PAIS ADOTADOS (Amor que você escolhe, recompensa que não tem preço) PROJETO DE PROTEÇÃO INTEGRAL E PARTICIPATIVA DOS DIREITOS DO IDOSO PROMOTORIA DO IDOSO E DOS DIREITOS HUMANOS DE ITÁPOLIS conscientização 1. INTRODUÇÃO Entender a complexidade da sociedade atual e a mudança de paradigmas da transição do Estado de Bem Estar Social para o Estado denominado „Contemporâneo‟, pressupõe uma análise filosófica do tempo em que vivemos. A sociedade contemporânea ocidental, rotulada de „pós-moderna‟ e „globalizada‟, tem na comunicação instantânea, no avanço tecnológico e na crise do homem, permeados por um modelo de Estado que prima pela maximização de riquezas e eficiência econômica, seus novos paradigmas. Porém, a maioria dos homens olvidam que um dia lhe faltará força para o trabalho e por isso não se preparam para enfrentar no futuro os problemas relacionados à senilidade. De outra parte, a ineficiência do Estado em executar políticas públicas básicas, vem desmobilizando os movimentos sociais e desarticulando os mecanismos de cuidados dos idosos, gerando várias consequências1. Mais do que isso, o Poder Público, ao invés de buscar um projeto de investimento em políticas públicas, rapidamente procura dar uma resposta, por vezes irrazoável, anunciando nova mudança na legislação, como no 1 CAMPILONGO, Celso Fernandes. O Direito na Sociedade Complexa. Apresentação e ensaio de Raffaele De Giorgi, São Paulo: Max Limonad, 2000, p.54 caso do Estatuto do Idoso (Lei n° 10.741/03 - Estatuto do Idoso), no qual se estabelece vários direitos como o de preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas e de destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a sua proteção (artigo 3, incisos II e III do Estatuto do Idoso), sem o verdadeiro lastro de possibilidade de cumprimento imediato pelo Estado, o que fatalmente gerará frustrações a médio prazo. Assim, o american way of life, típico do Estado Social, não mais subsiste frente à falta de estrutura do Estado e às novas demandas decorrentes do envelhecimento da sociedade, que devido ao desenvolvimento de remédios e ao combate a doenças poderá envelhecer, porém muitos estarão longe de poder contar com qualidade de vida. De fato, os avanços na medicina repercutiram diretamente na longevidade da população, porém esses medicamentos, agora contínuos, são necessários para a continuidade da vida e do bem-estar individual. Já a sociedade contemporânea, cada vez mais competitiva, leva ao individualismo, que determina o afastamento dos familiares e desloca para o abandono um grande número de pessoas, principalmente os idosos que permanecem sozinhos e em situação de risco. E a partir desse momento estamos diante de uma „sociedade de risco‟2. Isto porque os idosos longe do bem estar social, passam a se tornar uma classe passiva, pois necessitam, mas não podem contar com serviços públicos gratuitos, porquanto o Estado cria a normatividade que estabelece direitos, mas não tem sistema e meios para o seu efetivo cumprimento. Como corolário, os idosos perdem o exercício do direito a cidadania, posto que o próprio Estado não lhes garante o respeito as suas diferenças decorrentes da idade e o cumprimento de seus direitos básicos. GILBERTO DIMENSTEIN, na obra “O Cidadão de Papel” nos mostra como, apesar da Declaração Universal dos Direitos Humanos e de todos os modernos atos normativos que regem o nosso país, o Brasil ainda 2 Expressão utilizada por ULRICH BECK (La sociedad de riesgo: hacia una nueva modernidad. Barcelona: Paidós. Tradução: Jorge Navarro, Daniel Jiménez e Maria Rosa Borrás, 1998) não conseguiu vencer a desigualdade social e da péssima distribuição de renda3. Ora, é fato que a ordem constitucional brasileira, apesar de seu aparente espírito igualitário, não é capaz de reverter o contexto de iniquidade social nem sequer de criar as condições políticas para a inclusão de setores expressivos da população nos quadros da cidadania formalmente regulada.4 De fato, BOAVENTURA DE SOUZA SANTOS estabelece a não aplicação da lei, a sua aplicação seletiva, a instrumentalização da lei para fins diversos dos oficiais, a não-regulamentação de direitos constitucionais e a ausência de dotação de meios humanos e financeiros para a implantação de políticas públicas, como elementos que implicam na total desvalorização dos direitos sociais previstos na Constituição, conduzindo por consequência a democracia a uma profunda crise de identidade.5 Em verdade, democracia diz respeito ao respeito ao ser humano, que neste momento precisa ser repensada e bem tutelada. Neste contexto, a única forma de realmente proteger o direito integral dos direitos dos idosos é conscientizar a sociedade e chamá-la para uma atuação participativa. Em outro caminho, devemos reconhecer que o Estado não difunde o ensino básico de respeito aos direitos do idoso, no momento em que se pode notar pessoas estacionando nas vagas que lhe são reservadas, sem o menor remorso de que aquele comportamento é no mínimo injusto. Porém, atento a essa condição, o legislador brasileiro estabelece a necessidade de tutela de valores ligados à estas pessoas em presumido estado de hipossuficiência, como ocorreu, por exemplo, com o advento da Lei n° 10.741/03 (Estatuto do Idoso). No entanto, mesmo após dez anos de aprovação da referida normatividade, o Estado não propiciou meios de proceder ao cumprimento dos direitos conferidos aos idosos. 3 DIMENSTEIN, Gilberto. O Cidadão de Papel. Ed. Ática, 2005. 4CAMPILONGO, op. cit., p. 56 10 SANTOS, BOAVENTURA DE SOUZA. O Estado e a Sociedade em Portugal (1974-1988); Afrontamento (1990), apud CAMPILONGO, op. cit., p. 62 5 Id. Enquanto isso o individualismo moderno, os déficits econômicos e a desestrutura da família, leva que os idosos sejam institucionalizados. A rigor, a tradicional família patriarcal está passando por transformação: a mulher, acertadamente, decidiu trabalhar e os filhos têm compromissos próprios; o homem, antes mero provedor, também tem de assumir seu papel de partícipe na criação e educação dos filhos. Ocorre que as mudanças ainda não foram assimiladas pela sociedade a ponto da educação ser devidamente reestruturada e com isso os idosos que não mais se encontram nesta nova estrutura familiar passam a morar sozinhos ou em instituições privadas ou públicas. Essa mudança estrutural da célula mais importante da sociedade brasileira já é algo perceptível. Contudo, ao que parece, nós não nos conscientizamos que o „problema da família‟, nestes novos tempos, não é mais um simples „problema da família‟. A sociedade e o Poder Público devem, necessariamente, interceder e auxiliar, sobretudo nas comunidades mais carentes. É preciso agir preventivamente. É preciso se aproximar da coletividade, da população, mantendo-se permanentemente aberto e acessível a ela, conhecendo-lhes os problemas, angústias e aflições, sabendo interpretar lhes os sentimentos, lutando para assegurar o respeito a seus direitos e interesses. Isso, além do caráter assistencialista, representa impedir inúmeros outros problemas que decorrerem, por consequência lógica e que podem levar ao abandono do idoso. Num panorama como este, é certo que Instituição nenhuma consegue agir sozinha. Sem uma visão multidisciplinar da referida questão, sem compreender que o trato do tema adoção de políticas públicas preventivas ou repressivas imediatas - está voltado para uma atuação conjunta entre Poder Público, comunidade forense e sociedade civil, estaremos nos habituando a conviver com um problema grave e que atinge a todos. 2. DA PROTEÇÃO PARTICIPATIVA DO DIREITO DO IDOSO Antes de serem instrumentos essenciais à função jurisdicional, o Ministério Público e a Ordem dos Advogados são aliados do cidadão no fomento de respeito à dignidade da pessoa humana, máxime quando se trata de temas relacionados aos direitos dos idosos. Aliás, além das questões recorrentes que atingiam a família brasileira, há uma nova tendência mundial: a presença intensa e massiva da terceira idade no cotidiano das civilizações, por conta da modificação da taxa de mortalidade e expectativa de vida. O IBGE divulgou sua projeção da população para 2050, segundo o qual o número de idosos será igual ao de jovens. Não por outro motivo, o advento do Estatuto do Idoso representou a ampliação do sistema protetivo, em verdadeira ação afirmativa para efetivação da igualdade material. Desta forma torna-se necessário que a questão seja discutida com a sociedade, visando à efetiva proteção dos direitos dos idosos por todos os munícipes de Itápolis. O tema é tão relevante que merece a consolidação de uma política social permanente que sirva, inclusive, como base para ser seguida pelo Poder Público. Pretende-se assim com o projeto denominado: Pais Adotados Amor que você escolhe, recompensa que não tem preço, incentivar e coordenar a participação de pessoas jurídicas e físicas nos cuidados com os idosos abrigados do Município de Itápolis, formando uma rede social constituída por todos os seguimentos da sociedade e por entidades privadas parceiras, cadastradas junto ao “Abrigo Rainha da Paz”. Pretende-se que tais pessoas auxiliem nas necessidades básicas e principalmente no que se refere à reintegração do idoso no meio familiar e social. Parece-nos uma solução razoável e que pode ser operada por meio de voluntários que se envolvam com o problema que atualmente acomete a cidade de Itápolis, pois a cada dia há uma maior procura visando a institucionalização dos idosos, que podem ser amparados em seus lares, evitando-se assim a desestruturação familiar. Com isso, evita-se o efeito em cadeia de abandono dos idosos e com isso a seguida desestrutura social. 3. OBJETIVOS DO PROJETO O presente projeto será realizado pela Promotoria de Justiça de Itápolis com a cooperação da “Paróquia Divino Espírito Santo”, que atualmente cuida do abrigo “Abrigo Rainha da Paz” e da Ordem dos Advogados de Itápolis e terá por objetivo promover a assistência dos idosos que se encontram abrigados, disseminando a cultura de que as pessoas jurídicas e físicas possam, através de colaboração moral e material, evitar o abandono social dos idosos. A ideia é resgatar e primar pela dignidade, cidadania e participação social do idoso. Iniciando-se com questões mais prementes (visitas contínuas, eventos no local, colaboração material com a aquisição de bens de consumo pessoal - destinados aos cuidados do idoso), levaremos ajuda ao local em que estão abrigados - após a formação de cadastro de parceiros que se habilitem a cooperar com o “Abrigo Rainha da Paz”. Em continuidade, irá se buscar a formação de uma rede de proteção dos idosos abrigados, visando o atendimento de seus direitos e a sua inclusão comunitária e social. Somente assim à sociedade itapolitana poderá velar pela composição de seus próprios interesses e no respeito às pessoas que prestaram relevantes serviços a nossa sociedade, prestando-lhes as devidas homenagens. O Ministério Público e a Ordem dos Advogados de Itápolis continuarão, através de instrumentos jurídicos adequados, velando pelo acesso às áreas de saúde jurídica e social dos idosos. Entretanto, necessita incentivar toda a sociedade a se conscientizar e nos auxilie a velar pelo direito dos idosos. 4. JUSTIFICATIVA A proposta deste trabalho é inédita e possibilitará que a sociedade forme uma rede de proteção aos idosos, minimizando os problemas ocasionados pela desestrutura do Estado. 5. METAS Possibilitar que a sociedade passe a acolher cada vez mais os idosos em direitos que não são disponibilizados através dos órgãos governamentais, minimizando os problemas locais e possibilitando assim formas de reintegração social dos idosos. 6. ESTRATÉGIAS DE AÇÃO a) reunião pública - com todos os seguimentos da sociedade para a iminente implantação do projeto Pais Adotados - Amor que você escolhe, recompensa que não tem preço, que permitirá a identificação e a formação de cadastro envolvendo todos os seguimentos sociais; b) trabalho conjunto com os integrantes do “Abrigo Rainha da Paz”, a fim de se analisar os instrumentos necessários que determinam de cooperação social; c) fomento à criação de uma verdadeira rede protetiva em Itápolis (em busca de parceiros privados), visando buscar a proteção integral dos idosos; d) conscientização externa - divulgação das atividades desenvolvidas, criando uma cultura de política afirmativa e fomentando o auxílio da sociedade para fazer parte da rede protetiva em favor o idoso; e) divulgação do evento nas redes sociais, em especial com criações de páginas no Facebook, com o nome do projeto e fomento com a imprensa local, visando divulgar o projeto e chamar a atenção da sociedade para a necessidade de respeito aos direitos dos idosos; f) palestras em escolas, buscando a conscientização das crianças e adolescentes em relação ao direitos dos idosos e visitação mensal e contínua aos abrigados em nítida busca da reintegração do idoso nos meios sociais; g) trabalho conjunto com os grupos de jovens da igreja católica e de serviços (Maçonaria, Rotary, Lions, Demoley, Interact, Nova Era, Brasa, Filhas de Jó), buscando a cooperação, em termos de visitas festivas (aniversário de todos os idosos, dias dos pais, dias das mães, páscoa e natal), bem como para integrarem o sistema de proteção dos idosos, no intuito de que possam continuar a viver de forma digna e plena. Itápolis, 09 de maio de 2.014. LUCIANO GARCIA RIBEIRO 1º Promotor de Justiça de Itápolis (Promotoria de Justiça dos Direitos do Idoso) CARLOS EDUARDO IMAIZUMI 2º Promotor de Justiça de Itápolis (Promotoria de Justiça dos Direitos Humanos)