovens e adultos
que se encontram, em pleno século XXI, sem escolaridade necessária e fundamental para se
inserir com competência no mercado de trabalho e cidadão crítico-reflexivo dentro da
sociedade. Sendo que a Constituição Federal reserva à União competência privativa para
legislar sobre as diretrizes e bases da Educação Nacional (CF, art. 22, XXIV): “Art. 22.
73
Compete privativamente à União legislar sobre: XXIV - diretrizes e bases da educação
nacional”.
E competência concorrente à dos Estados e Distrito Federal para legislar sobre
Educação, mediante normas gerais (CF, art. 24, IX):
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa,
desenvolvimento e inovação
Outro fator a ser observado é que juridicamente, a organização dos sistemas da
Educação (CF, art. 211) acompanha a organização político administrativa da República (CF,
art. 18, caput) aplicando-se, por simetria, o princípio da descentralização normativa e
executiva.
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios,
financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria
educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de
oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante
assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na
educação infantil.
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino
fundamental e médio.
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a
universalização do ensino obrigatório.
§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.
Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil
compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos
autônomos, nos termos desta Constituição. (caput)
E na ausência de normas gerais, os Estados exercem a capacidade legislativa plena,
sendo que a superveniência da lei federal suspenderá a eficácia da lei estadual, no que lhe for
contrário, como expresso (CF, art. 24, IX e parágrafos):
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa,
desenvolvimento e inovação
§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União
limitar-se-á a estabelecer normas gerais.
§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui
a competência suplementar dos Estados.
§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a
competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
§ 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a
eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.
74
Alguns parâmetros se fazem necessários para distinguir entre normas nacionais e
normas federais, tanto em face do Congresso Nacional quanto em decorrência da atividade
regulatória do Conselho Nacional de Educação.
As normas de diretrizes e bases e normas gerais da educação aprovadas pelo
Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República, incidem indistintamente,
sobre todos os sistemas de ensinos. E os Estados, por intermédio de suas Assembleias podem
suplementar as normas gerais (CF, art. 24, IX), mas não as diretrizes e bases. E os decretos
do Presidente da República, não incidem sobre os sistemas estaduais e municipais desde que
regulamentados nas normas gerais ou diretrizes e bases sem alterar o conteúdo. E finalmente
pareceres, deliberações e resoluções do Conselho Nacional de Educação incidem sobre
todos os sistemas de ensino quando veiculem normas gerais de educação, desde que
homologadas pelo Ministro da Educação e atendido o Princípio da Legalidade.
Localizando que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) é uma lei federal de
âmbito nacional que estabelece os princípios gerais da educação. Alcança todos os sistemas
de ensino, por ser uma norma de competência da União, não tem a natureza de legislação
exaustiva (CF, art. 22, XXIV), constituindo eixo jurídico da organização do ensino no Brasil.
Para tanto, torna-se necessário conceituar a palavra “diretriz” significa linha
reguladora, conjunto de instruções para se tratar a levar o termo a um plano, uma ação; no
direito “opção mérito” e na educação “diretriz” são as metas de promoção do indivíduo como
pessoa cidadão e trabalhador (RANIERI, 2013, p.96).
Aprofundando no termo “diretrizes e bases” designam, portanto, fundamentos,
organização, condições exequibilidade e a previsão da LDB conferindo a Educação garantia
constitucional, conferindo unidade de ação em todo país e refletem o momento histórico de
sua elaboração e a direção que se pretende imprimir à preparação para a cidadania e à
formação de recursos humanos, reflete, consequentemente na política governamental no
momento histórico.
A lei 9.394/96 pode afirmar é inovadora e modernizadora, ao romper com as rígidas
prescrições das legislações anteriores. De maneira geral, não cria amarras institucionais e
burocráticas, privilegiando em seu conjunto a liberdade de conteúdo e forma para todos
níveis, estabelecendo um novo padrão de articulação entre União, Estados e os Municípios,
entre estes e a esfera privada.
Outro fato importante ampliou o grau de atuação autônoma dos sistemas e das
instituições de ensino, porém, controle de resultados. São dos os eixos que orientam a
articulação: descentralização – expresso na discriminação de competência das unidades
75
federadas e dos sistemas de ensino; o estímulo à inovação pela margem de liberdade de
processos que concede aos sistemas e às instituições (RANIERI, 2013, p.97)
A edição da LDB assinalou um novo marco à Educação na Constituição Federal de
1988, o seu regime jurídico fundado na natureza pública e na supremacia do interesse público
sobre o particular. E ponto primordial é que “regime legal pode ser flexibilizado, na medida
em que o permitam os valores educacionais, a letra da lei cede ao interesse público nas quais
o processo de aprendizagem se complete, em benefício do aluno” (RANIERI, 2013, p.97). O
problema é que, desde a edição da atual LDB, sucessivas e frequentes alterações de seu
conteúdo põe em risco os seus principais eixos, portanto, sua efetividade.
Iniciaremos a análise das alterações efetuadas na LDB, através das emendas na
Constituição e Lei no Capítulo III – Da Educação, da Cultura e do Desporto – Seção I – Da
Educação no texto constitucional focalizando na educação de jovens e adultos (EJA) e a
educação profissional demonstrando pontos e contrapontos, fazendo uma releitura política e
sua legalidade.
Passados pouco menos de seis meses, o Decreto nº 2.208 de 17 de abril de 1997
(BRASIL, 1997A) regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 42 da Lei nº 9.394/96, trazendo
uma nova visão à educação profissional as reformulações para ensino nível técnico e colocou
em pauta a formação profissional e a educação profissional. É preciso esclarecer a distinção
entre os termos formação profissional e educação profissional.
... apesar das variações no entendimento e na definição dos níveis escolares e
modalidades de ensino direcionados ao mundo do trabalho, formação profissional
designava, a maneira geral, o conjunto de iniciativas não escolares, informais, não
submetidas à normalização legal, destinada à transmissão de conhecimentos
específicos ao exercício profissional e desenvolvidas por instituições de estatutos
diversos: públicos, privados, ONGs, empresas e associações empresariais,
organizações sindicais, etc., para trabalhadores empregados e desempregados, bem
como para jovens em busca do primeiro emprego. Conveniou-se incluir entre essas
iniciativas não integradas ao sistema nacional de educação as ações filantrópicas
assistencialistas, dirigidas à população desescolarizada onde baixa escolaridade,
como substitutivas do ensino regular (MORAES et al., 1999, p.16)
Decreto 2.208/97 complementando a LDB (Lei 9.394/96) definiu a Educação
profissional em três níveis: Básico – destinado à qualificação e requalificação e
reprofissionalização de trabalhadores, independentemente de escolarização prévia; Técnico –
destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos matriculados ou egressos do ensino
médio; e Tecnológico: corresponde a cursos de nível superior na área tecnológica, destinada a
egressos do ensino médio e técnico.
O decreto também marcou uma grande mudança: a desconexão entre ensino médio e
a educação profissional: os cursos com currículo integrado foram extintos podendo ser
76
oferecidos na forma concomitante ou sequencial (Decreto 2.208/97, art. 5º)
Com nível básico, a formação profissional adquire status de educação profissional,
segundo Moraes, et al., (1999, p.17) alerta que: “incorporação da formação a categoria
educação profissional” estava associada à ideia de ajustar a Educação Profissional às
demandas impostas pelo mercado de trabalho.
Ainda no bojo do Decreto nº 2.208 de 17 de abril de 1997 (BRASIL, 1997A),
apresentam-se as definições dos níveis da educação profissional e o modo de oferta para esse
tipo de ensino do qual se extraíram os pontos de relevância conforme adiante:
A educação profissional de nível básico é modalidade de educação não-formal e
duração variável, destinada a proporcionar ao cidadão trabalhador conhecimentos
que lhe permitam reprofissionalizar-se, qualificar-se e atualizar-se para o
exercício de funções demandadas pelo mundo do trabalho, compatíveis com a
complexidade tecnológica do trabalho, o seu grau de conhecimento técnico e o
nível de escolaridade do aluno, não estando sujeita à regulamentação curricular.
As instituições federais e as instituições públicas e privadas sem fins lucrativos,
apoiadas financeiramente pelo Poder Público, que ministram educação
profissional deverão, obrigatoriamente, oferecer cursos profissionais de nível
básico em sua programação, abertos a alunos das redes públicas e privadas de
educação básica, assim como a trabalhadores com qualquer nível de escolaridade.
Aos que concluírem os cursos de educação profissional de nível básico será
conferido certificado de qualificação profissional.
A educação profissional de nível técnico terá organização curricular própria e
independente do ensino médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou
sequencial a este.
Os cursos de nível superior, correspondentes à educação profissional de nível
tecnológico, deverão ser estruturados para atender aos diversos setores da
economia, abrangendo áreas especializadas, e conferirão diploma de Tecnólogo.
As disciplinas de caráter profissionalizante, cursadas na parte diversificada do
ensino médio, até o limite de 25% do total da carga horária mínima deste nível de
ensino, poderão ser aproveitadas no currículo de habilitação profissional, que
eventualmente venha a ser cursada, independente de exames específicos.
O mesmo Decreto cria ainda diferentes formas operativas e uma nova organização
curricular para o ensino profissional técnico de nível médio e para a educação profissional de
nível superior de onde se destacam as principais mudanças conforme exposto adiante:
77
A educação profissional será desenvolvida em articulação com o ensino regular ou
em modalidades que contemplem estratégias de educação continuada, podendo ser realizada
em escolas do ensino regular, em instituições especializadas ou nos ambientes de trabalho.
A educação profissional compreende os seguintes níveis:
I - básico: destinado à qualificação, requalificação e reprofissionalização de
trabalhadores, independente de escolaridade prévia;
II - técnico: destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos matriculados ou
egressos do ensino médio, devendo ser ministrado na forma estabelecida por este Decreto;
III - tecnológico: correspondente a cursos de nível superior na área tecnológica,
destinados a egressos do ensino médio e técnico.
Resta demonstrado que o Decreto 2.208/97 foi revogado pelo Presidente Luiz Inácio
Lula da Silva fundamentado na antonímia e retrocesso na educação porque os currículos
plenos dos cursos técnicos estavam em desacordo com PARECER CNE/CEB Nº16/99 dispõe
sobre as diretrizes curriculares nacionais para Educação Profissional de Nível Técnico.
O Conselho Nacional de Educação (CNE), em seu Parecer 17/97 aprovado em 8 de
dezembro de 1997 (BRASIL, 1997B), e homologado em 14 de janeiro de 1998, contraria o
que estabelece o Decreto nº 2.208/97 e formula a resolução de que somente seria oferecida
certificação de técnico aos egressos desses cursos que também tivessem concluído o ensino
médio, tanto anteriormente ou simultaneamente ao curso técnico. Desta maneira, não seria
oferecida certificação aos alunos que só concluíssem os módulos de uma especialidade
técnica, eliminando a possibilidade de certificação independente do ensino médio.
Em 8 de dezembro de 1999, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional da
Educação, por meio da Resolução nº CEB/CNE 4/99 (BRASIL, 1999), instituiu as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico e definiu as vinte áreas
profissionais do ensino profissional técnico, que poderiam ser modificadas com a inclusão ou
exclusão de áreas. Tal processo de permanente atualização conta com a participação de
representantes da área da educação, empregadores e trabalhadores. As áreas profissionais
definidas em 1.999 estão mostradas no Quadro 3 adiante.
78
Área Profissional
Agropecuária
Artes
Comércio
Comunicação
Construção Civil
Design
Geomática
Gestão
Imagem pessoal
Indústria
Informática
Lazer e desenvolvimento social
Meio ambiente
Mineração
Química
Recursos pesqueiros
Saúde
Telecomunicações
Transportes
Turismo e hospitalidade
Carga Horária Mínima de cada
Habilitação
1.200
800
800
800
1.200
800
1.000
800
800
1.200
1.000
800
800
1.200
1.200
1.000
1.200
1.200
800
800
Quadro 3 – Áreas Profissionais e Cargas Horárias Mínimas
Fonte: Conselho Nacional de Educação – Resolução CNE/CEB 4/99
Importante mudança na educação profissional técnica de nível médio ocorreu no ano
de 2004, adaptando suas finalidades às necessidades do sistema produtivo e da sociedade, ao
ser promulgado o Decreto nº 5.154 de 23 de julho de 2004 (BRASIL, 2004), que estabelece e
regulamenta o ensino profissional com alterações o § 2º do art. 36 e os arts. 39 ao 41 da Lei nº
9.394/96, e cria uma nova relação para a Educação Profissional no Brasil. Estas alterações
ocorreram no período entre o segundo mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso e o
primeiro mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva há recrudescimento da discussão
acerca de um projeto societário para o país (MOURA, 2010).
Com o Governo de Fernando Henrique Cardoso, percebeu-se um sério
distanciamento entre as políticas implementadas para a educação profissional e os contextos
teóricos e do próprio mundo do trabalho relacionados a essa modalidade de ensino, como bem
critica Ramos (2002, p. 402-403):
[...] Apesar de compor as tendências globalizantes de normas e padrões culturais e
políticos, transposições desagregadas de certas teorias para realidade brasileira
causam sérias consequências: [...] no âmbito educacional, as apropriações apressadas
e limitadas desta noção podem reduzir a educação profissional a práticas voltadas
para formações restritas, num triste recuo a princípios educacionais considerados
superados pelo debate educacional crítico das últimas décadas.
79
É assim que, ao final de seu primeiro mandato, Fernando Henrique Cardoso outorga
o Decreto de n.º 2.208/97 no qual, segundo as análises de Manfredi (2002, p. 129), apresenta
as seguintes finalidades:
a) Formar técnicos de nível médio e tecnológico de nível superior para os diferentes
setores da economia;
b) Especializar e aperfeiçoar (o trabalhador em seus conhecimentos tecnológicos);
c) Qualificar, requalificar e treinar jovens e adultos com qualquer nível de escolaridade,
para a sua inserção e melhor desempenho no exercício do trabalho.
Ao ensino profissional previa-se a possibilidade legal de ser desenvolvido em três
níveis, a saber:
• Nível básico: livre a todos os trabalhadores, não exigindo qualquer nível de
escolaridade e com direito à certificação;
• Nível técnico: a estudantes ou a egressos do ensino médio, com currículo distinto
deste, com a flexibilidade de poder ocorrer concomitante ou sequencialmente ao
ensino médio, porém a diplomação só se daria com a conclusão deste;
• Nível tecnológico: referente a todo curso superior da área tecnológica, e voltado a
quem concluísse o ensino médio e/ou técnico. (Idem)
Diante desse fato, Manfredi (2002) levanta sérias críticas a esse modelo de educação
profissional afirmando que este fragmenta a formação dos trabalhadores ao separar o ensino
médio do ensino profissional, e:
Além disso, o desdobramento dos dois tipos de ensino recriará, necessariamente, a
coexistência de redes de ensino separadas, que funcionarão com base em premissas
distintas; o sistema regular com uma perspectiva de preparação para a continuidade
dos estudos em nível universitário, e o sistema profissional ancorado à lógica do
mercado [...]. (Idem, p. 135)
Frigotto, Ciavatta e Ramos, (2005a); Silva; Fernandes; Moura et al., (2006) apontam
que uma solução transitória e viável é um tipo de Ensino Médio que garanta a integralidade da
educação básica e, também, objetivos de formação profissional numa perspectiva da
integração dessas dimensões.
Essa solução transitória, é fundamental que se avance na direção em que os jovens
das classes populares possam optar por uma profissão após os 18 anos (MOURA, 2010).
Igualmente, é viável porque “o ensino médio integrado ao ensino técnico, sob uma base
unitária de formação geral, é uma condição necessária para se fazer a “travessia” para uma
nova realidade” (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2010, p.43).
80
O fato era que a reformulação da LDB, no que se refere à educação profissional foi
de vital importância para a sociedade e “o novo decreto seria um dispositivo transitório que,
enquanto garantisse a pluralidade de ações a sistemas e instituições de ensino, mobilizasse a
Sociedade Civil em torno do assunto” (FRIGOTTO et al., 2005a, p.4). As diversas discussões,
debates e estudos resultaram no Decreto nº 5.154/04, que:
[...] além de manter as ofertas dos cursos técnicos concomitantes e subsequentes
trazidas pelo Decreto nº 2.208/97, possibilita a integração do ensino médio aos
cursos técnicos, numa perspectiva que não se confunde totalmente com a educação
tecnológica, mas que aponta em sua direção por conter os princípios de sua
construção (MOURA, 2010, p.11).
E o anúncio do Ministério da Educação sobre a educação profissional – reconstrução
da política pública – fundamenta as transformações na política educacional com foco na
profissionalização:
[...] corrigir distorções de conceitos e de práticas decorrentes de medidas adotadas
pelo governo anterior, que de maneira explícita dissociaram a educação profissional
da educação básica, aligeiraram a formação técnica em módulos dissociados e
estanques, dando um cunho de treinamento superficial à formação profissional e
tecnológica de jovens e adultos trabalhadores (BRASIL, 2005, p.2).
As relações de trabalho, segundo Frigotto (2001), se fundamentavam em
“harmonizar e humanizar as relações do homem com a natureza, com a ciência, com a cultura
e com a técnica”. Um outro fato a ser elencado é o trabalho como princípio educativo
(ARROYO, 1998, p.152) que é vínculo entre a vida produtiva e cultura, com o humanismo,
constituição histórica do ser humano, de sua formação intelectual e moral, sua autonomia e
liberdade individual e coletiva, sua emancipação. Portanto, princípio educativo, situa-se no
campo de preocupações com os vínculos entre a vida produtiva e a cultura, com humanismo,
formação intelectual e moral. Este princípio é a base re(construção) do ensino
profissionalizante porque não se restringe ao “aprender trabalhando” ou ao “trabalhar
aprendendo”, mas à busca de uma unidade teórica e prática que contribua para a superação da
divisão capital/trabalho que, segundo Baracho (2007, p.28) é “uma utopia necessária”.
O objetivo da formação integral dos educandos é, antes de tudo, romper com a
fragmentação que historicamente tem sido imposta aos estudantes oriundos da classe
trabalhadora.
Com o Governo de Luís Inácio Lula da Silva, algumas alterações já se apresentam
em termos de documentos de regulamentação da educação profissional, tem-se a substituição
do Decreto de n. º 2.028/97 pelo de n.º 5.154/04, sob a alegação de que o primeiro estava
cheio de ilegalidade, como afirmam Frigotto, Ciavatta e Ramos (2004, p. 1):
81
[...] O Decreto n. 2.028/97 era ilegal ao determinar a separação entre o ensino médio
e a educação profissional [...], em confronto com a LDB: "O ensino médio, atendida
a formação geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões
técnicas" [...] e "A educação profissional será desenvolvida em articulação com o
ensino regular (...)".
Diante das demandas contemporâneas do mundo do trabalho, é necessário conceber a
integração do currículo a partir da articulação ensino/pesquisa, a qual contribui para formar a
autonomia dos indivíduos.
O Decreto 5.154/04 vem de encontro com a perspectiva Freireana (2002), o
estudante deixa de ser um depósito de conhecimentos produzidos e transmitidos e passa a
construir, desconstruir e reconstruir suas próprias percepções a respeito dos conteúdos, da
ciência, da tecnologia, do mundo e da própria vida. Sabendo das limitações impostas à
educação profissionalizante pelo capitalismo, é preciso encontrar seu sentido em face das
mudanças ocorridas no mundo do trabalho, produtoras de crescente exclusão; entre o
autoritarismo fundamentalista e o individualismo neoliberal, uma saída possível é:
[...] desenvolver um projeto político-pedagógico que, sistemática e
intencionalmente, conduza à compreensão das relações entre universal e particular,
sujeitos e sociedade, ciência e trabalho, razão e emoção, conteúdo e método, produto
e processo, produtor e proprietário” (KUENZER, 2000, p.35).
Porém, esse Decreto torna possível a integração do ensino médio com o técnico de
nível médio e tenta restabelecer um modelo de educação já previsto anteriormente pela LDB.
Entretanto, não consegue resolver os problemas da educação profissional, tendo em vista que
mantêm vários aspectos do decreto 2.208/97, como por exemplo, a modularização do ensino e
as certificações intermediárias.
Em suma, a realização humana implica a apropriação ativa e o domínio da cultura, da
ciência, da arte. Isso significa uma aposta num novo critério de educação profissionalizante
que contribua para a construção da identidade social e a integração da cidadania, e através da
concretização da política educacional o Conselho Nacional de Educação declarou e o ministro
da Educação ratificou a vigência das novas diretrizes - Parecer nº 39/2004 - da Câmara de
Educação Básica, do Conselho Nacional de Educação, e a Resolução nº 01/2005, que
atualizaram as Diretrizes Curriculares Nacionais vigentes (BRASIL, CNE, 1998 e 1999) às
disposições do Decreto nº 5154/2004.
Com o advento da educação à distância e a necessidade de se ofertar formação
profissional em regiões onde não há oferta de cursos na modalidade presencial, foi criado,
através do Decreto nº 6.301 de 12 de dezembro de 2007 (BRASIL, 2007), o Sistema Escola
Técnica Aberta do Brasil, o qual estabelece a possibilidade do desenvolvimento da educação
82
profissional na modalidade de educação à distância, gratuita, democratizando o acesso aos
cursos técnicos de nível médio para regiões onde não há ofertas desses cursos na modalidade
presencial.
Em junho de 2008, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de
Educação (BRASIL, 2008) reestrutura por meio do Parecer nº CNE/CEB nº 11/2008 as áreas
profissionais, transformando-as em doze eixos tecnológicos, conforme Quadro 3, são
definidos como eixos temáticos do Catálogo Nacional de Cursos Técnico de Nível Médio
(BRASIL, 2009). Tal modificação ainda sem ser transformado em Lei ou Decreto foi
referendada pelo Ministério da Educação através da Portaria nº 870, de 16 de julho de 2008.
Eixos Tecnológicos
Mínima
Máxima
01. Ambiente, Saúde e Segurança
800
1.200
02. Apoio Educacional
800
1.200
03. Controle e Processos Industriais
1.200
04. Gestão e Negócios
800
05. Hospitalidade e Lazer
800
06. Informação e Comunicação
07. Infraestrutura
1.000
1.200
800
1.200
08. Militar*
09. Produção Alimentícia
1.200
800
10. Produção Cultural e Design
800
11. Produção Industrial
12. Recursos Naturais
1.200
1.200
1.000
1.200
Quadro 4 – Resumo do Catálogo Nacional de Cursos Técnico de Nível Médio por Eixos Tecnológicos conforme
CNE/CEB nº 11/2008
Fonte: Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação e Portaria nº 870, de 16 de julho de
2008.
(*) A formação no Eixo Tecnológico – Militar será ministrada única e exclusivamente pelas Forças Armadas
(Exército, Marinha e Aeronáutica), vedada a possibilidade de os cursos deste eixo tecnológico serem ministrados
por outras instituições de ensino.
O Quadro 4 mostra os eixos tecnológicos definidos e adotados pela Portaria nº 870
de 16 de julho de 2008, do Ministério da Educação como guia para os cursos de formação
profissional de nível médio no país.
A Lei 11.741 de julho de 2008 será amplamente discutida sobre o enfoque –
trajetória histórica da legislação do PROEJA – Decreto 5.840, de julho de 2006.
O próximo item abordará a formação do ensino profissional técnico de nível médio.
83
2.2 O ENSINO PROFISSIONAL TÉCNICO DE NÍVEL MÉDIO – FORMAÇÃO - PROEJA
Neste item é apresentado o desenvolvimento do Ensino Profissionalizante Técnico de
Nível Médio do Brasil e, simultaneamente, foram analisadas as legislações educacionais para
nível escolar estudado de acordo com o tema Formação – PROEJA.
2.2.1 Legislação da Formação
A educação figura na natureza social mais significativa no sentido de transformação
e melhoria de vida dos cidadãos. Nesse contexto, a educação alcança o patamar de direito
fundamental13 dentro do sistema jurídico brasileiro, pois concretiza a ideia construção do bem
comum14 e de uma sociedade justa15. A Constituição Federal de 1988 tem fundamental
importância porque consolida esse bem jurídico tutelado – a educação – aos brasileiros (natos
e naturalizados16) e sua aplicabilidade no processo educacional, cumprindo a função
primordial no que tange a proteção jurídica17 desse bem comum.
13
Os direitos fundamentais são também conhecidos como direitos humanos, direitos subjetivos públicos,
direitos do homem, direitos individuais, liberdades fundamentais ou liberdades públicas. A própria Constituição
da República de 1988 apresenta diversidade terminológica na abordagem dos direitos fundamentais, utilizando
expressões como direitos humanos (artigo 4º, inciso II), direitos e garantias fundamentais (Título II e artigo 5º,
parágrafo 1º), direitos e liberdades constitucionais (artigo 5º, inciso LXXI) e direitos e garantias individuais
(artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV).
Optamos, dessa forma, por adotar a terminologia “Direitos Fundamentais”, pois esse termo abrange todas as
demais espécies de direitos. Neste obstante, “a expressão direitos fundamentais é a mais precisa”.
Os direitos fundamentais surgiram com a necessidade de proteger o homem do poder estatal, a partir dos ideais
advindos do Iluminismo dos séculos XVII e XVIII, mais particularmente com as concepções das constituições
escritas.
14 Bem Comum: para distinguir bem comum de bem particular, Johannes Messner – jurista e político austríaco –
associa os conceitos de “ser” e “valor”. “O bem comum– afirma – “é uma realidade social com categoria
supraindividual de ser e valor, em virtude da pluralidade dos membros da sociedade que dela dependem no seu
ser humanamente perfeito; o bem particular é uma realidade com categoria de ser e valor suprassocial, própria da
pessoa humana”.
15
Sociedade Justa: a própria Constituição nos responde. É uma sociedade sem preconceitos e discriminação de
raça, sexo, cor ou idade; uma sociedade livre, solidária, sem pobreza e desigualdades sociais, na qual a cidadania
e a dignidade da pessoa humana estão no topo da pirâmide jurídica.
16
Art. 12 CF/88. São brasileiros:
I – Natos
a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a
serviço de seu país;
b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da
República Federativa do Brasil;
c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição
brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo,
depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira; (Redação da EC 54/2007)
II - Naturalizados
84
Assim, a educação se faz presente em todos os atos do ser humano, podendo ser
avaliada como uma necessidade básica para que se construa uma sociedade justa e igualitária
possibilitando uma melhoria intelectual e social.
Oportuno se faz destacar que a educação e ensino têm acepções diferentes, como
dispõe Roberto Moreira, 1988, p.156:
[...] os conceitos de educação e ensino diferem quanto à sua amplitude e
abrangência. Assim, o conceito de educação envolve todas as influências que o
indivíduo recebe em sua vida, em diferentes instituições e circunstâncias variadas. O
conceito ensino é mais restrito, é a educação escolar, que se desenvolve em
instituições próprias, ou seja, as escolas. Nestes termos, todo ensino é educação, mas
nem toda educação é ensino ou educação escolar (MOREIRA, 1988, p.156) (Grifos
nossos)
Necessário se faz conceituar o sistema educacional e sistema de ensino, pois, não são
coincidentes. O sistema educacional envolve a educação formal (desenvolvida nas escolas) e a
educação não formal (desenvolvida em outras instituições e circunstâncias diversas). E o
sistema de ensino (foca apenas à educação escolar ou processo escolarização). Para que os
atos normativos sejam vistos em suas peculiaridades, neste momento, o enfoque é a educação
institucional que promove a formação do indivíduo com objetivo de desenvolver os saberes.
Pierre Toussaint Roy dispõe que a educação:
É um direito exigível, inalienável18, indispensável, independente, indivisível e
integral. Pois é um direito do cidadão e um dever do Estado, reconhecido tanto
pelas constituições de quase todos os países da América Latina como por diversos
pactos e convenções internacionais. (ROY, 2006, p.30) (Grifos nossos)
Para Carlos Zarco: “a educação é um direito humano, um bem público, e a primeira
responsabilidade do Estado é garantir esse direito a todos” (ZARCO, 2006, p.13).
Reafirma o direito a educação segundo Richard Hartill:
A educação é um direito universal e não um serviço. A educação que buscamos é
de qualidade, possibilita inclusão, permite o pleno desenvolvimento da
potencialidade de cada pessoa, constrói o respeito à diferença, promove a equidade e
a paz (HARTILL, 2006, p.56) (Grifo nosso)
a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua
portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;
b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze
anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira. (Redação da EC de
Revisão 03/1994)
17
18
Proteção Jurídica: Proteção advinda dos operadores do direito, não divindade.
Inalienável: do latim inalienabĭlis, inalienável é aquilo que não se pode alienar (ou seja, cujo domínio não
pode ser passado ou transmitido a alguém). Portanto, à luz da lei, o que é inalienável não pode ser vendido nem
cedido.
85
Sob o prisma jurídico Maria Cristina de Brito Lima corrobora, “[...] o direito à
educação básica é uma norma constitucional especial, um direito público subjetivo, que
ostenta aplicabilidade imediata” demonstrando que a exigibilidade desse direito de grande
relevância para que se possa garantir a sua efetivação.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) – Lei nº 9.394/96 em seus artigos 1º,
2º e 3º:
Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na
vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e
pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas
manifestações culturais.
§ 1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve,
predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.
§ 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à
prática social.
Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios
de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
[...]
VII - valorização do profissional da educação escolar;
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da
legislação dos sistemas de ensino;
IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extraescolar;
XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.
Resta demonstrado que a formação profissional se encontra na agenda política dos
formuladores da LDB, da atualidade, já que passa por diversas transformações para adequar
aos fatos sociais vigentes.
Segundo dados do IBGE, 2013:
Tabela 1 - Número de Matrículas de Educação Básica por Etapas e Modalidade de Ensino, segundo a
Dependência Administrativa - Brasil 2007 - 2013
Fonte: IBGE, 2013
86
Nos 190.706 estabelecimentos de educação básica do País, estão matriculados
50.042.448 alunos, sendo 41.432.416 (82,8%) em escolas públicas e 8.610.032 (17,2%) em
escolas da rede privada. As redes municipais são responsáveis por quase metade das
matrículas (46,4%), o equivalente a 23.215.052 alunos, seguida pela rede estadual, que atende
a 35,8% do total, 17.926.568 alunos. A rede federal, com 290.796 matrículas, participa com
0,6% do total.
Gráfico 1 – Distribuição Percentual da Matrícula por Etapa de Ensino e Dependência
Administrativa – Brasil 2013
Fonte: IBGE, 2013
Em relação ao ensino médio profissionalizante, instituído na rede federal em parceria
com os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, CEFET de Minas Gerais e Rio
de Janeiro, consta apenas 0,5% do total e que as política públicas deverão avançar com escopo
de ampliar para que mais jovens possam ingressar elevando o nível de profissionalização para
o mercado de trabalho, mas também resgatar sua cidadania, já que o programa PROEJA foi
articulado nos Fóruns Eneja com parcela dos pensadores e articulador dos Institutos Federais
de Ciência e Tecnologia (IFs), devido a influência de Gramsci “educação unitária” e Paulo
Freire, no qual, resgata a importância do ensino aprendizagem como instâncias de produção
dialógica coletiva e de negociação cultural (FREIRE, 1985; RIGAL, 1991).
Para tanto, é promovida uma reforma institucional que procura alcançar
simultaneamente dois objetivos estratégicos: a formação da cidadania moderna e a
competitividade internacional dos países. Acrescentam que, para alcançar esse último
objetivo,
[...] é preciso estabelecer um novo tipo de relação entre a educação e a produção. A
pergunta é como ressituar a educação frente ao trabalho, e este frente àquela,
reconhecendo que ambos os espaços (o formativo e o laboral) estão cada vez mais
87
próximos e entrecruzam-se de numerosas e diversas maneiras (CEPAL – UNESCO,
1992).
No Brasil, a obrigatoriedade era apenas do ensino fundamental, por força da Emenda
Constitucional nº 59/2009, o ensino médio tornar-se-á a partir de 2016 embora essa emenda
constitucional não explique se o ensino profissional técnico esteja incluso nesta
obrigatoriedade. Fazendo uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico brasileiro,
onde a Magna Carta dispõe o “princípio (artigo 208, II, CF/88 modificado pelo art. 2º I, II da
EC 14/96” ampliando o direito da universalização oferta gratuita a todos os que não
tiveram acesso na idade própria. Embora não esteja expresso gramaticalmente na
EC59/2009 mas está implícito na interpretação legal pautado princípio constitucional
hierarquia das leis.
EC nº 59/2009
As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º
do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto
constitucional:
Art. 1º Os incisos I e VII do art. 208 da Constituição Federal, passam a
vigorar com as seguintes alterações:
"Art. 208. .................................................................................
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de
idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram
acesso na idade própria; (NR)
VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de
programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e
assistência à saúde." (NR)
Art. 6º O disposto no inciso I do art. 208 da Constituição Federal deverá ser
implementado progressivamente, até 2016, nos termos do Plano Nacional de
Educação, com apoio técnico e financeiro da União.
Art. 7º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data da sua publicação.
Brasília, em 11 de novembro de 2009.
Vale ressaltar segundo dados OCDE – 2012/07:
Nas últimas décadas, quase todos os países da OCDE têm observado um aumento
expressivo no nível educacional de uma geração para a outra. Em média, 74% das
pessoas de 25 a 64 anos de idade chegaram pelo menos ao ensino médio; e 82% das
pessoas de 25 a 34 anos de idade concluíram o ensino médio. A diferença média
entre as gerações de 25 a 34 anos e as gerações de 55 a 64 anos, na OCDE, foi de 20
pontos percentuais. No entanto, em países como Chile, Grécia, Irlanda, Itália,
Coreia, Portugal e Espanha a diferença foi de 30 pontos percentuais ou mais.
Essas medidas protetoras OCDE – 2012 para os estudantes que deixam a escola antes
de terminar o ensino médio, pois, tendem a enfrentar dificuldades maiores para entrar – e
permanecer – no mercado. Alguns países, como Portugal ou Comunidade Flamenga da
Bélgica, estão aumentando as oportunidades de se adquirir uma qualificação de nível médio
posterior, por meio de programas de “segunda chance”. Outros, como Holanda, introduziram
88
mudanças na legislação de auxílio às famílias que acrescentam à escolaridade compulsória a
obrigação de se obter nível de qualificação.
E a legislação brasileira através da Emenda nº 59/2009 acrescenta ao §3º artigo 7319
do Ato Disposições Constitucionais Transitórias para reduzir, anualmente, a partir do
exercício de 2009, o percentual de desvinculação das Receitas da União incidindo sobre
recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino de que trata o artigo 212 da
CF/8820. Constitui um avanço em direção ao Princípio da Dignidade Humana e de encontro
com as mudanças legislativas (OCDE/2012) em prol dos cidadãos que não completaram o
ensino médio.
E o sistema educacional brasileiro, compreendendo, desde o ensino fundamental até
o ensino superior, dispõe escolas gratuitas para todos os níveis nas escolas públicas. Há,
também, as escolas particulares que são responsabilidade das empresas privadas e das
manutenções destas pais ou responsáveis.
No Brasil existem 18.508 escolas públicas e 7.415 particulares que oferecem o
ensino médio e desse total 3.535 (13,64%) oferecem o ensino médio profissional e
dessas 1.173 (33,18%) são escolas públicas, que oferecem o ensino médio
profissional gratuito. (MEC/INEP, 2009).
Sendo que a permanência dos alunos no Brasil perfaz nove anos de duração para
ensino fundamental e o ensino (propedêutico ou profissional) três anos, totalizando doze anos
entre o início da formação escolar até o fim do ensino médio.
Conforme artigo 21 da LDB:
“Art. 21. A educação escolar compõe-se de:
I - educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio;
II - educação superior”.
E a estrutura ensino profissional três anos sequenciais, o aluno brasileiro pode fazer o
primeiro ano formação geral e optar por fazer os dois anos restantes em uma das
especialidades do Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos. De acordo com a legislação
vigente e conforme dados do portal do MEC (BRASIL, 2011), os cursos do PROEJA podem
ser ofertados nas seguintes modalidades:
19
Art. 73. § 3° Os Ministros do Tribunal de Contas da União terão as mesmas garantias, prerrogativas,
impedimentos, vencimentos e vantagens dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça, aplicando-se lhes, quanto
à aposentadoria e pensão, as normas constantes do art. 40.
20
Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de
transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
89
1- Educação profissional técnica integrada ao ensino médio na modalidade de
educação de jovens e adultos.
2- Educação profissional técnica concomitante ao ensino médio na modalidade de
educação de jovens e adultos.
3- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional integrada ao ensino
fundamental na modalidade de educação de jovens e adultos.
4- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional concomitante ao
ensino fundamental na modalidade de educação de jovens e adultos.
5- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional integrada ao ensino
médio na modalidade de educação de jovens e adultos.
6- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional concomitante ao
ensino médio na modalidade de educação de jovens e adultos.
Importante notar que as mudanças devem ser acompanhadas de autonomia escolar,
em que se exige um currículo flexível e contextualizado. Outro detalhe são as discussões e
avaliações das propostas pedagógicas, por parte dos estudantes que precisam ter potencial
para compreender o processo educativo e nele interagir, para poder criticar e propor mudanças
para a qualidade. Se tais mudanças acontecem de forma fragmentada, seu efeito coletivo não
atinge uma transformação substancial nas práticas educativas tradicionais, voltadas para o
mero conteudismo e avaliação quantitativa.
As perspectivas de uma educação um pouco mais condensada, objetivando o acesso
ao Ensino Superior, ou de obtenção de conhecimentos formativos e profissionalizantes
orientados pela meta de qualificação para o mercado de trabalho, voltam-se para
características do ensino médio integrado aos saberes técnicos e profissionais. Simbolizam,
assim, certos significados atribuídos pelos próprios alunos que voltam às aulas e se formam
nessa modalidade de ensino: PROEJA.
Atualmente, com a Lei 11.741 de 16 de julho de 2008, no qual altera dispositivos da
Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, para redimensionar, institucionalizar e integrar as ações da educação profissional
técnica de nível médio, da educação de jovens e adultos e da educação profissional e
tecnológica.
Art. 36-C. A educação profissional técnica de nível médio articulada, prevista no
inciso I do caput do art. 36-B desta Lei, será desenvolvida de forma:
I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental,
sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à habilitação profissional
técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino, efetuando-se matrícula
única para cada aluno;
90
II - concomitante, oferecida a quem ingresse no ensino médio ou já o esteja
cursando, efetuando-se matrículas distintas para cada curso, e podendo ocorrer:
a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades educacionais
disponíveis;
b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades
educacionais disponíveis;
c) em instituições de ensino distintas, mediante convênios de
intercomplementaridade, visando ao planejamento e ao desenvolvimento de projeto
pedagógico unificado.
Segundo dados do IBGE (2010), os números da educação profissional apontam para
a manutenção de sua expansão, com crescimento de 7,4%, ultrapassando 900 mil matrículas
em 2010. Considerando o médio integrado, os números indicam um contingente de 1,14
milhão de alunos atendidos. A educação profissional subsequente – oferecida aos alunos que
já concluíram o ensino médio – aumentou 27% no número de matrículas e tem uma
participação de 62% no total de matrículas da educação profissional. Por outro lado, na rede
federal a educação profissional concomitante ou integrada ao ensino médio tem uma
participação de 61,8% do total de matrículas nesta rede. Nos últimos 8 anos, a rede federal
mais que dobrou a oferta de matrícula de educação profissional, com um crescimento de
114% no período.
Nota-se um crescimento na educação profissionalizante modificando a Lei Federal nº
9.394, atual LDB, resultando alterações do texto aprovado em 20 de dezembro de 1996,
sancionada pelos Presidentes da República sem nenhum veto, fato inusitado no histórico da
legislação educacional brasileira, pois a educação é um bem comum universal.
CF/88
LDB/1996
Art. 208. O dever do
Estado com a educação será
efetivado mediante a garantia de:
I - educação básica obrigatória e
gratuita dos 4 (quatro) aos 17
(dezessete)
anos
de
idade,
assegurada inclusive sua oferta
gratuita para todos os que a ela
não tiveram acesso na idade
própria; (Inciso com redação dada
pela Emenda Constitucional nº 59,
de 2009)
Art. 4º O dever do Estado
com educação escolar pública será
efetivado mediante a garantia de:
I - ensino fundamental,
obrigatório e gratuito, inclusive
para os que a ele não tiveram
acesso na idade própria;
II - progressiva extensão da
obrigatoriedade e gratuidade ao
ensino médio;
Quadro 5 – CF/88 / LDB / EC 59/2009
Fonte: própria
Emenda
Constitucional
EC 59/2009
Art. 1º Os incisos I e VII
do art. 208 da
Constituição Federal,
passam a vigorar com as
seguintes alterações:
"Art. 208.
I - educação básica
obrigatória e gratuita
dos 4 (quatro) aos 17
(dezessete) anos de
idade,
assegurada
inclusive sua oferta
gratuita para todos os
que a ela não tiveram
acesso na idade própria;
(NR)
91
A partir do Quadro 5 infere que o legislador resgata a inclusão de todos os brasileiros
que por qualquer momento histórico não puderam frequentar a escola na busca de coroar o
princípio da dignidade humana. Ademais, Santos (2006), analisando as heterogeneidades
pessoais que se encontram nas salas de aula das instituições que oferecem a Educação de
Jovens e Adultos integrada ao Ensino Profissional, esclarece que:
O aluno/a aluna da EJA foi expulso(a) da escola regular ou a ela não chegou. Esta
fora da idade considerada “certa”; na maioria das vezes e um aluno/uma aluna que
trabalha, ou está a procura de trabalho, não tendo tempo disponível, principalmente
no que os professores consideram como tempo ideal para aprofundar seus estudos.
Nessa linha de pensamento, esses cidadãos que buscam na EJA uma forma de se
inserir no mercado de trabalho, buscando conhecimentos gerais e profissionais, são,
normalmente, os egressos jubilados do ensino regular que refletem o fracasso de ações
pedagógicas tradicionais tanto no ensino público, quanto no privado.
Nos estudos de Moura (2006) sobre a Rede Federal de Educação Profissional e
Tecnológica e com base na designação dessa modalidade de ensino – Programa de Integração
da Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade Educação de Jovens e Adultos
(PROEJA) – tem por objetivo ofertar oportunidades educacionais que agreguem em uma
única etapa da Educação Básica, a cultura geral e a formação profissional.
CF/88
Art. 208.
O dever do Estado
com a educação será
efetivado mediante a
garantia de:
II
progressiva
universalização
do
ensino
médio
gratuito; (Inciso com
redação dada pela
Emenda
Constitucional nº 14,
de 1996)
LDB/1996
Art. 37. A educação de jovens e
adultos será destinada àqueles que não
tiveram acesso ou continuidade de estudos no
ensino fundamental e médio na idade própria.
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão
gratuitamente aos jovens e aos adultos, que
não puderam efetuar os estudos na idade
regular, oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características
do alunado, seus interesses, condições de vida
e de trabalho, mediante cursos e exames.
§ 2º O Poder Público viabilizará e
estimulará o acesso e a permanência do
trabalhador na escola, mediante ações
integradas e complementares entre si.
Quadro 6 – CF/88 / LDB / EC14/1996
Fonte: própria
Emenda Constitucional
EC 14/1966
Art. 2º É dada nova redação aos
incisos I e II do art. 208 da
Constituição Federal:
"I - ensino fundamental
obrigatório e gratuito,
assegurada, inclusive, sua oferta
gratuita para todos os que a ele
não tiveram acesso na idade
própria;
II - progressiva universalização
do ensino médio gratuito; "
92
Esta alteração constitucional através da Emenda 14/1966 tem como objetivo garantir
aos jovens e adultos a gratuidade a todos; já que anteriormente, apenas garantia do direito à
educação ao ensino fundamental e médio que é concretização universalização do ensino
médio gratuito.
Cabe lembrar que a educação é um direito de todos, dever do Estado e da família, de
um lado, há a pessoa humana portadora do direito a educação e, do outro lado, a obrigação
estatal prestá-la. E no artigo 20621 CF/88, aborda os princípios constitucionais que norteiam o
caminhar dos aplicadores da lei.
Linhares (2005, p.156) afirma que “o direito a educação deverá ser exigido não
somente como direito social, mas como direito a vida e, portanto, sob a proteção de uma
norma eficácia plena e de aplicabilidade imediata”. (Grifos nossos)
CF/88
Art.
208. O dever do
Estado com a
educação
será
efetivado mediante
a garantia de:
I
educação
básica
obrigatória
e
gratuita dos 4
(quatro) aos 17
(dezessete) anos de
idade, assegurada
inclusive sua oferta
21
LDB/1996
Lei
Art. 39. A educação
Lei 11.741/2008
profissional, integrada às
Altera dispositivos da Lei
diferentes formas de
no 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, que
educação, ao trabalho, à
estabelece as diretrizes e
ciência e à tecnologia,
bases da educação nacional,
conduz ao permanente
para redimensionar,
desenvolvimento de aptidões
institucionalizar e integrar
para a vida produtiva.
as ações da educação
Parágrafo único. O
aluno matriculado ou
profissional técnica de
egresso do ensino
nível médio, da educação
fundamental, médio e
de jovens e adultos e da
superior, bem como o
educação profissional e
trabalhador em geral, jovem
tecnológica.
Promulgada/
Sancionada/
Publicada
Presidente da
República: Luiz
Inácio Lula da
Silva
Ministro da
Educação:
Fernando
Haddad
Em: 16 / julho /
2008
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de
ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com
ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de qualidade.
VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei
federal.
Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação
básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
93
gratuita para todos
os que a ela não
tiveram acesso na
idade
própria;
(Inciso
com
redação dada pela
Emenda
Constitucional nº
59, de 2009)
II
progressiva
universalização do
ensino
médio
gratuito; ( VI oferta de ensino
noturno
regular,
adequado
às
condições
do
educando;
§ 1º O
acesso ao ensino
obrigatório
e
gratuito é direito
público subjetivo.
§ 2º O
não-oferecimento
do
ensino
obrigatório
pelo
poder público, ou
sua oferta irregular,
importa
responsabilidade
da
autoridade
competente.
ou adulto, contará com a
Os arts. 37, 39, 41 e 42 da
possibilidade de acesso à
Lei no 9.394, de 20 de
educação profissional.
dezembro de 1996, passam
Art. 41. O
a vigorar com outra redação
conhecimento adquirido na
educação profissional,
inclusive no trabalho, poderá
ser objeto de avaliação,
reconhecimento e
certificação para
prosseguimento ou
conclusão de estudos.
Parágrafo único. Os
diplomas de cursos de
educação profissional de
nível médio, quando
registrados terão validade
nacional.
Art. 42. As escolas
técnicas e profissionais,
além dos seus cursos
regulares, oferecerão cursos
especiais, abertos à
comunidade, condicionada a
matrícula à capacidade de
aproveitamento e não
necessariamente ao nível de
escolaridade.
Quadro 7 – Comparativo CF/88 / LDB / Lei 11.741/2008
Fonte: própria
Nota-se que a preocupação do legislador é articulação da Educação Jovem e Adultos
– EJA, com a educação profissional.
No ensino profissionalizante na Rede Federal de Ensino, em suas dimensões
jurídicas, integrar a formação geral e profissional, em uma única modalidade de ensino,
significa dar visibilidade a uma estrutura capaz de implantar, desenvolver, controlar e avaliar
políticas que, no final, volta-se para a inclusão de um segmento educacional que se encontra
em situação de risco e vulnerabilidade social, ou seja, um fragmento numeroso de
trabalhadores brasileiros. Do mesmo modo, a visão jurídica do governo federal é a ruptura de
94
uma sucessão de desigualdades socioeconômicas, uma vez que determina amplas mudanças
na educação, porém não assegura a interdisciplinaridade, pois as disciplinas de formação
geral, nem sempre estão em diálogo ou sequer complementam os conteúdos específicos da
formação técnica.
Legalmente, a concepção do PROEJA proposta no documento base (BRASIL, 2006),
está inserido no marco da elaboração de uma política que construa uma sociedade mais
solidária e economicamente mais justa. Essa mesma visão se apoia em eixos norteadores das
diretrizes educacionais profissionais, atualmente vigentes, voltada para a expansão da oferta
pública de vagas, embora ainda existam processos de seleção em diversos institutos e centros
federais de educação, pois a oferta de vagas chega a ser irrisória diante da procura (MOURA,
2006).
Ainda no que se refere à dimensão educacional, o documento base do PROEJA
(BRASIL, 2007), afirma que este programa educacional deixa de abranger apenas o Ensino
Médio e passa a envolver toda a Educação Básica, ou seja, inclui no percurso rumo ao Ensino
Profissionalizante, o Ensino Fundamental.
Gráfico 2 – Distribuição do número de matrículas na Educação Profissional por Dependência
Administrativa – Brasil 2013
Fonte: IBGE, 2013
A partir dos dados levantados IBGE/2013, a leitura dos dados informa que a forma
subsequente foi a mais requerida pelos jovens e adultos e um rápido crescimento no ensino
médio integrado. Segundo Jamil Cury: “ [...] a função dessa nova educação profissional é de
preparar as pessoas para o exercício da cidadania e para o trabalho, em condições de
influenciar o mundo do trabalho e de modificá-lo pelo exercício de um trabalho profissional
competente”. E para Arroyo (1997, p.62):
[...] durante mais de um século, o conjunto de lutas da classe trabalhadora levou a
conscientização de que o trabalhador não tem que se aperfeiçoar só para produzir
95
mais, ou para rebaixar os custos e ser mais eficiente, mas, sobretudo, porque é gente,
ser humano, e como tal, tem direito à qualificação.
Neste momento, a preocupação dos formuladores de política (legislador) é criar
condições favoráveis para que os jovens e adultos completem a escolaridade não iniciada na
idade própria ou interrompida, por diversos motivos e que o Brasil caminhe rumo a
alfabetização e cumpra as metas do Pacto Internacional da Declaração de Hamburgo (1997).
Diante das diversas fragmentações na LDB com escopo de alavancar a inclusão de
jovens e adultos no seio da educação e sua profissionalização, pois nos últimos 8 anos, a rede
federal mais que dobrou a oferta de matrícula de educação profissional, com um crescimento
de 114% no período (IBGE/2010). Onde atuam na educação um conjunto de estabelecimentos
públicos e privados, que se caracterizam como escolas técnicas, agrotécnicas, centros de
formação profissional, associações/escolas, dentre outros. O Censo Escolar 2010 revela que a
participação da rede pública tem crescido anualmente e já representa 52% das matrículas.
Tabela 2 - Número de matriculas da Educação Profissional por Dependência Administrativa - Brasil 2007
- 2013
Fonte: MEC/Inep
Diante dos dados expostos, a Lei 11.741 de 16 de julho de 2008 que altera a lei
9.394/96, que estabelece a educação nacional, para redimensionar, institucionalizar e integrar
as ações da educação da educação profissional técnica de nível médio, da educação de jovens
e adultos e da educação profissional e tecnológica, apelidada de “PAC da Educação”, tendo
como Relator o Deputado Pedro Wilsom (PT-GO). O artigo 36C da Lei 11.741/2008 dispõe
sobre a forma de ingresso nos cursos profissionalizantes outorgando aos jovens e adultos a
escolher da melhor forma para sua capacitação profissional:
Art. 36-C. A educação profissional técnica de nível médio articulada, prevista no
inciso I do caput do art. 36-B desta Lei, será desenvolvida de forma:
96
I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental,
sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à habilitação profissional
técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino, efetuando-se matrícula
única para cada aluno;
II - concomitante, oferecida a quem ingresse no ensino médio ou já o esteja
cursando, efetuando-se matrículas distintas para cada curso, e podendo ocorrer:
a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades educacionais
disponíveis;
b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades
educacionais disponíveis;
c) em instituições de ensino distintas, mediante convênios de
intercomplementaridade, visando ao planejamento e ao desenvolvimento de projeto
pedagógico unificado.
Considerando-se que a natureza e história da cultura escolar brasileira ainda se
encontra carregada pela diretriz de compensação entre ensino de jovens e adultos
fundamentado no ensino supletivo, uma vez que se volta para a reposição e recuperação do
“tempo” perdido pelos estudantes (LOPES; VALENTIN, 2007). Nessa perspectiva, a
integração entre formação geral e formação profissional está associada a um projeto políticopedagógico, apropriado às particularidades dos métodos de aprendizagem direcionados aos
jovens e adultos, exigindo ações e estratégias educativas concebidas como elo entre formação,
trabalho e cidadania
Ação Educacional
Níveis Educacionais
Infantil, Fundamental, Médio e Educação Superior
Abrangência
• Educação infantil e fundamental obrigatórias, Ensino
médio e superior
• A educação deve vincular-se ao mercado de trabalho
• Na estruturação para Educação Profissional,
estabelece formação aos alunos mesmo que não
tenham concluído formação anterior formal.
Experiência profissional anterior na área que atua
pode ser objeto de avaliação
Ampliar o Ensino Fundamental para nove anos de duração,
com a matrícula da criança de seis anos de idade e
estabelece prazo implantação, até 2010
Gratuidade de Ensino
Educação infantil, fundamental e média
Universalização do ensino médio gratuito
Acrescenta parágrafos e incisos, dá nova redação aos
incisos, parágrafos da Constituição Federal Brasileira no que
tange a desvinculação de receitas para a educação e prevê a
Lei / Decreto
Data
LDB nº 9.394
20/12/1996
LDB nº 9.394
20/12/1996
Lei 11.274
06/02/2006
LDB nº 9.394
Lei 12.061
Emenda
Constitucional
nº 59
20/12/1996
27/10/2009
11/11/2009
97
obrigatoriedade do ensino básico dos quatro aos dezessete
anos e amplia a abrangência dos programas suplementares
para todas etapas da educação básica. Não explicita se a
educação profissional estará incluída na obrigatoriedade.
Idades Limites
Não há idade para o acesso a qualquer um dos níveis
educacionais previsto na legislação.
Na formação profissional é dada oportunidade para quem
tenha uma base (leitura e escrita), independentemente de ter
concluído ou ser aprovado em níveis básicos
Desenvolvimento da Educação Profissional de Nível Médio
Tipos:
• Formação inicial e continuada ou de qualificação
profissional
• Educação profissional técnica nível médio
• Educação profissional tecnológica de graduação e
pós graduação
Educação profissional de nível médio será desenvolvida da
seguinte forma:
- Articulada com ensino médio nas formas:
Integrada: para concluintes do ensino fundamental e
conduzido a habilitação profissional na mesma
instituição
Concomitante: para quem ingressa ou já estejam
cursando o ensino médio na mesma instituição ou
instituição distintas
Áreas de Atuação da Educação Profissional
Alteração de denominação e estruturação das áreas
profissionais para doze “eixos tecnológicos”
Reduzir de 2800 denominações de cursos técnicos para 185
Implantação de Catálogo Nacional de Cursos Técnicos
baseado na estruturação do Parecer CEB/CNE 11/2008
MEC referendou através de portaria a estruturação prevista.
Ainda não há lei ou decreto promulgado sobre o Catálogo
Nacional de Cursos Técnicos.
Recomenda utilização para padronizar denominações das
especialidades e para os novos cursos.
LDB nº 9.394
20/12/1996
LDB nº 9.394
20/12/1996
LDB nº 9.394
Decreto nº
5.478
Decreto nº
5.840
20/12/1996
25/06/2005
23/07/2006
Lei nº 11.741
16/07/2008
Parecer
CEB/CNE
11/2008
12/06/2008
Portaria nº 840
16/06/2008
Quadro 8 – Desenvolvimento da Educação Formal do Brasil 1990 até 2010
Fonte: própria
No próximo capítulo será observado a trajetória histórica do PROEJA.
98
3 TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO PROEJA
As políticas públicas têm, cada vez mais, se convertido em objeto de análise que
atraem a atenção de diversos grupos que se pautam sobre as diversas formas assumidas pela
relação Estado-Sociedade, apropriando do conceito Lasswell (1950) a análise de política
campo de forte caráter contextual (preocupado com especificidade de cada contexto),
multidisciplinar e multimetódico e orientado por problemas. Wildwsky (1970) conceitua a
análise de política “um campo cuja fronteiras (internas e externas) de investigações não
obedecem a limites rígidos, sendo estabelecidas de acordo com a natureza do problema a ser
analisado”. Sendo que o processo de elaboração da política pública – o instrumental de
Análise de Política diferencia três dimensões da política:
A dimensão “policy” que se refere às instituições políticas e ao sistema político.
Outra dimensão é a processual, o processo político, denominado de “politcs”. E a
terceira dimensão é a material, a “policy” que se refere às políticas públicas em si.
Estas estão entrelaçadas e se influenciam mutuamente. (FREY, 2000, p.217)
Considerando que políticas públicas é um campo de conhecimento que tem sua
origem na ciência política, a presente análise tem por objetivo retomar algumas das vertentes
teóricas, marcos conceituais, teoria tridimensionalidade de Reale tendo como escopo
demonstrar o impacto do PROEJA e da Lei 11.741/06 na Constituição Federal, LDB e na vida
em sociedade-Escola.
Embora a literatura sobre políticas públicas tenha se expandido no Brasil, observa-se
que os estudos são recentes, este fato é corroborado por Farah (2012):
A literatura acadêmica fora do Brasil diferencia os estudos de políticas públicas da
análise de políticas públicas. Segundo esta literatura, os primeiros consistem em
estudos de políticas públicas, enquanto a análise de políticas públicas se refere a
estudos para políticas públicas (DOBUZINSKIS, HOWLETT e LAYCOCK, 2007).
Os estudos de políticas públicas são desenvolvidos predominantemente por
acadêmicos e procuram explicar a ação do Estado. A análise de políticas públicas,
por sua vez, é a expressão utilizada para se referir à pesquisa aplicada de base
científica desenvolvida com o objetivo de subsidiar a formulação, a implementação
e a avaliação de políticas públicas, como afirma Dobuzinskis, Howlett e Laycock
(2007: 3-4). No Brasil, não se estruturou um campo claramente delimitado de
formação, de pesquisa e de atuação profissional voltado à elaboração de alternativas
de políticas públicas (análise de políticas públicas). Tampouco houve, na literatura
sobre políticas públicas, uma diferenciação entre estudos de políticas públicas e
análise de políticas públicas. O campo de políticas públicas lato sensu que começara
a se estruturar no final dos anos 60 (FARAH, 2011 e FARIA e MARQUES, no
prelo), após sofrer uma solução de continuidade com a ditadura, está ainda em
processo de (re) constituição no Brasil (FARAH, 2012: 2).
Além disto, a teoria básica do institucionalismo no qual se concentra sua análise na
gestão dos espaços institucionais. O campo teórico e prático é o saber engendrado pelo
99
aparato do Estado, das instituições, da estrutura, das regras, normas, que garantem a ação e
desenvolvimentos das políticas, foco da tese – PROEJA (currículo).
Na perspectiva neoinstitucionalista afirma que as instituições, responsáveis pela
elaboração das políticas públicas, afetam o comportamento dos indivíduos, definem e
determinam as políticas públicas educacionais. Ocorre que nesta perspectiva de análise do
PROEJA e da Lei 11.741/06 predomina a organização da instituição – Ministério de
Educação com suas articulações internas, regras, definições, partido político do presidente ou
ministro dentre outras questões determinantes.
Além deste fator, há a necessidade de se fundamentar que as políticas públicas são o
resultado da própria atividade política de recursos e na provisão de demandas, logo, não
podemos deixar que as políticas públicas educacionais, têm e devem ter sua origem no
Estado, ente responsável pela solução dos problemas (RUA, 1998, p.231)
As sociedades modernas têm, como principal característica, a diferenciação social.
Isto significa que seus membros não apenas possuem atributos diferenciados (idade,
sexo, religião, estado civil, escolaridade, renda, setor de atuação profissional, etc.),
como também possuem ideias, valores, interesses e aspirações diferentes e
desempenham papéis diferentes no decorrer da sua existência. Tudo isso faz com
que a vida em sociedade seja complexa e frequentemente envolva conflito: de
opinião, de interesses, de valores, etc. Entretanto, para que a sociedade possa
sobreviver e progredir, o conflito deve ser mantido dentro de limites administráveis.
Para isto, existem apenas dois meios: a coerção pura e simples e a política. O
problema com o uso da coerção é que, quanto mais é utilizada, mais reduzido se
torna o seu impacto e mais elevado se torna o seu custo.
Resta, então, a política. Esta envolve coerção - principalmente como possibilidade mas que não se limita a ela. Cabe indagar, então, o que é a política. Uma definição
bastante simples é oferecida por Schmitter: política é a resolução pacífica de
conflitos. Entretanto, este conceito é demasiado amplo, restringe pouco. É possível
delimitar um pouco mais e estabelecer que a política consiste no conjunto de
procedimentos formais e informais que expressam relações de poder e que se
destinam à resolução pacífica dos conflitos quanto a bens públicos (RUA, 1998:
231).
É a partir de 2002, no governo do presidente Lula, que houve um intenso número de
políticas e de programas governamentais, que ingressam no cenário nacional, assim, aumenta
demanda para a investigação e análise de PPs. E ampliando o entendimento com a crítica de
Lindblom (1959) no qual incorpora diferentes variáveis à análise inicial PPs. E ampliando o
entendimento com a crítica de Lindblom (1959) no qual incorpora variáveis à análise inicial
de PPs:
[...]avançou um passo adiante da simples racionalidade partidária, sendo assim, traz
para a análise diferentes elementos tais como: as burocracias, o papel dos atores
destas burocracias, os grupos de interesse determinantes dentro de um governo e os
arranjos institucionais (LINDBLOM, 1959, p.40)
100
E o segundo aspecto de análise é diante da historicidade dos atos normativos, da
agenda política Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, partido político dos trabalhadores (PT),
dados informados pelo IBGE, PNAD dentre outros com base na tridimensionalidade de Reale
(fato, valor, norma) e processo legislativo figuram o PROEJA e Lei 11.741/06 e análise do
discurso segundo Bernstein, 1996.
Tendo que à norma o objeto central do Direito, não há como se abandonar, para sua
real interpretação e aplicação, as questões fático-valorativas que antecedem a sua produção.
Diz textualmente o jurista Miguel Reale que:
O direito é uma realidade trivalente, digamos assim, trivalente, ou, por outras
palavras, tridimensional. Ela tem três sabores que não podem ser separados um dos
outros. O direito é sempre fato, valor e norma, para quem quer que o estude,
havendo apenas variação no ângulo ou prisma de pesquisa. A diferença é, pois, de
ordem metodológica, segundo o alvo que se tenha em vista atingir, (...) de tal modo
que o discurso do jurista vai do fato ao valor e culmina na norma. REALE, 2003
Portanto, para adequada percepção da Ciência Jurídica, cujo objeto é o Direito, deve
o pesquisador analisar, não apenas o direito posto, mas sim os fatos e os valores sociais que
geram a criação da norma, a fim de se estabelecer sua perfeita interpretação e aplicação. Além
disso, prática discursiva, pois nenhuma produção dos sentidos ocorre fora do discurso e para
permitir fluxo das diferenças “para diferir, para subverter o sentido, tem que haver um
sentido” (BURITY, 2008, p.50)
Partindo das premissas expostas, a conquista do direito à EJA, inserida no processo
de redemocratização do sistema político nas décadas de 1980 e 1990, forte presença da
sociedade civil na reivindicação de direitos e pressão por participação nos rumos da gestão
pública1.
Outro fator a ser elencado, estrutura da educação básica superior manteve-se
basicamente a mesma desde a instituição da LDB, em 1996, a Educação Profissional passou
por quatro mudanças estruturais que são dignas de nota: a trazida pelo Decreto 2.208 de 1997;
Decreto 5.154 de 2004; Lei 11.741 de 2008 e a Lei 11.892 de 2008; permeando nestas
alheações da LDB encontra-se o PROEJA – 5.840 de 13 de junho de 2006.
Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos (2010, p. 29) em análise do percurso da edição
do Decreto 5.154/2004, afirmam que foi feita a opção por um Decreto2, ao invés de um
1
Sobre o tema, ver Avritzer & Costa (2004), Dagnino (1994), Telles (1994a, 1994b).
Decreto: Um decreto é uma ordem emanada de uma autoridade superior ou órgão (civil, militar, leigo ou
eclesiástico) que determina o cumprimento de uma resolução.
No sistema jurídico brasileiro, os decretos são atos administrativos da competência dos chefes dos poderes
executivos (presidente, governadores e prefeitos).
2
101
projeto de lei3 que alterasse a LDB, haja vista que houve um consenso entre governo,
segmentos da intelectualidade e movimentos sociais de que havia urgência de demonstrar uma
mudança na política educacional e o fato de que “o trâmite de um projeto como esse no
Congresso Nacional certamente seria longo, em função tanto do embate entre as forças que o
compõem quanto da agenda de votações”.
No ano de 2005, ocorre o lançamento por parte do MEC da chamada Fase 1 da
Expansão da Rede Federal de Educação Profissional, quando foram criadas as Unidades de
Ensino Descentralizadas (UNEDs) dos Centros Federais de Educação Tecnológica.
No ano de 2008, ocorre o edital de chamada pública para a Fase 2 da expansão. A
partir de então, as escolas da rede federal de EPT (CEFET’s, Escolas Agrotécnicas Federais,
Escolas Técnicas vinculadas às Universidades Federais e Escola Técnica Federal de Palmas)
passaram a ter autonomia para implantar cursos nos diferentes níveis de educação profissional
e permite-se a integração entre ensino médio e a educação profissional de nível técnico
(decreto 5.154/2004), conforme Oliveira, apesar do Decreto nº 5.154/2004 abrir novas
possibilidades, ele não significou o abandono aos princípios do decreto 2.208/97, uma vez
que, “permitiu tanto a organização de cursos integrando ensino médio e técnico quanto à
estruturação de cursos completamente separados” (OLIVEIRA, 2005, p.91). Neste momento
cabe reflexão sobre a articulação e integração proposta com foco no currículo.
Ainda neste período, como expressão do compromisso do governo Lula em destinar
investimentos para a Educação profissional no Brasil, inicia-se a partir de 2006, um processo
de expansão e reordenamento dessa modalidade de ensino no país. Como parte do processo, o
governo federal propõe um conjunto de programas destinados a estimular a oferta do ensino
médio integrado à educação profissional, como é o caso do Programa Brasil
Profissionalizador, do Programa Ensino Médio Inovador e do Programa Nacional de
Integração da Educação Profissional com Educação Básica na modalidade de Educação de
Jovens e Adultos (PROEJA).
Criado em 2007, pelo governo federal, o programa Brasil Profissionalizado objetiva
modernizar e expandir a rede pública de ensino médio integrado à educação profissional –
meta expressa no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).
Um decreto é usualmente usado pelo chefe do poder executivo para fazer nomeações e regulamentações de leis
(como para lhes dar cumprimento efetivo, por exemplo), entre outras coisas.
3
Projeto de lei: é um tipo de proposta normativa submetida à deliberação de um órgão legislativo, com o
objetivo de produzir uma lei. Normalmente, um projeto de lei depende ainda da aprovação ou veto pelo Poder
Executivo antes de entrar em vigor.
102
Todo este processo, entretanto, não transcorre livre de contradições, pois em 2006 há
uma reorganização da estrutura no Ministério da Educação que cria a Secretaria da Educação
Profissional e Tecnológica e a Secretaria da Educação Básica em substituição às antigas
Secretaria do Ensino Fundamental e Secretaria da Educação Média e Tecnológica, separando
a gestão profissional da básica4.
Neste próximo item será abordado a EJA integrada à Educação Profissional e sua
localização na estrutura educacional brasileira e análise da Lei 11.741/2008.
3.1 ANÁLISE DO PROEJA - EJA INTEGRADA À EDUCAÇÃO PROFISSIONAL ESTRUTURA EDUCACIONAL BRASILEIRA
Seguindo princípios contidos na Constituição Federal de 1988, promulga-se a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, em 20 de dezembro de 1996. A
legislação complementar à lei 9.394/96, em particular, a Portaria/MEC 646/97, determinou a
separação entre o ensino médio e profissional, gerando sistemas e redes distintas, o que impôs
a perspectiva de uma especialização profissional como etapa que ocorreria após a conclusão
de uma escola básica unitária.
Em seu artigo 39, a LDB 9394/96 indica que “a educação profissional, integradas às
diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente
4
Publicada nova estrutura regimental do MEC:
A nova estrutura regimental do Ministério da Educação foi publicada no dia 29/07, no Diário Oficial da União.
Pelo documento, o MEC passa a ter seis secretarias em substituição às sete existentes. As novas secretarias
também mudam seus focos de atuação, com o objetivo de dar maior amplitude e agilidade aos programas
executados pela pasta. Ao anunciar a reestruturação do MEC, em março passado, o ministro Tarso Genro
explicou que ""essas mudanças visam concentrar, priorizar e hierarquizar as ações do ministério"". Mudanças –
A Secretaria de Educação Infantil e Fundamental (Seif) ganhou nova nomenclatura e nova atuação. Ao receber
da Secretaria de Educação Média e Tecnológica a administração da educação média, transformou-se na
Secretaria de Educação Básica (SEB). A alteração tem por objetivo qualificar a educação básica como direito
social. Caberá a ela promover, em articulação com os sistemas de ensino e com os movimentos sociais
organizados, a democratização da gestão e do acesso e a garantia da permanência de crianças, jovens e adultos
nas escolas brasileiras. O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) será
implementado, visando à ampliação do atendimento a todos os níveis da educação básica. Também será preciso
estimular os sistemas de ensino para a formação dos profissionais da educação, por meio da Rede Nacional de
Formação Continuada, por ações voltadas à formação inicial, e pela criação de condições de ampliação do ensino
fundamental para nove anos, garantindo o ingresso de crianças de 6 anos de idade nesse nível de ensino. Outra
mudança nominal e estrutural ocorreu na Secretaria de Educação Média e Tecnológica (Semtec), que passou a se
chamar Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec). A missão da nova secretaria é elevar o nível
de qualificação e escolaridade de jovens, adultos e trabalhadores. Serão instituídos mecanismos de controle
social voltados à gestão democrática, transparente e eficaz no âmbito da política pública de educação
profissional e tecnológica. A Setec vai promover a articulação com outros ministérios e instituições para otimizar
recursos do governo federal para a área. Uma das prioridades da secretaria são os projetos destinados a promover
a inclusão social e formar mão-de-obra qualificada, de acordo com as necessidades apontadas em programas de
desenvolvimento regional. A missão da nova secretaria é expandir a educação profissional de maneira a atender
às necessidades de formação do trabalhador e ampliar o acesso às novas tecnologias.
103
desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva”. A finalidade desse dispositivo legal foi
propor os objetivos da educação profissional, considerando-se as novas demandas e modos de
produção ocupacional, referendadas pelo conhecimento científico e tecnológico tanto dos
gestores, quanto dos trabalhadores (RODRIGUES, 2009).
E outro elemento a ser analisado é que Educação Profissional Técnica de Nível
Médio e a Educação de Jovens e Adultos são consideradas modalidades na Educação Básica.
Torna-se necessário re(significação) o termo modalidade nos parâmetros legais (parecer
CNE/CEB 11/2000) referendado pelo Conselheiro Jamil Cury:
O termo modalidade é diminutivo latino de modus (modo, maneira) e expressa uma
medida dentro de uma forma própria de ser. Ela tem, assim, um perfil próprio, uma
feição especial diante de um processo considerado como medida de referência.
Trata-se, pois, de um modo de existir com característica própria. (BRASIL, 2000,
p.26)
Assim, podemos afirmar que uma modalidade é uma referência onde se insere,
especificamente, na Educação Básica – Ensino Fundamental e o Ensino Médio. E o parecer
CNE/CEB 11/2000 explica a relação à educação de jovens e adultos, por analogia, aplica-se a
todas as modalidades inclusive à Educação Profissional Técnica de Nível Médio:
Ora, sendo a EJA uma modalidade da educação básica no interior das etapas
fundamental e média, é lógico que deve se pautar pelos mesmos princípios postos na
LDB. E no que se refere aos componentes curriculares dos seus cursos, ela toma
para si as diretrizes curriculares nacionais destas mesmas etapas exaradas pela
CEB/CNE. Valem, pois, para a EJA as diretrizes do ensino fundamental e médio. A
elaboração de outras diretrizes poderia se configurar na criação de uma nova
dualidade. (BRASIL, 2000, p.61)
Essa modalidade de ensino se converte em um processo de educação permanente,
pois deve conduzir ao permanente processo de aptidões para a vida produtiva. Nessa nova
legislação há uma abertura aos trabalhadores que não dispondo de diploma de conclusão
do ensino médio regular, terão a oportunidade de realizar cursos em escolas técnicas ou
em centros diversos de formação profissional (SOUZA; SILVA, 1997).
De acordo com o disposto no artigo 40 da LDB a educação profissional não mais
seria integrada, obrigatoriamente, ao ensino regular (fundamental e médio), embora com
ele deva-se articular quando ministrado em instituições especializadas ou no ambiente de
trabalho (em serviço). Conforme Kuenzer (1997), a educação básica tem por finalidades:
desenvolver o aluno, garantir sua formação plena, indispensável para o desenvolvimento
da cidadania e fornecer-lhes meios para prosperar no trabalho tanto a nível superior
quanto na educação profissional em caráter permanente.
104
Ademais, ao materializar os princípios educacionais constitucionais, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96, segundo Hamze (2010), muda a
nomenclatura de Ensino Supletivo para Educação de Jovens e Adultos (EJA). Com o
Parecer CEB/CNE 11/2000, o qual fundamentou a Resolução do CNE de Diretrizes
Curriculares para a EJA, são politicamente ressaltadas as alterações da terminologia de
ensino supletivo para EJA: o direito público subjetivo dos cidadãos à educação; as
dimensões de resgate; de igualdade e de formação pessoal, como ainda diferenciam a EJA
da aceleração de estudos.
Importante destacar que na visão educacional brasileira vigente, orienta-se para a
necessidade de contextualização do currículo e dos processos pedagógicos e recomendase, para tanto, a formação continuada e permanente de educadores. Além disso, segundo
Machado (2008), a interdisciplinaridade é um dos pressupostos capaz de assegurar um
diálogo frequente entre a formação geral (conhecimentos científico e cultural) e a
formação profissional (conhecimento técnico e prático).
Essa decisão revelou-se mais amiúde do que a proposta pelo Conselho Federal de
Educação, a qual possibilitava a opção do trabalhador em aprofundar nos estudos gerais,
ou por concorrer a uma habilitação profissional, no ensino técnico. No entanto, quais
razões teriam levado à adoção de aparatos políticos e legais que instruam a dualidade
entre formação geral e formação técnica, criando instituições federais de ensino
profissionalizante, propondo ora a integração ora a articulação entre os diferentes saberes
na formação do trabalhador brasileiro?
A percepção do PROEJA, fundamentada nas políticas educacionais de base, está
inserida no marco da formalização de um projeto indispensável de sociedade mais
igualitária e motiva-se nas diretrizes norteadoras das políticas de educação profissional,
atualmente em vigor: a ampliação da oferta pública de educação, assim como o
desenvolvimento de táticas de financiamento público que viabilizam a alocação de
recursos para uma EJA de qualidade. (MOURA, 2007)
Do mesmo modo, pode-se citar a oferta de educação profissional na perspectiva
da formação integral do cidadão – Ensino Médio Integrado à Educação Profissional
Técnica – formação que coadune, na sua práxis e nos seus preceitos científicos, históricos
e sociais, a sintonia com o mundo do trabalho, a ciência e a cultura – e a missão
imprescindível da educação profissional com relação à formalização e aplicação das
políticas públicas de integração social (MOURA, 2007).
105
No período entre 2003 e 2006, relativo ao primeiro mandato do Governo Lula, a
política educacional proporciona ao EJA um maior destaque do que o realizado nos
governos anteriores pós-redemocratização. No entanto, se existe um discurso que apregoa
sua valorização, que não se faz acompanhar de realizações palpáveis para a superação da
estrutura formalizada na década de 1990 (RUMMERT; VENTURA, 2007).
Ao instituir tais políticas para educação de jovens e adultos, o governo e
educadores necessitam se fundamentar na visão de conjunto, por práticas pedagógicas
coletivamente aplicáveis ao ser humano em sua integralidade, por enfoques que
questionem a dinâmica do mundo do Trabalho; uma formação voltada para a
multidisciplinaridade, a contextualização e a conexão dos conteúdos, pela motivação à
criatividade e pela importância social e ética (MACHADO, 2006).
Ventura (2011, p.84-85) dispõe que as ações da Educação de Jovens e Adultos
são deficitárias do ponto de vista de sua institucionalidade. Já que a proposta de uma
institucionalidade que contribua para uma sociedade menos desigual, que esteja
“comprometida com o todo social, com algo que funde a igualdade na diversidade”,
sugere que essa política (PROEJA) se oriente para a busca de unidade entre a formação
geral e a profissional – podendo aproximar da ideia da escola unitária, tal qual Gramsci
(2000), que ofereça oportunidades iguais de formação a todos os sujeitos. De acordo com
Soares (2000, p.410) “quando Gramsci propõe a “escola unitária” como reação ao
dualismo escolar, o adjetivo “unitária” está relacionado a um princípio mais amplo,
parâmetro de toda análise sobre a organização da cultura. Trata-se do princípio da
igualdade” ou “princípio unitário” diretriz para superar os conflitos sociais.
Frigotto (2009, p.73) apesar da retórica do governo Lula sinalizar um
compromisso com reorganização do sistema educacional como foco e superação da
desigualdade social presentes no Brasil, não há reformas estruturais na educação, portanto,
jamais se colocou de fato o projeto de uma escolaridade básica e formação técnicoprofissional como direito social subjetivo para a maioria dos trabalhadores. (Ibid, p.73)
para o referido autor, essa é uma questão presente no Governo Fernando Henrique
Cardoso e que persiste “caminho desviante” do governo Lula.
Ferreira (2009, p.265) dispõe que a política educacional na gestão Lula “sofre os
limites das políticas anteriores porque fragmentadas e não alcança a educação escolar em
sua totalidade”.
Sobre esse aspecto, Moura (2007, p. 28) afirmou que:
106
É fundamental assumir que no atual momento histórico, umas das formas de
construir um sentido para o ensino médio é buscando sua integração com a educação
profissional técnica de nível médio10. Para isso, é fundamental a sua ampliação
gradativa de forma gratuita, laica e com qualidade nos sistemas públicos de
educação. Entretanto, apesar dessa necessária ampliação, há que se cuidar para que o
processo ocorra de forma planejada e coordenada entre as distintas esferas de
governo.
Em princípio, conforme Blum e Zanardini (2010) este programa seria ofertado
apenas nas Instituições Federais. Entretanto, por meio do Decreto 5.840 de 13 de julho de
2006, anula-se o anterior, e a EJA integrada à Educação Profissional passa a ter a
possibilidade de ser ofertado além das Instituições Federais de Educação Profissional,
também nas instituições públicas estaduais, municipais e privadas. O PROEJA se torna,
assim, em um programa em âmbito nacional, alterando sua denominação para Programa
Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade
de Educação de Jovens e Adultos.
Deve ser, pois, uma política pública do Estado brasileiro, com oferta educativa de
qualidade, autêntica e transformadora, tanto para a inserção do jovem ou adulto, quanto
criar condições para que este venha concluir os níveis de ensino almejados. Nas palavras
de VIRIATO; GOTARDO (2009, p.219):
Tomar como reflexão a legislação que se relaciona com o PROEJA, permitiu
mostrar as contradições e as incoerências a serem enfrentadas para que possamos
construir e implementar um currículo que efetivamente expresse os conhecimentos
necessários à classe trabalhadora para a sua emancipação.
Segundo a legislação vigente e conforme dados do portal do MEC (BRASIL,
2011), os cursos do PROEJA podem ser ofertados nas seguintes modalidades:
1- Educação profissional técnica integrada ao ensino médio na modalidade de
educação de jovens e adultos.
2- Educação profissional técnica concomitante ao ensino médio na modalidade de
educação de jovens e adultos.
3- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional integrada ao ensino
fundamental na modalidade de educação de jovens e adultos.
4- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional concomitante ao
ensino fundamental na modalidade de educação de jovens e adultos.
5- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional integrada ao ensino
médio na modalidade de educação de jovens e adultos.
6- Formação inicial e continuada ou qualificação profissional concomitante ao
ensino médio na modalidade de educação de jovens e adultos.
Sintetizando, o Ensino Médio Integrado ao Técnico na Modalidade de Educação
de Jovens e Adultos é a modalidade na forma integrada à Educação Profissional Técnica
de Nível Médio, o PROEJA, um programa que objetiva estimular a implementação da
Educação Profissional integrada à Educação Básica na modalidade EJA, foi instituído o
107
Decreto 5.478/2005, revogado pelo Decreto 5.840/2006. Este determina a adoção da
modalidade por parte das Instituições Federais de Educação Profissional, com percentual
mínimo de 10% do total das vagas ofertadas e progressivo aumento, sendo facultado a
oferta a escolas da rede estadual, municipal e do Sistema S, e estabelece normas e cargas
horárias mínimas dispostas nas diretrizes curriculares da educação profissional –
programa PROEJA, porém, as metas propostas não foram alcançadas em sua totalidade
conforme dados do PNAD/2009 e PPPA 2016-2019 abaixo dispostos.
De acordo com a formulação do PNE 2001-2010, a preocupação maior era com os
altos índices de analfabetismo e com a institucionalização da EJA, visando ampliar os níveis
de escolaridade da população que ainda não havia concluído a educação básica. As metas
vinculam-se à erradicação do analfabetismo, ampliação da oferta, produção de dados
estatísticos, de modo a subsidiar o planejamento de políticas e programas educacionais.
Tabela 3 - Evolução da Taxa de Analfabetismo entre a população de 15 anos ou mais Brasil – Ano 2000 e
2009
Fonte: Censo Demográfico 2000 e PNAD/IBGE 2005, 2009.
Os grandes números do analfabetismo brasileiro parecem ser pouco sensíveis ao
esforço da União, em associação a outras iniciativas dos poderes públicos estaduais e
municipais e de organizações não governamentais, para alfabetizar em grande escala.
CASTRO (2009) constata que “a taxa de analfabetismo dentro de uma mesma geração é
pouco sensível a mudanças com o passar dos anos” e que “a queda do analfabetismo está
ocorrendo pela escolarização da população mais nova e pela própria dinâmica populacional
com a “saída” dos idosos analfabetos (morte) ”. De fato, mantida a redução média dos últimos
dez anos, cerca de 0,4 pontos percentuais ao ano, serão necessárias pelo menos mais duas
décadas para vencer o analfabetismo.
Em 2009, um estudo realizado pelo IPEA acerca da evolução do analfabetismo no
Brasil concluiu que a redução lenta deve-se, em grande medida, à “incipiente inserção nos
108
programas de alfabetização de jovens e adultos, assim como à sua baixa efetividade”. (IPEA,
2010b)
Para Ciavatta e Frigotto (2005) que fragmentação da política pública EJA a e
consequentemente PROEJA que se concretiza que as políticas educacionais no governo Lula
e compromete sua eficácia e eficiência.
Tabela 4 - Sumário da avaliação de adequação das Metas do PPPA 2016-2019 com o PNE 2014-2024
Metas PNE
1 - Educação Infantil
2 - Ensino Fundamental
3 - Ensino Médio
4 - Educação Especial
5 - Alfabetização Infantil
6 - Educação integral
7 - IDEB e Aprendizado
Adequado
8 - Escolaridade Média
9 - Alfabetização de Jovens
e Adultos
10 - EJA Integrada à
Educação Profissional
11 - Educação Profissional:
Indicadores
Crianças de 4 e 5 anos matriculadas: 2013: 81,4%.
Meta 2016:100%
Crianças de 0 a 3 anos matriculadas: 2013: 23,2%.
Meta 2024: 50%
Crianças de 6 a 14 anos matriculadas: 2013: 98,4%.
Meta 2024: 100%
Jovens de 16 anos que concluíram o ensino
fundamental:
2013: 66,7%. Meta 2024: 95%
Porcentagem de jovens de 15 a 17 anos na escola:
2013: 84,3%. Meta 2016: 100% Porcentagem de jovens
de 15 a 17 anos no ensino médio:
2013: 55,3%. Meta 2024: 85%
Taxa de inclusão de alunos de 4 a 17 anos:
2014: 86,93%. Meta 2024:100%
Crianças do 3º ano alfabetizadas:
2012: 98,1% Meta 2024: 100%
Escolas públicas com matrículas em tempo integral:
2014: 42%. Meta 2024: 50%
Matrículas na rede pública em tempo integral:
2014: 15,7%. Meta 2024: 25%
IDEB do ensino médio:
2013: 3,70. Metas: 2015: 4,3; 2017: 4,7; 2019: 5; 2021:
5,2.
IDEB dos anos finais do ensino fundamental:
2013: 4,20. Metas: 2015: 4,7; 2017: 5; 2019: 5,2; 2021:
5,5.
IDEB dos anos iniciais do ensino fundamental:
2013: 5,20. Metas: 2015: 5,2; 2017: 5,5; 2019: 5,7;
2021: 6
Escolaridade média da população de 18 a 29 anos:
residente em área rural:
2013: 7,8 anos. Meta 2024: 12 anos região de menor
escolaridade do país: 2013: 9,0 anos. Meta 2024: 12
anos 25% mais pobres:
2013: 7,9 anos. Meta 2024: 12 anos população negra:
2013: 9,18 anos. Meta 2024: igualar à população não
negra
Taxa de alfabetização da população (15 anos ou mais):
2013: 91,5%. Metas: 2015: 93,5%; 2024: 100% Taxa
de analfabetismo funcional (15 anos ou mais):
2013: 18,1%; Meta 2024: 9,05%
Matrículas de EJA articulada à educação profissional:
2014: 2,8%. Meta 2024: 25%
Matrículas de educação profissional técnica:
2014: 1.741.528. Meta 2024: 5.224.584 Matrículas de
Adequação do
PPPA
INADEQUADO
INADEQUADO
INADEQUADO
ADEQUADO
NÃO PREVISTO
INADEQUADO
INADEQUADO
INADEQUADO
INADEQUADO
ADEQUADO
INADEQUADO
109
educação profissional pública:
2014: 784.763 Meta 2024: 2.526.291
Taxa bruta de matrícula na educação superior:
2013: 30,30%. Meta 2024: 50% Matrículas da
população de 18 a 24 anos na educação superior:
12 - Educação Superior
2013: 20,2%. Meta 2024: 33%
Novas matrículas no segmento público: Meta 2024:
40% das novas matrículas
Percentual de mestres ou doutores:
13 - Titulação de
2013: 72,61%. Meta 2024: 75% Porcentagem de
Professores da Educação
doutores:
Superior
2013: 33%. Meta 2024: 35%
Número de mestres titulados:
2013: 50.141. Meta 2024: 60.000 Número de doutores
14 - Pós-graduação
titulados:
2013: 15.287. Meta 2024: 25.000
Porcentagem de professores com curso superior:
15 - Formação de
2013: 74,8%. Meta 2024: 100% Com licenciatura na
Profissionais da Educação
área (anos finais do ensino fundamental):
Básica
2013: 32,8 %. Meta 2024: 100% Com licenciatura na
área (ensino médio): 2013: 48,3%. Meta 2024: 100%
16 - Pós-graduação e
Professores da educação básica com pós-graduação:
Formação Continuada
2013: 30,2%. Meta: 2024: 50%
Razão entre salários de professores e demais
17: Valorização de
profissionais:
Professores
2013: 76,5% . Meta 2024: 100%
Planos de carreira dos profissionais da educação básica
18 - Planos de Carreira
e superior:
Meta: implementação em 2016
Gestão democrática da educação:
19 - Gestão Democrática
Meta: efetivação em 2016
Investimento público em educação em relação ao PIB:
20 - Financiamento da
2013: direto: 5,2%; total: 6,2%. Meta 2019: 7%. Meta
Educação
2024: 10%
Fonte: PPPA 2016-2019, PNE 2014-2024, IBGE, INEP
INADEQUADO
NÃO PREVISTO
ADEQUADO
ADEQUADO
INADEQUADO
ADEQUADO
ADEQUADO
NÃO PREVISTO
INADEQUADO
Evidencia-se que as metas PNE (alfabetização de jovens e adultos e Educação
Profissional) foram inadequadas de acordo com a PPPA 2016 – 2019; PNE 2014-2024 –
(IBGE, INEP) através da Consultoria de Orçamento e Fiscalização da Câmara dos Deputados.
Apenas alcançou a meta EJA integrada à Educação Profissional ficando dentro dos
indicadores, concretizando as análises dos autores Ferreira e Frigotto, nas políticas públicas
educacionais fragmentação não leva sua institucionalidade.
No próximo item a ser abordado é a análise da Lei 11.741 de julho de 2006 e seus
impactos na Constituição Federal de 1988 e na Lei 9.394/96 – LDB.
110
3.1.1 Análise da Lei 11.741/2006 e seus impactos na Constituição Federal de 1988 e na
Lei 9.394/1996 - LDB
Para compreender e interpretar a Lei 11.741/2006 torna necessário retroceder no
tempo buscando na historicidade fatos que justificam a alteração dos dispositivos da Lei
9.394/1996 no qual estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para redimensionar,
institucionalizar e integrar as ações da educação técnica de nível médio, da educação de
jovens e adultos e da educação profissional e tecnológica.
Necessário se faz conceituar redimensionar, institucionalizar e integrar pois estes
comandos estão dispostos no preâmbulo da lei 11.741/06, pois segundo Barroso (1999, p.134135) dispõe que:
Na tradição constitucional brasileira sempre se afastou o preâmbulo5 do corpo
normativo, propriamente dito, da Constituição. O sistema está ordenado de forma
que as disposições textuais ocupem espaços definidos dentro de sistema mais amplo
que o envolve. É a percepção do lugar do texto no conjunto, sobressaindo a
preocupação de determinação formal-textual.
Como método de análise – método exegético – para o preâmbulo da lei, já que é um
importante documento porque revela a vontade do legislador, sendo um problema formal e
não material (BORGES; ALVES, 2011, p.128). E partindo deste pressuposto, a análise
linguística do termo, segundo Houaiss, redimensionar mudança do ângulo de uma pesquisa
ou estudo; institucionalizar é o processo de assemelhação ou de transformação de alguma
coisa em uma instituição, entendendo esta como uma associação ou organização de caráter
social, filantrópico e integrar, por sua vez, dar forma institucional, passar a fazer parte de um
grupo ou coletividade, sentir-se parte de alguma coisa.
Em 1996, a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96 –
alterou todo o ordenamento educacional, e a formação politécnica com base na compreensão
teórica e prática dos fundamentos científicos das múltiplas técnicas utilizadas no processo
produtivo como princípio organizador do ensino médio, deferida por educadores organizados
por meio do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública e constante na primeira versão do
Projeto de Lei de LDBEN.
5
Bonavides, 1998, 70-71, na redação de Constituições modernas, consagra a divisão (não necessariamente nesta
ordem) formas de organização:
I - preâmbulo;
II - a parte introdutória com as definições fundamentais do regime político, forma de governo e organização do
Estado;
III - a parte dogmática com as declarações de Direitos;
IV -a parte orgânica com a definição de órgãos e competências estatais;
V - a parte de disposições gerais ou finais
111
Encaminhada ao Congresso de 1988, não se efetuou o texto final, que pelo seu
caráter minimalista, permitiu que o governo, alinhado com uma nova concepção de capital
humano, regulasse a separação formal entre o ensino médio e a educação profissional por
meio do Decreto 2.208/97 que definiu três níveis para a educação profissional: básico, técnico
e tecnológico.
Este Decreto alterou a estrutura da educação profissional que “a educação
profissional de nível técnico terá organização curricular própria e independente do ensino
médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou sequencial a este”.
A educação profissional passa a ser caracterizada como complementar e o ensino
médio retorna, legalmente, um sentido puramente propedêutico. A educação profissional
constitui-se em sistema paralelo retornando à estrutura dualista e segmentada e mais uma vez
rompe-se com o conceito de equivalência, permitindo apenas a articulação entre a educação
profissional e a educação básica.
Este modelo de organização da educação profissional já estava sendo articulado,
anteriormente, à aprovação LDBN, por meio do Projeto de Lei 1.603/96, contestado pelos
movimentos educacionais. Este projeto de lei foi abandonado pelo governo, a partir do
entendimento que o texto da LBBEN permita a regulamentação por meio de decreto, evitando
o embate para aprovação no Congresso Nacional.
Na sequência, o CNE emitiu pareceres com o objetivo de aplicação do decreto. As
diretrizes curriculares nacionais para ensino médio foram implantadas pela Resolução
CNE/CEB 3/1998 e da educação profissional de nível médio no Parecer CNE/CEB 16/1999
revogando o Parecer 45/1972. Estes dispositivos definiram a organização dos cursos técnicos
sob a lógica de organização setores produtivos: “Os cursos deviam ser organizados por áreas
profissionais estruturadas por competências profissionais e com possibilidade de serem
organizadas em módulos, com certificações intermediárias” (CNE/CEB 16/1999).
Frigotto (2010) dispõe que a sociedade em construção no país não necessitava da
universalização da escola básica e reproduzia uma escola dual que que tem marcado a história
no Brasil; construindo uma educação profissional restrita para a formação de um cidadão
produtivo.
Novos processos de constituição hegemônica resultam na eleição de Luiz Inácio Lula
da Silva, os movimentos educacionais reorganizam-se na tentativa de restabelecer os
princípios defendidos em 1988 pelo projeto de LDBEN defendido pelo Fórum Nacional de
Defesa da Escola Pública. (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005).
112
Assim, em 2004 foi promulgado o Decreto 5.154/2004 regulamenta §2º do artigo 36
e os artigos 39 a 41 da LDB. E a concepção de educação defendida pelas centrais sindicais e
pelos sindicatos dos trabalhadores, formação integral, sob a forma de educação profissional
entrelaçada ao ensino fundamental e ao ensino médio (CUT, 1998; LIMA, 1999, 2005).
Decreto
5.154/2004
Análise da LDB – 9.394/96
Art. 36. O currículo do ensino médio observará o disposto na Seção I deste Capítulo e
as seguintes diretrizes:
§ 2º O ensino médio, atendida a formação geral do educando, poderá prepará-lo para
o exercício de profissões técnicas.
Art. 39. A educação profissional e tecnológica, no cumprimento dos objetivos da
educação nacional, integra-se aos diferentes níveis e modalidades de educação e às
dimensões do trabalho, da ciência e da tecnologia.
Art. 40. A educação profissional será desenvolvida em articulação com o ensino
regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições
especializadas ou no ambiente de trabalho.
Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profissional e tecnológica, inclusive
no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para
prosseguimento ou conclusão de estudos
Quadro 9 - Análise da LDB – 9.394/96
Fonte: LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996.
No Decreto 2.208/97 dispunha sobre o ensino profissionalizante na forma
subsequente e concomitante, porém, desvinculava a forma integrada, pois, este era
antinômico, passando a vigorar do decreto 5.154/2004, já na gestão do Partido dos
Trabalhadores – Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E a portaria ministerial nº 2.080/2005
no qual determina às diretrizes para oferta da educação profissional, na forma integrada aos
cursos de ensino, na modalidade de jovens e adultos, EJA na rede federal de educação
tecnológica; fundamentado na escola politécnica, compreendendo-a como uma educação
unitária e universal destinada à superação da dualidade entre cultura geral e cultura técnica.
E as transformações foram ocorrendo baseando na LDB e os parâmetros
constitucionais, promulgado decreto nº 5.478/2005 – nasce o PROEJA no âmbito federal sob
o comando federal. Já que o ensino médio integrado ao ensino técnico, sob uma base unitária
de formação geral é a condição necessária para fazer a “travessia” para uma nova realidade
(FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p.43).
113
Decreto
5.478/2005
EC 26/2000
EC 64/2010
Análise Decreto
Instituiu, no âmbito das instituições de educação tecnológica o Programa de
Integração da Educação de Ensino Médio na modalidade de Educação de Jovens e
Adultos – PROEJA
Projeto Programa Nacional de inclusão de jovens: Educação, Qualificação e Ação
Continuada – PROJOVEM – Secretaria Geral Presidência da República, 2005.
As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3o do art.
60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:
Art. 1o O art. 6o da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 6o São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência
aos desamparados, na forma desta Constituição." (NR)
As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da
Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:
Art. 1º O art. 6º da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia,
o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a
assistência aos desamparados, na forma desta Constituição." (NR)
Quadro 10 - Análise Decreto
Fonte: própria
Segue as normatizações em busca dar a sociedade respostas de ações sociais
educacionais eficazes na inclusão de jovens e adultos no fulero trabalho com cidadania.
Desenvolve sob a tutela dos Partidos dos Trabalhadores, tendo como base os sindicatos
trabalhistas.
Decreto
5.840/2008
PROEJA
EC 65/2010
Análise Decreto
Instituiu, no âmbito federal, o Programa de Integração da Educação Profissional com
a Educação Básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA
As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da
Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:
Art. 1º O Capítulo VII do Título VIII da Constituição Federal passa a denominar-se
"Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso".
Art. 2º O art. 227 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do
adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais,
mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos:
§ 3º
III - garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola;
114
VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e
ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins.
§ 8º A lei estabelecerá:
I - o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens;
II - o plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das
várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas." (NR)
Quadro 11- Análise Decreto
Fonte: própria da autora.
Em, 16 de julho de 2008, nasce da Lei nº 11.741 amparado no processo legislativo
pautado princípio democrático, faz alterações estruturais na LDB – 9.394/96, estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional tendo como defensor Chico Lopes (PCdoB/CE).
3.1.2 Projeto de Lei 919 de 2007
A concretização deste ato normativo, dessa convergência mínima entre os envolvidos
na discussão que se edificaram as bases que deram origem ao Decreto 5.154/04, e
posteriormente, permitiram a incorporação na LDB pela lei 11.741/2008.
Neste momento, torna-se preponderante questionar porque as grandes mudanças no
cenário da educação profissional concretizam nos decretos (2.208/1997; 5.154/2004;
5.478/2005; 5.840/2006) e a Lei 11.741/2008. Deve-se observar processo legislativo, entraves
políticos e o caráter de urgência para regular uma situação de risco ou trazer o equilíbrio
social, armazenando as desigualdades sociais.
Segundo Alexandre de Moraes, 2004, p.544:
O termo processo legislativo pode ser compreendido num duplo sentido, jurídico e
sociológico. Juridicamente, consiste no conjunto coordenado de disposições que
disciplinam o procedimento a ser obedecido pelos órgãos competentes na produção
das leis e atos normativos que derivam diretamente da própria Constituição,
enquanto sociologicamente podemos defini-lo como o conjunto de fatores reais que
impulsionam e direcionam os legisladores a exercitarem suas tarefas. (MORAES,
2004, p. 544)
A Constituição Federal estabelece como espécie normativa: emenda à constituição,
leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos
e as resoluções. “Art. 59. Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração,
redação, alteração e consolidação das leis”.
Nota-se que a LDB vem sendo modificada através das Emendas Constitucionais, que
o constituinte de 1988, ao prever a possibilidade de alteração das normas constitucionais
através de um processo legislativo especial; define a Constituição Federal como rígida,
115
fixando a supremacia da ordem constitucional. Maria Helena Diniz corrobora com seguinte
entendimento:
O fato do preceito constitucional submeter-se a determinadas formalidades de
produção e alteração é importante para a fixação de sua eficácia, pois se pudesse ser
modificada sem que houvesse processo especial, comprometida ficaria a produção
concreta de seus efeitos jurídicos (DINIZ, p.141).
A Emenda à Constituição Federal enquanto proposta é um ato infraconstitucional
sem qualquer normatividade, só ingressando no ordenamento jurídico, após a aprovação pelo
Congresso Nacional, passando então a ser um preceito constitucional, de mesma hierarquia
das normas constitucionais originárias.
Outro elemento agregador é a diferença entre decreto-legislativo e decreto-lei e
medida provisória para análise. O Decreto legislativo é uma espécie normativa destinada a
veicular as matérias de competência exclusiva do Congresso Nacional, não haverá sanção do
Presidente da República por se tratar de matéria competência do Poder Legislativo
(MORAES, 2004, p.590)
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
[...]
X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos
do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta;
XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da
atribuição normativa dos outros Poderes;
E a diferença entre Decreto-Lei e a medida provisória. O Decreto-Lei tem
legitimidade jurídica em caráter de urgência ou interesse público relevante e ao passo a
medida provisória em caso de relevância e urgência, ambos têm que ser submetidos à
aprovação no Congresso Nacional. Estes atos são exclusivos do Presidente da República.
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar
medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao
Congresso Nacional.
[...]
§ 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia,
desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias,
prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso
Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes.
§ 4º O prazo a que se refere o § 3º contar-se-á da publicação da medida provisória,
suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso Nacional.
§ 5º A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das
medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus
pressupostos constitucionais.
§ 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados
de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma
das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação,
todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando.
§ 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória
que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação
encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional.
116
§ 8º As medidas provisórias terão sua votação iniciada na Câmara dos Deputados.
§ 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas
provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão
separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional.
§ 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que
tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.
§ 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a
rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas
e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela
regidas.
§ 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida
provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou
vetado o projeto.
E em relação às leis, faz necessário um projeto de lei, sendo submetido ao Congresso
Nacional para sua aprovação, emenda ou rejeição. É um processo, onde há confrontos
políticos, ideológicos – agenda política se concretizando em lei.
Art. 67. A matéria constante de projeto de lei rejeitado somente poderá constituir
objeto de novo projeto, na mesma sessão legislativa, mediante proposta da maioria
absoluta dos membros de qualquer das Casas do Congresso Nacional. ”
Sendo assim, a justificativa para que as alterações na LDB ocorreram em sua grande
maioria por decretos (maior agilidade no processo) enquanto a lei (processo é burocrático e os
conflitos de ideologia partidária).
A Lei 11.741/2008 ao alterar a LDB, localiza a educação profissional técnica de
nível médio como Seção IV do Capítulo II – Da Educação Básica. Essa disposição no texto
legal procura ressaltar a concepção de que esses cursos são da Educação Básica e encontra-se
no âmbito políticas públicas educacionais, além disso, trata educação jovens e adultos na
Seção V.A inclusão da Seção IV-A, demonstra a compreensão de que a Educação Profissional
Técnica de Nível Médio é uma das possibilidades de desenvolvimento do ensino médio e não
uma modalidade educacional. A concepção de modalidade educacional é assumida por EPT
em geral e passa a compor o Capítulo III.
O artigo 39 disposto EPT desenvolverá:
Cumprimento dos objetivos da educação nacional:
- Pleno desenvolvimento do educando;
- Seu preparo para a cidadania;
- Sua qualificação para o trabalho
O § 1º do artigo 39 traz a possibilidade de EPT organizar-se a partir da metodologia
eixos
tecnológicos
permitindo
diferentes
itinerários
formativos.
Porém,
a
atual
regulamentação da EPT se faz através dos Estágios Nacionais dos Cursos Técnicos6.
6
Instituído pela Portaria Ministerial 870/08, aprovados pela Resolução CNE/CEB 3/2008 com base no Parecer
CNE/CEB 11/2008
117
O artigo 39 § 2º estabelece os tipos de cursos possíveis para EPT:
• Formação inicial e continuada ou qualificação profissional;
• Educação profissional e Técnica Nível Médio;
• Educação Profissional tecnológica de graduação e pós graduação
Os artigos 36 ao 42 explicita a não vinculação dos cursos, formação inicial e
continuada a qualquer dos níveis de ensino; porém, disposto artigo 40 “será desenvolvida em
articulação com ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada” (Grifos
nossos).
Esta expressão em articulação com poderá compreendida da seguinte maneira que a
oferta de EPT
ambiguidade,
que poderá ou não fazer parte do ensino regular ocasionando uma certa
pois
o
termo
articular,
neste
contexto,
a
noção/possibilidade
de
desenvolvimento no curso regular quanto fora dele.
Os artigos 41 e 42 não traduzem novidade ao texto legal, porém, o artigo 41 vale
para todos os cursos de EPT elencados no § 2º do artigo 39 da LDB.
Conclui-se que o ensino no Brasil historicamente foi se estabelecendo a dualidade
estrutural: de um lado um sistema diferenciado com uma finalidade específica de preparar
para atuar no sistema produtivo, nas funções técnicas, e de outro o ensino propedêutico
destinado à elite dirigente. Entre os autores que entendem desta maneira, destacamos o que
diz Batistoli:
A educação brasileira especificamente e a sociedade em geral têm instalado
culturalmente uma visão dicotômica entre educação profissional e formação geral.
Construção histórica marcada por um aprofundamento da dualidade entre a escola
que reserva o conhecimento a uma elite, aos dirigentes, e aquela que promove a
instrução de ofícios para a maioria da população (BATISTOLI, E. C. 2010, p.202).
Esta estratificação social se reflete nos sistemas escolares paralelos que
historicamente se formou no Brasil. Isto é, a desigualdade social sistêmica do capitalismo está
presente na desigualdade educacional. Resulta daí uma educação a ser oferecida aos filhos da
classe dirigente e outra destinada à conformação da classe trabalhadora. Os documentos do
governo manifestam sua preocupação com uma educação de caráter mais abrangente em
relação à dualidade presente no nosso sistema educacional.
Esta ideia de apresentar a formação dos sujeitos de maneira totalizante está presente
no modelo pedagógico do PROEJA e é seu diferencial na comparação com outros projetos de
ensino profissional. Tivemos algumas tentativas de romper com a dualidade: o movimento
escolanovista, nas décadas de 1920/1930; a educação popular a partir dos anos 1950/1960; a
LDB de 1971; a experiência do Integrar da CNM/CUT no período de 1980/2000; os cursos de
118
nível médio integrado a formação profissional, incluídos na estrutura da educação nacional, a
partir do Decreto 5.145/2004 e programas daí derivados como o PROEJA e o PROJOVEM.
Tais experiências buscaram uma integração pedagógica e foram oferecidas à classe
trabalhadora sem atingir a sociedade como um todo. Portanto, até hoje não se conhece
experiências de escola unitária e politécnica efetivadas para toda a sociedade, no sistema
social capitalista.
Outro fator é que governar com base em programas e projetos, em lugar de políticas
de Estado, é uma forma mais flexível de repassar recursos públicos para a esfera privada
(GRABOWSKI, 2010). O uso de verba pública para empreendimentos particulares é legal
pela LDB/1996 que prevê em seu Art. 77- Os recursos públicos serão destinados às escolas
públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas.
Segundo Santos, L. (2003, p.23), para Bernstein, as distorções existentes no sistema
escolar são:
[...] decorrentes da forma como este sistema opera na distribuição de conhecimento,
de recursos, de acesso e nas condições necessárias para que a aprendizagem ocorra.
As desigualdades na distribuição desses elementos afetam os direitos ao
desenvolvimento pessoal, à inclusão e à participação. [...]
De acordo com Santos, L. (2003, p.24), Bernstein trabalha com o pressuposto de que
é grande a probabilidade de os alunos não usufruírem esses direitos na escola, terem origem
em grupos sociais que não os usufruem na sociedade. Para ele, “[...] a classe social permanece
como maior regulador na distribuição dos estudantes no que diz respeito ao sucesso e ao
fracasso escolar [...]”. No entanto, Bernstein defende que o desempenho dos alunos não está
somente relacionado à estrutura social, mas, fundamentalmente, à forma como a escola lida
com as hierarquias externas – de valores de classe e de outras diferenças – e ainda com as
questões de ordem social.
Apesar dos pesos e contrapesos, a educação de jovens e adultos integrada a educação
profissional cresceu em atos normativos, sua executoriedade e eficácia/eficiência, segundo os
dados já analisados na tese de acordo com o artigo 2277 da Constituição Federal de 1988.
7
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem,
admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos
seguintes preceitos:
I - aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil;
II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de
deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de
119
Assim, a educação está submetida a princípios de legalidade,
obrigatoriedade,
compulsoriedade, coercitividade e executoriedade.
educação
Significa
que
a
tem
previsão legal (legalidade); a educação é obrigatória por lei (obrigatoriedade); ao
Ministério Público é creditado o poder de polícia para compelir órgãos públicos
manterem devidamente matriculados jovens e adultos (compulsoriedade); contra os que se
negarem ou falta regular do EJA há meios para coagi-los a fazê-lo (coercitividade); e
forma para cobrar a negligência para com a educação (executoriedade) (QUINTINO, 2008
apud VILA, 2009). (Grifos nossos)
3.2 PROEJA: VISÃO FORMAL E POLÍTICA
Equívocos que marcaram a gênese do PROEJA e ajustes no processo político para
sua institucionalidade enquanto política pública educacional; vale ressaltar a importância da
formalização conceitual de dois termos: políticas públicas e programa. Isto é importante para
circunstanciar os limites dos campos de ação dentro do ciclo de políticas – formulação e no
contexto jurídico. A política pública é na definição de Saravia (2006):
deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços
coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação.
§ 2º A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de
fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de
deficiência.
§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;
II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;
III - garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola;
IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação
processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica;
V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;
VI - estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos
da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado;
VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem
dependente de entorpecentes e drogas afins.
§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
§ 5º A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua
efetivação por parte de estrangeiros.
§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e
qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
§ 7º No atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se- á em consideração o disposto no
art. 204.
§ 8º A lei estabelecerá:
I - o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens;
II - o plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder
público para a execução de políticas públicas.
120
[...] uma perspectiva mais operacional, poderíamos dizer que ela [a política pública]
é um sistema de decisões públicas que visa a ações ou omissões, preventivas ou
corretivas, destinadas a manter ou modificar a realidade de um ou vários setores da
vida social, por meio da definição de objetivos e estratégias de atuação e da alocação
dos recursos necessários para atingir os objetivos estabelecidos. (SARAVIA, 2006,
p.29).
Além disto, Villanueva (2006) corrobora que:
As decisões que conformam tal política pública – distributiva, redistributiva ou
regulatória, universal ou focalizada – assumem diferentes formatos: podem ser
enunciados de diretrizes estratégicas de governo, leis e decretos normativos, que
especificam de forma mais clara e operacional tais diretrizes, criação de
organizações ou programas que vão conferir operacionalidade às diretrizes, leis e
normas. (VILLANUEVA, 2006).
Já o programa é assim definido por Rossi et al. (2004):
O programa público é, pois, um dos instrumentos operacionais das políticas
públicas. Mais especificamente, trata-se de um conjunto sistêmico de ações
programadas e articuladas entre si, com objetivo de atender uma demanda pública
específica, encampada na agenda de prioridades de políticas públicas do Estado ou
governo. Assim, um programa social é um conjunto de atividades direcionadas para
solucionar um problema vivenciado pela sociedade, no seu todo ou por grupos.
(ROSSI et al., 2004).
Podemos depreender que a análise de políticas públicas é uma atividade muito mais
ampla que análise de um programa e o PROEJA é um programa que nasce de um decreto do
poder executivo sob a tutela do presidente Luiz Inácio Lula da Silva/PT.
Oportuno registrar que: a agenda política corresponde ao conjunto de assuntos e
problemas que os gestores públicos e a comunidade política entendem como mais relevantes
em dado momento e, não necessariamente, à lista de preocupações da sociedade ou destaques
da imprensa (JANN; WEGRICH, 2007). Afinal, o reconhecimento de uma questão social
como problema de governo ou Estado não é um processo simples e imediato, que responde
automaticamente às estatísticas disponíveis.
Abaixo está disposto o ciclo do programa:
121
Figura 6 - O Ciclo de Políticas e Programas Públicos
Fonte: Estudo Técnico nº 07/2013
Delimitando o objeto de estudo PROEJA, com base na educação básica de jovens e
adultos, no Brasil, pode-se afirmar que predominam iniciativas individuais ou de grupos
isolados, acarretando descontinuidades, contradições e descaso dos órgãos responsáveis
(MOURA, 2005). Por outro lado, a cada dia, aumenta a demanda social por políticas públicas
perenes nessa esfera. Tais políticas devem pautar o desenvolvimento de ações baseadas em
princípios epistemológicos que resultem em um corpo teórico bem estabelecido e que respeite
as dimensões sociais, econômicas, culturais, cognitivas e afetivas do jovem e do adulto em
situação de aprendizagem escolar (CABELLO, 1998). Paralelamente, as instituições federais
de educação profissional e tecnológica (EPT)8, convocadas a implantar o PROEJA, atuam no
ensino médio integrado aos cursos técnicos tendo como grupos destinatários os adolescentes
recém concluintes do ensino fundamental, mas, historicamente, a grande maioria dessas
instituições não havia atuado na modalidade EJA, até o surgimento do PROEJA. Enquanto
isso, nas redes estaduais, também convidados a participar no PROEJA, há atuação na EJA e
na EPT, mas não de forma integrada.
Segundo os documentos oficiais (BRASIL, 2006a), o PROEJA surge, então, com
uma dupla finalidade. A primeira é enfrentar as descontinuidades e o voluntarismo que
8
Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica, formada pelos centros federais de educação tecnológica
(CEFETs), escolas técnicas federais (ETFs), escolas agrotécnicas federais (EAFs) e escolas técnicas vinculadas
às universidades federais.
122
marcam a modalidade EJA no Brasil, e, a segunda, integrar à educação básica uma formação
profissional que contribua para a integração socioeconômica de qualidade do coletivo de
jovens e adultos.
Fica evidente que o Programa PROEJA tem grandes desafios que é integrar três
campos da educação: o ensino médio, a formação técnica profissional de nível médio e a
educação de jovens e adultos.
Nesse contexto, as instituições federais de educação, incluindo a Rede Federal de
Educação Profissional de Tecnológica, têm papel relevante. Algumas características dessa
Rede Federal de EPT potencializam a função que as instituições a ela vinculadas podem
assumir nesse processo. Em primeiro lugar, estão presentes em quase todos os estados da
federação. Em segundo, mas não com menor importância, está a experiência e a qualidade
com que reconhecidamente atuam no ensino médio e na educação profissional técnica de
nível médio.
Essa Rede ainda é formada por instituições que não aderiram aos Institutos Federais,
mas também oferecem educação profissional em todos os níveis. São dois Cefets, 25 escolas
vinculadas a Universidades, o Colégio Pedro II e uma Universidade Tecnológica.
Instituições:
• Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia
•
Centros Federais de Educação Tecnológica
•
Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais
•
Universidade Tecnológica Federal
Gráfico 3 – Cenário da Rede Federal
Fonte: http://redefederal.mec.gov.br/images/M_images/Img_2015/cenrio_rede_federal_2014_3-0102.png
123
Veja a Rede Federal no Estado de Minas Gerais:
Figura 7 – Rede Federal por Estado
Fonte: http://redefederal.mec.gov.br/
124
Sendo que a institucionalidade dos Institutos Federais se deu a partir do governo do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, concretamente fez presente através da logomarca “a
marca do IF possui duas cores. O pensamento forte, expresso e com energia, é representado
com o uso da cor vermelha. Como na ecologia, o verde expressa a harmonia e integração na
rede” (MEC/2015).
A partir da vigência da Lei Nº 3.552/1959, as instituições que deram origem aos
atuais institutos federais passaram a oferecer cursos na última etapa da educação básica –
atual Ensino Médio – e cursos técnicos de nível médio. Em alguns momentos históricos, essa
oferta ocorreu de forma integrada, ainda que essa integração não tenha acontecido em toda a
plenitude de seu significado. Em outros momentos, ela ocorreu de forma separada, ou seja,
ensino médio por um lado e cursos técnicos de nível médio por outro. De qualquer maneira,
nas últimas quatro ou cinco décadas, essas ofertas educacionais estiveram presentes no âmbito
da Rede Federal de EPT. Essa experiência associada à reconhecida qualidade dos cursos
oferecidos em todo o país a qualifica como locus importante na fase inicial de implantação do
PROEJA.
Já no aspecto das formalidades do processo legislativo e a hierarquia dos atos
normativos, o PROEJA, marca sua gênese com equívocos e ajustes no processo para dar
licitude ao processo em curso – institucionalizar o PROEJA como uma política pública da
inclusão de jovens e adultos na escolarização profissional.
Segundo (BRASIL, 2004), as intenções políticas expostas no Programa PROEJA são
justas (inclusão dos jovens e adultos no mundo da escola profissionalizante) definida pelo
Governo Federal, portanto há legitimidade e prosseguimento no processo – pré projeto – para
trazer e constituir o Programa PROEJA com fulcro arte cultural, com a educação básica e com
o mundo do trabalho, além disso, interagir com outras políticas públicas, com o escopo de
garantir o direito de acesso à educação básica.
Outro fator, reconhecido para que um ato normativo tenha legitimidade e
executoriedade, a fim de garantir a hierarquia legal, é observar o princípio constitucional da
hierarquia das leis.
Antes de verificar a existência de hierarquia, necessário se torna definir o que vem a
ser hierarquia em direito. Segundo Temer (apud BASTOS, 1999, p.17):
[...] hierarquia, para o direito, é a circunstância de uma norma encontrar sua
nascente, sua fonte geradora, seu ser, seu engate lógico, seu fundamento de validade
numa norma superior. A lei é hierarquicamente inferior à Constituição porque
encontra nesta o seu fundamento de validade. [...] se hierarquia assim se conceitua, é
preciso indagar: lei ordinária por acaso encontra seu fundamento de validade, seu
125
engate lógico, sua razão de ser, sua fonte geradora na lei complementar?
Absolutamente não!
Bastos (1999, p.17) leciona que,
[...] extrair o seu fundamento de validade significa conferir condições de
possibilidade jurídica. A norma hierarquicamente inferior materialmente caminha
nos limites legais impostos pela norma superior. Isso significa que a lei superior
dispõe sobre certas matérias que condicionam a atividade regulamentadora da
inferior.
E o artigo 59 da Constituição Federal de 1988 dispõe:
Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:
I - emendas à Constituição;
II - leis complementares;
III - leis ordinárias;
IV - leis delegadas;
V - medidas provisórias;
VI - decretos legislativos;
VII - resoluções.
Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e
consolidação das leis.
E no processo de constituição da educação profissional – PROEJA – ocorreram
alguns equívocos na gênese dessa iniciativa governamental.
Em primeiro lugar, tem-se a instituição da Portaria nº. 2.080/2005-MEC, de junho de
2005, que deu materialidade ao tema. Esse dispositivo determinava que todas as instituições
federais de EPT oferecessem, a partir de 2006, cursos técnicos integrados ao ensino médio na
modalidade EJA, estipulando, inclusive, um percentual mínimo de vagas que deveriam ser
destinadas à nova oferta. Entretanto, legalmente uma portaria não pode ferir um decreto, que
tem maior hierarquia e havia o Decreto nº. 5.224/2004, que dispõe sobre a organização dos
CEFETs9, o qual estabelece em seu artigo primeiro, que:
[...] os centros federais de educação tecnológica – CEFETs –, criados mediante
transformação das escolas técnicas federais e escolas agrotécnicas federais, [...]
constituem-se em autarquias federais, vinculadas ao Ministério da Educação,
detentoras de autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didáticopedagógica e disciplinar. (BRASIL, 2004a, p. 1, grifo dos autores).
A Portaria nº 2.080/2005 – MEC carecia de legitimidade, devido ao princípio
constitucional da hierarquia das leis10 ferir o decreto 5.224/2004, pois sendo a portaria espécie
normativa de hierarquia inferior não é permitido restringir o alcance de um decreto.
9
À época deste estudo, os CEFETs ainda não haviam se transformado em institutos federais.
Todas as fontes descritas no art. 59 da CF/88, denominadas fontes primárias, encontram-se, pois, com sua área
de atuação definida, cada uma operando em um campo próprio. Por inexistência de subordinação e supremacia,
as Leis Ordinárias, as Leis Complementares, as Leis Delegadas, as Medidas Provisórias, as Emendas
10
126
Observando a figura 8, a hierarquia das leis, em obediência ao princípio
constitucional da hierarquia das leis, para assegurar o equilíbrio entre os atos normativos
(art.59, CF/88).
Figura 8: Hierarquia das Leis
Fonte: Meirelles, 1995.
Apesar das críticas a portaria nº 2.080/2005 – MEC, o conteúdo foi ratificado, quase
integralmente pelo Decreto nº 5.478/2005, que instituiu, no âmbito da Rede Federal o Decreto
nº 5.478/2005 no qual instituiu na rede federal de educação, profissional e tecnológica o
PROEJA, numa tentativa de resolver o princípio constitucional da hierarquia das leis, ou seja,
hierarquia das normas, mas o objetivo não logrou êxito, pois o Decreto nº 5.244/2004 é mais
antigo e permanece com executoriedade na sociedade brasileira.
Outro fato a ser destacado, é que alguns institutos federais (à época CEFETs)
oriundos de EAFs reduziram substancialmente o quadro docente do ensino médio nos últimos
anos. Em algumas dessas instituições, em função do Decreto Nº. 2.208/1997 que, conforme
explicitado, separou a oferta do ensino médio dos cursos técnicos, optou-se por extinguir a
Constitucionais, os Decretos Legislativos, e também as Resoluções não possuem qualquer grau hierárquico entre
si. Todas encontram-se apenas subordinadas à Constituição. (MEIRELLES, 1995, p.160)
Seguindo a ordem escalonada, abaixo dessas fontes primárias antes referidas, logo abaixo da Constituição, têmse na estrutura piramidal as fontes secundárias que são os decretos regulamentares, portarias, instruções
normativas, convênios, enfim, atos da administração pública, editados para complementar aquelas, as primárias.
As fontes formais secundárias são aquelas que contêm um comando geral do Executivo, visando à correta
aplicação da lei. Como lembra Hely Lopes Meirelles, o objetivo imediato de tais atos é explicitar a norma legal a
ser observada pela administração e pelos administrados, expressando em minúcia o mandamento abstrato da lei.
Não são leis em sentido formal, mas tão só no material, já que proveniente do executivo. (MEIRELLES, 1995,
p.160)
127
oferta do ensino médio. Dessa forma, o respectivo quadro de professores foi gradativamente
sendo reduzido. Evidentemente, nessas instituições, simplesmente, não havia corpo docente
suficiente sequer para oferecer cursos técnicos integrados ao ensino médio para os
adolescentes egressos do ensino fundamental.
Diante desse panorama, não seria razoável exigir que a Rede passasse a reservar,
obrigatoriamente, para os cursos do PROEJA, 10% de todas as vagas anuais destinadas aos
cursos técnicos e cursos superiores de tecnologia, conforme estabelecido no Decreto Nº
5.478/2005.
Portanto, não é preciso grande esforço de análise dos fatos para constatar que essa
matéria deveria ter sido estudada, aprofundada, discutida e avaliada em espaços mais amplos
antes de vir à tona, sob pena de má utilização de recursos públicos e da não consecução dos
objetivos explicitados. Caso isso tivesse ocorrido, se concluiria que, para que o PROEJA não
fosse apenas uma ação isolada e, desse modo, pudesse contribuir para a construção de uma
política educacional efetivamente comprometida com a melhoria das ofertas educacionais do
campo da EJA, não poderia ser implementado apenas no âmbito da Rede Federal de EPT,
posto que sua capacidade de oferta de vagas é minúscula diante da demanda nacional. É
evidente que a concepção inicial deveria ter contemplado a participação das redes públicas
estaduais e municipais de educação constitucionalmente consagrados à universalização do
ensino fundamental e à contínua ampliação da oferta do ensino médio. Estas questões foram
amplamente discutidas por Moura (2005); Frigotto, Ciavatta & Ramos (2005).
O primeiro passo, nessa nova fase, foi a constituição de um grupo de trabalho
plural11 que teve a função de elaborar um Documento Base (BRASIL, 2006a) de concepções e
princípios do Programa, até então inexistente, e cujo resultado aponta na direção de
transformar esse Programa em política pública educacional.
Posteriormente, a partir das diretrizes apontadas nesse documento base – Decreto nº
5.478/2005 – foi revogado pelo Decreto nº 5.840/2006 (BRASIL, 2006b) atual PROEJA,
11
Grupo de Trabalho Plural:
Especialistas em EJA das universidades brasileiras, representantes da SETEC, da SECAD, dos fóruns de EJA,
dos institutos federais (então CEFETs), das EAFs e das escolas técnicas vinculadas às universidades federais.
No Documento Base do PROEJA, consta uma retrospectiva histórica sobre a educação de jovens e adultos no
Brasil; uma análise dos problemas de acesso, permanência e qualidade da educação básica no País, tanto para o
público denominado “regular” como na EJA. A partir daí, apresentam-se e discutem-se as concepções e os
princípios do Programa.
128
trazendo mudanças estruturais – ampliação da carga horária12, espaços culturais13 e da
abrangência do Programa14.
Outro panorama a ser acrescentado – a visão do PT, em relação a educação
profissional segundo o programa Brasil que Queremos, p.70, reafirma que:
Alfabetização de Jovens e Adultos (EJA)
No âmbito das determinações do Decreto 6093, que prevê o estabelecimento do
Plano Plurianual de Alfabetização como condição do apoio técnico e financeiro da
União a Estados, Municípios e Distrito Federal, é relevante que se destaque a
integração entre EJA, certificação de conhecimentos e saberes, qualificação
social e profissional e geração de emprego e renda. Trata-se de ampliar a
formação de jovens e adultos e contribuir para a superação das condições de
exclusão, tal qual indicado no programa de governo A EJA não pode ser
exclusivamente voltada para a alfabetização, mas deve ser direcionada também para
o ensino fundamental (1º e 2 º segmentos) e ensino médio, com ênfase nos
currículos integrados (educação básica e qualificação social e profissional).
Também não pode ser exclusivamente voltada para o domínio da leitura, escrita e da
aritmética, sendo fundamental as abordagens do contexto social e territorial, além da
história das comunidades onde se inserem os educandos contribuindo para o
fortalecimento das suas identidades sociais e fornecendo-lhes o instrumental para
uma leitura do mundo na perspectiva emancipatória. Nesse mesmo sentido o
Programa Pró-Jovem deverá, necessariamente, estar articulado com as ações de
educação de jovens e adultos dos municípios e estados. Visando aperfeiçoar essa
formação dos alunos, é importante que nos estados e municípios seja favorecido o
acesso e o contato com a produção cultural da forma mais ampla possível. (Grifos
nossos)
Neste programa Brasil que Queremos corrobora que o PROEJA – política
educacional de jovens e adultos e que haja expansão da educação profissional de nível técnico
e tecnológico deve ser acompanhada por medidas que superem a concepção produtivista e
mercadológica, voltada exclusivamente para a empregabilidade, ainda hegemônica no país.
Currículos integrados (a exemplo do PROEJA, Saberes da Terra, PROJOVEM e Trabalho
Doméstico Cidadão), formação de educadores de educação profissional.
3.2.1 A construção do conhecimento na pesquisa ênfase as entrevistas
Segundo Gaskell, 2008, p.247 a análise de discurso há quatro temas principais: uma
preocupação com o discurso em si mesmo, uma visão linguagem construtiva (criadora) e
12
A ampliação das cargas horárias dos cursos (o Decreto Nº 5.478/2005 estabelecia cargas horárias máximas
para os cursos e, contrariamente, o Decreto Nº 5.840/2006 fixou limites mínimos, deixando a definição da carga
horária a ser adotada em cada curso para o âmbito da autonomia da instituição ofertante)
13
A ampliação dos espaços educacionais em que o PROEJA pode ser oferecido (o Decreto Nº 5.478/2005
limitava a oferta à Rede Federal de EPT, ao passo que o Decreto Nº 5.840/2006 incluiu as instituições públicas
estaduais e municipais de educação também como espaço para as ofertas do PROEJA)
14
A ampliação da abrangência do Programa (o Decreto Nº 5.478/2005 limitava o PROEJA ao ensino médio,
enquanto o Decreto Nº 5.840/2006 incluiu o ensino fundamental), englobando toda a educação básica
129
construída; uma ênfase no discurso como forma de ação e uma convicção na organização
retórica do discurso.
Necessário se faz conceituar o termo “discurso” sendo empregado para se referir a
todas as formas de fala e textos, ou seja, quando há conversações (material de entrevistas ou
textos escritos de todo o tipo).
E conforme problematização na introdução da tese e as inquietações que geraram a
pesquisa com foco na formulação do PROEJA, tendo como interesse a análise do integrar
e/ou articular dentro de um contexto curricular, surgiram com as premissas aproximações no
campo de pesquisa, que se deram, com a análise e acompanhamento do projeto pedagógico da
Agroindústria e contabilidade no Campus Uberaba, no Instituto Federal Educação Ciência e
Tecnologia do Triângulo Mineiro/IFTM, ano 2010 a 2012.
Neste momento aproprio da pesquisa exploratória através dos procedimentos
técnicos de pesquisa bibliográfica, pesquisa documental e as entrevistas semi estruturadas,
para trazer as vivências da agenda política no olhar dos construtores deste Programa dentro do
MEC – Conselho Nacional da Educação.
A coleta de dados, optamos pela pesquisa bibliográfica (livros, periódicos e
impressos diversos) e a pesquisa documental, ou seja, documentos de primeira mão sendo
aqueles que não receberam tratamento analítico (regulamentos, ofícios, leis, decretos, portaria,
diretrizes curriculares, matriz de referência, matrizes curriculares, planos de curso) e
documentos que já foram analisados (relatórios de pesquisa, dissertações, teses, tabelas
estatísticas).
Foram atualizados, então, na pesquisa exploratória a seguinte técnica e instrumento
para coleta de dados: entrevista E1 e E2. A utilização desse procedimento, além de favorecer
um contato maior com o objeto a ser estudado, possibilita a articulação entre os pressupostos
teóricos e os dados da realidade.
Além de pesquisa bibliográfica em material já publicado sobre temas afins ao objeto
da pesquisa, em especial políticas educacionais, políticas curriculares e currículo, adotou-se
os seguintes procedimentos:
a) Pesquisa na documentação oficial:
- No âmbito do MEC: em Leis e Decretos e documentos produzidos para tentar
controlar os sentidos das políticas, bem como em Resoluções e Pareceres do CNE, nas
diretrizes curriculares nacionais, nos catálogos nacionais dos cursos superiores de tecnologia e
técnico, entre outros;
130
- No âmbito institucional: estatuto, regimento, regimentos internos dos campi, plano
de desenvolvimento institucional, projeto pedagógico institucional, projetos pedagógicos de
cursos, regulamentos e normas internas, relatórios de gestão, atas e resoluções do Conselho
Superior e relatórios internos, entre outros.
b) Entrevistas com analistas políticos, assim considerados envolvidos na construção
curricular. (Diretrizes Curriculares Nacionais)
Como suporte teórico-metodológico são utilizados o ciclo de políticas de Villanueva,
descrito na seção 2.2, o qual orientou a pesquisa de campo, e a Teoria do Discurso (TD) de
Basil Bernstein, descrita na seção 2.4, cujos conceitos orientaram todo o processo de
construção da análise.
Ao adotar a perspectiva discursiva na abordagem na pesquisa, procurou-se destacar
os processos de fixação e deslocamentos de sentidos na construção da política curricular na
instituição. Assume-se, de antemão, em todas as escolhas realizadas, o pressuposto, como em
qualquer processo social, da parcialidade do processo investigativo.
Entretanto, ainda que sem pretensão de totalidade ou de representatividade, a diretriz
que orientou a observação ao campo empírico foi a de investigar diferentes processos
institucionais. Assumindo que a “realidade” é construída discursivamente, este trabalho não
tem a perspectiva de descortinar nenhuma verdade absoluta, constituindo-se também ele em
uma fixação parcial de sentidos num campo de luta, como qualquer outro processo de fixação.
A Figura 9 apresenta o esquema de técnicas instrumentais que foram utilizadas para
coleta de dados.
Campus Uberaba
Campus Avançado Uberaba
Parque Tecnológico
Entrevista
Entrevistas
Análise Documental
IFTM
Figura 9 – Técnicas instrumentais utilizadas.
Fonte: Entrevistas
No MEC o foco de estudo foi a Secretaria de Educação e Profissional e Tecnológica
(SETEC) por ser a secretaria que trata das políticas para EPT. Por meio do sítio oficial, em
131
participação em reuniões que envolviam assuntos de gestão do IFTM, em contatos com
pessoas que transitavam na SETEC/MEC, buscou-se acompanhar o processo de construção
das políticas para EPT ao longo da pesquisa e coletar documentos.
É importante destacar que os IFs possuem um órgão representativo que busca
articular as políticas para a rede e criar um canal de comunicação oficial com o governo: o
Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e
Tecnológica (CONIF). Este conselho é dividido em câmaras temáticas (administração,
desenvolvimento institucional, gestão de pessoas, ensino, extensão, educação do campo,
pesquisa e inovação e relações internacionais), as quais possuem como órgãos de
assessoramentos os respectivos fóruns, compostos por um representante de cada instituto
federal responsável pelas ações sistêmicas vinculadas ao tema, que se reúnem ordinariamente
duas vezes ao ano.
Este Conselho substituiu órgão existente anteriormente, o Conselho de Dirigentes
dos Centros Federais de Educação Tecnológica (CONCEFET), que por sua vez havia
substituído o órgão representante das antigas Escolas Técnicas Federais, o que demonstra uma
longa tradição de um espaço de articulação política entre as instituições da rede federal.
Assim, na construção dos institutos, processos de articulação ocorrem entre a rede, por meio
do CONCEFET/CONIF e o MEC / SETEC e a produção de documentos regulatórios
envolveu um árduo processo de negociações e lutas.
Os “documentos oficiais do MEC” são basicamente de duas categorias: os
documentos legais que tratam da criação e estruturação dos institutos e documentos que
“interpretam” a política, publicados durante o processo de constituição dos IFs, os quais
buscam consolidar determinados sentidos. Neste último grupo têm-se documentos publicados
com assinatura da SETEC, em geral assinados pelo secretário ou por membros de sua equipe
e documentos publicados em revistas, assinados por professores / gestores da rede.
A Tabela 5 apresenta, com uma breve descrição, os documentos oficiais do MEC,
todos disponíveis na internet, que serão considerados na pesquisa para acessar o discurso
oficial do Ministério para os institutos federais.
132
Tabela 5 - Documentos oficiais do MEC utilizados na análise documental
Fonte: Entrevistas
Em relação à documentação do IFTM deve-se ressaltar que alguns documentos
foram construídos após a transformação em instituto, tais como o Estatuto, o Regimento Geral
e os Regimentos Interno dos campi, entretanto outros são documentos previamente
construídos que tiveram apenas correções textuais, dentre os quais se cita o projeto
pedagógico institucional, aprovado pelo Conselho Diretor em 2008. A mesma situação ocorre
em relação à documentação dos cursos: existem projetos que foram (re)construídos após a
transformação em Instituto (em especial nos campi novos) e projetos que não foram alterados
nos últimos anos15. A Tabela 6 apresenta os documentos oficiais do IFTM que serão
considerados na análise documental.
15
O fato de o documento formal permanecer o mesmo não permite inferir que não houve alteração no currículo:
em geral o processo educacional supera o que está registrado no documento oficial.
133
Tabela 6 - Documentos oficiais do IFTM utilizados na análise documental.
Documento
Estatuto
Regimento
Regimento interno dos campi
Descrição
Estabelece a constituição do IFTM.
Detalha a estrutura do IFTM.
Detalha a estrutura de cada campus.
Estabelece os procedimentos didáticoOrganização didática
pedagógico administrativos, relativos ao
processo educacional.
Estabelece princípios, fundamentos e
concepções que balizam as diretrizes
administrativas e educacionais, para
todas as modalidades e níveis de ensino.
Projeto pedagógico institucional
Foram removidos do texto original os
dados dos cursos (nome, perfil, campo
de atuação, forma/modalidade e carga
horária).
Proposta de adesão aos
Formaliza proposta institucional de
Institutos Federais
adesão ao modelo de institutos federais.
Estabelece o planejamento institucional
para um período de 5 anos. Existem dois
Planos de desenvolvimento
PDIs: um como CEFET (2007-2011) e
Institucional *
outro como IFTM (2009-2014). A
revisão é anual.
Relatório de Gestão que são
apresentados aos órgãos de controle
Relatórios de gestão*
interno e externo como prestação de
contas ordinária anual.
Atas e resoluções do Conselho Atas e resoluções de reuniões ordinárias
Superior *
e extraordinárias do Conselho Superior.
Regulamentos aprovados pelos órgãos
Regulamentos *
competentes que regulam aspectos não
contemplados nos regimentos.
Arquivo
IFTM_estatuto
IFTM_regimento
RI_[nome do campus]
IFTM_OD
IFTM_PPI
IFTM_adesao
PDI_[ano]
PDI_rev_[ano]
Rel_Gestão_[ano]
* Estes documentos foram utilizados para interpretações de contexto e não integram o corpus digital que será
analisado posteriormente.
Fonte: Entrevistas
A tabela 7 apresenta, com breve descrição, os documentos oficiais do MEC, todos
disponíveis na internet, que serão considerados na pesquisa para acessar o discurso oficial,
ponto de análise de política – PROEJA.
134
Tabela 7 – Legislação de Educação Profissional
Constituição Federal 1988
Lei 9394/1996
Lei 11741/2008
Decreto 2208/1997
Decreto 5154/2004
Decreto 5478/2005
Decreto 5840/2006
Decreto 6095/2007
Portaria 646/1997
Portaria Interministerial
1018/1997
Portaria SETEC 30/2000
Portaria SETEC 80/2000
Portaria MEC 2080/2005
Resolução 04/1999 CEB
Resolução 01/2005 CEB
Capítulo Educação
Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Altera dispositivos da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que
estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para
redimensionar, institucionalizar e integrar as ações da educação
profissional técnica de nível médio, da educação de jovens e adultos e
da educação profissional e tecnológica.
Regulamenta o § 2 º do art. 36 e os arts. 39 a 42 da Lei nº 9.394, de
20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional.
Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20
de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, e dá outras providências.
Institui, no âmbito das instituições federais de educação tecnológica,
o Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio
na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA
Institui, no âmbito federal, o Programa Nacional de Integração da
Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de
Educação de Jovens e Adultos - PROEJA, e dá outras providências
Estabelece diretrizes para o processo de integração de instituições
federais de educação tecnológica, para fins de constituição dos
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia - IFET, no
âmbito da Rede Federal de Educação Tecnológica.
Regulamenta a implantação do disposto nos artigos 39 a 42 da Lei
Federal Nº 9.394/96 e no Decreto Federal Nº 2.208/97 e dá outras
providências (trata da Rede Federal de Educação Tecnológica).
Criar o Conselho Diretor do Programa de Reforma da Educação
Profissional - PROEP
Reformulação da oferta de cursos de nível técnico e os respectivos
currículos para implantação no ano 2001, atendendo aos princípios e
critérios estabelecidos na Resolução nº 04/99 do CNE/CEB.
Prorroga o prazo, constante da Portaria SEMTEC/MEC nº 30/00, para
a conclusão dos Planos de Cursos de nível técnico, pelas instituições
de educação profissional integrantes do sistema federal de ensino
Estabelecer, no âmbito dos Centros Federais de Educação
Tecnológica, Escolas Técnicas Federais, Escolas Agrotécnicas
Federais e Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais, as
diretrizes para a oferta de cursos de educação profissional de forma
integrada aos cursos de ensino médio, na modalidade de educação de
jovens e adultos - EJA.
Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Profissional de Nível Técnico.
Atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho
Nacional de Educação para o Ensino Médio e para a Educação
Profissional Técnica de nível médio às disposições do Decreto nº
5.154/2004.
135
Resolução 02/2005 CEB
Parecer 16/1999 CEB
Parecer 10/2000 CEB
Parecer 33/2000 CEB
Parecer 39/2004 CEB
Modifica a redação do § 3º do artigo 5º da Resolução CNE/CEB nº
1/2004, até nova manifestação sobre estágio supervisionado pelo
Conselho Nacional de Educação
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de
Nível Técnico
Providências do CNE/CEB para orientar os Conselhos Estaduais de
Educação sobre procedimentos para implantar a Educação
Profissional de Nível Técnico
Novo prazo final para o período de transição para a implantação das
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de
Nível Técnico
Aplicação do Decreto nº 5.154/2004 na Educação Profissional
Técnica de nível médio e no Ensino Médio.
Estes documentos fazem parte da análise da tese
Fonte: própria da autora.
Foram realizadas 02 entrevistas semiestruturadas no mês de outubro de 2014,
totalizando aproximadamente 10,5 horas de gravação. Elas foram sendo realizadas conforme
disponibilidade do entrevistado e oportunidade para entrevista, com objetivo de compor um
conjunto de textos que permitisse transitar por discursos de diferentes.
As entrevistas, em consonância com a função do entrevistado, estão divididas em
dois grandes grupos: um com o foco política profissionalizante e o currículo. A informação de
gênero será desconsiderada, a fim de não identificar os entrevistados.
Ao longo de todo o processo de entrevistas, cada entrevistado recebeu previamente,
por e-mail, o resumo da pesquisa. Todas as entrevistas foram realizadas pelo pesquisador,
ocorreram em conformidade com a disponibilidade do entrevistado e foram realizadas em
local escolhido por ele, geralmente seu ambiente de trabalho. No início da entrevista era
apresentada a pesquisa, o estágio em que ela se encontrava, a pesquisa.
A primeira questão dos diferentes instrumentos tinha por objetivo propiciar um
momento de reflexão de cunho pessoal ao entrevistado a fim de estabelecer um processo de
empatia com a pesquisa e o entrevistador, contribuindo para criar um clima de tranquilidade
para a entrevista. Em geral as entrevistas se caracterizaram por um bate papo entre
entrevistador e entrevistado sobre os diferentes temas contemplados nos instrumentos e,
algumas vezes, outros de natureza institucional / educacional.
Deste modo, os entrevistados contaram histórias, citaram exemplos e nominaram
colegas reforçando suas falas sobre diferentes temas. Estes elementos não foram incluídos na
transcrição, à íntegra da entrevista, mas foram rigorosamente realizadas no sentido de manter
sem alterações a fala do entrevistado nas questões de interesse da pesquisa. Todos os arquivos
136
de transcrição das entrevistas possuem marcadores de tempo, em geral de 5 em 5 min com o
objetivo de permitir o fácil acesso a partes da gravação, sempre que necessário.
A fim de investigar como tem sido a construção de sentidos para as políticas
curriculares para analistas políticos, optou-se por aprofundar a investigação em relação ao
Conselho Nacional de Educação. O objetivo não é traçar comparação entre eles e sim
investigar os sentidos e deslocamentos em contextos diferentes.
A fim de preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa, adotou-se um padrão de
designação dos sujeitos e dos arquivos que, ao facilitar a análise, não possibilite qualquer
forma de identificação das entrevistadas. A Tabela 8 apresenta o formato de identificação dos
entrevistados, o qual foi mantido para identificação dos arquivos.
Tabela 8 - Formato de identificação dos entrevistados
Atividade
Forma de
Intervenção
01 – Entrevista (E1) analista político /
analista político / educador
Pessoalmente
02 – Entrevista (E2) filósofo político /
analista político / educador
Pessoalmente
e internet
03 – Dados virtual IFTM
Internet
Duração
13h30min
às
18h30min
8h30min
às
14h00min
14h00min
Período de
Coleta
Local
12/05/2014
PUC Pós
Graduação
BH
14/05/2014
Escritório SP
Todo o
período
IFTM
Uberaba/MG
Fonte: própria da autora
A pesquisa exploratória nos possibilitou compreender o poder de uma agenda
política para a criação do PROEJA, as coligações partidárias, enfim, como está política se
inscreve perante a sociedade. Consideramos as seguintes categorias gerais da pesquisa:
educação profissional, educação de jovens e adultos, currículo (integrar e/ou articular). Com
base nestas categorias utilizamos – análise do discurso segundo Potter B Wetherell (1987)
mostram que a metáfora “construção” realça três facetas do enfoque. Primeiro ela chama a
atenção para o fato de que o discurso é construído, ou manufaturado, a partir dos recursos
linguísticos. Segundo lugar, montagem de um conjunto implica em escolha. Finalmente, o uso
construtivo da linguagem é um aspecto da vida social aceito sem discussão.
Importa destacar que o nosso objetivo inicial de pesquisa no projeto de tese era
análise de política – PROEJA e sua relação com integrar e/ou articular no currículo / educação
profissional. Com base na análise dos dados da pesquisa exploratória – análise do discurso
(E1) passamos a discorrer alguns pontos fortes para a pesquisa (E1) na sua integralidade:
137
1 - A integração é uma modalidade da articulação na qual estes dois polos se aproximam
de tal modo, embora distintos eles fazem parte de um mesmo corpo. Isso é muito claro na
educação profissional, quando o decreto 5.514 refez e retornou a articulação através da
integração (ensino médio e educação profissional). Havia três espécies (articulação,
concomitância, subsequente) do mesmo conceito de articulação - é como se fosse um
gênero. Fazendo correlação com o Direito, a norma é o "guarda-chuva" (Constituição
Federal de 1988) e debaixo desta norma teremos as leis complementares, as leis
ordinárias, que são as espécies do gênero. A articulação é um gênero (guarda chuva) e
debaixo a integração (uma espécie).
2 - Os Institutos Federais é uma agenda política de programa de Governo no qual o foco
é profissionalizar. A LDB vem sendo fragmentada e deixando lacunas profundas. Há a
necessidade de ver os dois lados, há alterações no corpo da LDB e também nas leis
paralelas. A função do Conselho Nacional é normatizar para que haja aplicação da Lei.
Há aproximadamente 102 intervenções na LDB, isto é desfiguração, o que traz a
necessidade de observar quais são as alterações a favor da EJA e quais as oportunistas.
3 - Na LDB, esta questão de qualificação para o trabalho no capítulo da educação
profissional de forma integrada - educação, ciência, tecnologia - tem que considerar que
os desenvolvimentos científicos e tecnológicos alteram significativamente o mundo do
trabalho. O Decreto 2.208 que enfatizou a separação entre as formações geral e
profissionalizante, fez com que o CNE pensasse em sua revogação, que bastava orientar
as diretrizes curriculares para a LDB, conforme transformações da própria sociedade. O
Decreto 5.154/04, no Governo Lula, revogando o 2.208 do ponto de vista das diretrizes
curriculares, fez com que no Conselho Nacional de Educação (CNE) tratasse as
alterações mais formais do que objetivas.
4 - O ensino médio que é o escopo da cidadania aberto a todos e a partir da Emenda 59,
obrigatório para os jovens de 15 a 17 anos - obrigatoriedade plena em 2016, tornou-se
muito novo que é estender a obrigatoriedade para todos, considerando-se que quem tem
acima de 18 anos não perde esse direito, pois tem a titularidade, ou seja, poderá exigir
uma vaga no ensino médio. A realidade na qual vivemos hoje, a profissionalização seja
um objetivo de muitos grupos sociais, e isto a LDB captou ao colocar a educação
profissional como uma modalidade ligada à Educação Básica.
138
5 - A integração foi um ganho para a educação profissional, PRONATEC é uma ideia
muito boa mas tornou-se populista. Se o projeto do PRONATEC tivesse sido feito consulta
por outras pessoas (consultas nos IF, ao Conselheiro Francisco Cordão) teria saído um
projeto mais consistente. Hoje, jovens estão querendo a educação profissionalizante,
apenas o Ensino Médio não o satisfaz, pois eles querem o ensino médio e o
profissionalizante. Este crescimento dos ensinos profissionalizantes, sem controle, está
pondo em risco a ideia (crescimento profissionalizante), uma EAD sem controle.
Inferimos, a partir da entrevista E1, que os processos da integração curricular
possam garantir que a EJA atenda às necessidades dos jovens e adultos trabalhadores, com
formação humana e profissional, uma vez implantadas a linha de atuação (políticas e
programas), cabe à equipe pedagógica fazer com que as diretrizes do governo sejam
efetivamente desenvolvidas. Não basta recorrer à dimensão política da educação, pois a
promoção integral dos jovens e adultos será uma referência profissional, uma maneira de
analisar e aperfeiçoar a forma como a educação irá se articular com a sociedade, a
tecnologia e o trabalho.
A entrevista E2 tendo os mesmos parâmetros, passamos a discorrer os pontos
fortes da pesquisa:
1 - Pela primeira vez utilizam o termo integrado na LDB. A educação profissional, porém,
não se confunde com o ensino médio, pois este é a etapa de consolidação da Educação
Básica, mas é integrada às diferentes formas de educação, sendo integrada com
educação, trabalho, ciência, tecnologia. Nesse momento, dá dimensão ao "integrada", o
que significa integrada com a educação. Ela se assenta sólida na Educação Básica,
quanto melhor for a formação básica melhor será a profissional.
2 - As diretrizes curriculares estavam dizendo "o ensino médio é etapa de preparação
básica para o mundo do trabalho, o ensino médio não conduz necessariamente a uma
habilitação profissional". A habilitação profissional é livre; a escola não está obrigada a
fornecer habilitação profissional. Mas se oferecer não deve ser baseada nos moldes da
Lei 5.692/71, pois o que era habilitação profissional nessa lei, conduzia a uma integração
entre educação geral e educação profissional.
139
3 - Não dá para separar educação profissional da educação básica. Tenho que ter
conhecimento dos códigos de linguagem, ser alfabetizado, conhecimento de matemática.
Tudo que acontece no mundo da educação é essencial para o mundo do trabalho.
Anteriormente havia dois mundos (trabalho e educação). Tínhamos o Conselho Federal
de Educação que tratava as questões relacionadas ao mundo da Educação. O Conselho
Federal de Mão de Obra era responsável pelo mundo do trabalho. As instituições do
sistema S (SENAI, SENAC, SESC, etc.) era responsabilidade do Ministério do Trabalho.
Assim não havia integração, mas ênfases diferentes, ou seja, instituições vinculadas á
educação e outras vinculadas ao Ministério do Trabalho.
4 - A Educação Profissional, a qual inclui a Educação de Jovens e Adultos (EJA), sendo
que esta é uma modalidade integrada, atualmente, ao Ensino Fundamental, ao Ensino
Médio e á formação profissional, que pode ainda ser cursada concomitante, ou seja, o
aluno tem a opção de realizar o ensino médio em uma escola e o ensino profissionalizante
em outra instituição de concomitantemente.
5 – Não houve resposta em relação PRONATEC – EJA – PROEJA
A partir da análise do discurso E2 concluímos que ao se focar na formação
profissional, o que se encontra respaldo na dimensão política da EJA são os processos de
integralidade na promoção educativa, cujos normativos e programas podem ser utilizados
de forma aprimorada e com domínio das exigências sociais, o que envolve um estudo
criterioso e aprofundado do currículo em relação aos modos de produção atuais.
Outro ponto marcante é que nas “entrelinhas” dispõe que a dimensão
educacional estabelece um sistema de linhas de atuação coerentes com demandas do
mundo do trabalho, para que todas as unidades escolares possam alcançar os objetivos da
integração entre educação básica e educação profissional.
Ambos os entrevistados fazem a correlação entre integrar e/ou articular no
currículo, porém, não expõem claramente sobre a interdisciplinariedade e a
transdisciplinaridade, elementos essenciais para construção de um currículo integrador.
Outro elemento, constante em ambas entrevistas, é a falta de continuidade nos
programas educacionais e que a educação deve constituir-se em uma política pública, faz
referência EC 59, para que haja crescimento na área educacional.
140
Diante do exposto, partindo do referencial teórico da TD adotada neste trabalho,
não se assume que esta diversidade de documentos, de diferentes origens, seja
representativa da totalidade discursiva sobre a temática em estudo ou que através deles
se desvendará alguma realidade dada a priori, mas sim que permitem acessar uma parte
campo da discursividade vigente sobre os Institutos Federais e sobre o IFTM e os seus
processos educacionais.
141
4 A CONSTRUÇÃO DAS POLÍTICAS CURRICULARES PARA A
EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA
Trabalhando-se com a concepção de política curricular como discurso e, portanto,
pratica significação, de produção de sentidos, ela está no presente em todo o texto da tese,
quando se discute os embates políticos, quando apresenta sua estrutura e organização,
cultura institucional, composição dos Institutos Federais.
O que se fará é analisar um conjunto de documentos coletados em diferentes
espaços institucionais com o escopo de aprofundar a discussão sobre a construção dos
processos educacionais e a política curricular dentro do PROEJA no Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro – IFTM – Campus Uberaba e
Campus Avançado Uberaba Parque Tecnológico.
Assumindo o conceito de discurso, ultrapassando as fronteiras do texto escrito
segundo Basil Bernstein e dialogando com Villanueva (2003), na perspectiva de política
como texto e sua interpretação textual e a importância central de diferentes portadores
textuais para o estudo das políticas curriculares, além disso, examinar a educação jovens e
adultos integrada à educação profissional, à luz da literatura, às tendências de organização
da educação profissional no Brasil. Recorreu da história não para ilustrar e servir de “pano
de fundo” mas para situar o problema e “vasculhar zonas de sombra” (WARDE, 1984,
citada por Soares, 2003) com objetivo de identificar as tendências que orientam as
políticas de educação profissional e compreender para onde se dirige o PROEJA na
sociedade educacional brasileira.
A justaposição dos discursos de diferentes fontes e atores sociais não estabelece
como verdade absoluta. A análise do discurso enfatiza a movimentação de sentidos, falta
conexão lógica, existência de vazios e das hegemonias, conforme já discutido no ciclo de
políticas (VILLANUEVA, 2003) e com aportes teóricos (BERNSTEIN, 1991).
Outro dado, as escolas técnicas industriais retratam função propedêutica.
Outro fator a ser acrescentado é a análise do PROEJA, à luz da Teoria da
Tridimensionalidade de Reale (fato, valor e norma) dentro do sistema hierárquico das leis
segundo princípios constitucionais vigentes.
142
4.1 CONSTRUÇÕES TEÓRICAS: CICLO DE POLÍTICAS, TEORIA DO DISCURSO DE
BASIL BERNSTEIN, TRIDIMENSIONALIDADE DE MIGUEL REALE E A POLÍTICA
CURRICULAR PARA EPT
Este capítulo tem por objetivo apresentar o campo conceitual sobre o qual este
trabalho está construído. Inicialmente justifica-se a opção de não simplificação das
análises políticas discutindo, posteriormente, com os aportes teóricos que o ciclo de
políticas de Villanueva e a Teoria do Discurso de Basil Bernstein, a complexa construção
política de sentidos sociais, neste aporte Miguel Reale na interpretação do programa
PROEJA fundamentado na Teoria Tridimensional de Reale.
Na sequência o capítulo irá abordar as políticas curriculares para EPT. Neste
processo, começa refletindo sobre os deslocamentos de sentidos para currículo,
assumindo, com Alice Lopes e Elizabeth Macedo, a perspectiva de currículo e política
curricular como prática discursiva, no campo de lutas por produção de sentidos para o
social. Posteriormente, ao examinar políticas curriculares para EP na rede federal tendo
por base a legislação, destaca os embates que vem ocorrendo em torno deste campo
educacional, concluindo-o como ainda não hegemonizado, não estabilizado e, portanto,
ainda suscetível a constantes deslocamentos, aparentemente contraditórios
Esta seção termina com a apresentação da complexidade de um processo de
construção curricular, atravessado por múltiplas produções de sentidos, de diferentes
origens. Ao final do capítulo destacam-se as opções conceituais que orientam as análises
realizadas nesta tese.
4.1.1 A complexidade – Análise de política curricular na visão de Villanueva, Basil
Bernstein, Alice Lopes e Elizabeth Macedo
Os estudos epistemológicos – políticas educacionais – avançam configurando um
campo distinto de investigação, os indicadores deste crescimento são: aumento das
pesquisas, publicações, grupos da linha de pesquisa, fóruns e eventos (congressos,
simpósios) sobre políticas públicas educacionais com escopo visualizar na política os
indicadores positivos e negativos na vida do cidadão brasileiro. Como esta política se
institucionaliza no ceio da sociedade e de que modo ela é vista pela comunidade social.
Segundo Ball, Mainardes, 2011, p.12 dispõe que
143
Nas pesquisas e publicações brasileiras sobre políticas educacionais, observa-se
a existência de dois grupos distintos: a) estudos de natureza teórica sobre
questões mais amplas do processo de formulação de políticas, abrangendo
discussões mais amplas do processo de formulação de políticas, abordagens
históricas das políticas educacionais brasileiras (geralmente vinculadas à análise
de contextos socioeconômico e político, entre outros aspectos; e b) análise e
avaliação de programas e políticas educacionais específicas. (BALL;
MAINARDES, 2011, p.12)
Consequentemente, os estudos no campo do currículo se ampliam em diferentes
olhares, isto é, concretizando no meio educacional já que crescem as referências teóricas
para o campo curricular. Segundo Elizabeth Macedo, 2006, p.99 “desde os anos 80, a
produção em torno da temática do currículo ampliou-se consideravelmente no Brasil”.
Porém, segundo Moreira (2001), não há por parte dos estudiosos do currículo,
uma delimitação dos temas prioritários de suas investigações. Macedo et al. (2005 apud
Macedo, 2006) ao analisarem 453 teses e dissertações produzidas no país, no período de
1996 a 2002, concluem que, na medida em que se amplia a preocupação com a temática
ocorre uma dispersão no que se entende por currículo.
Ao tomarmos o currículo como cerne de análise, não pretendemos debruçar sobre
o hibridismo (formal e prático), tão pouco temos pretensão de construir novas teorias
sobre o mesmo. A tese em foco preocupa em tecer algumas reflexões sobre as relações
que podem se estabelecer entre currículo, conhecimento e poder na construção de
hegemonias, partindo do pressuposto de que ele é práxis resultante dos embates que se
travam por grupos / instituições no campo político e educacional.
E as teorias críticas, a partir da década de 1970, ajudaram-nos a compreender que
o currículo não é um corpo neutro, inocente e desinteressado de conhecimento: o
conhecimento selecionado no currículo é um conhecimento particular, resultado de um
processo que reflete os interesses particulares de classes e grupos sociais. (SILVA, 2007,
p.45 e seguintes). Assim, não é possível dissociar o estudo do currículo e das políticas de
currículo do estudo de políticas educacionais e políticas em geral, tanto no contexto local,
quanto no contexto global. Assim que, nesta próxima seção se apresentará alguns
elementos para uma compreensão de questões envolvidas na política curricular da
educação profissional.
144
4.1.2 Currículo e sua trajetória no contexto educacional
A primeira dificuldade é conceituar currículo. Gimeno Sacristán (2000) começa
seu livro O currículo: uma reflexão sobre a prática apontando que os principais
dicionários de língua espanhola não tratam o conceito na sua acepção pedagógica. Relata
o autor no primeiro parágrafo do livro
Nossa cultura pedagógica tratou o problema dos programas escolares, o trabalho
escolar, etc. como capítulos didáticos, mas sem a amplitude nem ordenação de
significados que quer sistematizar o tratamento sobre currículo.
A prática a que se refere o currículo, no entanto, é uma realidade prévia muito
bem estabelecida através de comportamentos didáticos, políticos,
administrativos, econômicos, etc., atrás dos quais se encobrem muitos
pressupostos, teorias parciais, esquemas de racionalidade, crenças de valores,
etc., que condicionam a teorização sobre currículo. (SACRISTÁN, 2000, p.13)
Lopes e Macedo (2011) também trabalham com a premissa de que
não é possível responder “o que é currículo” apontando para algo que lhe é
intrinsecamente característico, mas apenas para acordos sobre os sentidos de tal
termo, sempre parciais e localizados historicamente. Cada “nova definição” [...]
se posiciona, seja radicalmente contra, seja explicitando suas insuficiências, em
relação às definições anteriores, mantendo-se ou não, no mesmo horizonte
delas”. (LOPES; MACEDO, 2011a, p.19-20)
E independentemente do lugar conceitual de onde se fale em currículo, em
comum existir a ideia de organização, experiência e situações de aprendizagem a fim de
dar conta de um processo educativo. É importante ressaltar que não existe neutralidade no
currículo, constitui um veículo de ideologia. É justamente na construção ou na elaboração
das propostas curriculares que se define que tipo de sociedade e cidadão se quer construir.
Sendo que na constituição ou definição das propostas que serão selecionados os conteúdos
que ajudará a interagir e compreender o meio em que está inserido.
E as teorias críticas denunciavam o papel do poder, da ideologia, da estrutura
econômica para que as pessoas “sejam convencidas” da desejabilidade e da legitimidade
dos arranjos sociais existentes, as teorias pós-críticas/pós-estruturais, a partir do final dos
anos 1980 – anos 1990 no Brasil – vão deslocar a discussão das questões de ideologia,
poder e resistência para as conexões entre significação, identidade e poder: o currículo
está, irremediavelmente, envolvido na formação de sentidos, nos processos pelos quais
nos tornamos o que somos.
É importante conceituar o currículo para que haja a delimitação do objeto de
análise como também demonstrar o poder da política curricular na construção de uma
educação e que reflete dos interesses de classes e grupos sociais. Para Sacristán (2000):
145
O currículo é uma práxis antes que um objeto estático emanado de um modelo
coerente de pensar a educação ou as aprendizagens necessárias das crianças e
dos jovens, que tampouco se esgota na parte explicita do projeto de socialização
cultural nas escolas. É uma prática, expressão, da função socializadora e cultural
que determinada instituição tem, que reagrupa em torno dele uma série de
subsistemas ou práticas diversas, entre as quais se encontra a prática pedagógica
desenvolvida em instituições escolares que comumente chamamos de ensino. O
currículo é uma prática na qual se estabelece diálogo, por assim dizer, entre
agentes sociais, elementos técnicos, alunos que reagem frente a ele, professores
que o modelam. (SACRISTÁN, 2000, p.15-16)
Porém, na avaliação de Elizabeth Macedo, 2006, o conceito de currículo,
utilizados nas pesquisas sobre o currículo parece bipartido. Para ela “essa distinção
contribui para hierarquização do poder, no qual dificulta a possibilidade de pensar o
currículo para além da prescrição” (MACEDO, 2006p.99)
Partindo do entendimento que o currículo se faz no tempo e espaço escola
estruturado como um repertório para o percurso educativo, construído pelas experiências,
atividades, conteúdos, métodos, forma e meios empregados para cumprir as diretrizes
curriculares nacionais, fins que são definidos (implícita ou explicitamente) pelos
interesses dos grupos hegemônicos.
Neste sentido, o currículo é um campo político pedagógico no qual as diversas
relações entre sujeitos, conhecimento e realidade constroem saberes e reconstroem os já
institucionalizados. Neste processo dinâmico e dialético, a realidade é um elemento
constituinte do processo pedagógico.
Assim, considerando que a linguagem ao invés de representar o mundo, o
constrói, a atribuição do significado de um significante torna-se um processo cultural uma
vez que “seu sentido somente poderá ser definido dentro de uma formação discursiva
histórica e socialmente contingente” (LOPES; MACEDO, 2011a, p.40) o que descoloca a
discussão de currículo para o campo da política, da política curricular:
Currículo, bem como os demais significantes a ele associados – conteúdos,
conhecimento, cultura, avaliação, professor, aluno, dentre muitos outros – são
significados de determinada maneira por estarem inseridos em uma formação
discursiva decorrente de lutas políticas pela significação. [...] São, portanto,
construções discursivas de sujeitos descentrados em sociedades sem
fundamentos fixos, soluções negociadas, precárias e provisórias, mesmo quando
essa provisoriedade nos parece de tão longa duração que nos iludimos julgandoa eterna. (LOPES, 2012, p.9)
Outro elemento é que há um elevado número de trabalhos foco (prática
curricular) e uma pequena parte trata de forma mais integrada à prática e às propostas,
além disso, está em sua grande parte buscar entender as formas de apreensão das
propostas oficiais. Elizabeth Macedo (2006) dispõe:
146
ainda assim, esse número correspondeu quase que exclusivamente a estudos que
buscaram entender as múltiplas formas de apreensão das propostas oficiais pelos
professores em sala de aula ou propor maneiras de fazê-lo. (MACEDO, 2006, p.
99)
Villanueva (1992, p.219-220) afirma que:
La elaboración de políticas es un proceso de aproximaciones sucesivas a algunos
objetivos deseados que van también cambiando a la luz de nuevas
consideraciones. La adopción de decisiones de política es en el mejor de los
casos un proceso difícil. Ni los científicos sociales, ni los políticos ni los
administradores públicos saben todavía lo suficiente acerca del mundo social
para evitar los errores que cometen una y otra vez en sus pronósticos sobre las
consecuencias de las políticas. Unpolicymaker sabio espera, por consiguiente,
que sus políticas logren sólo en parte lo que espera y que, al mismo tiempo,
produzcan consecuencias imprevistas e indeseadas. Por consiguiente, al decidir a
través de una sucesión de cambios incrementales, evita de diversas maneras
errores serios.
Assim, ao mesmo tempo em que uma política está sendo construída está sendo
contestada e alterada: os “elaboradores” não conseguem controlar o significado de uma
determinada política, uma vez que elas serão interpretadas pelos agentes das diferentes
arenas/níveis, criando novos significados, num processo que Bernstein denomina
recontextualização (BERNSTEIN, 1996; 2003).
Para o referencial teórico do discurso a Teoria do Dispositivo Pedagógico “a
estrutura do discurso pedagógico” e a “Pegagogia, control simbólico e identidad”
(BERNSTEIN, 1998) tendo por base esta teoria no qual foi elaborada para analisar o
processo pelo qual um campo específico de conhecimento é transformado para constituir o
conhecimento escola, o currículo, conteúdos e relações a serem transmitidas.
Além disso Singh (2002) afirma que:
Por meio da Teoria Dispositivo Pedagógica, Bernstein procurou explicar as
regras geradoras de estabilidade e uniformidade dos sistemas nacionais de
educação. Além disso, criou um modelo de como a mudança nos princípios de
ordenação e desordenação da pedagogização do conhecimento podem ser
investigadas. (SINGH, 2002, p.81) (Tradução nossa).
E as regras do dispositivo pedagógico estão sujeitas a ideologias sendo que
segundo Bernstein (1998, p.68) “o dispositivo pedagógico actua como regular simbólico
de la consciência”.
Assim discurso pedagógico se estabelece dentro do discurso instrumental1 e o discurso
regulador2. Este, segundo Bernstein (1998) pode ter um caráter de discurso dominante.
1
Discurso Instrumental (DI) – refere-se aos conhecimentos mais específicos (o que e como transmiti-los)
147
Para o referencial teórico da teoria do discurso de Bernstein, política é a própria
razão de ser da existência do social pois “aponta para estabelecer uma ordem, organizar a
coexistência humana em condições sempre conflitivas” ligadas “ao antagonismo que se
manifesta na diversidade das relações sociais” (MOUFFE, 1999, p.14) e, como será visto,
Villanueva considera hegemonia o conceito chave para se pensar a política.
E política segundo Stephan Ball (1994): “política é (...) um conjunto de
tecnologias e práticas as quais são realizadas e disputadas em nível local. Política é
ambos, texto e ação, palavras e fatos, é tanto o que é intencionado como o que é realizado.
(BALL, 1994, p.10, tradução nossa) ”.
Segundo Macedo (2006b, p.106) é necessário desconstituir os conceitos de
currículo formal e currículo emoção, sendo uma etapa fundamentar para que o currículo
seja visto como espaço/tempo de produção cultural, ou seja, menos linear, vertical e
hierárquico.
Ferreira (2005) afirma que as comunidades disciplinares são constituídas por
grupos que se apropriam de certos padrões curriculares socialmente produzidos e
legitimados pelos sistemas educacionais. Esses padrões possuem “valor como moeda no
mercado identidade social” (GOODSON, 1997, p.27). As comunidades disciplinares
atuam, assim, como arenas nas quais ocorrem embates em torno de variadas tradições
disciplinares (VILLANUEVA, 2005, p.101).
Visto que as comunidades disciplinares contribuem para recontextualização de
discursos que associam a determinados padrões e se tornam contingencialmente
hegemônicos, seus subgrupos operam nos contextos do “ciclo produtor de políticas de
currículo”. Estes subgrupos desenvolvem no interior uma série de conflitos, apresenta-se
com menor poder nas lutas institucionais (BALL, 1997 apud LOPES & MACEDO, 2011).
Goodson (1997) dispõe que quanto maior a capacidade de uma retórica em
associar interesses idealistas, materiais e morais, mais estabilizados e naturalizados
estarão os discursos e as práticas curriculares, podendo conferir o estabelecimento da
comunidade disciplinar frente às outras.
Lopes (2006) infere sobre as políticas curriculares e sua força hegemônica diante
de comunidades epistêmicas:
No caso específico das políticas de currículo, defendo que os discursos
hegemônicos são disseminados por comunidades epistêmicas com capacidade de
influência nos Estados-nação, muitas vezes perpassando distintas sociedades
2
Discurso regulador (DR) – possui um cunho ideológico (discurso moral e de transmissão de valores,
identidades) e que DI está sempre integrado a DR.
148
políticas. As comunidades epistêmicas são compostas por grupos de
especialistas que compartilham concepções, valores e regimes de verdade
comuns entre si e que operam nas políticas pela posição que ocupam frente ao
conhecimento, em relações de saber–poder [...] Pela ação de comunidades
epistêmicas nas políticas de currículo, sejam elas específicas do campo
educacional, das áreas de ensino de disciplinas específicas ou do campo da
economia e da administração, é possível investigar alguns dos instrumentos de
homogeneização [...]. As comunidades epistêmicas produzem tais instrumentos
de homogeneização, na medida em que fazem circular diagnósticos sobre a
situação educacional e organizam modelos de solução para os problemas
identificados, valorizando seu próprio conhecimento como fonte dessas
soluções. (LOPES, 2006, p.40-41)
A autora investiga como as comunidades epistêmicas agem de forma conjunta
com as comunidades disciplinares3.
Em nosso grupo de pesquisa temos operado com as comunidades epistêmicas
procurando entender tanto a forma como contribuem para a produção e difusão
de discursos do contexto de influência quanto para projetar determinadas
identidades nas práticas e introduzir determinados discursos nos textos das
políticas. [...] procuramos investigar como as comunidades disciplinares atuam
localmente como comunidades epistêmicas (LOPES; MACEDO, 2011, p.272273)
Tais teorizações alertam-nos para a complexidade da análise política. Antônio
Flávio Moreira (2007) também destaca a necessidade que “se as políticas são conjuntos de
tecnologias e práticas que se desenrolam, em meio a lutas, em cenários locais, não faz
sentido se ficar restrito às deliberações oficiais” (p.267).
Tal propositiva revela “[...] o quanto a educação está inserida no mundo real das
relações de poder cambiantes e desiguais. E as teorias, políticas e práticas envolvidas, na
educação não são técnicas; são inerentemente éticas e políticas [...]” (APPLE, 2006, p.22)
Nesse sentido, o currículo se constitui como:
[...] expressão da função socializadora e cultural que determinada instituição
tem, que reagrupa em torno de uma série de subsistemas ou práticas diversas,
entre as quais se encontra a prática pedagógica desenvolvida em instituições
escolares que comumente chamada de ensino (SACRISTÁN, 2002, p.15-16).
E a política não é implementada de forma linear e hierárquica (VILLANUEVA,
2003).
Em outro texto ele chama a atenção para o fato de que “nem todas as
organizações incorporam as mudanças com igual boa vontade e entusiasmo” (BALL,
2006, p.16) e, logo, a “análise política necessita ser acompanhada por cuidadosa pesquisa
regional, local e organizacional se nos propusermos a entender o grau de ‘aplicação’ e de
3
Comunidades disciplinares são constituídas por atores sociais envolvidos na constituição de cada disciplina professores da educação básica, pesquisadores e especialistas de disciplinas específicas (GOODSON,1997)
149
‘espaço de manobra’, envolvido na tradução das políticas nas práticas” (BALL, 2006,
p.16).
Diante desta complexidade, apontada por autores de diferentes linhas teóricas,
conclui-se que não faz sentido trabalhar com binarismos, tais como política oficial versus
não oficial, escrita versus não escrita, legítima versus ilegítima. As políticas serão sempre
produto de acordos em vários estágios, sendo fruto de múltiplas influências. Sempre que
forem consideradas apenas algumas dessas influências e, por consequência, certas
políticas como legítimas, outras serão marginalizadas. Não é possível predizer, determinar
a priori, quais serão os resultados de uma determinada política quando estiver deslocada
em outros contextos e submetidas a releituras / reinterpretações de outros atores.
E as divisões que conformam a política pública – distributiva, redistributiva ou
regulatória, universal ou focalizada – assumem diferentes formatos: podem ser enunciados
de diferentes estratégias de governo, leis e decretos normativos que especificam de forma
mais clara e operacional tais diretrizes, criação de organizações ou programas que vão
conferir operacionalidade às diretrizes, leis e normas (VILLANUEVA, 2006).
Além disso, Rossi et al., 2004 informa que o programa público é, pois, um dos
instrumentos operacionais das políticas públicas. Mais especificamente, trata de um
conjunto de ações programadas e articuladas entre si, com o objetivo de atender a
demanda pública específica, encampada na agenda de prioridades de políticas públicas do
Estado ou Governo, neste foco insere o PROEJA.
Moreira (2006), a partir de seu interesse em compreender o conceito de
transferência educacional, tendo por base outros referenciais teóricos, ao estudar o
estabelecimento do campo do currículo no Brasil até meados da década de 80, também se
depara com estas questões:
Tendências curriculares não podem ser concebidas como um conjunto
homogêneo de temas, metodologias e propósitos. Em outra escala, o mesmo
pode ser dito de teorias curriculares que refletem a influência de tendências
diversas e combinam diferentes princípios e interesses, não apresentando,
consequentemente, um caracter monolítico. [...] será viável considerarmos que o
campo brasileiro [do currículo] emergiu exclusivamente dominado pelo
tecnicismo? Independente das mediações que inevitável ocorreram, o próprio
material transferido [dos EUA] não era, como procuramos demonstrar, pura e
exclusivamente tecnicista. Mesmo Tyler e Taba, visto por Domingues 4 como
típicos autores tecnicistas, apresentam forte influência de ideias progressivistas.
(MOREIRA, 2006, p.79)
4
DOMINGUES, J. L. O Cotidiano da escola de 1º grau: o sonho e a realidade. 1985. Tese (Doutorado).
Pontifícia Universidade Católica, São Paulo.
150
Neste trabalho, compartilha-se com Lopes e Macedo, o conceito de
currículo/política curricular como prática discursiva, em consonância com os conceitos da
teoria do discurso apresentada em seção anterior:
ele [o currículo] é uma prática de poder, mas também uma prática de
significação, de atribuição de sentidos. Ele constrói a realidade, nos governa,
constrange nosso comportamento, projeta nossa identidade, tudo isto produzindo
sentidos. Trata-se, portanto, de um discurso produzido na interseção entre
diferentes discursos sociais e culturais que, ao mesmo tempo, reitera sentidos
postos por tais discursos e os recria. [...] qualquer manifestação do currículo,
qualquer episódio curricular, é a mesma coisa: produção de sentido. (LOPES;
MACEDO, 2011a, p.41-42)
Neste próximo item será analisada a política curricular na educação profissional
na rede federal.
4.1.3 A política curricular para educação profissionalizante na rede federal
Nesta seção, com foco na rede federal, serão apresentadas e discutidas as políticas
curriculares para educação profissional em andamento no país. Para tentar entendê-las de
uma forma mais ampla e menos hierárquica, far-se-á um movimento mais longo no tempo,
buscando focalizar nos entraves destas políticas na arena Federal.
Para discutir a educação para o trabalho no Brasil no objeto política pública
profissionalizante foram elencados para compor esta seção Demerval Saviani, Gaudêncio
Frigotto, Jamil Cury, Maria Ciavatta, Francisco Cordão, especialmente, a obra de Luís
Antônio Cunha a obra O ensino profissionalizante na Irradiação do Industrialismo, 2000.
Vale ressaltar que os autores supracitados pautam na perspectiva marxista,
centralizados no poder do Estado e na estrutura econômica como pilastras nas políticas
públicas profissionalizadas, porém, há a necessidade de questionar outras influências que
compõem nos processos de construção hegemônica que compõem o programa PROEJA.
Há que se procurar a fonte desta regra jurídica, diz Montoro apud Du Pasquier, 1995,
p.300 significa investigar o ponto em que ela saiu das profundezas da vida social para
aparecer na superfície do direito.
Necessário se faz conceituar fonte formal e fonte material. Segundo André Franco
Montoro em sua obra Introdução à Ciência do Direito.
Fontes formais, isto é, os fatos dão a uma regra o caráter direito positivo e
obrigatório (legislação, costume jurídico, jurisprudência, doutrina)
Fontes Materiais representadas pelos elementos que concorrem para a formação
do conteúdo ou matéria da norma jurídica, isto é, realidade social, valores que
o direito procura realizar e fundamentos da justiça. MONTORO apud DU
PASQUIER, 1995, p.323) (Grifo nosso)
151
Necessário se faz investigar o início do processo escolar institucionalizado e suas
marcas de governo (re)empoderamento alguns atores políticos, os processos hegemônicos
no qual possibilita a educação profissional é apoderar-se das fontes materiais que dará ao
formador de política propor dentro da agenda partidária dados para transformar em fontes
formais, ou seja, legislação.
Saviani (2007, p.9-19) corrobora que a origem das instituições educativas
remonta ao momento da ruptura do modo de produção comunal (o comunismo primitivo)
que determinou o advento das sociedades de classe, surgimento da escola.
Manacorda retoma o “poder da oratória sendo que é uma arte política do
comando”, neste ponto, trabalha o poder das fontes materiais na formulação das políticas.
A separação entre instrução e trabalho, a discriminação entre a instrução para os
poucos e o aprendizado do trabalho para os muitos, e a definição da instrução
"institucionalizada" como institutio oratoria, isto é, como formação do governante
para a arte da palavra entendida como arte de governar (o "dizer", ao qual se associa
a arte das armas, que é o "fazer" dos dominantes); trata-se, também, da exclusão
dessa arte de todo indivíduo das classes dominadas, considerado um "charlatão
demagogo", um meduti. A consciência da separação entre as duas formações do
homem tem a sua expressão literária nas chamadas "sátiras dos ofícios". Logo esse
processo de inculturação se transforma numa instrução que cada vez mais define o
seu lugar como uma "escola", destinada à transmissão de uma cultura livresca
codificada, numa áspera e sádica relação pedagógica. (MANACORDA, 1989,
p.356)
O Estado estabelece tempo e espaço para disputa, sua matéria – o(s) motivo(s) e
as regras do jogo; embora existam outras relações de poder nos espaços locais que serão
desafiados pelas políticas oficiais dentro da sua prática cotidiana. (BALL, 1994)
E com base nas contribuições da teoria do discurso de Laclau (2011):
[...] não uma ruptura radical, mas uma nova modulação de seus temas; não o
abandono de seus princípios básicos, mas sua hegemonização a partir de uma
perspectiva diferente [...] um alargamento do campo da indecidibilidade estrutural
que abre caminho para um aumento do campo da decisão política. (LACLAU, 2011,
p.134)
Outro panorama a ser acrescentado é que qualquer teoria geral relacionada com
social, que rejeita o discurso tecnicista da gestão social, no qual alarga o campo da
política; traduz a hegemonia e Estratégia Socialista (MOUFFE, LACLAU, 1987, p.318)
Afirmação de um “fundamento” que somente vive de negar seu caráter fundamental;
de uma “ordem” que só existe como limitação parcial da desordem; de um “sentido”
que só se constrói como excesso e particular frente ao sem sentido – em outros
termos, o campo da política como espaço de jogo que não é nunca “soma-zero”,
por que as regras e os jogadores não chegam jamais a ser plenamente
explícitos. Este jogo, que escapa ao conceito, tem ao menos um nome:
hegemonia. (MOUFFE; LACLAU, 1987, p.318, tradução nossa) (grifo nosso)
152
E assim, com base na obra “O Ensino Profissional na irradiação do
industrialismo, bem como as legislações, pretende contrapor a centralidade do Estado e na
economia – premissas marxistas – dando ênfase na construção das políticas educacionais
como processos hegemônicos, tencionam a sociedade e que justificam a própria
instabilidade destas políticas e da legislação no contexto brasileiro.
Assim, esta seção será referenciada os autores citados para trazer a história da
educação como reconstrução cognitiva do processo de desenvolvimento da educação. Já
que a realidade humana de cada indivíduo se constrói em relação com os outros e se
desenvolve no tempo, a memória configura como uma faculdade específica e
essencialmente humana sendo expressão memória histórica (SAVIANI, 2008)
Esta é importante para compreender o movimento da política educacional, suas
perspectivas e seus avanços e retrocessos na construção da sociedade.
No Brasil, a origem das instituições escolares (1949) com a chegada dos jesuítas
“a primeira escola brasileira” (MATTOS, 1958, p.37). Este é o ponto de partida da
história das instituições escolares brasileiras.
Saviani, 2005, p.12 esboça a historiografia, como fonte de aprofundar nas raízes
históricas para compreender a política educacional e curricular das legislações atuais.
Segundo ilustre professor Saviani corrobora que:
O primeiro período (1549-1759) é dominado pelos colégios jesuítas; o
segundo (1759-1827) está representado pelas “Aulas Régias” instituídas pela reforma
pombalina, como uma primeira tentativa de se instaurar uma escola pública estatal
inspirada nas ideias iluministas segundo a estratégia do despotismo esclarecido; o
terceiro período (1827-1890) consiste nas primeiras
intermitentes,
de
se
organizar
a
educação
tentativas,
descontínuas
e
como responsabilidade do poder
público representado pelo governo imperial e pelos governos das províncias; o
quarto período (1890-1931) é marcado pela criação das escolas primárias nos
estados na forma de grupos escolares, impulsionada pelo ideário do iluminismo
republicano. (SAVIANI, 2005, p.12)
A partir da década de 1930, a base do desenvolvimento brasileiro teve por
objetivo a industrialização, num modelo denominado “substituição das importações”.
Saviani destaca que este processo foi capaz de unir
“os empresários nacionais e internacionais, as classes médias, os operários e as
forças da esquerda [...] [entretanto] as razões que os moveram eram divergentes.
Enquanto para a burguesia e as classes médias a industrialização era um fim em
si mesmo, para o operariado e as forças de esquerda, as razões que os moveram
na mesma direção eram divergentes” (SAVIANI, 2008, p.362)
153
Apesar do entusiasmo do período republicano com a criação dos grupos
escolares, o ensino escolar permanece estagnado, de devido a fragmentação da política
educacional e curricular pois não basta as edificações são necessárias mudanças
curriculares. Saviani, revela que:
O país não atingiu as finalidades pretendidas, pois durante os 43 anos do regime
republicano no Brasil o sistema esteve desarticulado e fragmentado pela dissociação entre
as reformas econômicas e as educacionais, o que não permitiu a instituição de um sistema
educacional capaz de atender as necessidades modernas do país. (SAVIANI, 2007)
Torna necessário, ampliar o número de cidadãos alfabetizados para trabalhar nas
indústrias, devido ao processo de aceleração na industrialização no Brasil, cabe observar
que, ao longo de quase quatro séculos, a educação ficava restrita a pequenos grupos. Ela a
burguesia busca consolidar sua posição, as forças de esquerda retomam bandeiras
representativas da ideologia do nacionalismo desenvolvimentista que as motivava, em
conflito com o modelo econômico vigente, de caráter desnacionalizante, muito favorável
às empresas estrangeiras9. Estabelecem-se então novos movimentos de luta para
estabelecimento de novas hegemonias as quais, ao extremo, desencadeiam a instabilidade
política da década de 1960 e golpe militar de 1964.
Outro ponto a ser observado é que durante o regime militar predomina-se a
concepção produtivista na educação tendo como substrato a teoria capital humano que tem
como ponto crucial que a incorporação na legislação, os princípios da racionalidade,
eficiência e produtividade, como corolários do “máximo resultado com o mínimo
dispêndio” e “não duplicação de meios para fins idênticos” (SAVIANI, 2008, p.365). E a
lei 5.692/71 estrutura-se em uma tendência produtivista a todo ensino básico do país,
convertendo a pedagogia tecnicista10 em pedagogia oficial. (SAVIANI, 2008, p.366).
A Lei 5692/71, que tornava compulsório a profissionalização no segundo grau,
dividia o currículo em três partes: o núcleo comum – obrigatório em âmbito nacional –,
uma parte diversificada – com finalidade de atender as peculiaridades locais – e a parte
9
“Em função da implantação das indústrias de bens duráveis exigir altos investimentos, a implantação de um
parque industrial deste tipo foi viabilizado com o estímulo a implantação de empresas internacionais. As forças
de esquerda vão levantar bandeiras do tipo nacionalização das empresas estrangeiras, controle da remessa de
lucros, dividendos e royalties e reformas de base - tributária, financeira, bancária, agrária, educacional, etc.”
(SAVIANI, 2008)
10
“Com base no pressuposto da neutralidade científica e inspirada nos princípios de racionalidade, eficiência e
produtividade, a pedagogia tecnicista advoga a reordenação do processo educativo de maneira que o torne
objetivo e operacional. De modo semelhante ao que ocorreu no trabalho fabril, pretende-se a objetivação do
trabalho pedagógico. [...] Para a pedagogia tecnicista o que importa é aprender a fazer”. (SAVIANI, 2008, p.381383)
154
específica – onde ocorria a formação profissional. A lei definia ainda a obrigatoriedade de
Educação Moral e Cívica, Educação Artística e Programas de Saúde. Na sequência o
Conselho Federal de Educação, emitiu pareceres e resoluções, definindo a constituição do
núcleo comum do ensino de segundo grau e o currículo mínimo para cada habilitação
profissional por intermédio do Parecer 45/72, que estruturou a Educação Profissional até
1998, quando foi aprovado um novo ordenamento legal.
Ciavatta, 2012 corrobora que
Com o fim do “Milagre econômico” em meados dos anos 1970 e fortes pressões
sobre o regime militar, planos e programas foram implementados junto às
populações das áreas mais pobres.11 Ainda no final dessa década, a profissionalização universal e compulsória empreendida pela lei n. 5.692/71 é flexibilizada pelo
Parecer do CFE n. 75/76 e consolidada pela lei n. 7.044/82 com as seguintes
alterações: a) substituição de “qualificação para o trabalho” por “preparação para o
trabalho” (caput do art. 1o); b) absorção de “preparação para o trabalho” como
elemento da “formação integral do aluno” em caráter obrigatório no ensino de 1o e
2o graus (art. 4o, parágrafo 1o); e c) conversão da habilitação profissional em opção
dos estabelecimentos de ensino (art. 4o, parágrafo 2o). (CIAVATTA, 2012)
Na década de 1970, por meio de pareceres do CFE que reinterpretaram a Lei
5692/71, desobrigando a transformação de todas as escolas em técnicas a divisão a parte
geral e específica, o que representava a possibilidade de acréscimo de carga horária da
parte geral e redução da parte específica. Posteriormente, com a aprovação da Lei 7044/82
eliminou a obrigatoriedade da profissionalização no segundo grau e o CFE expediu a
Resolução 06/86 que reestruturou o núcleo comum, separando a Matemática e
acrescentado a obrigatoriedade de Literatura em Português. Exigia ainda que Língua
Portuguesa, Literatura – preferencialmente a brasileira -, Matemática, Física, Química,
Biologia, Língua Estrangeira e Filosofia – quando houvesse – fossem tratadas como
disciplinas no segundo grau, sendo que Matemática e Português deviam ser ofertadas em
todos os períodos letivos.
Ponto ápice da política educacional profissionalizante, diferentes motivações e
origens esta política se vê fragilizada e requer mudanças estruturais, produzindo
deslocamentos na política e possibilitando novos processos hegemônicos. Cunha, 2000
dispõe que: “ A mais ambiciosa medida de política educacional de toda a história do Brasil
foi, sem dúvida, a profissionalização universal e compulsória no ensino de 2° grau. Ela
representou, certamente, o maior fracasso”. (CUNHA, 2000, p.181)
Além disso,
Cunha, estudando o processo de implantação desta reforma, identifica a função
contenedora do ensino de 2° grau com terminalidade: mesmo sem conhecimento da
real demanda por técnicos de nível médio, os administradores educacionais da época
“acreditavam que ela fosse grande o suficiente para canalizar a frustração dos
155
concluintes do ensino médio que não ingressassem no ensino superior”. (CUNHA,
2000, p.188)
A Resolução do CFE 8/71 definiu que o núcleo comum abrangeria as matérias de
Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e Ciências. Em Comunicação e Expressão, a
Língua Portuguesa foi definida como conteúdo obrigatório e recomendava-se a inclusão
de uma Língua Estrangeira Moderna; em Estudos Sociais foram definidos como
obrigatórios conteúdos de Geografia, História e Organização Social da Política Brasileira
e em Ciências Matemática, Ciências Físicas e Biológicas. Estes conteúdos deviam ser
organizados preferencialmente na forma de disciplinas, dosadas segundo as habilitações
profissionais.
Por sua vez, a Resolução 2/72, anexa ao Parecer 45/72, fixou os mínimos a serem
exigidos para cada habilitação profissional. O anexo C desta Resolução definia as
habilitações, as matérias obrigatórias para cada Habilitação – 52 habilitações de nível
técnico – e as cargas horárias das matérias de cada habilitação. A Tabela 9 apresenta um
exemplo de currículo mínimo para um determinado curso e apresenta a distribuição de
carga horária entre as matérias do núcleo comum.
Tabela 9 – Distribuição de matérias e cargas horárias de um curso técnico.
Fonte: Parecer CFE 45/72
Hora-aula (h/a): 55min – ano com 30 semanas
156
Gráfico 4 - Distribuição de Carga Horária do núcleo comum definida pelo Parecer CFE 45/72.
Ao final da década de 1980, o processo de redemocratização das relações
institucionais, somado às mudanças no mundo do trabalho e à elaboração de uma nova LDB.
Existiu uma mobilização em torno da reformulação curricular no interior das instituições
federais pela implantação de um currículo comum da educação tecnológica baseada na
conexão entre ensino e trabalho, excluindo a oposição entre cultura e profissão.
A aprovação da LDB em 1996 significou, na verdade, somente o início de um
movimento de reformas na educação brasileira, que tomou corpo mediante as
regulamentações posteriores realizadas na estrutura educacional – no caso da educação
profissional, o decreto n. 2.208/97 – e outras no campo conceitual, objetivadas, no âmbito da
educação básica, pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, sejam do ensino fundamental, do
ensino médio ou da educação profissional de nível técnico. A elaboração dessas diretrizes
ficou a cargo da União – com a colaboração do Conselho Nacional de Educação –
considerando sua função de estabelecer, em colaboração com os estados, o Distrito Federal e
os municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o
ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar
formação básica comum. (Brasil, 1996, art. 9º, inciso IV). (CIAVATTA, 2012, p.21)
Em 1996 a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – a Lei 9394/96 –
alterou todo o ordenamento educativo. O artigo 26 define que
os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a
ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma
parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da
cultura, da economia e da clientela. (Lei 9394/96, Art. 26)
157
A oferta deve abranger obrigatoriamente “o estudo da língua portuguesa e da
matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,
especialmente do Brasil”. Definiu o ensino da arte, da língua estrangeira e a educação física
como componentes curriculares obrigatórios. Posteriormente, foram incluídas também, como
obrigatórios, o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena, o conteúdo de música e
as disciplinas de Filosofia e Sociologia em todas as séries do ensino médio.
Tendo por base na compreensão teórica e prática dos fundamentos científicos das
múltiplas técnicas utilizadas no processo produtivo – como princípio organizador do ensino
médio, defendida por educadores organizados por meio do Fórum Nacional em Defesa da
Escola Pública e constante na primeira versão do PL de LDBEN13 encaminhado ao Congresso
em 1988, não se efetivou no texto final, que, pelo seu caráter minimalista14, permitiu que o
governo, alinhado com uma nova concepção de capital humano, regulasse a separação formal
entre o ensino médio e a educação profissional por meio do Decreto 2208/97.
O decreto 2.208/97 altera a estrutura da educação profissional estabelecendo no
seu artigo 5º que “a educação profissional de nível técnico terá organização curricular
própria e independente do ensino médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou
sequencial a este”, introduzindo uma profunda alteração na organização curricular vigente
nos cursos técnicos de segundo grau, nos quais a formação técnica era realizada
conjuntamente ao ensino médio.
Vale ressaltar que o termo conjuntamente significa no decreto 2.208/97:
A expressão “conjuntamente” foi utilizada para referenciar esta forma de
organização daquele contexto uma vez que a expressão “integrado” irá aparecer na
documentação legal apenas na legislação atual, para caracterizar a forma de
organização curricular em que o curso será “planejado de modo a conduzir o aluno à
habilitação profissional técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino,
efetuando-se matrícula única para cada aluno” (Lei 9394/96, Art. 36-C, Inciso I).
Evita-se desta forma o uso corrente das expressões “integrado antigo” para referir-se
a cursos regidos pelo parecer CFE 45/72 e “integrado novo” para cursos regidos pela
atual LDBEN.
A educação profissional de nível médio passa a ser caracterizada como
complementar e o ensino médio retoma, legalmente, um sentido puramente propedêutico,
enquanto etapa final da educação básica. Esse decreto definia que o ensino técnico poderia ser
cursado na forma concomitante ou subsequente ao ensino médio. Assim, a educação
profissional constitui-se, novamente, em um sistema paralelo retornando à estrutura dualista e
13
LDBEN: Leis de Diretrizes Básicas da Educação Nacional estruturou a educação.
Caráter minimalista: compatível com Estado mínimo, ideia reconhecidamente central na orientação política
dominante. SAVIANI, Dermeval. A nova lei da educação: trajetória, limites e perspectivas. 5 ed. Campinas (SP):
Autores Associados, 1999
14
158
segmentada e mais uma vez rompe-se o conceito de equivalência, permitindo apenas a
articulação entre educação profissional e educação básica.
Este novo modelo de organização da educação profissional já estava sendo articulado
anteriormente à aprovação da LDBEN, por meio do PL 1.603/96, duramente contestado pelos
movimentos educacionais. Este PL foi abandonado pelo governo, a partir do entendimento
que o texto da LDBEN permitia a regulação por meio de um decreto, evitando o embate para
aprovação de uma lei no Congresso Nacional. Na sequência, o CNE emitiu pareceres e
resoluções com objetivo de regular a aplicação deste decreto. As diretrizes curriculares
nacionais para o ensino médio foram implantadas pela Resolução CNE/CEB 3/98.
Já a definição das diretrizes curriculares nacionais para a educação profissional de
nível médio foi feita por intermédio da Resolução CNE/CEB 04/99, baseada no Parecer
CNE/CEB 16/99, revogando o Parecer 45/72. Estes dispositivos definiram a organização dos
cursos técnicos sob a lógica de organização dos setores produtivos: os cursos deviam ser
organizados por áreas profissionais estruturadas por competências profissionais e com a
possibilidade de serem organizados em módulos, com certificações intermediárias.
Shiroma, Moraes e Evangelista (2003, p.11), tratando das políticas educacionais,
destacam como nos anos do governo FHC as decisões fecharam-se, distante “dos fóruns
democráticos e do debate”, “do rico consenso que educadores brasileiros construíram sobre
pontos básicos da educação brasileira, na luta pela democratização do país”.
Mais uma vez, no final do governo Lula da Silva e nos primeiros meses do governo
Dilma Rousseff, somos surpreendidos com a ressuscitação das Diretrizes Curriculares
Nacionais. Emanadas do CNE em 1998 para orientar a implantação do decreto n. 2.208/97,
foram maquiadas e reiteradas em 2004, após a revogação do mesmo decreto e a exaração do
decreto n. 5.154/04. Novamente em 2010, o relator da Câmara de Educação Básica, Professor
Cordão, ignorou a particularidade da introdução da alternativa formação integrada ao lado das
formas concomitante e subsequente de articulação entre ensino médio e educação profissional
(CIAVATTA, 2012).
O documento veio a lume no primeiro semestre de 2010, e o primeiro documento
alternativo de um Grupo de Trabalho, promovido pelo Ministério da Educação, reunindo
movimentos sociais, entidades científicas e setores do próprio Ministério, começou a ser
elaborado em meados do mesmo ano (Brasil, 2010). Em reunião convocada pelo Ministério
da Educação e Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (MEC/SETEC), realizada
em 23 de maio de 2011, os participantes elaboraram um documento que subsidiou a carta
encaminhada ao Presidente da Câmara de Educação Básica do CNG, divulgada neste número
159
da Revista Brasileira da Educação na seção Documentos, expondo suas divergências com o
Parecer Cordão (Brasil. CNE/CEB, 2011) e apresentando os pressupostos básicos do
documento alternativo que, neste texto, servirá de base para a análise crítica de alguns
aspectos mais gerais, fundantes do mesmo Parecer15.
A proposta do Parecer Cordão, relativo à atualização das DCNEP, inicia-se com um
histórico da educação profissional técnica de nível médio a partir da LDB de 1996,
destacando o conjunto de regulamentações provocadas pelo decreto n. 2.208/97.
Curiosamente, ressalta que essas permaneceram plenamente compatíveis com o decreto n.
5.154/2004, o que teria exigido do Conselho somente sua atualização promovida pelo Parecer
CNE/CEB n. 39/2004. Nesse momento, a finalidade de um novo parecer seria principalmente
explicitar orientações complementares em relação a eventuais pontos de divergência,
considerando, inclusive, as alterações introduzidas pela lei n. 11.741/2008.
Um novo modelo de educação profissional, centrado no desenvolvimento de
competências profissionais, organizadas por área profissional. A Resolução CNE/CEB 4/99
define que
as competências requeridas pela educação profissional, considerada a natureza do
trabalho, são as: I - competências básicas, constituídas no ensino fundamental e
médio; II - competências profissionais gerais, comuns aos técnicos de cada área; III competências profissionais específicas de cada qualificação ou habilitação.
(Resolução CNE/CEB 4/99, p.2).
As competências profissionais gerais de cada uma das vinte áreas foram explicitadas
no anexo da resolução. Porém,
[...] os perfis profissionais de conclusão de qualificação, de habilitação e de
especialização profissional de nível técnico serão estabelecidos pela escola. [...] A
organização curricular, consubstanciada no plano de curso, é prerrogativa e
responsabilidade de cada escola (Resolução CNE/CEB 4/99, p.2).
Outro fato que indica alterações primordiais na LDB pela Lei n. 11.741/2008, relativas
à educação profissional e tecnológica, incluindo a educação de jovens e adultos. Reiteramos
que tais alterações não exigiriam muito mais do que esclarecimentos e aprofundamentos de
alguns princípios e orientações. O relator reconhece que a educação profissional se situa na
confluência de dois direitos fundamentais do cidadão: o direito à educação e o direito ao
trabalho.
Reafirma Cordão que
15
Em janeiro de 2011, o Relator, Professor Aparecido José Cordão, apresentou ao CNE/CEB a nova versão de seu
Parecer (Brasil. CNE/CEB, 2011), incorporando expressões próximas ao conteúdo do documento alternativo do Grupo
de Trabalho, mas mantendo as ideias centrais de sua proposta.
160
Se não há discordâncias a esse respeito, nem quanto à necessidade de superação das
qualificações profissionais restritas aos postos de trabalho, também afirmada pelo
parecer, o mesmo não se pode afirmar sobre a suposição de que isto “determina a
emergência de um novo modelo de educação profissional centrado no
desenvolvimento de competências profissionais por eixo tecnológico” (BRASIL,
CNE/CEB, 2011, p. 17).
Outro fator é que o Parecer, após ratificar os princípios axiológicos definidos pela
DCNEM de 1998, com base nos quatro pilares da educação da UNESCO, aqui comentados,
dedica dez páginas para expor os fundamentos de sua proposta curricular baseada na
“CHAVE” para o entendimento do compromisso da educação profissional e tecnológica com
o desenvolvimento de competências profissionais” (Brasil, CNE/CEB, 2011, p. 20). E que a
palavra “CHAVE” sigla reúne os componentes da competência (conhecimento, habilidade,
atitude, valores e emoção) sendo eixo do argumento do parecer.
Trata-se de uma metáfora retificadora do poder econômico e social da educação tão
difundido na Teoria Capital Humano nas décadas 1950 a 1970. (CIAVATTA, 2012, p.21).
Este embate entre diferentes concepções de educacional profissional de nível médio
se acirrou no processo de construção das novas DCNs para EPT de nível médio: depois de um
longo processo de negociação, em setembro de 2012 foi aprovada a Resolução CNE/CEB
6/2012 que estabelece as novas DCNs – obrigatórias a partir do início do ano de 2013 –,
revogando definitivamente a Resolução CNE/CEB nº 4/99 e da Resolução CNE/CEB nº
1/2005.
Cunha (2000) detalha as dificuldades materiais e políticas da aplicação da legislação
profissional
[...] falta de recursos humanos e materiais, especialmente das escolas públicas;
expansão da oferta dos cursos de menor custo; sobrecarga das escolas industriais da
rede federal – usadas como paradigma desta reforma –; insatisfação dos
profissionais de educação, tanto os das disciplinas da parte geral – que viam sua
importância diminuída –, como os da parte especial – que temiam a desvalorização
da profissão de técnico industrial com a expansão da oferta –; rejeição dos
estudantes pela diminuição da carga horária das disciplinas que interessavam para o
exame vestibular; críticas da iniciativa privada em educação pelo custo elevado da
formação profissional, etc. (CUNHA, 2000, p.50).
Diante dos fatos e fundamentos supracitados resta demonstrado que a política da
educação, dos trabalhadores e sua regulamentação curricular expressam as marcas do Estado
que constrói na consolidação do capitalismo comprometido com interesses burgueses. E as
regulamentações sempre cumpriram a finalidade de obtenção de consentimento dos
governados, seja pela coerção, ou revestida hegemonial. Assim, a política curricular constrói e
reconstrói para adequar a realidade social vigente. E nas últimas décadas têm crescido este
processo conflituoso, gerando, para os formadores de política novos olhares para a educação
161
que resgate o princípio constitucional da dignidade humana. Já que, na construção de
hegemonia pelos trabalhadores, o conhecimento torna-se mediação de uma relação
pedagógica entre os grupos sociais.
Na próxima seção será abordado a educação profissional – PROEJA – política
curricular no IFTM.
4.2 PROEJA - POLÍTICA CURRICULAR NA REDE FEDERAL
Antes de passar a uma explicação mais detalhada sobre a política curricular no
PROEJA, vale formalizar dois termos – políticas públicas e programas públicos. Isso é
importante para circunstanciar os limites do campo do diálogo estabelecido no texto, já que
formulação de política pública e formação de programas públicos são termos muito
imbricados, mas referem-se a contextos diferentes (em amplitude) da análise de intervenção
estatal.
As decisões que formam política pública – distributiva – redistributiva ou regulatória
– assumem diferentes formatos: podem ser enunciados de diretrizes estratégicas de governo,
leis e decretos normativos, que especificam de forma mais clara e operacional tais diretrizes,
criação de organizações ou programas que vão conferir operacionalidade às diretrizes, leis,
normas (VILLANUEVA, 2006).
O programa público é, pois, um dos instrumentos operacionais das políticas públicas.
Mais especificamente, trata-se de um conjunto sistêmico de ações programadas e articuladas
entre si com objetivo de atender uma demanda específica, encampada na agenda de
prioridades de políticas públicas do Estado ou governo. Assim, um programa social é um
conjunto de atividades direcionadas para solucionar um problema vivenciado pela sociedade,
no seu todo ou por grupo (ROSSI et al., 2004).
Segundo Owen (2007) na análise de política trata do contexto político-social do
surgimento da política, dos atores participantes. Volta-se mais ao exclusivamento de seu
processo de construção do que da recomendação prática de como aprimorá-lo, constituindo,
na realidade, um campo de investigação mais acadêmico que a perspectiva técnica –
profissional em que se realiza a avaliação em que se realiza a avaliação de programa.
No limiar dos sete anos da Lei 11.892/2008 compreender o significado da Rede
Federal ainda constitui algo desafiador. Na perspectiva da ampliação social do seu
significado, busca compreender a Rede Federal enquanto espaço de formação para o trabalho
e a melhoria da qualidade de ensino na educação básica. Assim, a Rede Federal configura-se
162
numa estrutura planejada para oportunizar educação profissionalizante de maneira abrangente,
voltada às conquistas científicas e tecnológicas com vistas ao desenvolvimento regional e
local e ampliação ao acesso qualificação ao mundo do trabalho.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei no
9.394/1996 (BRASIL, 1996), a educação brasileira é organizada em dois níveis – educação
básica e educação superior – e respectivas etapas de ensino. A educação profissional e
tecnológica, por sua vez, está prevista como modalidade educacional que se integra aos
diferentes níveis e etapas de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e da tecnologia.
Assim, os cursos de educação profissional e tecnológica se articulam com a educação básica e
com a educação superior e, ainda, com as modalidades de educação de jovens e adultos e de
educação a distância.
Nessa perspectiva, a oferta educacional das instituições que integram a Rede Federal
abrange tanto a educação básica quanto a educação superior e, transversalmente, como
modalidade, a educação profissional e tecnológica (Figura 8).
Figura 8 – Organização dos níveis e etapas da educação brasileira em articulação com a
educação profissional e tecnológica
Fonte: Equipe de sistematização do documento orientador (2014)
Os cursos ofertados pela Rede Federal incluem cursos de:
• formação inicial e continuada ou de qualificação profissional, ministrados de forma
livre ou articulados com o ensino fundamental ou com o ensino médio;
163
• educação profissional técnica de nível médio (cursos técnicos);
• educação superior de graduação (licenciaturas, cursos superiores de tecnologia ou
bacharelados); e
• educação superior de pós-graduação lato (especialização) e stricto sensu (mestrado e
doutorado).
Pelo gráfico 5, pode-se observar que os cursos técnicos e os FIC, juntos, concentram
aproximadamente 55% da oferta educacional da Rede Federal. Dada a importância, as
características relativas a essas ofertas são detalhadas, à sequência.
Gráfico 5 – Distribuição de matrículas em cursos ofertados pela Rede Federal de 2009 a 2013.
Fonte: SISTEC/MEC, extração em dezembro de 2013.
Os cursos de educação profissional técnica de nível médio (cursos técnicos) têm por
finalidade proporcionar ao estudante conhecimentos, saberes e competências profissionais
necessários ao exercício profissional e da cidadania, com base nos fundamentos científicotecnológicos, sociohistóricos e culturais (BRASIL, 2012), cuja conclusão enseja a emissão de
diploma de técnico de nível médio. Tais cursos são desenvolvidos nas seguintes formas:
a) articulada integrada, ofertada somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental,
com matrícula única na mesma instituição, promovendo habilitação profissional técnica de
nível médio do estudante e conclusão da última etapa da educação básica.
b) articulada concomitante, ofertada a quem ingresse no ensino médio ou já o estejam
cursando, efetuando-se matrículas distintas para cada curso, e podendo ocorrer:
• na mesma instituição de ensino;
164
• em instituições de ensino distintas; e
• em instituições de ensino distintas, mediante convênios de intercomplementaridade,
visando ao planejamento e ao desenvolvimento de projeto pedagógico unificado.
c) subsequente, ofertada a quem já tenha concluído o ensino médio.
Os cursos técnicos podem ser também desenvolvidos na modalidade de educação de
jovens e adultos19. Cabe ressaltar que, com objetivo de ampliar as oportunidades de acesso à
educação profissional e tecnológica para jovens e adultos, foi instituído, por meio do Decreto
nº 5.840, de 2006, técnicos nas formas articulada integrada ou articulada concomitante ao
ensino médio com projeto pedagógico unificado (PROEJA Técnico). O Programa Nacional de
Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de
Jovens e Adultos (PROEJA), por meio do qual são desenvolvidos, entre outros, cursos
técnicos nas formas articulada integrada ou articulada concomitante ao ensino médio com
projeto pedagógico unificado (PROEJA Técnico).
Porém, estas metas de ampliar o espectro de ação na área educacional com foco na
profissionalização foram consolidadas devido à política pública da expansão da Rede Federal
da Educação Profissional.
A rede federal passa por uma grande expansão pautada por motivações de naturezas
distintas. Por um lado, o crescimento do País pressionou a demanda por mão de obra
qualificada. Por outro lado, viu-se uma oportunidade quanto à convergência espacial da
expansão da rede com outras políticas públicas voltadas para o desenvolvimento regional. A
esses dois vetores somou-se o entendimento de que a interiorização das escolas técnicas,
reinstitucionalizadas em Institutos Federais, poderia contribuir para o desenvolvimento das
microrregiões menos desenvolvidas.
Segundo as metas de expansão divulgadas pelo Governo Federal, a Rede Federal de
Educação Profissional passará de 140 escolas, em 2003, para um total de 562, em 2014. Essa
expansão está se dando de forma sucessiva e continua, e pode ser dividida em três fases, cada
uma informada por um conjunto de critérios que define a localização dos novos campi,
conforme mostrado na tabela a seguir.
19
A educação de jovens e adultos é destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no
ensino fundamental e médio na idade própria, conforme previsto no art. 37 da LDB.
165
Tabela 10 – Critérios de escolha dos lugares dos novos campi por fase da expansão.
Fase da Expansão
Fase I (2003 a
2010)
Fase II
(2011/2012)
Fase III
(2013/2014)
Critérios
a) Proximidade da escola aos arranjos produtivos instalados em níveis local e
regional;
b) Importância do município para a microrregião da qual faz parte;
c) Valores assumidos pelos indicadores educacionais e de desenvolvimento
socioeconômico;
d) Existência de potenciais parcerias para a implantação da futura unidade;
e) Atender a pelo menos uma das três seguintes diretrizes: e.1) estar
localizada em uma Unidade da Federação que ainda não possui instituições
federais de educação profissional e tecnológica instaladas em seu território;
e.2) estar localizada em alguma das regiões mais distantes dos principais
centros de formação de mão de obra especializada; e.3) nos casos em que o
município selecionado pertencer a uma região metropolitana, a escola deverá
estar situada nas áreas de periferia.
a) Distribuição equilibrada das novas unidades (distância mínima de 50 km
entre os novos campi);
b) Cobertura do maior número possível de mesorregiões;
c) Sintonia com os arranjos produtivos locais;
d) Aproveitamento de infraestrutura física existente;
e) Identificação de potenciais parcerias.
a) População dos Estados em relação à população total do Brasil;
b) Presença das redes federal e estadual de educação profissional e
tecnológica nos Estados (esta última apoiada pelo Programa Brasil
Profissionalizado);
c) Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de cada Estado;
d) Jovens de 15 a 24 anos cursando os últimos anos do ensino fundamental
(6º ao 9º ano) em relação à população jovem do Estado;
e) Número de mesorregiões e municípios presentes em cada unidade da
Federação.
Fonte: Setec/MEC.
Interiorização da rede. Outro dado reforça essa constatação: 176 campi estão em
municípios com menos de 50.000 habitantes e, destes, 45 estão em municípios com menos
de 20.000 habitantes.
Tabela 11 – Quantitativo de campi da Rede Federal de Ensino Profissionalizante, por Região e fase de
expansão.
Pré-existentes
2003-2010
2011-2012
2013-2014
Total
Norte
Nordeste
13
18
8
14
53
49
68
25
52
194
Centrooeste
11
21
18
14
64
Sudeste
Sul
Total
39
66
18
23
146
28
41
19
17
105
140
214
88
120
562
Fonte: Elaboração própria a partir de dados extraídos do Sistec.
A análise dos critérios presentes na tabela 10 revela um conjunto de motivações
de naturezas distintas. Por um lado, o crescimento do País pressionou a demanda por mão
166
de
obra
qualificada.
Por
outro
lado,
a
interiorização
das
escolas
técnicas,
reinstitucionalizadas em Institutos Federais de Educação Profissional, poderia contribuir
para o desenvolvimento das microrregiões menos desenvolvidas.
Assim, a expansão teve duas direções: a) a ampliação do número de vagas e
infraestrutura das escolas pré-existentes com a construção de novos campi nas regiões
metropolitanas, de modo a fazer frente ao dinamismo econômico dessas regiões; b) a
interiorização dos institutos, visando ocupar os lugares de maior carência socioeconômica.
Figura 9 – Expansão da Rede Federal de Ensino Profissionalizante
Fonte: Elaboração própria a partir de dados extraídos do Sistec e do IBGE.
A Tabela 11 apresenta a expansão segmentada por Região. Como se pode inferir, o
Nordeste conterá aproximadamente 35% das escolas/campi instalados em 2014. Essa
concentração é consequência dos critérios de implantação utilizados nas diferentes fases da
expansão, que sistematicamente aprofundaram o vetor de redução das desigualdades
regionais. Cabe observar que 85% das escolas/campi estarão fora das capitais estaduais, o que
reforça a preocupação com a interiorização dos IF’s.
Nesse contexto, destaca-se a importância de retomar a história da educação
profissional e tecnológica, salientando que a ênfase seja deslocada para a questão social
quando postulam que “é no enlace dessa trajetória centenária com o futuro que já se faz
167
presente que os Institutos Federais assumem seu verdadeiro papel social, contribuindo para
uma sociedade menos desigual, mais autônoma e solidária” (BRASIL, MEC/SETEC, 2008,
p.10).
A proposta de uma institucionalidade aos IF’s que contribua para uma sociedade
menos desigual, que esteja “comprometida com o todo social, como algo que funda a
igualdade na diversidade”. Esta é a bandeira da rede federal de educação.
Contudo, o exame dessa política defendida pelo governo Lula e que se mantém no
atual governo requer atenção aos enfoques e práticas presentes no processo de organização
dos Institutos Federais. Apesar da retórica do governo Lula sinalizar um compromisso com a
reorganização do sistema educacional tendo como perspectiva a superação das desigualdades
sociais presentes na realidade brasileira, Frigotto adverte que a burguesia brasileira impediu
“a construção de um projeto nacional de desenvolvimento, mediante reformas estruturais que
permitissem reduzir a desigualdade social” (FRIGOTTO, 2009, p.73). Portanto, jamais “se
colocou de fato o projeto de uma escolaridade básica e formação técnico-profissional como
direito social e subjetivo, para a maioria dos trabalhadores, apesar dos dados apresentados
mostrar um crescimento vertiginoso dos Institutos Federais, porém, a política educacional
profissionalizante entraves porque os formulários da política vê a educação como política de
governo e não política de Estado, consequentemente, há fragmentação na educação
profissional e os programas resultam em descontinuidade, interrupção e resultados pífios, em
desperdício de recursos públicos (MOURA, 2005; FRIGOTTO; CIAVATTA, 2005).
4.2.1 PROEJA dimensão curricular Rede Federal – Evasão e Repelência
Na realidade, a formulação de políticas configura-se como um processo que envolve
a interação de muitos agentes, com diferentes interesses. É marcada por apoios entusiasmados
de alguns, resistências legítimas ou não de outros. Está repleta de avanços e retrocessos, com
desdobramentos não necessariamente sequenciais e não plenamente antecipáveis. Como
observam Jann & Wegrich (2007):
Policy process rarely features clear-cut beginnings and endings. At the same time,
policies have always been constantly reviewed, controlled, modified and sometimes
even terminated; policies are perpetually reformulated, implemented, evaluated and
adapted…. Moreover, policies do not develop in a vacuum, but are adopted in a
crowded policy space that leaves little space for innovation[…] (JANN; WEGRICH,
2007, p.44-45)
168
Contudo, na visão de Howlett & Ramesh (2003), esse modelo de representação tem a
grande virtude de facilitar o entendimento do processo complexo de interação de diversos
agentes, nos múltiplos estágios por que passa a formulação de políticas públicas, oferecendo
um marco metodológico geral para análises isoladas de cada etapa do processo ou das
relações de cada uma com as demais, à frente ou à jusante.
E a construção de indicadores de monitoramento da ação governamental é tão ou
mais antiga que a própria avaliação de programas públicos, se forem consideradas as medidas
de performance mais geral do setor público baseadas na entrega de obras e produtos e na
computação de indicadores de custos de serviços, a partir da execução orçamentária. Como
registram Mcdavid e Hawthorn (2006) em livro que procura oferecer uma visão integrada
entre avaliação de programas e medição do desempenho governamental:
While we have tended to situate the beginnings of performance measures in the
United States, in the 1960s, with the development of performance management
systems such as programmed planned budgeting systems (PPBS)[…] there is good
evidence that performance measurement and reporting was well-developed in some
American local governments early in the 20th century. (MCDAVID; HAWTHORN,
2006, p.283).
Figura 10: Integração de informações de diferentes fontes na estruturação de um Sistema de
Indicadores de Monitoramento
Fonte: Estudo Técnico n.º 07/2013
Para um e para outro gestor, os indicadores devem ser os pertinentes à sua esfera de
decisão, ajustados à referência temporal e territorial que lhes compete e interessa.
169
Neste momento se faz avaliar o nível de evasão e retenção do Programa PROEJA,
nível federal como um indicador de análise da política curricular do PROEJA disposta na
Diretrizes Curriculares Nacionais e sua estrutura no Projeto Pedagógico vivenciado no
PROEJA Agroindústria no Campus Uberaba.
4.2.1.1 Evasão dos Institutos Federais
Segundo dados do Tribunal de Contas da União (2013):
A evasão representa problema que alcança diferentes modalidades de ensino em
maior ou menor medida. No Brasil, a educação profissional não foge a essa regra, sendo um
importante vazamento que impede que boa parte dos alunos concluam seus respectivos
cursos. A meta de 90% para a taxa de conclusão prevista no Projeto de Lei do Plano Nacional
de Educação 2011-2020, ou mesmo da taxa de 80% para todas as modalidades de cursos
ofertados pelos institutos prevista no Termo de Acordo de Metas, aparentemente, ainda é um
ideal de longo-prazo. Quando se analisam as taxas de conclusão em nível nacional se situam
em 46,8% para o médio integrado, 37,5% para o Proeja, 25,4% para a Licenciatura, 27,5%
para o Bacharelado e 42,8% para os cursos de tecnólogo. Em termos de estratégias de
combate à evasão, será observado que muitas vezes a atuação dos campi, de determinado
Instituto Federal, dá-se de forma isolada em relação aos demais. Constatou-se também
oportunidade de aperfeiçoar os instrumentos voltados ao acompanhamento periódico da
elevação gradual da taxa de conclusão dos cursos.
Diante da relevância desse tema, o presente capítulo discorre sobre a caracterização
da evasão nos principais cursos ofertados pelos Institutos Federais. Adicionalmente,
demonstra que é oportuno o acompanhamento, de modo conjugado, de três tipos de
indicadores – de evasão, retenção e conclusão – para corretamente monitorar essa evasão.
Foram escolhidos três cursos de nível médio (Proeja Médio, Subsequente Médio e Integrado
Médio) e três cursos de nível superior (Licenciatura, Bacharelado e Tecnólogo) para ilustrar a
aplicação dos indicadores. (TCU – 2013)
E este critério para escolha desses cursos foi a exigência legal, presente no art. 8º da
Lei 11.892/2008, de que 50% das vagas ofertadas pelos Institutos Federais fossem garantidas
para alunos de ensino médio, prioritariamente na modalidade integrado. E que 20% fossem
ofertados para cursos de licenciatura. Os demais cursos foram escolhidos por apresentarem
quantidade considerável de cursos e alunos. (TCU – 2013)
170
Já que o Projeto de Lei do Plano Nacional de Educação (2011–2020) estipula, no
item 11.10, que trata do aumento da oferta de educação profissional técnica de nível médio, a
elevação gradual da taxa de conclusão para 90%. Deve ser destacado que a mesma meta para
o ensino superior, presente no item 12.3, restringiu-se às Universidades Públicas, não tendo
sido estendida aos Institutos Federais. Também é mencionado, o dever de se preservar à
qualidade da educação ao realizar o aumento da participação dos alunos no nível médio. A
importância do princípio de preservação da qualidade produz reflexos nas estratégias de
combate à evasão. Ou seja, a evasão não deve ser combatida por meio da diminuição da
qualidade do ensino ministrado nem por meio de políticas que, de forma artificial, façam com
que os alunos, sem a devida qualificação, passem de ano ou não repitam mesmo sem ter nível
para aceder a séries mais elevadas. (TCU – 2013)
Pontual aponta, que os Institutos Federais ofertam cursos para públicos bastante
heterogêneos. Por exemplo, nos cursos de nível médio integrado, os alunos não apresentam
retenções substanciais em seus históricos escolares, sendo compostos, na sua maioria, por
estudantes adolescentes. Já nos cursos de nível médio do Proeja os alunos são jovens ou
adultos que, em sua maioria, apresentam histórico de retenções escolares e que há algum
tempo não frequentavam a escola.
O SISTEC, diferentemente do Censo Escolar, tem a vantagem de registrar
efetivamente a vida do estudante ou de um conjunto de estudantes (ciclo de matrículas) na
instituição, desde seu ingresso até sua saída, e as mudanças que ocorrem durante esse período.
Isso permite o acompanhamento dos indicadores de conclusão, evasão e retenção dentro de
um mesmo ciclo. A Figura 11, a seguir, apresenta esquematicamente a organização do ciclo
de matrícula no SISTEC e a Figura 12 descreve as possibilidades de situação (status) de
matrícula dos estudantes em um ciclo.
171
Figura 11 – Organização do ciclo de matrícula no SISTEC.
Fonte: Equipe de sistematização do documento orientador (2014)
Figura 12 – Possibilidades de situação (status) de matrícula dos estudantes no SISTEC em um
ciclo.
Fonte: Equipe de sistematização do documento orientador (2014)
Com base nos dados extraídos do Sistec, é possível calcular as taxas de Alunos
Evadidos, Alunos em Curso e Alunos Concluintes, conforme observado na Tabela 12. Ao se
calcular a Taxa de Alunos Evadidos, os cursos com pior situação, ou seja, com maiores taxas
de evasão, são os de nível médio: principalmente cursos de Proeja (24%) e cursos Médios
Subsequentes (19%). Pontuando, neste dado TCU, necessário se faz a releitura da política
curricular do PROEJA, para elencar os entraves, conforme tabela abaixo:
172
Tabela 12 - Alunos Evadidos, Em Curso e Concluintes, por tipos de cursos, de ciclos de matrícula
iniciados a partir de 2004 e encerrados até dezembro de 2011.
Indicador / Tipo de
curso
Quantidade de
Ciclos de
Matrícula*
Quantidade de
alunos dos cursos
Percentual de
Evadidos
Percentual de
Alunos em Curso
Percentual de
Concluintes
Proeja
Médio
Nível Médio
Subsequent
e Médio
Integrado
Médio
Licenciatu
ra
Nível Superior
Bacharela
Tecnólogo
do
287
1.544
483
163
107
739
5.836
59.871
16.066
3.084
2.538
21.762
24,0%
18,9%
6,4%
8,7%
4,0%
5,8%
37,9%
49,3%
44,4%
64,5%
68,1%
50,8%
37,5%
31,4%
46,8%
25,4%
27,5%
42,7%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados brutos extraídos do Sistec.
Obs: Os dados referem-se a ciclo de matrículas que terminaram até o primeiro semestre de 2011.
* Ciclos de Matrícula representa uma agregação de cursos: por exemplo, o ciclo de matrícula do curso médio
integrado de química de determinado campus abrange todos os cursos (diurnos, noturnos, integrais e a
distância) médios integrados de química ministrado nesse campus.
Apesar de o ensino médio apresentar maiores taxas de evasão, essa situação pode vir
a se modificar no futuro, momento em que se terá convicção sobre o destino dos alunos na
situação ‘em curso’. Assim, observa-se que para a avaliação da evasão faz-se necessário
acompanhar não somente indicadores de evasão, mas também indicadores de retenção (atraso
relativo de alunos ‘em curso’) e de conclusão (taxa de conclusão dos alunos).
O grande número de alunos “em curso” sugere que devem ser analisados os padrões
de retenção ou atraso estudantil vivenciado pelos alunos. A premissa é que alunos com maior
nível de atraso são mais propensos a evadir.
Observa-se na Tabela 13, que, para todos os cursos, a maior parte dos alunos
apresenta retenção moderada, de até um ano. Os cursos de nível médio apresentam menor
quantidade de retenção do que os de nível superior. Para cursos como Licenciatura,
Bacharelado e Tecnólogo temos que 43%, 44% e 37% respectivamente dos alunos apresentam
retenção superior a um ano. Esses percentuais são muito menores para os cursos médios (22%
para o Proeja, 35% para o Subsequente e 17% para o Integrado). (TCU – 2013)
173
Tabela 13 - Alunos em retenção por diferentes prazos e diferentes cursos, de ciclos de matrícula
encerrados até dezembro de 2011.
Indicador / Tipo de
curso
Quantidade de alunos
com retenção
Quantidade de alunos
com retenção de até 1
ano
Quantidade de alunos
com retenção entre 1 e 2
anos
Quantidade de alunos
com retenção entre 2 e 3
anos
Quantidade de alunos
com retenção de mais de
3 anos
Proeja
Médio
Nível Médio
Subsequent
e Médio
Integrado
Médio
Nível Superior
Bacharelad
Licenciatura
Tecnólogo
o
2.217
29.541
7.137
1.990
1.728
11.060
1.723
(77,8%)
19.445
(65,8%)
5.894
(82,6%)
1.133
(56,9%)
957
(55,4%)
6.922
(62,6%)
400
(18,0%)
8.915
(30,2%)
986
(13,8%)
583
(29,3%)
450
(26,0%)
2.643
(23,9%)
94
(4,2%)
781
(2,6%)
230
(3,2%)
121
(6,1%)
295
(17,1%)
942
(8,5%)
0
(0%)
400
(1,4%)
27
(0,4%)
153
(7,7%)
26
(1,5%)
553
(5,0%)
Fonte: Elaboração própria a partir de dados brutos extraídos do Sistec.
Para exemplificar a necessidade de acompanhar a evasão, por meio dos três tipos de
indicadores propostos, tem-se na Tabela 14 que a Taxa de Evasão estimada para determinado
momento do tempo pode ser considerada o mínimo desse indicador em determinado período.
Por sua vez, o máximo da taxa de evasão é obtido pela fórmula (100% - Taxa de Conclusão
(%)). A evasão final somente poderá ser computada no futuro, contudo, pode-se estimar a
probabilidade da taxa de evasão se situar mais próxima do mínimo ou do máximo pela
quantidade de alunos com atrasos significativos ou com retenção alta.
Tabela 14 – Conjugação de indicadores para acompanhamento da Evasão.
Mínimo de Evasão
Taxa de Evasão
PROEJA Médio
Taxa de Evasão =
24,0%
Licenciatura
Taxa de Evasão = 8,7%
Aumento na Probabilidade de Evasão
Quantidade de Alunos com Prazo de
Retenção Alto Aumenta
Exemplos
Máximo de Evasão
(100% – Taxa de Conclusão)
Taxa de Retenção – Mais de um ano
Taxa de Retenção = 21,8%
(100% – Taxa de Conclusão)
(100% – 37,5%) = 62,5%
Taxa de Retenção – Mais de um ano
Taxa de Retenção = 43,0%
(100% – Taxa de Conclusão)
(100% – 25,4%) = 74,6%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados brutos extraídos do Sistec.
Observa-se da Tabela 14 que o curso de Proeja apresenta um mínimo de evasão três
vezes maior que o mínimo da Licenciatura. Contudo, a Licenciatura possui um máximo
potencial superior ao do Proeja e também possui maior quantidade de alunos com prazo de
retenção alto, o que leva a uma maior probabilidade da taxa de evasão aumentar mais do que
no caso do Proeja.
174
Partindo dos dados expostos pelo Tribunal de Contas da União, órgão de controle
externo, art. 1º, I, lei 8.443, de 16 de julho 1992: “[...] julgar as contas de qualquer pessoa
física ou jurídica, pública ou privada arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e
valores públicos [...] (grifo nosso) ”.
Necessário se faz analisar a política curricular e os parâmetros de sua eficácia e
eficiência, já que, são vidas em curso, são ideias de luta, são horizontes a serem construídos. E
o direito a educação é a base das pilastras de uma sociedade mais justa. Segundo Miguel
Reale (2003) a justiça não é o mesmo que liberdade, nem coincide com a igualdade, a ordem
ou a segurança. A justiça é a “condição primeira de todos eles, a condição transcendental de
sua possibilidade com atualização histórica. E a mais fundamental de todas as finalidades
humanas, vez que se encontra vinculada às raízes da essência humana.
Para analisar a política pública curricular, necessário se faz análise do discurso para
focalizar os atos normativos no contexto social.
Bernstein (1996) dispõe que as práticas pedagógicas contêm possibilidades de
mudança e serem importantes para a transformação cultural, Morais, Neves e Pires (2004), em
seus estudos sobre Bernstein, realizam pesquisas sobre as características sociológicas da
prática pedagógica e suas relações com o desenvolvimento científico dos alunos para
identificar
as características da prática pedagógica que mais contribuem para o
melhor
aproveitamento científico dos alunos – sucesso dos alunos.
[...] a análise sugere que quando a prática pedagógica é pobre ao nível do que
é caracterizada, ao nível do como, por um fraco enquadramento nos critérios de
avaliação, por uma forte classificação entre o espaço da professora
e o espaço dos alunos e também por uma forte classificação nas
relações
intradisciplinares e por um forte enquadramento nas regras hirárquicas alunoaluno, há um baixo nível de aprendizagem científica e um aproveitamento diferencial
elevado entre os alunos. Ao contrário, quando há uma boa prática pedagógica ao
nível do que e, ao nível de como, a prática é caracterizada por um forte
enquadramento quanto aos critérios de avaliação, por uma fraca classificação nas
relações intra-disciplinares e por um fraco enquadramento nas regras hirerárquicas
aluno-aluno, há um elevado nível de aprendizagem científica e um aproveitamento
diferencial baixo entre os alunos (MORAIS; NEVES; PIRES, 2004, p. 15-16).
As autoras concluem em suas pesquisas que o efeito da prática pedagógica pode
sobrepor-se ao efeito do nível socioeconômico familiar dos alunos, no sentido da
aprendizagem e do desenvolvimento, inclusive das competências cognitivas complexas,
não necessitando, portanto, baixar o nível de exigência conceitual para o sucesso de todos
os alunos.
[...] o efeito da prática pedagógica se pode sobrepor ao efeito do nível
socioeconômico familiar dos alunos, mesmo quando o aproveitamento dos alunos se
refere ao desenvolvimento de competências cognitivas complexas. Este é um
175
resultado de extrema importância se considerarmos que é ao nível do
desenvolvimento das competências cognitivas complexas que os alunos,
particularmente os mais desfavorecidos, tendem a revelar maiores dificuldades. O
facto de a prática pedagógica poder esbater diferenças a este nível, entre alunos
sociologicamente diferenciados, mostra que não há necessidade de baixar o nível de
exigência conceptual no processo de ensino-aprendizagem para que todas as
crianças sejam bem sucedidas na escola. Pelo contrário, se a prática pedagógica
possuir características favoráveis à aprendizagem de todas as crianças, elevar o nível
de exigência conceptual constitui um passo crucial para que todas tenham acesso a
um elevado nível de literacia científica e, consequentemente, tenham acesso ao texto
científico mais valorizado, quer pela comunidade científica, quer pela sociedade em
geral. (MORAIS; NEVES; PIRES, 2004, p. 20-21).
O autor ainda explica que são os códigos que regulam as relações entre os contextos
e no interior dos contextos, gerando as regras de reconhecimento e regras de realização.
[...] As regras de reconhecimento criam os meios que possibilitam efetuar distinções
entre os contextos e, assim, reconhecer a peculariedade daquele contexto. As regras
de realização regulam a criação e produção de relações especializadas internas
àquele contexto. Ao nível do sujeito, diferenças no código implicam diferenças nas
regras
de
reconhecimento
e
nas
regras
de
realização.
[...]
(BERNSTEIN, 1996, p. 30).
As regras de reconhecimento podem ser inapropriadas e, consequentemente, as
regras de realização também inapropriadas; ou as regras de reconhecimento podem ser
apropriadas, porém as regras de realização, inapropriadas (BERNSTEIN, 1996, p. 85).
De acordo com Nascimento (2006, p.04), os docentes podem dominar as regras de
reconhecimento de um discurso considerado pelos seus idealizadores como inovador, por
reconhecerem as principais aplicações dessas mudanças práticas. E, no entanto, podem não
dominar as regras de realização desse discurso.
Portanto, as intenções explícitas no PROEJA são coerentes com as políticas públicas
para educação profissional e tecnológica, porém, os dados evasão, retenção e repetência
(TCU- 2003) revelam que o currículo integrador tendo suas pilastras na interdisciplinariedade
há fraturas na aplicação do programa que deverão ser analisadas na implementação desta
política pública devido os dados apresentados pelo SETEC, TCU/2013, demonstram que as
metas de alfabetização propostas não foram alcançadas e que há falhas no processo de ensino
aprendizagem devido o nível de evasão e repetência no PROEJA, considerado alto. Assim, as
propostas como aparecem no texto legal precisam externalizar o cuidado de não vender falsas
promessas. O documento assinala que o PROEJA não é garantia de emprego e de melhoria
material, mas acena a possibilidade de os alunos alcançarem esses objetivos (BRASIL, 2007,
p.36).
176
4.2.2 PROEJA: análise política curricular no IFTM
Apresentamos as matrizes curriculares de referência para os cursos técnicos do
Programa de Integração da Educação Profissional /PROEJA.
O PROEJA Agroindústria iniciou 2007 a primeira turma modalidade integrada e a
segunda turma em 2008 na modalidade concomitante com parceria com a Escola Estadual
Santa Terezinha.
Art. 1. § 1o O PROEJA abrangerá os seguintes cursos e programas de educação
profissional: I - formação inicial e continuada de trabalhadores; e II - educação profissional
técnica de nível médio. § 2o Os cursos e programas do PROEJA deverão considerar as
características dos jovens e adultos atendidos, e poderão ser articulados: I - ao ensino
fundamental ou ao ensino médio, objetivando a elevação do nível de escolaridade do
trabalhador, no caso da formação inicial e continuada de trabalhadores, nos termos do art.
3o, § 2o, do Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004; e 55 II - ao ensino médio, de forma
integrada ou concomitante, nos termos do art. 4o, § 1o, incisos I e II, do Decreto nº 5.154, de
2004. (BRASIL, 2007, p. 55)
[...] Art. 4º: Os cursos de educação profissional técnica de nível médio do PROEJA
deverão contar com carga horária mínima de duas mil e quatrocentas horas, assegurando-se
cumulativamente: I - a destinação de, no mínimo, mil e duzentas horas para a formação
geral; II - a carga horária mínima estabelecida para a respectiva habilitação profissional
técnica; (BRASIL, 2007, p. 56-57).
Em relação à carga horária as matrizes foram pensadas de modo a cumprir as 2.400
horas propostas pela lei; portanto, cada curso deverá observar suas peculiaridades e fazer as
adequações necessárias.
A matriz elaborada foi organizada da seguinte forma: 1ª turma ofertou o PROEJA e
forma integrada e a 2ª (turma) na concomitante.
Nesse sentido, a proposta aqui apresentada aplica-se ao que prevê a Resolução nº 4,
de 13 de julho de 2010, no art. 32, I, II.
Art. 32. A Educação Profissional Técnica de nível médio é desenvolvida nas
seguintes formas:
I - articulada com o Ensino Médio, sob duas formas:
a) integrada, na mesma instituição; ou
b) concomitante, na mesma ou em distintas instituições;
II - subsequente, em cursos destinados a quem já tenha concluído o Ensino Médio.
177
Esta proposta de Matriz Curricular é uma referência, e cada instituição tem
autonomia para a organização dos seus projetos político-pedagógicos para o sistema e-Tec
Brasil, observando uma margem de até 20% para atender as conformidades de sua realidade
socioeconômica, preservando a articulação entre o ensino médio e a educação profissional
técnica de nível médio, considerando sempre a articulação com o previsto no § 4º do artigo 1
do Decreto 5.840/2006, e ainda o § 2º do artigo 32 da Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010,
ao propor que:
§ 2º Os cursos técnicos articulados com o Ensino Médio, ofertados na forma
concomitante, com dupla matrícula e dupla certificação, podem ocorrer: I - na mesma
instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis; II - em
instituições de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis;
III - em instituições de ensino distintas, mediante convênios de intercomplementaridade, com
planejamento e desenvolvimento de projeto pedagógico unificado. (BRASIL, 2010b, p.11).
Em todas as direções é preciso considerar as indicações dos documentos normativos
para a incorporação ao projeto pedagógico interinstitucional único, priorizando as
concepções, princípios e diretrizes estabelecidas para a oferta integrada. Ao fazer esse
movimento, a instituição deverá propor a reorganização das dimensões conceituais, das bases
conceituais/tecnológicas e suas ementas, observando a integração com os respectivos
componentes já presentes nesse documento, levando em consideração que um dos princípios
do PROEJA é a integração entre os saberes.
Seguindo a orientação (BRASIL, 2007, p.11) os documentos a seguir não apresentam
uma organização separada em relação às dimensões conceituais e teórico-práticas por
disciplinas, mas o que se pretende é que tais dimensões possam indicar uma coerência em
relação aos saberes da formação geral e da habilitação profissional técnica, bem como a
valorização e o aprofundamento daqueles adquiridos nas vivências cotidianas e de trabalho de
jovens e adultos, possibilitando-lhes o prosseguimento de estudos em uma concepção de
educação ao longo da vida. Nesse sentido, entende-se que boa parte dessas dimensões
dialogam com as bases conceituais, as quais poderão ser desenvolvidas de forma
interdisciplinar, pois nas matrizes buscou-se articular conceitos interdisciplinarmente nas
áreas de: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias; Ciências
da Natureza e Ciências Humanas e suas Tecnologias.
No IFTM, no desenvolvimento da proposta pedagógica estabeleceu um debate
coletivo entre os docentes para efetivar diálogo constante entre as disciplinas, ou seja,
178
estabelecendo uma organização do trabalho entre os professores para efetivar a integração
curricular, de forma a não sobrepor conteúdo.
Também é importante ressaltar que bases conceituais e tecnológicas importantes para
a formação profissional foram integradas às disciplinas da base nacional comum, para garantir
coerência com a proposta do PROEJA. Assim, por exemplo, conceitos de estatística e
matemática financeira foram integrados à disciplina de Matemática. As bases conceituais da
Redação Técnica foram integradas à Língua Portuguesa e elementos de ética profissional
foram incorporados à disciplina de Filosofia. As áreas do conhecimento foram indicadas aqui
de forma que atendessem, de modo geral, a todos os cursos, mas podem ser alteradas segundo
as necessidades de cada instituição.
Ainda é preciso observar o que estabelece a Resolução nº. 3, de 15 de junho de 2010,
que institui as Diretrizes Operacionais para a Educação de Jovens e Adultos nos aspectos
relativos à duração dos cursos e idade mínima para ingresso nos cursos de EJA; idade mínima
e certificação nos exames de EJA e Educação de Jovens e Adultos desenvolvida por meio da
Educação a Distância. Nesse documento destacamos quatro questões em particular:
a) A do direito dos jovens e adultos à garantia do aproveitamento de estudos a ser
prevista na organização curricular, conforme a própria LDBEN e no artigo 11 dessa
resolução.
b) A questão de que o ensino regular sequencial deve ser inserido em uma concepção
de escola unitária e politécnica, conforme prevê o artigo 12 dessa mesma resolução, o que
devemos almejar nas propostas pedagógicas dos cursos.
Art. 12. A Educação de Jovens e Adultos e o ensino regular sequencial para os
adolescentes com defasagem idade-série devem estar inseridos na concepção de escola
unitária e politécnica, garantindo a integração dessas facetas educacionais em todo seu
percurso escolar, como consignado nos artigos 39 e 40 da Lei nº 9.394/96 e na Lei nº
11.741/2008, com a ampliação de experiências tais como os programas PROEJA e
PROJOVEM e com o incentivo institucional para a adoção de novas experiências
pedagógicas, promovendo tanto a Educação Profissional quanto a elevação dos níveis de
escolaridade dos trabalhadores.(BRASIL, 2010a, grifo nosso).
É nesse sentido que se propõe, fundamentalmente, ao visualizar nessa resolução uma
concepção de escola unitária e politécnica, possibilitar ao estudante “a compreensão das
relações sociais de produção e do processo histórico e contraditório de desenvolvimento das
forças produtivas” (RAMOS, 2010, p.67).
179
Nas matrizes deste caderno buscou-se indicar uma integração entre os saberes de
formação geral e os de formação profissional, o que vai ficar mais evidente em algumas áreas
do conhecimento em função da especificidade do eixo tecnológico em que se inserem os
próprios cursos. Como exemplo, poderemos perceber maior ênfase na articulação de conceitos
entre o núcleo comum e a formação profissional nas áreas de biologia, química e física, nos
cursos dos eixos tecnológicos de recursos naturais e de produção alimentação, o que para
outros cursos o enfoque já será outro. Embora no núcleo comum as matrizes tenham várias
semelhanças e elementos partilhados, elas trazem as singularidades marcadas pelas
especificidades das áreas dos cursos sem comprometer o aprofundamento científico da
compreensão de um conceito da sua respectiva área. Procurou-se na proposta delinear uma
organização de integração entre trabalho, ciência e cultura, pois:
A respeito da organização curricular, considera-se que a Educação de Jovens e
Adultos abre possibilidades de superação de modelos curriculares tradicionais,
disciplinares e rígidos. A desconstrução e construção de modelos curriculares e
metodológicos, observando as necessidades de contextualização frente à realidade
do educando, promovem a ressignificação de seu cotidiano. Essa concepção permite
a abordagem de conteúdos e práticas inter e transdisciplinares, a utilização de
metodologias dinâmicas, promovendo a valorização dos saberes adquiridos em
espaços de educação não-formal, além do respeito à diversidade. (BRASIL, 2007, p.
48).
E a Portaria 179 de 31 de outubro de 2006 dispõe sobre a comissão encarregada do
Projeto do PROEJA – Agroindústria – Campus Uberaba (IFTM).
O PROEJA foi ofertado para a comunidade uberabense na modalidade integrada
concomitante. Esta ocorreu com a parceria Escola Estadual Santa Terezinha. Tendo uma
carga horária de 120 horas de estágio, com duração de 06 semestres. Os conteúdos de
natureza teórica poderão ser ministrados de forma presencial ou semi presencial dentro de
todas as unidades curriculares em até 20% da carga horária. Conforme figura 13:
180
MÓDULO
BÁSICO
Controle de
Qualidade
Agroindustrial
Tecnologia de
Transformação do
Leite
Tecnologia de
Transformação da
Carne
Tecnologia de
Transformação de
Produtos de Origem
Vegetal
ESTÁGIO
Diplomação
120horas
Figura 13 – Fluxograma
A matriz curricular do curso PROEJA Agroindústria desenvolvida pelos docentes
convocados pela Portaria 179 de 2006 (parte profissionalizante) e o ensino médio foi
ministrado pelos professores estaduais da Escola Estadual Santa Terezinha. O PROEJA teve
início em 2008 (1ª turma) e 2009 (2ª turma) somente, após o PROEJA iniciou o PRONATEC.
Tabela 15 – Dados do PROEJA Agroindústria e PROEJA Contabilidade
Ano
Turma
Matriculados
Evasão
2008 Agroindústria
1ª (noturno)
30
06
2009 Agroindústria
2ª (noturno)
30
19
2008 Contabilidade
1ª (noturno)
30
29
Fonte: própria
Evidencia-se que a forma integrada, 1ª turma PROEJA Agroindústria assumiu a
proposta vanguardista, assumindo uma postura crítica que redefiniu o olhar sobre o currículo
integrado. Já que a vinculação entre educação e trabalho, torna-se, assim, uma referência
primordial. No que diz respeito à educação profissional e a LDBEN esclarece que: “A
educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à
181
tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva”
(BRASIL, 1996, Art. 39).
A grade curricular do PROEJA Agroindústria concomitante:
Gráfico 6 – Distribuição da carga horária das disciplinas.
Assim, para que tal política tenha a possibilidade de êxito, reafirma-se a necessidade
de interação entre as redes públicas de educação federal, estaduais e municipais, no sentido de
buscar a integração entre o ensino básico, a educação profissional técnica de nível médio e a
EJA com vistas à construção de um novo campo educacional que terá elementos desses três,
mas que não será apenas sua somatória. Dito de outra maneira, essa esfera educacional deve
ter identidade própria, constituindo-se em um novo objeto de estudo que demandará métodos
específicos, material didático específico, adequação dos horários ao grupo a que se destina,
formação dos agentes educacionais envolvidos (professores, pedagogos e gestores). Isso
implica em clareza teórica, na vontade política e no compromisso ético com a cidadania
conscientizada e emancipada dos grupos destinatários (FREIRE, 2005).
Finalmente, cabe ressaltar o significativo alcance socioeconômico que pode ter o
PROEJA, caso seja transformado em política pública a ser implementada nas redes públicas
182
da União, dos Estados, dos munícipios e do Distrito Federal por meio de processos
participativos, planejados e que integrem essas distintas esferas educacionais.
No próximo item será abordado o currículo formador no PROEJA.
4.2.3 Currículo formador no PROEJA
A mudança na política curricular fez com que a comunidade acadêmica e a sociedade
em geral questionassem sobre o currículo integrador proposto pelo PROEJA.
De acordo com relatos de Ciavatta & Ramos (2009) é que
[...] matérias publicadas em jornais, no ano de 2009, sobre o ensino médio integrado
à educação profissional, partiu do pressuposto que as notícias reproduzem não só o
pensamento hegemônico do governo e dos empresários, como também o senso
comum da sociedade, que enfatiza a importância da educação profissional para as
necessidades do mercado e dos alunos.
Ramos (2011, p.771) relata que a integração da educação “o principal gargalo do
sistema educacional brasileiro”, um “nó” que o governo federal tenta resolver; e cita uma
frase emblemática do secretário de educação tecnológica do MEC, Eliezer Pacheco,
reconduzido ao cargo no novo governo: “a maioria [dos alunos] não consegue relacionar a
permanência na escola com o futuro profissional”. No lastro dessa constatação, a integração
da educação profissional ao ensino médio tem, na maioria das vezes, simplesmente
transformado o ensino médio em profissionalizante, visando à preparação de jovens para um
possível ingresso imediato no mercado de trabalho como alternativa ao prosseguimento de
estudos no nível superior.
De modo particular, o currículo escolar tem ficado indiferente às formas pelas quais
a cultura popular20 (televisão, música, videogames, revistas, cotidiano) vem construindo uma
parte central e importante da vida das crianças e jovens (SILVA, 1996, p.94). Segue o autor:
[...] o fato das novas tecnologias e a informática ilustrarem as profundas
transformações que estão se dando na esfera da produção do conhecimento
técnico/administrativo, transformações que têm implicações tanto para o conteúdo
do conhecimento quanto para sua forma de transmissão. A não incorporação desse
fenômeno à teorização curricular crítica, implica em entregar a direção de sua
incorporação à educação e ao currículo nas mãos de forças que os utilizarão
fundamentalmente para seus objetivos mercadológicos e de preparação de uma mão
de obra adequada aos fins da acumulação e legitimação.
20
Neste início de 2011, temos presenciado na mídia uma cobertura injusta e desqualificada sobre o livro de EJA
que o MEC patrocinou. Trata-se de ensinar aos alunos que há vários dialetos na Língua Portuguesa, assim como
em outras, e que a forma escrita e falada é distinta em muitos aspectos. A forma culta é uma das possibilidades e
deve ser aprendida. Contudo, não pode haver desprezo por outras formas de expressão dialetais. Há boa
sustentação linguística no livro, contudo a mídia, aparentemente desconhecendo o livro como um todo, retira
uma ou duas frases do contexto e afirma que o MEC está patrocinando o ensino da Língua Portuguesa com erros.
183
O conhecimento disciplinar refere-se a um conjunto de estruturas abstratas e as leis
intrínsecas que permitem classificações particulares de conceitos, problemas, dados e
procedimentos de verificação, de acordo com modelos de coerência assumidos historicamente
e posicionados em termos de classe e poder. As disciplinas constituem-se referências a partir
das quais o pensamento, a percepção da realidade e a ação humana são organizados, criados e
transformados por intermédio da linguagem e de métodos específicos (SANTOMÉ, 1998).
Analisando essa mesma problemática, Bernstein (1996) estabelece uma classificação
para o currículo disciplinar, em que deve ser considerado o grau de isolamento entre as
categorias, a intensidade do isolamento e o espaço em que uma categoria pode se tornar
especifica. Para ele, “quanto mais forte o isolamento entre categorias, mais forte será a
fronteira entre uma categoria e outra e mais definido o espaço que qualquer categoria ocupa
e em relação ao qual ela é especializada” (BERNSTEIN, 1996, p.42). Para Bernstein, um
forte isolamento entre categorias significa uma forte classificação e um fraco isolamento entre
categorias significa uma classificação fraca.
Com o objetivo de traçar um novo rumo para a Educação de Jovens e Adultos,
PauloFreire,apesar não ter desenvolvido uma teoria curricular propriamente dita, certamente
tem sido uma das principais referências em estudos nessa área, ao conceber a educação como
um ato político e propor uma nova metodologia de ensino para adultos. Apesar de seus
estudos terem sido voltados para a alfabetização de adultos, suas reflexões abarcam a
educação de modo geral, propondo uma educação libertadora e um novo olhar para os
processos de ensino-aprendizagem e para as discussões acerca do currículo.
Mesmo não tendo elaborado uma teoria curricular, Freire exerce forte influência nas
reflexões sobre currículo e em algumas propostas curriculares, já que buscava uma forma de
ensino que suprisse lacunas e necessidades da educação de adultos.
O maior entrave é romper um currículo baseado em disciplinar para currículo
integrador fundamentado na interdisciplinariedade.
Ciavatta (2005, p.84) corrobora que
Remetemos o termo [integrar] ao seu sentido de completude, de compreensão das
partes no seu todo ou da unidade no diverso, de tratar a educação como uma
totalidade social, isto é, nas múltiplas mediações históricas que concretizam os
processos educativos [...]. Significa que buscamos enfocar o trabalho como princípio
educativo, no sentido de superar a dicotomia trabalho manual/intelectual, de
incorporar a dimensão intelectual ao trabalho produtivo, de formar trabalhadores
capazes de atuar como dirigentes e cidadãos (CIAVATTA, 2005, p.84).
184
Na concepção de Santomé (1998), a opção pedagógica pelo currículo integrado
funda-se na conjunção de três grupos de argumentos: i) epistemológicos e metodológicos,
relacionados com a estrutura substantiva e sintática da ciência, que defendem que o ensino de
uma ciência integrada serve para que alunos e alunas analisem os problemas, não só da
perspectiva de uma única disciplina, mas também do ponto de vista de outras áreas do
conhecimento; ii) com base em razões psicológicas, que podem ser agrupados em três
subgrupos – argumentos sobre a idiossincrasia da psicologia infantil, sobre razões derivadas
do papel da experiência na aprendizagem e sobre a importância dos processos de
aprendizagem; e iii) sociológicos, que são abundantes para um currículo integrado.
Contudo, a partir das perspectivas sociológicas, Santomé afirma que:
[...] a integração é defendida como uma forma de educação que propicia visões da
realidade nas quais as pessoas aparecem como sujeitos da história, como as peçaschave para entender o mundo; consequentemente, como uma boa estratégia para
estimular o compromisso de alunos e alunas com sua realidade e para obrigar-se a
uma participação mais ativa, responsável, crítica e eficiente na mesma (SANTOMÉ,
1998, p. 118).
A integração curricular pode significar a criação das condições necessárias para uma
maior motivação para a aprendizagem, por intermédio de uma maior liberdade de seleção das
questões de estudo e pesquisa, a partir de critérios, assuntos e problemas mais interessantes e
mais familiares para os estudantes. Os alunos e as alunas podem perceber que as atividades
diárias da sala de aula, o uso de metodologias científicas e estruturas conceituais, bem como
as suas experiências, podem servir para ajudar a solucionar problemas na vida real. O
conhecimento escolar deixa de ser algo unicamente válido para as situações construídas nas
salas de aula, como ocorre nos modelos curriculares mais tradicionais e disciplinares.
Portanto, o currículo integrado é entendido como uma possibilidade de inovação
pedagógica para o ensino médio, em resposta às expectativas dos diferentes sujeitos sociais
para os quais se destina, por meio de uma concepção que considera o mundo do trabalho e os
diversos saberes produzidos em diferentes espaços sociais.
Diante dos fatos apresentados, o desafio foi a construção de um projeto político
pedagógico que tenha um propósito curricular integrado que agregue conteúdos necessários
para instrumentalizar os jovens e adultos a exercerem o poder político participando
ativamente da sociedade. Para tanto, precisamos “[...] entender a favor de quem o currículo
trabalha e como fazê-lo trabalhar a favor dos grupos e classes dos oprimidos” (MOREIRA &
SILVA, 1994, p.16).
185
Necessário se faz saber a origem do termo interdisciplinariedade, e como se
apropriou deste a política curricular.
Inicia-se a interdisciplinariedade na política curricular através de reivindicações dos
movimentos estudantis querendo um ensino mais específico para o campo do saber, ou seja,
tenha aplicabilidade no mundo do trabalho. Fazenda (1999, p.19) dispõe que:
[...] oposição a alienação da Academia as questões da cotidianeidade, as
organizações curriculares que evidenciam a excessiva especialização e a toda e
qualquer proposta de conhecimento que incitava o olhar do aluno em uma única,
restrita e limitada direção [...] (FAZENDA, 1999, p. 19).
Como destaca Fazenda (2008), para superar as barreiras do pensamento cartesiano
não é suficiente pensar a interdisciplinaridade como uma simples interação entre duas ou mais
disciplinas. Para além dessa ideia, a concepção de interdisciplinaridade com a qual trabalha a
autora pressupõe a organização de um modelo diferente de ciência. Esse modelo sugere a
religação de saberes ora desconectados, pois convida pesquisadores a trabalharem em
conjunto e a viverem o desapego das falsas seguranças geradas pelas ideias de redução e
fragmentação do conhecimento (MORIN, 2001 apud FAZENDA, 2008).
Assim como Fazenda (2008), Luck (2010) também destaca as potencialidades da
interdisciplinaridade, tanto para o campo da ciência quanto para o ensino. Discorrendo
primeiramente sobre o âmbito da ciência, a autora afirma que o movimento interdisciplinar
tem o potencial de “[...] contribuir para superar a dissociação do conhecimento produzido e
para orientar a produção de uma nova ordem de conhecimento” (LUCK, 2010, p. 52).
Para Luck (2010), esse processo de integração e engajamento modifica o objetivo
maior da educação, que se volta para a formação integral de alunos e alunas, de modo que
sejam capazes de articular os conhecimentos disciplinares para analisar e resolver os
problemas globais que se apresentam cotidianamente. Sob a ótica de Luck, portanto, esses
problemas passam a ser estudados na escola e as disciplinas tradicionais não perdem sua
importância, pois estabelecem entre si uma relação de interdependência cujo objetivo e “[...]
produzir coerência entre os múltiplos fragmentos que estão postos no acervo de
conhecimentos da humanidade” (LUCK, 2010, p. 43).
Neste universo se insere o PROEJA, como um programa integrador de educação de
jovens e adultos como o ensino profissionalizante. Fazenda (2008) relata que uma das
contribuições da interdisciplinaridade no campo da ciência refere-se a superação da
dissociação do conhecimento, em seus aspectos metodológicos. Outra contribuição, segundo
Luck (2010), é a possibilidade que a visão interdisciplinar oferece para a produção de novos
186
conhecimentos, o que acarreta uma compreensão diferente da realidade, em seus aspectos
epistemológicos.
Como afirma Luck (2010), ao centrar esforços na reprodução do conhecimento, a
escola pode acabar descuidando da apropriação inteligente e da produção de novos
conhecimentos. Isso ocorre quando o ambiente escolar, na tentativa de levar alunos e alunas a
aprender, o faz de maneira a apenas
[...] dar importância ao conteúdo em si e não a sua interligação com a situação da
qual emerge, gerando a já clássica dissociação entre teoria e pratica: “o que se
aprende na escola não tem nada a ver com a realidade” [...] (LUCK, 2010, p. 14).
Para Luck (2010), um dos riscos desse tipo de ensino e desconsiderar as ligações
entre os saberes e deixar de lado o exercício da cidadania e o aprendizado da participação na
sociedade, já que alunos e alunas ficam impossibilitados de interligar os estudos disciplinares
realizados na escola aos problemas que vivem em sua realidade social.
Necessário se faz conceituar o termo “interdisciplinariedade” no contexto da política
curricular do PROEJA – Decreto nº 5.840/2006. Já que no art. 4º, III “observância das
diretrizes curriculares e demais atos normativos do Conselho Nacional de Educação
para educação profissional técnica de nível médio” (Grifos nossos).
Fazenda, 2002, p.53 – interdisciplinariedade aplicada à ciência visa a interligação
estre saberes para dar origem a novas compreensões da realidade.
Outro dado a ser acrescentado, Fazenda (2002, p.54) – ensino interdisciplinar
pressupõe um trabalho em conjunto e sincronizado entre professores, gestores e outros
profissionais da escola, tendo vista mudanças não só na sala de aula, como também de outros
espaços associados a ela.
Além disso, Araújo (2003) – interdisciplinariedade é a contextualização e
articulação dos objetos de conhecimento presente nas diferentes disciplinas escolares.
Neste momento, torna-se necessário conceituar a “interdisciplinariedade” na visão
jurídica; no qual corresponde ao termo “articular” que é a comunicação entre os campos dos
saberes e visualiza a construção do conhecimento abrangente e articulado com a realidade.
João Ribeiro (2003, p.5) afirma que
O Direito, portanto, relaciona-se interdisciplinarmente com o conjunto dos
problemas universais da própria vida humana, diante de valores e conceitos comuns
às mais variadas disciplinas, dentre eles a liberdade, a moralidade, a justiça, a
segurança, a equidade, e ecologia, e assim por diante, na busca de uma concepção
total do mundo e da vida (JUNIOR, 2003)
187
Com a interdisciplinaridade interligando os conteúdos, é possível atingir uma visão
mais ampla da realidade e da totalidade do conhecimento.
É, portanto, uma nova concepção de ensino e de currículo, baseada na
interdependência entre os diversos ramos do conhecimento, buscando a integração do
conhecimento num todo harmônico.
Esta interdependência contribui para a formação do estudante e do cidadão,
preparando-o para receber informações interligadas e globalizadas, possibilitando reflexão
acerca destas, propiciando a construção do conhecimento.
Interdisciplinaridade é a interligação de duas ou mais disciplinas, na pesquisa ou
educação, proporcionando novos conhecimentos que não seriam possíveis se não fosse esta
integração. É a transferência dos métodos de uma disciplina à outra.
Já a transdisciplinaridade está ligada à revolução epistemológica desencadeada pela
física, no começo do século XX. Este vocábulo transdisciplinaridade foi enunciado por Jean
Peaget, colóquio de 1970. Segundo Weil, 1993, p.32 disse que a transdisciplinaridade não é
uma visão tão nova “[...] o desenvolvimento da ciência ocidental, desde o século XVII, não
foi somente um desenvolvimento disciplinar, mas também transdisciplinar [...]”.
Para Morin: “ Uma nova transdisciplinaridade com um paradigma que permita ao
mesmo tempo, a distinção, separação, ou mesmo a oposição, isto é, a disjunção desses
domínios científicos mas que possa fazê-los comunicar sem operar a redução” (MORIN apud
WEIL, 1993, p.33).
Essa ideia de separação e associação simultânea exclui a possibilidade de restringir o
conhecimento.
Além disso, a transdisciplinaridade é a atitude de abertura ao diálogo e ao
compartilhamento de ideias, pensamentos, opiniões, emoções e sentimentos, “ela tem como
fundamento a complexidade, a lógica primária e a multidimensionalidade do mundo”
(NICOLESCU apud ANTONIO, 2002).
Outro fato a ser acrescentado é que a transdisciplinaridade significa transgredir a
lógica da não contradição, articulando os contrários, sujeito e objeto, subjetividade e
objetividade, matéria e consciência, simplicidade e complexidade, unidade e diversidade. Ao
articular esses pares binários, por meio da lógica do terceiro termo incluído, a compreensão da
realidade ascende outro nível, tomando um significado mais abrangente e sempre aberto para
novos processos (NICOLESCU, 1999, p.29). Os parâmetros curriculares nacionais (PCNs)
(BRASIL, 2006) os temas transversais recorrem a esta lógica quando articulam os
conhecimentos das diversas disciplinas.
188
Além disso, os temas transversais, tendo em vista um tema social, transgride as
fronteiras epistemológicas de cada disciplina, possibilitando uma visão mais significativa do
conhecimento e da vida, e exige postura democrática cognitiva (todos os saberes são
igualmente importantes), superando o preconceito pela hierarquização dos saberes
(ARAGÃO, 1993).
Na transdisciplinaridade os alunos constroem conhecimentos, como diz Paulo Freire
(1997) trabalhar a educação com tal visão supera a mesmice do padrão educativo, encanta o
aprender e resgata o prazer de aventurar-se no mundo das ideias.
Miguel Reale, teoria tridimensional, infere que o “direito é sempre tridimensional”
quer no estudo sociológico, filosófico ou científico positivo. A diferença está na análise de
discurso, pois todos são tridimensionais.
Noberto Bobbio (2004) “propugnava por uma concepção tridimensional genérica do
fenômeno jurídico e não tridimensional específica, de base dialética”. Assim, tomando a
norma jurídica como objeto de estudo a partir de três critérios de valoração possível (justiça,
validade e eficácia). Assim, a visão transdisciplinar traz uma nova perspectiva à vida humana,
extirpando a fragmentação do conhecimento (ANTONIO, 2002) a necessidade de uma nova
“escrita poética”, a transdisciplinaridade é como um emaranhado de múltiplas interações que
sempre está começando e recomeçando, transpondo os limites antes impostos, chegando
verdadeiramente ao que é conhecimento, um vasto infinito.
Para a área jurídica, a transdisciplinaridade equivale ao integrar, pois é gênero onde a
espécie e o articular que constitui a interdisciplinariedade. Já que estes termos, na legislação
educacional, constantemente e dispostos nos atos jurídicos.
Por meio da teoria tridimensional do Direito desvendam-se os alicerces e
fundamentos das análises do discurso jurídico. No qual será discutido no próximo item – o
PROEJA nesta visão.
4.2.4 PROEJA – Na visão da tridimensionalidade de Miguel Reale
“Nenhum outro interesse público exigirá forma tão especial do Estado quanto a
Educação” (TEIXEIRA, 1986, p.171).
O direito à Educação, previsto na Constituição Federal nos Títulos II (Dos direitos e
garantias fundamentais) e VIII (Da ordem social) estes conjuntos de artigos com escopo
proteção a este direito e as alterações propostas principalmente na educação de jovens e
adultos, profissionalizante tem por meta ampliar a proteção e a promoção do direito. E os
189
princípios e regras constitucionais – verdadeira política pública de custo médio e longo prazo,
que se desdobra em direitos e deveres, vínculos e limites, Jorge Miranda denominou-os de
“Constituição da Educação21”.
Uma das peculiaridades do direito à Educação é que os titulares e os sujeitos
passivos do direito à educação são, simultaneamente, uma coisa e outra. Já que os titulares são
os indivíduos ou grupo de indivíduos; e seu sujeito passivo é o Estado, responsável pelas
ações e intervenções que conferem efetividade, mas o Estado também é beneficiário do
direito, assim como a sociedade em face do princípio democrático e do republicano
(RANIERE, 2013, p.88).
Outros elementos a serem abordados são: o princípio republicano designa a
supremacia do bem comum sobre os interesses individuais, o que implica moralidade e
responsabilidades públicas, além da igualdade de todos e a valorização da dignidade humana.
E princípio democrático designa de modo geral, a supremacia da vontade popular e implica a
preservação da liberdade e igualdade de direitos, assim como, os demais direitos
fundamentais.
Logo, do ângulo da formação da pessoa (criança, adolescente) a Educação é direito e
dever de absoluta prioridade (art. 227) na CF22. Por essa razão, o acesso ao ensino obrigatório
e gratuito e qualificado como direito subjetivo (art. 208 § 1º)23, assegurada a sua
universalização, inclusive para a ele não tiveram acesso na idade própria e a responsabilidade
das autoridades no caso de não oferecimento ou oferta irregular (art. 208 § 2º)24. Dando
continuidade à política, a Constituição exige progressiva universalização do Ensino Médio
sob a égide da equidade (art. 206)25 dentre os princípios que orientam a atividade educacional.
21
Expressão empregada por Jorge Miranda em prefácio à obra de Monica Sifuentes, Direito Fundamental à
Educação a aplicabilidade dos dispositivos constitucionais. Porto Alegre. Núria. Fabris, 2009, p.11
22
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
23
Art. 208 § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
24
Art. 208 § 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa
responsabilidade da autoridade competente.
25
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
190
E as normas constitucionais desdobram-se nas Constituições e leis ordinárias
estaduais nas leis orgânicas e ordinárias municipais e em diversas leis federais que conferem
ao conjunto das disposições referentes à exigibilidade do Direito à Educação abaixo disposto:
• Plano Nacional de Educação – Lei 10.172/2001
• Estatuto da Criança e do Adolescente (ELA) – Lei 8.069, de 13/07/1990
• Lei de Diretrizes Básicas da Educação Federal (LBD) – Lei 9.394 de
20/12/1996.
• Entre outras
Segundo Ranieri (2013, p.69), é inegável, no caso brasileiro, o dirigismo
constitucional em matéria de direito à Educação. O amplo conteúdo normativo incorporado à
Constituição Federal se, por um lado, assegurou a realização da política pública, de outro
reduziu o espaço de controvérsia própria ao confronto político e pode resultar na exclusão de
proposta e programas alternativos de realização do direito, a despeito da competência
concorrente dos Estados nesta matéria CF, art. 24, IX26.
Andrade (2001, p.138) corrobora que não se pode negar, de nenhum modo, a
relevância conferida à normativa constitucional do regime de proteção do direito à Educação,
que se destaca pela densidade de suas dimensões, também denominada de “mais valia
jurídica”. Na sua dimensão subjetiva, o direito à educação é demonstrado sob o ângulo dos
titulares posições jurídicas individuais ou coletivas perante o Estado e entre si, em dimensão
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de
ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com
ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de qualidade.
VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei
federal.
Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação
básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
26
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação
191
objetiva, proteção que se rende sob ângulo das garantias institucionais, funcionais em relação
aos deveres.
Para circunstanciar a educação na arena jurídica, faz necessário conceituá-la.
Delimitar o conceito jurídico de educação na constituição da educação, não é, portanto, uma
questão semântica, mas um problema conceitual para exigência no Direito e para a
interpretação hermenêutica. Segundo Ranieri, grande maioria dos julgados do Supremo
Tribunal Federal, nos quais a educação é tomada por suas finalidades, conforme artigo 205 da
Constituição Federal.
“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
O conceito de educação como “direitos de todos” neutraliza a variedade de sentidos e
de concepções que oferecem história, filosofia, educação pedagógica, ciências sociais e
políticas.
Já na Constituição Federal, o substantivo “educação” ao ser empregado isoladamente
indica ação de educar (isto é, desvinculado da expressão “direito à educação”, sendo inclusive
usado como sinônimo de ensino). É o que se conforma em face quando dispõe o art. 1º LDB:
Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida
familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa,
nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações
culturais.
Porém, o conceito constitucional da Educação é um direito e um dever do indivíduo,
do Estado, da família e da sociedade, na definição legal a Educação é especificada como
direito que abrange os diversos processos formativos necessários ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para cidadania e sua qualificação para o trabalho. No texto
constitucional, o ensino como processo formativo escolar é, em consequência espécie do
gênero “Educação”, conforme artigo 210 §2º CF/8827.
A definição de ensino como Educação escola encontra-se, na Convenção contra a
Discriminação na Escola de 1960, art. 1º, n.2 (BRASIL, Decreto 63.22328 de 06/09/1968).
27
Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação
básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.
§ 2º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas
também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem.
28
Decreto 63.223/68: Promulga a convenção relativa à luta contra a discriminação no campo do ensino.
192
Portanto a palavra “Educação”, no direito brasileiro, refere-se a todos os processos
formativos, formais e informais, públicos e privados voltados a propiciar o pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para cidadania e sua qualificação do trabalho.
E a natureza jurídica do direito à Educação constitucionalmente é composta de
diferentes espécies de direitos fundamentais, diferentes características em relação ao objeto e
à titularidade, assim, expõe Alexy: é um “direito fundamental completo”, isto é, “um feixe de
posições de direitos fundamentais” de caráter dinâmico. (ALEXY, 2008, p.248)
Assegurar por normas de direitos fundamentais contidas, nas disposições dos arts.
629, 20530, 20631 e 20832 da Constituição Federal de 1988 é direito subjetivo a prestação, fálica
29
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição.
30
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho.
31
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de
ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com
ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de qualidade.
VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei
federal.
Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação
básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
32
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive
sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;
II - progressiva universalização do ensino médio gratuito;
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de
ensino;
IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada
um;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de
material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa
responsabilidade da autoridade competente.
193
ou normativa, por parte do Estado, de titularidade individual difusa ou coletiva (RANIERI,
2013, p.75). Sendo que a natureza jurídica de direito fundamental é cláusula pétrea exige
quóruns qualificados para sua deliberação e modificação constitucional.
Assim, a educação é uma categoria de direito fundamental subjetivo que tem por
finalidade assegurar interesses e necessidades vitais e, por isso, fundamentais. Já que o direito
subjetivo é o direito exigir; conceito técnico-jurídico que exprime a faculdade de ação
reconhecida aos titulares do direito para realização de interesses que lhes são próprios e que
deriva de uma norma constitucional (ANDRADE, 2001, p.113-114).
O direito à educação não é ideologicamente neutro, em vários dispositivos a
Constituição Federal assiná-la sua finalidade, o que denota um forte juízo de valor. Conforme
se depreende da visão global do sistema constitucional, a difusão dos princípios republicano e
democrático, como fundamento do Estado brasileiro (art. 1º CF/88) são o seu conteúdo
político nuclear, assim disposto:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de
Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Diante do exposto, a educação é problema político, tomada de decisões coletivas, à
legitimação e ao exercício do poder nas sociedades contemporâneas. Este pensamento é
corroborado por Anísio Teixeira, 1977, p.149: “A forma democrática de vida funda-se no
pressuposto de que ninguém é tão desprovido de inteligência que não tenha contribuição a
fazer às instituições e a sociedade a que pertence”.
E o regime jurídico do direito à Educação é extraído da Constituição Federal,
caracteriza por ser um regime de prestações estatais como é típico dos direitos fundamentais
sociais, submetido ao direito público em razão de seu objeto: a proteção, pelo Estado, de um
bem individual e coletivo de interesse público do qual decorre sua superioridade em relação
aos particulares. E a educação é colocada no rol dos direitos sociais, art. 6º CF/88, e ser
composto de ações estatais que promovem, protegem ou garantem sua realização, sendo que o
§ 3º Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar,
junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.
194
regime jurídico da educação extrai diretamente do texto constitucional, é uma determinação
de conteúdo e densidade proteção na CF/88.
Além disso, no regime jurídico do direito à Educação é o fato de que a obrigação
pública não se esgota com atendimento material e administrativo das exigências
constitucionais (universalização do Ensino Fundamental gratuito, garantia das condições de
acesso e permanência (material escolar, alimentação, saúde)), formação de professores,
porquanto há deveres impostos ao legislativo (art. 22, XXIV33; art. 24, VIII34) e também ao
Ministério Público (art. 129, III35).
Além disso, os bens protegidos pelo direito à educação – os processos formativos,
formais e informais públicos e privados, voltados a propiciar o pleno desenvolvimento da
pessoa humana, sua qualificação para o trabalho e seu preparo para cidadania, assim como os
demais direitos de liberdade, igualdade e eles inerentes têm justificativa imediata.
Um dado a ser acrescentado é que a dificuldade de efetivação do direito à educação,
como problema do direito positivo, não deriva da força jurídica de suas normas definidoras,
mas de sua eficácia e aplicabilidade como norma que dependem de complementos, quer por
dependerem de reserva econômica, por razões discricionariedade estatal. Sendo prevista
aplicabilidade imediata das normas de direitos fundamentais prevista no art. 5º § 1º da
CF/8836, pode não operar os efeitos desejados pelo legislador constituinte.
Em relação à tutela judicial do direito à Educação cabe ao indivíduo, os pais e
responsável, grupos ou categorias, as associações, as entidades de classe, organismos sindicais
ou os entes estatais personalizados, como é caso Ministério Público, são titularidades de
direito de ação para tutela das prerrogativas ao direito à Educação. E a tutela judicial poderá
ser solicitada do ponto de vista interesse individual, coletivo ou público por intermédio dos
mecanismos previstos na Constituição Federal, na Lei Diretrizes e Bases da Educação e no
Estatuto da Criança e Adolescente.
33
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XXIV - diretrizes e bases da educação nacional
34
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico
35
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio
ambiente e de outros interesses difusos e coletivos
36
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
195
E esta tutela não se esgota no judiciário. Os Conselhos de Educação (órgãos
normativos do sistema de ensino) e os Tribunais de Contas Federal, estaduais e municipais
asseguram, em esferas distintas, outras formas de tutela do direito à Educação.
Para circunstanciar no campo do direito há necessidade de conceituar “trabalho”
como forma de delimitar o objeto de estudo, pois, na educação profissionalizante proposta o
trabalho e educação se interligam no objeto de construção do cidadão brasileiro. Portanto, a
definição de trabalho “qualquer atividade física ou intelectual, realizada por ser humano, cujo
objetivo é fazer, transformar ou obter algo, portanto, é uma relação entre empregado e
empregador” (art. 442, CLT).
E o trabalho sempre fez parte dos seres humanos. Sendo através dele que as
civilizações conseguiram se desenvolver e alcançar o nível atual. O trabalho gera
conhecimento, riquezas materiais, satisfação pessoal e desenvolvimento econômico. Por isso
ele é e sempre foi valorizado em todas as sociedades.
Mas qual é a diferença entre trabalho e emprego, o primeiro envolve a atividade
executada em si, o segundo refere-se ao cargo ou ocupação de um indivíduo numa empresa ou
órgão público, assim, relação de trabalho (gênero) e a relação de emprego (espécie), conforme
tabela 16.
Tabela 16 – Relação de trabalho e relação de emprego
1
2
3
Relação de trabalho
Gênero
Trabalho autônomo, eventual,
avulso, subordinado, etc.
Não é protegido pelo art. 3º
CLT37
Relação de emprego
Espécie
Trabalho subordinado do
empregado em relação empregador
Relação contratual art. 3º CLT
Fonte: própria
Nesta etapa o enfoque será o trabalho como princípio educativo na educação
profissional. Os atos jurídicos se cristalizam na visão de Marx diante do trabalho como
princípio educativo, Gramsci vai se aproximando do conceito de escola unitária durante a
sucessão de sua vida. É a escola unitária do trabalho, que, para Gramsci, é a escola unitária,
desinteressada, do trabalho industrial. Isso significa que essa escola pertence ao trabalho, mas
não a qualquer um, ao industrial. É a escola cujo eixo curricular principal, a disciplinar
37
Art. 3º CLT - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a
empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o
trabalho intelectual, técnico e manual.
196
formativa constante, é a questão da produção e reprodução da vida humana. Não é uma escola
necessariamente para trabalhar, mas que possibilita entender o trabalho, refletir sobre ela
(NOSELLA, 2004).
Além disso, a obra de Gramsci revela uma coerência, busca da superação de uma
educação em dualidade com o trabalho, possível pela compenetração com hegemonia da
educação (NOSELLA, 2004).
Saviani (2007), dispõe que o trabalho como princípio educativo é o significado de
politecnia, confirma que Manacorda (1989) optou em suas conclusões pela expressão
“educação tecnológica” para a educação do trabalhador, ainda que identificando haver
similitude nos textos de Marx, daquela com o termo “politécnico”. Acentuado que a questão é
conceitual, não terminológica, explica que as suas concepções e as de Nosella (2007) para a
educação atual não são excludentes, mas enriquecedoras e que, se necessário, abre mão “[...]
do termo politecnia, sem prejuízo algum para a concepção pedagógica que venho procurando
elaborar” (SAVIANI, 2007, p.165)
Consequentemente, a concepção de educação politécnica aqui adotada como
referência, diz respeito ao “domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas que
caracterizam o processo de trabalho moderno (...) resgatando o princípio da formação humana
em sua totalidade” (SAVIANI, 1989, p.17 apud CIAVATTA et al., 2005a, p.85). A escola
única por sua vez é proposta por Gramsci.
Focalizando no universo do trabalho Ciavatta (2005, p.1) infere que o “trabalho
como atividade fundamental da vida humana existirá enquanto existirmos”. O trabalho, assim
visto, é categoria ontológica de práxis humana em que o ser passa qualitativamente de ser
biológico a ser biológico e social pela ação intencional.
Vale inferir que o trabalho pode ser educativo não só para crianças e adolescentes,
mas também, para os adultos se for compreendido como a base estruturante de um novo tipo
de ser, e a consciência moldada por esse agir prático, teórico, poético ou político; e que não
seja entendido como emprego. Portanto, o trabalho como desenvolvimento físico, material,
cultural, social, político, estético, assim, trabalho como manifestação de vida.
Nesta etapa será enfocado a Teoria Tridimensional de Miguel Reale buscando o
cerne do PROEJA educação, jovens e adultos, profissionalização e projeto político
pedagógico integrador, ou seja, política curricular integradora.
Saviani (2005) dispõe que desde o final dos anos 1980, o debate sobre a educação
profissionalizante acirrou em torno de um projeto educacional para os trabalhadores na
educação profissional com desenrolar das legislações pós-LDB de 1996. Nos anos 2000, a
197
forma integrada de educação profissional passa a representar, ainda que não plenamente, um
projeto educacional mais alinhado ao princípio da politecnia, possibilidade então de
materialização de uma concepção pedagógica.
O princípio que rege o discurso pedagógico é o princípio recontextualizador que,
Seletivamente, apropria, reloca, refocaliza e relaciona outros discursos, para
constituir sua própria ordem e seus próprios ordenamentos. Neste sentido, o discurso
pedagógico não pode ser identificado com quaisquer dos discursos que ele
recontextualiza. Ele não tem qualquer discurso próprio que não seja um discurso
recontextualizador (BERNSTEIN, 1996, p.259)
Bernstein define os campos recontextualizadores como sendo o campo e o
subconjunto
estruturados.
Afirma
que
as
principais
atividades
dos
campos
recontextualizadores são criar, manter, mudar e legitimar: o discurso, a transmissão e as
práticas organizacionais que regulam os ordenamentos internos do discurso pedagógico. O
Campo Recontextualizador Oficial (CRO) é aquele dominado pelo Estado e seus agentes,
política e administrativamente; e o Campo Recontextualizador Pedagógico (CRP) é
constituído pelos educadores, departamentos de educação nas universidades, pelos periódicos
especializados e fundações de pesquisa (MAINARDES, 2007; SANTOS, L., 2003).
Na mesma lógica, Bernstein (1996, p.272) divide o discurso pedagógico em:
Discurso Pedagógico Oficial (DPO) – “as regras oficiais que regulam a produção, a
distribuição, a reprodução, a inter-relação e a mudança dos textos pedagógicos legítimos
(discurso), suas relações sociais de transmissão e aquisição (prática) e a organização de seus
contextos (organização)”; e Discurso Pedagógico Local (DPL) – “regula o processo de
reprodução cultural ao nível da contextualização inicial da cultura, essencialmente na família
e nas relações entre grupos de colegas”.
Segundo Kickert et al., 1997, redes políticas são formações institucionais que são
formadas em torno de programas ou problemas políticos específicos. Elas reúnem uma
variedade de pessoas em parceria e, teoricamente, um indivíduo sozinho não tem o poder
suficiente para determinar as ações estratégicas da rede. Rhodes e Marsh (1992) consideram
que uma rede de política é o resultado de uma cooperação mais ou menos estável e
hierárquica entre organizações que negociam, trocam recursos e podem compartilhar normas
e interesses num ambiente complexo.
Por conseguinte, à medida que as redes políticas vão traçando as articulações que
resultam numa maior aproximação entre a Educação Profissional e a EJA, os discursos que
têm como foco principal o grande contingente “cidadãos que foram cerceados do direito de
concluir a educação básica e de ter acesso a uma formação profissional de qualidade”
198
(BRASIL, 2007, p.11). A partir deste pressuposto, nasce o PROEJA, como um programa que
tem por objeto o resgate do princípio constitucional da dignidade humana e o princípio
democrático.
A análise funcional do preâmbulo constitucional com a utilização pelos métodos
tradicionais de interpretação constitucional no PROEJA.
O método literal-gramatical dá ao intérprete a responsabilidade de encontrar o
sentido unívoco da lei consagrado no texto. Obviamente o método literal-gramatical esforçase na concentração de recursos interpretativos nos padrões de língua culta e no dogma de
sistema jurídico completo, coerente e regulador pleno das condutas humanas (COELHO,
1979, 74-75).
A preferência do método literal-gramatical é pela interpretação das palavras do texto
tomando-as isoladamente, e não dentro da sua participação no período. Com isto, o método
literal-gramatical pretende evitar a invasão do intérprete na substância do texto. Quer manter
o intérprete no limite daquilo que é denominado literalidade do texto normativo.
O método exegético nasceu como elemento pós revolucionário, na transição do
ordenamento jurídico do antigo regime (monárquico e absolutista) ao regime burguês, e super
valorizando a figura do legislador. A valorização do legislador deveu-se ao momento em que
se creditavam aos legisladores - e ao legislativo - o papel primordial na definição de condutas
a serem seguidas, justamente por serem os legisladores, os lídimos representantes do povo.
Para evitar abusos interpretativos por julgadores servos do antigo passado absolutista, a escola
exegética alçou ao primeiro plano a vontade do legislador (WARAT, 1994, 69).
A diferença do método exegético na comparação com o método literal-gramatical
está na inserção da variável vontade do legislador. Sob este aspecto, o método exegético é
passo adiante à interpretação do teor literal, estrito, utilizado pelo método gramatical, pois
está implícito, ao buscar a vontade do legislador, que tal tarefa só tem razão de ser porque o
texto não apresenta a clareza e univocidade instantânea, como pretendia o literalismo do
método literal-gramatical. O esclarecimento também permite verificar que o método exegético
supera o literal-gramatical sem rejeitá-lo, apenas rompe com uma posição, entendida como
ingênua, de acreditar na disposição textual estritamente (FRANÇA, 1997, 14-15).
Já a hermenêutica engloba não somente os textos escritos, mas também tudo o que há
no processo interpretativo. Isso inclui as formas verbais e não verbais de comunicação assim
como aspectos que afetam a comunicação. Nesse sentido, Jean Grodim frisa que “a
hermenêutica, como a arte de entender corretamente o discurso alheio, sobretudo escrito,
199
participa da busca ideológica do saber” (GRODIM, 1999, p.133). Portanto, a hermenêutica,
com efeito, serve para determinar os processos e conceitos à atividade de sistemática.
O processo de análise com enfoque na teoria tridimensional de Miguel Reale, utiliza
da interpretação hermenêutica como princípio de valoração dos fatos e consequentemente da
norma, na busca da “verdade real”, ou seja, da justiça. Reale, 2003, p.18 corrobora que
O tridimensionalismo não serve só para o Direito, mas para qualquer atividade
cultural. Assim é que o artista, inspirado ante certa realidade factual, projeta a sua
preferência valorativa, impressionista ou expressionista, por exemplo, e esta se
concretiza numa forma expressa por uma pintura ou u m a escultura. O que é u m a
obra de arte senão a expressão formal de uma vivência axiológica do fato vivido
pelo artista? Ora, o que é forma para o artista é norma para o jurista. A norma é a
forma que o jurista usa para expressar o que deve ou não deve ser feito para a
realização de u m valor ou impedir a ocorrência de um desvalor. (REALE, 2003,
p.18)
Coelho (1974, p.61) afirma que, para Reale, não se pode separar o fato da conduta,
tampouco o valor (finalidade) com o qual a conduta se relaciona. Ademais, também não se
pode separar a norma que incide sobre a conduta, visto que o Direito é tridimensional é fato,
valor e norma, portanto, “[...] não pode haver direito, nem estudo do direito que não seja
necessariamente tridimensional” (REALE, p.372)
O fato, para Miguel Reale [...] não é um dado externo indiscutível e
puramente empírico. A correlação funcional sujeito/objeto realça a contribuição do
objeto. Esta contribuição resulta de uma atitude crítica, da qual provém uma
concepção funcional do fato em movimento [...]
Por outro lado, na perspectiva do valor, cabe dizer que o ato de
conhecimento para Miguel Reale, não é puramente lógico-formal, mas também um
potencial axiológico da própria estrutura do conhecimento.
Os valores deste potencial são históricos, tendo uma objetividade
proveniente da totalidade do processo histórico que se põe em movimento. São
características dos valores, para Miguel Reale, sua realizabilidade na história e sua
inexauribilidade da abertura, a cada momento histórico particular, ao pluralismo das
possibilidades de expressão da atividade humana.
Finalmente, quanto à norma, esta é apreciada lato sensu como uma
expressão dialética que integra, em cada situação histórica, de maneira mais ou
menos duradoura, mas nunca definitiva, fato e valor. Essa integração envolve uma
escolha de opção por um caminho dentre múltiplos caminhos possíveis. Tal escolha,
que resulta da necessidade de um ato hierárquico de gestão, se dá através da
interferência decisória do poder (LAFER, 1981, p.163-164).
Segundo Reale, os três polos do Direito – fato, valor e norma – entram em conexão
mediante uma dialética cultural peculiar; por ele denominada de dialética da implicaçãopolaridade. E a noção de direito, para Reale, corresponde a três aspectos básicos, os quais
discerníveis em todos os momentos da atividade jurídica, são eles:
a) Aspecto normativo: o Direito enquanto um ordenamento e sua ciência;
b) Aspecto fática: o Direito como fato, em sua efetividade social e histórica, e;
c) Aspecto axiológico: o Direito como valor da justiça
(REALE, 2002c, p.64-65)
200
Portanto, onde que haja um fenômeno jurídico, há, sempre e necessariamente, um
fato subjacente (fato econômico, geográfico, demográfico, de ordem técnica, etc.); um valor,
que confere determinada significação a esse fato, inclinando ou determinando a ação dos
homens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo; e, finalmente uma
regra ou norma, que representa a relação ou medida que integra um daqueles elementos no
outro: o fato ou valor. Estes elementos ou fatores (fato, valor e norma) não existem separados
um dos outros, mas coexistem numa unidade concreta, mais ainda, esses elementos ou fatores
não só se exigem reciprocamente, mas atuam como elo no processo (REALE, 2002c, p.65).
O fato que levou a construção do decreto 5.840/2006 (PNAD/IBGE) em 2002, o
Brasil possuía 23.098.462 de jovens com idade entre 18 e 24 anos. A situação de trabalho
desses jovens no mercado formal é preocupante. De acordo com o Registro Anual de
Informações Sociais (RAIS/TEM, 2002), apenas 5.388.869 cerca de 23,3% dos jovens dessa
faixa etária tinham emprego no mercado de trabalho formal no mesmo ano. É necessário
garantir o acesso à alfabetização, ao ensino fundamental e à educação profissional a 62
milhões de jovens e adultos (IBGE, PNAD, 2003) que não tiveram condições de completar a
educação básica nos tempos de infância e da adolescência que deveriam anteceder, na lógica
própria da cultura moderna, o tempo do trabalho. Este foi o legado que o Presidente Lula
recebeu na posse do seu primeiro mandato – posse em 2003.
Diante deste fato social, ou seja, massa de excluídos do direito à escolaridade, as
pressões internas através dos Fóruns EJA e ENCEJA e todos os segmentos sociais, como
também, as pressões externas constituem o 1º elemento da tridimensionalidade Reale (fato) e
este aliado às ideologias de Gramsci e de Paulo Freire (valor) culminado no elemento
normativo (Decreto 5.840/06 - PROEJA), contempla-se assim o amparo jurídico pretendido
pelos cidadãos brasileiros.
Diante dos fatos apresentados, o ser humano, é visto na visão da teoria tridimensional
como um ser cultural antes de ser um ser histórico, já que a história assinala a autoconsciência
do “[...] processo cultural, pressuposto da capacidade de selecionar valores, a fim de se
determinar o que deve ser reconhecido como um bem a ser preservado na memória coletiva”
(REALE, 2004, p.3). Nesse sentido é que o Direito nasce enquanto expressão da cultura e, por
isso mesmo, linguística do ser humano. E a partir de uma análise fenomenológica da
experiência jurídica, confirmada por dados históricos. Miguel Reale afirma a estrutura do
Direito é tridimensional. Por isso, pressupõe uma situação de fato, referida a determinados
valores, sendo tridimensional porque é composto da tríade (fato, valor e a norma).
201
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“ (...) o direito à educação representa a indivisibilidade e interdependência de todos
os direitos humanos” (Comissão de Direitos Econômicos e Sociais das Nações
Unidas – 1999)
Empreendemos uma pesquisa para compreendermos o contexto educacional que
gerou a formulação do Programa de Integração de Educação Profissional com a Educação
Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA, tendo por objeto de
estudo a análise do “integrar” e/ou “articular” no PROEJA em sua relação política, jurídica e
pedagógica no currículo, tendo como categoria teórica - o currículo. Assim, o propósito de
fazer uma análise da formulação do PROEJA fundamentado no ciclo de políticas
(VILLANUEVA, 2003), análise de discurso (BERNSTEIN, 2006) e finalmente, a Teoria da
Tridimensionalidade (REALE, 2003).
Chegamos a um momento conclusivo de nossa pesquisa, porém, considerando que o
conhecimento está recorrentemente em reconstrução. Expressamos o nosso sentimento de luta
e entraves propostos no caminhar de uma tese que tem como fonte a justiça pela qualidade
em educação de jovens e adultos e através das escolhas certas, no que se refere ao
referencial teórico-metodológico adotado para os fins a que nos propusemos.
Esperamos que a tese venha contribuir, somar com outras pesquisas e oferecer
subsídios para as reflexões em diversos contextos da política educacional e na política
curricular profissionalizante de jovens e adultos. Não estamos dando “fórmulas” mas
proporcionar elementos para discussões, reflexões e debates nos quais os sujeitos possam ter
seus próprios caminhos.
Nesse sentido, fundamentados no referencial teórico adotado e a incursão no
processo da formulação do Decreto 5.840/2006 e a institucionalidade este no Campus
Uberaba e Campus Avançado Uberaba Parque Tecnológico passamos circunstanciar o
elemento normativo possibilitaram confirmar a hipótese da pesquisa “ como os gestores
educacionais estão recontextualizando a política PROEJA sob a influência do currículo
partindo da análise “integrar” e/ou “articular” e esta recontextualização está
conduzindo os processos de inclusão”.
Vários foram os pontos que nos permitiram refletir e a questionar, a hipótese, sobre a
recontextualização do currículo na visão de inclusão no contexto da formulação:
No que se refere ao aspecto da política educacional sendo concebida “poder do
Estado – ou da sociedade política – em atuar, proibir, ordenar, planejar, legislar, intervir, com
202
efeitos vinculadores a um grupo social definido...” (SHIROMA, 2011, p.7). A partir desta
definição podemos, em sentido macro, inferir como política propriamente dita a um programa
educacional estabelecido pelo Estado, voltado a atender um público específico,
desdobramento como uma política de governo ou de Estado.
O PROEJA, um programa oficializado por meio texto normativo (decreto
5.840/2006) que confere legitimidade para dispor as normativas de sua aplicabilidade, sendo
uma legislação específica para jovens e adultos. O olhar dialético nos ajuda a compreender
importantes avanços no que tange aos interesses das classes dominantes no PROEJA, isto não
invalida a representatividade que a lei assume em relação à classe dominante. Thompson,
1987, p.354 “[...] se a lei é manifestamente parcial, não vai mascarar nada, legitimar nada,
contribuir em nada para hegemonia de classe alguma [...]”.
O documento oficial do MEC defende um modelo de currículo integrado, proposto
para o PROEJA, devemos olhar com desconfiança, já que a política e a legislação expressam
no seu interior reflexos de uma tensão dialética de grupos de interesses distintos, já que, a lei
não é apenas um instrumento de dominação, mas pode expressar lutas de classes. Isso ocorre
porque ela impõe “restrições às ações dos dominantes”.
O primeiro ponto da fragilidade do PROEJA é o envolvimento de instituições que, na
maioria dos casos, nunca haviam trabalhado com EJA; mesmo as que haviam já trabalhado
com essa modalidade de ensino, não o faziam perspectiva do currículo integrado. Tal fator,
aliado à ausência de professores preparados para esse trabalho, fazia com que não fosse
“razoável” obrigar as Escolas Técnicas da Rede Federal a destinarem 10% de suas vagas ao
Programa.
Outro aspecto se relaciona à questão da carga horária prevista para os cursos
PROEJA, o texto falava em carga horária máxima e o “usual em Educação é a carga horária
mínima” (SANTOS, 2008, p.2). Esta delimitação aponta um empobrecimento curricular
(carga horária máxima) pois impede o atendimento especificidades regionais.
O olhar específico para os Institutos Federais constitui autarquia federal com
legitimidade para dispor resoluções (Conselho Superior) acerca do ensino, se vê sua
autonomia ferida e não reconhecem, na proposta PROEJA, elementos que lhes
possibilitassem assumir a curto prazo uma experiência nova em vários aspectos. E por outro
lado EJA, gostaria de ver alinhada com aquilo que vinha conquistando historicamente nos
fóruns de EJA, estes alunos, não se veem nesta proposta de política educacional. A síntese das
discussões, a partir dos textos, demonstra que os professores manifestam resistência à
proposta, sendo apontadas as seguintes causas dessa dificuldade:
203
• A forma impositiva como é apresentada;
• A mentalidade conservadora dos padrões pedagógicos vigentes, assim como de
posições políticas avessas ao discurso da formação integrada e da educação
emancipatória com base na crítica à sociedade de mercado;
• O desconhecimento conceitual;
• A falta de condições materiais;
• A carência de gestão e de participação democrática nas instituições;
• A dificuldade de envolvimento dos professores temporários, com vínculos
precários de trabalho e de compromisso com as instituições. (FRIGOTTO;
CIAVATTA, RAMOS, 2010)
E o discurso pedagógico do PROEJA, que é resultado do processo desmonte de
identidades pedagógicas e da construção de novas identidades do período do capitalismo de
transição, denotam um avanço das concepções nas políticas de Educação Profissional e de
EJA. No entanto, as recontextualizações produzidas pelos professores tem se traduzido em
prática pedagógica relacionada para instrumentalização para o mercado de trabalho, que já
distancia de uma prática pedagógica intercultural (com foco interdisciplinariedade e
transdisciplinaridade) porque demanda reconstrução das entidades dos docentes no sentido
modelos de desempenho para os modelos de competências que considerem as relações sociais
e sentido formativo da politecnia e da interculturalidade e diante dos dados quantitativos do
Tribunal de Contas da União, IBGE, PNAD, SETEC que demonstram um índice elevado de
evasão e retenção no PROEJA.
Reafirmo que há necessidade de rever esta política em nível de implementação
devido ao insucesso da política curricular no PROEJA, pois há fraturas nos níveis macro e
micro ausência de uma prática pedagógica inclusiva intercultural e as questões políticas
externas e internas articulados: implicações dos descaminhos do PROEJA é a ocorrência do
insucesso dos alunos no interior do Instituto, isto é, apenas um dos fatores da fragilidade no
PROEJA no contexto educacional e social.
Diante do exposto, a efetivação do PROEJA, no IFTM – Campus Uberaba e Campus
Uberaba Parque Tecnológico vem realizando um percurso contrário da inclusão, já que a
maior parte dos alunos, com insucesso escolar, estão distantes de obter mudanças sociais. Se a
educação responde, antes qualquer coisa, as necessidades individuais e políticas (art. 205,
CF/88), o seu conceito, no Estado Democrático de Direito, não pode ser desvinculado dos
objetivos fundamentais da República (art. 3º, CF/88). Tal finalidade, por sua vez, implica na
204
conservação de determinados valores, quais sejam a democracia, justiça social, liberdade e
paz, sendo esta a razão determinada da sistemática constitucional de promoção, proteção e
garantia do direito à Educação.
A chegada de Jaqueline Moll à SETEC/MEC possibilitou a promoção de um diálogo
entre os atores interessados tendo por desafio a junção EJA com a Educação Profissional na
perspectiva integrada. Com representações da rede federal, sistema S (Serviço Nacional
Aprendizagem Industrial), coordenadores estaduais do Ensino Médio e o Ministério do
Trabalho, ocorreram elementos dialéticos para legitimidade do Programa.
Outro fator, o caminho percorrido pelo PROEJA, depois do segundo momento,
culminou na sua implantação, fato aponta um diferencial em relação a outros programas que,
geralmente, são gestados em gabinetes.
Finalizando, o PROEJA é uma exceção por conseguir, através das contradições e
disputas, romper com uma imposição verticalizada e se construir, ou se reconstruir, em meio a
intensos diálogos. E não há como desvincular o direito à Educação do próprio direito
democrático como expresso no artigo 21, I e III da DUDH.
Artigo 21
I) Todo o homem tem o direito de tomar parte no governo de seu país diretamente
ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.
[...]
III) A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será
expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto
ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto.
Diante do exposto, a política pública PROEJA enquanto na sua formalização logrou
êxito, entrou na agenda do governo Lula e se fez presente através do ato normativo –decretoabraçou
os anseios da sociedade brasileira e aos pactos internacionais em propor uma
programa que tem seu ponto central um currículo inovador e integrador com foco na
diminuir o índice de analfabetos no solo brasileiro, como também, melhor capacitação para o
mercado de trabalho na sua construção do trabalhador cidadão reflexivo e construtor de sua
história, porém, se esbarrou na política curricular que não logrou êxito porque a proposta
vigente ,no decreto 5.840/2006, era currículo integrador tendo por fundamento Gramsci e nos
pensamentos de Paulo Freire, porém, no solo federal do Triângulo Mineiro – IFTM – campus
Uberaba, ocorreu um currículo propedêutico baseado em habilidades e competências e que
não
concretizou a interdisciplinaridade e se que iluminou na transdisciplinaridade , neste
aspecto deverá ser revisto a implementação do decreto 5840/2006 – PROEJA, portando, não
ocorreu a inclusão social almejada pelos formuladores e pela comunidade jovens e adultos
que se viam , neste momento, histórico “gente que tem direitos e deveres” que leva o Brasil
205
que representa uma comunidade e não grupo , este desejo, está estampado na música de
Toquinho de Vinícius de Moraes “(...) Numa folha qualquer, eu desenho um navio de partida,
com alguns bons amigos, bebendo de bem com a vida, de uma América a outra, consigo
passar num segundo, giro um simples compasso, e num círculo eu faço o mundo, um menino
caminha, e caminhando chega num muro, e ali logo em frente, a esperar pela gente o futuro
está (...)”Assim, encontramos num percurso em
que há muitas vidas que ainda não
degustaram do prazer da inclusão e ter seus direitos fundamentais concretizados, pois, não
basta a Constituição Brasileira garanti-los, precisamos, urgentemente edificar estes para uma
sociedade mais justa que é o coração do Direito “trazer justiça ao caso concreto” que são os
jovens e adultos sem escolaridade e que a política educacional seja uma política de Estado e
não de governo.
206
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WILDAVSKY, A. Speaking truth to power: the art and craft of policy analysis. Boston:
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212
APÊNDICES
APÊNDICE 1 - RESUMO DO PROJETO DE PESQUISA
Título Provisório inicial: Perspectivas Políticas da Educação de Jovens e Adultos (EJA):
Convergência entre Direitos e as Especificidades da formação Profissional
O objetivo geral deste projeto será compreender como ocorre o processo de
recontextualização das políticas curriculares oficiais, até sua construção em forma de
currículo
na
EscolaMais
especificamente,
pretende-se
investigar
como
serão
recontextualizadas, nos Institutos Federais, as novas políticas curriculares descritas pelo MEC
para a educação profissional e tecnológica.
Para Elisabeth Macedo, desde os anos 80, a produção em torno da temática do
currículo ampliou-se consideravelmente no Brasil. Entretanto, pequena parte das pesquisas
trata de forma mais integrada À prática e às propostas e ainda assim, esse número
correspondeu quase que exclusivamente a estudos que buscaram entender as múltiplas formas
de apreensão das propostas oficias.
Este trabalho se encaixa nesta categoria e irá estudar o currículo não no sentido de
não prescrição, - restrito a visão de uma lista de disciplinas – mas com a visão de currículo
que abrange todo e qualquer fenômeno educacional, buscando capturar a trajetória da política,
como propõe Villanueva, a fim de buscar elementos que permitam compreender o complexo
processo envolvido na construção curricular.
As questões serão investigadas com base em documentos institucionais e
interação
com sujeitos que estão vivenciando a realidade social em estudo em seu contexto natural, os
quais atribuem sentido ao mundo com base nas suas subjetividades. Serão realizadas
entrevistas para compreender como se (re)articulam as diferentes instâncias de
recontextualização das políticas, na sua concepção em nível governamental.
Todas as decisões de pesquisa levarão em consideração a preservação da identidade
institucional, a fim de garantir a preservação da identidade dos sujeitos da pesquisa, os quais
terão sempre sua identidade preservada.
(DADOS DE IDENTIFICAÇÃO E ENDEREÇOS DE CONTATO REMOVIDOS)
213
APÊNDICE 2 - TERMO DE CONFIDENCIALIDADE
(DADOS DE IDENTIFICAÇÃO E ENDEREÇOS DE CONTATO REMOVIDOS)
O presente projeto de pesquisa tem como objetivo investigar como ocorre o processo de
formulação do PROEJA e a sua recontextualização das políticas curriculares oficiais, até sua
implantação em forma de currículo na Escola. Mais especificamente, pretende-se investigar
como serão recontextualizadas nos Institutos Federais, as novas políticas curriculares descritas
pelo MEC para a educação profissional e tecnológica.
A metodologia do projeto prevê, entre outras atividades, a realização de entrevistas a
Conselheiros do CNE/MEC diretamente envolvidos com normatizações que irão influenciar
diretamente a dinâmica no ensino aprendizagem do IF’s.
Os pesquisadores se comprometem a preservar a privacidade e o anonimato dos
sujeitos da pesquisa cujos dados serão coletados por meio de gravação em áudio, vídeo,
instrumentos escritos, etc. Esta garantia estende-se à coleta de dados realizadas por terceiros, no
âmbito dste projeto.
Todo o material coletado será utilizado exclusivamente com caráter científico, sendo
acessado apenas pelos pesquisadores do projeto, sendo estes responsáveis por qualquer extravio
ou vazamento das informações confidenciais. O entrevistado é livre para dsistir de participar da
pesquisa a qualquer momento, sem que isto lhe cause quaisquer prejuízo morais, físicos ou
financeiros.
Os instrumentos de coleta de dados serão mantidos por um período de até cinco anos sob
a responsabilidade dos pesquisadores e após este período, serão destruídos.
__________________________
Profª Drª Débora Cristina Jeffrey
Entrevistador:
Entrevistador:
_________________________
Profª Ana Keila Ennes Andrade
214
APÊNDICE 3 - ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA ANALISTAS POLÍTICOS
Fala inicial explicando o projeto e os conceitos de política e currículo com o qual o
projeto trabalha, a importância das entrevistas no contexto da pesquisa e ratificar a garantia de
confidencialidade.
Questões motivadoras:
1. Inicialmente eu gostaria que você destacasse coisas que você considera que são
importantes na sua vida e que contribuem para o exercício de sua função
(experiências, vivências, formação, etc.)
2. Na sua avaliação, o que se modifica na Educação Profissional com
a
criação
dos
Institutos (em relação ao que era antes como CEFET) e o que já mudou na Instituição
com este processo de transformação?
3. Existe alguma correlação conceitual entre os termos articulação e integração da
educação profissional e a educação de jovens e adultos? Como o Sr. a compreende?
4. Como essa proposição foi introduzida na legislação nacional (LDB, Plano Nacional de
Educação), Resoluções do CNE?
5. Por que há dualidade no uso dos termos “articulação” e “integração” na legislação, a
exemplo do que pode ser identificado no artigo 37 §3º (A educação de jovens e
adultos deverá articular-se, preferencialmente, com a educação profissional, na
forma do regulamento) e na Lei n. 11.741/2008, no Art. 39 (Educação profissional e
tecnológica, no cumprimento dos objetivos da educação nacional, integra-se aos
diferentes níveis e modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e
da tecnologia) e documentos base de Programas como PROEJA e PRONATEC?
6. Opinião do depoente sobre a trajetória da educação profissional e educação de jovens
e adultos no Brasil, após a LDB n. 9.394/96 e as propostas de articulação e integração
entre as duas modalidades de ensino.
215
7. O Direito trabalhista evoluiu nas garantias sociais e o direito educacional qual é a sua
visão? Os pactos internacionais influenciaram de que modo? Como o governo do PT
se posiciona?
8. Existem mecanismos de articulação (local / regional / nacional) em relação a
educação profissional (oferta – metodologias – resultados)? Como se constroem as
redes de colaboração?
9. Você gostaria de fazer alguma consideração que considere importante e que não foi
contemplada nas questões apresentadas até aqui?
216
APÊNDICE 4 – ORGANOGRAMA INSTITUCIONAL
217
APÊNDICE 5 – ORGANOGRAMA PRÓ REITORIA DE ENSINO
218
APÊNDICE 6 – ORGANOGRAMA PRÓ REITORIA DE EXTENSÃO TECNOLÓGICA
219
APÊNDICE 7 – ORGANOGRAMA PRÓ REITORIA DE EXTENSÃO TECNOLÓGICA
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