UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A LEGALIDADE DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA NA CONTA TELEFÔNICA MICHELLI MILKIEWICZ ITAJAÍ, OUTUBRO DE 2008. UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A LEGALIDADE DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA NA CONTA TELEFÔNICA MICHELLI MILKIEWICZ Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Msc. Maria da Graça Mello Ferracioli ITAJAí, OUTUBRO DE 2008. AGRADECIMENTO A Deus, por tudo. Aos meus ex-chefes da Brasil Telecom e sempre amigos, Dr. Leonardo Reis de Oliveira e Dra. Valéria Benedita dos Santos, pelo incentivo à pesquisa, bem como, aos demais colegas que estiveram comigo nos dois anos de estágio realizado na empresa. A minha Orientadora, Professora Maria da Graça, pela atenção, dedicação e carinho dispensados. A minha família que eu amo muito e sempre esteve ao meu lado, acreditando em mim e me dando força nos momentos de angústia. Aos amigos Plínio e Elizabeth De Nes por toda ajuda e, sem a qual, eu não teria chego até aqui. Aos meus verdadeiros amigos, que me confortaram e, muitas vezes, me fizeram enxergar “o outro lado da moeda”, pessoas essenciais em minha vida. DEDICATÓRIA A todos os usuários e clientes das empresas de telefonia brasileira pela paciência dispensada diariamente com estas, visto que apesar das inúmeras reclamações, estão sempre em busca de um serviço adequado, moderno e de qualidade para todos nós brasileiros. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí/SC, 20 de novembro de 2008. Michelli Milkiewicz Graduando PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Michelli Milkiewicz, sob o título A Legalidade da Cobrança da Tarifa de Assinatura Básica na Conta Telefônica, foi submetida em 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Josemar Sidinei Soares (examinador), e Maria da Graça Mello Ferraciolli (orientadora) e aprovada com a nota ____________________. Itajaí/SC, 20 de novembro de 2007. Maria da Graça Mello Ferracioli Orientador e Presidente da Banca Prof. Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS ANATEL Agência Nacional de Telecomunicações CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica C.R.F.B./88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 EMBRATEL Empresa Brasileira de Telecomunicações S/A LGT Lei Geral de Telecomunicações STFC Sistema Telefônico Fixo Comutado STJ Superior Tribunal de Justiça TELEBRÁS Telecomunicações Brasileiras S/A TELESP Telecomunicações de São Paulo S/A ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Agência reguladora Para Menezello (2002, p65), “a missão das agências é regular, normatizar, controlar e fiscalizar as atividades desenvolvidas por particulares, tendo em vista o interesse público”. Anatel “A Agência Nacional de Telecomunicações configura-se em uma autarquia especial, vinculada ao Ministério das Comunicações. Portanto, trata-se de pessoa jurídica de direito público de âmbito federal, autônoma (embora sujeita ao controle estatal), criada por lei e com o objetivo de praticar de forma especializada, determinada função pública. Detém patrimônio, receitas e atribuições próprias, diferenciando-se da entidade da Administração Direta que a criou”, conforme Moraes A. (2002, p.85). Concessão de Serviço Público “Concessão é uma espécie, em cujas manifestações se verifica, sempre, a incumbência de um serviço público a uma pessoa de direito privado, que em se nome os exerça” é o conceito de Masagão apud Di Pietro (2008, p. 272) Contrato de Concessão de Serviço Público Meirelles (2006, p.392) o define como “documento escrito que encerra a delegação do poder concedente, define o objeto da concessão, delimita a área, forma e tempo da exploração, esclarece os direitos e deveres das partes e dos usuários dos serviços”. Licitação Di Pietro (2008, p. 331) conceitua “licitação como o procedimento administrativo pelo qual um ente público, no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para a celebração do contrato”. Princípio da Legalidade Para Meirelles (2006, p.87) “significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso”. Princípio da Modicidade ou do Equilíbrio da Prestação dos Serviços Públicos Para Gasparini (2004, p. 285), “a modicidade impõe sejam os serviços públicos prestados mediantes taxas ou tarifas justas, pagas pelos usuários para remunerar os benefícios recebidos e permitir o seu melhoramento e expansão. Assim, os serviços não devem ser prestados com lucros ou prejuízos, mas mediante retribuição que viabilize esses interesses”. Serviço Público Cretella (1980, p. 55) afirma que "serviço público é toda atividade que o Estado exerce, direta ou indiretamente, para a satisfação das necessidades públicas mediante procedimento típico do direito público". Tarifa “Prestação pecuniária, decorrente da livre manifestação de vontade do comprador, exigida pelo Estado, ou órgão estatal, ou empresa associada, concessionária ou permissionária, em contraprestação pela aquisição de um bem material ou imaterial. Como conseqüência, a receita obtida através de preços públicos apresenta-se original e facultativa” Moraes B. (1990, p. 322). Tarifa de Assinatura Básica “Tarifa mensal cobrada nas contas telefônicas, prevista no contrato de concessão firmado entre a concessionária e a agência reguladora, visando a cobertura dos custos operacionais para a disponibilização ininterrupta dos serviços de telefonia fixa a todos os assinantes”. Brincas (2006)1. Taxa Gasparini, (2004, p.287) afirma que “(...) são remunerados por taxa, os serviços públicos em que sua utilização pelo administrado for obrigatória, não importando, neste caso, se há, ou não, efetiva utilização”. 1 Matéria retirada da Apelação Cível interposta contra a Ação Declaratória n.° 086.05.000067-0 da Vara Única de Otacílio Costa, do escritório Marcondes Brincas de Florianópolis/SC, que efetua as defesas da Empresa Brasil Telecom, referentes aos processos de Assinatura Básica, sendo que, assinam as peças o Dr. Renato Marcondes Brincas e o Dr. Karlo Koiti Kawamura. SUMÁRIO RESUMO .......................................................................................................................................... XIII INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 01 CAPÍTULO 1 .................................................................................................................................... 03 TARIFA .............................................................................................................................................. 03 1.1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS ..................................................................................................... 01 1.1.1 Conceito........................................................................ ................................ .......................03 1.1.2 Indelegabilidade da competência para fixar tarifas ...................................................... 04 1.1.3 Princípio do Equilíbrio ........................................................................................................... 04 1.1.4 Critérios para fixação tarifária ............................................................................................ 05 1.1.5 Critérios e procedimentos de reajuste e revisão ............................................................. 07 1.2 NATUREZA JURÍDICA DA TARIFA.............................................................................................. 09 1.2.1 Diferença entre tarifa e taxa ............................................................................................... 09 1.2.2 Elementos integrantes da tarifa .......................................................................................... 13 1.2.3 Modalidades de tarifa.......................................................................................................... 14 1.2.4 Modelo Tarifário .................................................................................................................... 15 1.2.5 A tarifa de assinatura básica na conta telefônica ........................................................... 16 CAPÍTULO 2 .................................................................................................................................... 18 A EXPLORAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ................................................................................. 18 2.1 Serviço Público ......................................................................................................................... 18 2.1.1 Conceitos ............................................................................................................................... 18 2.1.2 Elementos da definição ....................................................................................................... 19 2.1.3 Requisitos do serviço público ............................................................................................. 21 2.1.4 Princípios do serviço público .............................................................................................. 23 2.1. 5 Classificação dos serviços públicos ................................................................................. 25 2.2 Concessão de serviço público .............................................................................................. 27 2.2.1 Conceitos e características da concessão de serviços públicos ................................. 28 2.2.2 Regulamentação .................................................................................................................. 30 2.2.3 Licitação ................................................................................................................................ 31 2.2.4 Contrato de concessão de serviço público ..................................................................... 33 2.2.5 Fiscalização e intervenção na concessão ....................................................................... 37 CAPÍTULO 3 .................................................................................................................................... 40 3.1 AGÊNCIAS REGULADORAS ................................................................................................... 40 3.1.1 Conceito e características .................................................................................................. 40 3.1.2 Controle das Agências Reguladoras ................................................................................. 44 3.1.3 Autonomia das Agências Reguladoras ............................................................................. 46 3.2 ANATEL ...................................................................................................................................... 47 3.2.1 Natureza jurídica da Anatel ................................................................................................ 48 3.2.2 Independência da Anatel ................................................................................................... 49 3.2.3 Anatel: regulação da concorrência .................................................................................. 50 CAPÍTULO 4 .................................................................................................................................... 53 A LEGALIDADE DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA ................................ 53 4.1 ORIGEM ..................................................................................................................................... 53 4.1.1 O início do cenário brasileiro nas telecomunicações .................................................... 53 4.1.2 A privatização ....................................................................................................................... 55 4.2 A LEGALIDADE DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA NA CONTA TELEFÔNICA ..................................................................................................................................... 56 4.2.1 O princípio da legalidade ................................................................................................... 56 4.2.2 A existência de legislação específica .............................................................................. 58 4.2.3 A efetiva prestação do serviço .......................................................................................... 59 4.2.4 A expansão dos serviços através da tarifa de assinatura .............................................. 62 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................... 68 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................................................................... 71 RESUMO A presente pesquisa tem como objetivo geral, uma análise acerca da legalidade da polêmica cobrança da tarifa de assinatura básica nas contas telefônicas dos brasileiros, bem como, as razões dos diversos julgados espalhados pelo país que concluíram pela legalidade. Em um primeiro momento, trata Tarifa de forma geral, observando a importante distinção entre esta e a Taxa. Em seguida, aborda o que vem a ser o Serviço Público, tendo em vista sua extrema importância, para explicar a decorrência da cobrança, trazendo alguns conceitos e princípios, bem como, seu Contrato de Concessão. Segue ainda, esclarecendo os objetivos e características das Agências Reguladoras que fiscalizam o atual sistema de telefonia. Por fim, traz um breve histórico do sistema brasileiro de telecomunicações nacional, tratando especificamente da questão da Legalidade da referida Cobrança, ensejando demonstrar o quanto a Tarifa de Assinatura Básica é necessária e importante para o bom desenvolvimento e crescimento deste setor em nosso país, e também, para cumprir as metas de universalização exigidas pelas Agências Reguladoras. INTRODUÇÃO Buscando melhor compreensão sobre as relações entre os usuários e as empresas de telefonia, esta monografia tem como objeto a legalidade da cobrança da tarifa de assinatura básica nas contas telefônicas dos usuários deste serviço em nosso país, procurando esclarecer o assunto através de doutrinas e legislação. O presente trabalho foi dividido em quatro capítulos. No Capítulo 1, será tratada a questão da Tarifa e seus conceitos. Esta enseja uma idéia de prestação pecuniária decorrente da vontade do cidadão em obter, ou não, os serviços de telefonia em sua residência. Traz, ainda, critérios de reajuste, revisão e fixação tarifária e a importante diferença entre tarifa e taxa. No Capítulo 2, será abordado o conceito de serviço público, o qual se faz necessário para o complemento da pesquisa. Traz, também, seus requisitos e princípios essenciais. Observar-se-á como funciona o contrato de concessão deste serviço que determina o modo e a forma da prestação, bem como, as condições de remuneração da empresa concessionária. O Capítulo 3 trará as agências reguladoras com seus conceitos e características, assim como uma de suas insubstituíveis funções, a de fiscalizar as empresas concessionárias, entre outras. Aborda, ainda, a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL – quanto à sua natureza jurídica e autonomia. O quarto e último Capítulo buscará pesquisar com maior profundidade o tema chave desta pesquisa, qual seja, a legalidade ou não da cobrança da tarifa da assinatura básica das contas telefônicas, e para tanto iniciará fazendo um breve histórico do sistema brasileiro de telecomunicações nacional e uma análise geral sobre a legalidade da cobrança da tarifa de assinatura básica, abordando as teorias criadas para fundamentar a suposta ilegalidade e abusividade desta cobrança, ocasionadas, na maioria das vezes, pelo desconhecimento da matéria. A pesquisa foi desenvolvida tendo como base três hipóteses: a) Tarifa é uma prestação pecuniária cobrada em decorrência da vontade do cidadão em obter, ou não, determinados serviços . b) Determinados serviços públicos podem ser prestados através do regime da concessão ; c) No Brasil os serviços de telecomunicação são devidamente fiscalizados pelas Agências Reguladores; d) A cobrança da tarifa de assinatura básica pelas empresas concessionárias nas contas telefônicas é pautada pela legalidade. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, foi utilizado o Método Indutivo, sendo que, nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. CAPÍTULO 1 TARIFA 1.1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS 1.1.1 Conceito Antes de falar sobre a tarifa de assinatura básica, fazse necessária uma explanação acerca do conceito da palavra tarifa, cujos aspectos se revestem de importância jurídica e, especialmente econômica, Cretella (2002, p.406) dispõe que: (...) tarifa é a determinação do quantum a ser pago pelo usuário, fixação essa feita pelo poder público, depois, como o quantum, em dinheiro, que o usuário é obrigado a pagar à empresa concessionária, quando se utiliza, em concreto, do serviço concedido. Moraes B. (1990, p.322), conceitua preço público ou tarifa: Prestação pecuniária, decorrente da livre manifestação de vontade do comprador, exigida pelo Estado, ou órgão estatal, ou empresa associada, concessionária ou permissionária, em contraprestação pela aquisição de um bem material ou imaterial. Como conseqüência, a receita obtida através de preços públicos apresenta-se original e facultativa. 2 Tarifa é uma receita que provém da intervenção do Estado, como poder concedente, através de suas empresas concessionárias, onde o valor da cobrança (preço público) busca uma justa remuneração do capital, visando uma margem de lucro que não onere excessivamente o usuário, e também, uma melhora e expansão dos serviços, assegurando assim, o equilíbrio econômico e financeiro do contrato. A tarifa é a cobrança de um serviço facultativo. Não sendo sua exigência compulsória, não é possível considerar o preço público como uma espécie de tributo, pois não tem por base o poder fiscal do Estado (não é receita tributária). 1.1.2 Indelegabilidade da competência para fixar tarifas A fixação da tarifa tem competência indelegável e deverá ser fixada pelo próprio poder concedente (Estado). Ao particular (empresa concessionária), cabe somente a competência para desenvolver as tarefas atinentes à definição da tarifa ou sua revisão. Mesmo que veiculada por lei, seria nula qualquer previsão que atribuísse ao particular o poder de estabelecer tarifas. Segundo Cretella (2002, p. 408), “a fixação das tarifas é, materialmente, ato administrativo, usualmente exercido pelo Poder Executivo”. A tarifa adequada será calculada por ato unilateral da empresa concessionária e será submetida à análise do concedente, o qual tem competência privativa para aceitar ou rejeitar o entendimento. 1.1.3 Princípio do Equilíbrio A fixação tarifária deve obedecer ao princípio do equilíbrio (modicidade). 3 A cobrança da tarifa deve ser suficiente para viabilizar a prestação de serviço da empresa concessionária, onde há a remuneração do concessionário por seus custos e investimentos, e ainda, deve atender às necessidades de expansão e melhoramento do serviço. Se a tarifa não for economicamente justa, não se encontrará capital privado interessado em investir e colaborar com a Administração Pública. Segue a lição de Bielsa apud Justen Filho (2003, p.318): (...) como o concessionário não pode converter a exploração do serviço em um negócio lucrativo sem limites o que implicaria enriquecimento irregular à custa dos usuários como consequência de uma atividade própria do Estado, este tem o dever de moderar a exploração, mediante a revisão de tarifas, que devem ser justas e razoáveis. O princípio da modicidade da tarifa deve indicar preços razoáveis, que estejam ao alcance dos usuários. Em contraprestação, há a obrigação da manutenção de serviço adequado por parte da concessionária. Este princípio busca o equilíbrio financeiro na concessão de serviço público. 1.1.4 Critérios para fixação tarifária A tarifa desempenha duas funções. Sobre elas dispõe Cretella (2002, p.409): (...) nas relações entre concessionário e público, a de regular o preço das prestações de serviço, nas relações entre concessionário e concedente, a de regular os termos em que aquele consente a este a remuneração da sua iniciativa e dos seus capitais. Sem um mínimo de garantias na retribuição, ninguém iria tomar sobre os ombros a onerosa responsabilidade jurídico-econômica da 4 exploração do serviço público. Por esse motivo, os termos em que o concessionário poderá fixar as tarifas do serviço são objeto de cláusula contratual, quando a concessão é concretizada por contrato (...) Ainda que existam modelos econômicos e jurídicos para a fixação das tarifas, o poder concedente deve estabelecer uma proposta que seja cabível política e socialmente, e que mantenha a estabilidade do concessionário. É o entendimento de Justen Filho (2003, p.374): (...) a simples adoção do modelo de concessão já reflete uma proposta política sobre a repartição dos encargos atinentes ao fornecimento de utilidades essenciais. Reflete a concepção de que o custo dessas utilidades será arcado diretamente pelos que delas se utilizam. Celebrada a concessão, consagra-se o postulado de que paga quem usa e na medida em que o faz (itálico no original). Não é possível fixar tarifas baseando-se em uma partilha aritmética onde seriam avaliados os custos do serviço e o consumo entre os usuários. A redação do art. 9º da Lei 8.987 de 1995 que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, explica a regra de fixação tarifária: Art. 9 – A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato. § 1º A tarifa não será subordinada à legislação específica anterior, e somente nos casos expressamente previstos em 5 lei, sua cobrança poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário. § 2º Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômicofinanceiro. § 3º Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos, conforme o caso. § 4º Em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo, concomitantemente à alteração. Observar-se-á, a seguir, como funcionam as alterações no contrato, quanto ao reajuste e a revisão das tarifas. 1.1.5 Critérios e procedimentos de reajuste e revisão Deverão constar no contrato os procedimentos para reajuste e revisão das tarifas, e no edital, devem constar os critérios. Há diferença entre o conceito de reajuste e revisão. Conforme define Justen Filho (2003, p.263): O reajuste corresponde à modificação do valor da tarifa para enfrentar elevações normais de custos, relacionadas ao fenômeno inflacionário. Tanto poderá cogitar-se de inflação geral como de inflação setorial. Ou seja, pode-se admitir que um determinado setor de atividades se sujeite a variações de custos mais acentuadas, exigindo a adoção de índices específicos. Em princípio, o reajuste será 6 promovido periodicamente - asserção que deriva das circunstâncias nacionais, em que o fenômeno inflacionário tem-se mantido de um modo contínuo (itálico no original). Ainda neste rumo, dispõe Meirelles (2006, p.215): (...) o reajustamento contratual de preços e tarifas é a medida convencionada entre as partes contratantes, para evitar que, em razão das elevações do mercado, da desvalorização da moeda ou do aumento geral de salários no período de execução do contrato administrativo, venha a romper-se o equilíbrio financeiro do ajuste. Para que não se altere a relação encargo-remuneração em prejuízo do contratado, a Administração procede à majoração do preço, unitário ou global, originariamente previsto para a remuneração de um contrato de obra, serviço ou fornecimento ou da tarifa inicialmente fixada para pagamento de serviços públicos ou de utilidade pública prestados por particulares, em ambos os casos em conformidade com os critérios expressamente estabelecidos no ajuste (itálico no original). O reajuste deve ter um procedimento automático e simples, levando em conta que se trata de uma conduta contratual, prevista em lei, e que é de responsabilidade do poder concedente. Havendo a omissão do poder concedente, este, consequentemente autorizará que sejam aplicadas soluções automáticas pela concessionária, que não pode ser prejudicada pelo silêncio do Estado sobre o direito de reajuste. Este reajuste acontecerá nas épocas previstas contratualmente (geralmente de 12 em 12 meses), onde serão aplicados os índices acertados e o poder concedente determinará a elevação das tarifas. 7 A revisão também é de responsabilidade do poder concedente, em negociação com a concessionária, onde esta deverá demonstrar que eventos excepcionais provocaram modificações nos custos e deverá comprovar “a renda da empresa, as despesas do serviço e a remuneração do capital investido ou a ser investido nas ampliações necessárias” (Meirelles, 2006, p.243). Explica Justen Filho (2003, p.319): Nem edital nem contrato poderão frustrar indiretamente o direito de o concessionário obter a revisão das tarifas. Não é juridicamente admissível que se preveja um procedimento incompatível com o princípio da ampla defesa e do contraditório. Deverá dar-se oportunidade para o concessionário produzir provas e a decisão administrativa deverá ser motivada. Não se admite, enfim, que a decisão desvincule-se da avaliação da alteração da equação econômico-financeira e se funde em razões de conveniência, assim entendidas aquelas relativas aos interesses secundários. A revisão é um procedimento que deverá ser pleiteado pela concessionária e pode vir a ser demorado. Porém, se essa demora for injustificada, ela caracteriza infringência no processo administrativo, podendo assim, a concessionária buscar tutela jurisdicional, onde continuará prestando serviço, e uma demora no pedido de revisão, pode acarretar desrespeito ao direito constitucionalmente assegurado a ela. 8 1.2 NATUREZA JURÍDICA DA TARIFA 1.2.1 Diferença entre tarifa e taxa A diferença entre taxa e tarifa (preço público) é uma questão complexa para os doutrinadores, já que são espécies autônomas de remuneração dos serviços públicos. Taxa é uma obrigação instituída por lei, onde as pessoas que se encontram na situação de usuário, custeiam determinado serviço jurídico-administrativo do Estado. Deve respeitar o princípio da anualidade (ser instituída e estar vigente em um ano, para ser exigida no seguinte). A previsão da cobrança de taxas encontra-se na Constituição da República Federativa do Brasil de 19882, em seu art. 145, II: Art. 145 A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...] II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; No caso de taxa, aplica-se o regime tributário, e é uma cobrança a ser utilizada quando o consumo de serviço público for compulsório. 2 As taxas somente podem ser instituídas em A partir de agora a respectiva Constituição da República Federativa do Brasil será apresentada sobre a abreviatura C.R.F.B./88. ato 9 materialmente legislativo, por força do princípio da representação como base do poder impositivos fiscal. Gasparini (2004, p.287), define: “Os serviços públicos são remunerados por taxa ou tarifa. São remunerados por taxa sempre que sua utilização pelo administrado for obrigatória, não importando, neste caso, se há, ou não, efetiva utilização”. Já a tarifa, é uma obrigação assumida voluntariamente. Depende da adesão por parte do usuário e por ser contratual não tem caráter compulsório. Compulsoriedade é conseqüência e não causa da distinção entre taxa e tarifa. Para, em certa situação, ter-se uma taxa (“compulsória”) ou um preço (“voluntário”), seria preciso definir, antes, qual dessas figuras deve (ou pode) ser aplicada. Se cabível a taxa, a “compulsoriedade” seria mera conseqüência do seu regime jurídico. Se houver outra opção para o indivíduo fruir a utilidade que é objeto do serviço público, este serviço será remunerado por tarifa, caso contrário, por taxa. Entendendo-se, portanto, por tarifa, a quantia entregue pelos particulares usuários às empresas concessionárias que exploram serviços públicos. É o quantum a ser pago pelo usuário para remunerar os serviços públicos facultativos, ou seja, o serviço é oferecido aos utentes, mas estes utilizam quando e se desejarem. A fixação deste valor é feita pelo poder público (Estado), e seu regime é de direito administrativo. É chamada também de preço público, pois quando o preço de certa quantidade de serviço vem fracionado em unidade, ele se traduz em tarifa (grifo nosso). Escreve Laubaudére apud Justen Filho (2003, p.274): Nas relações entre concedente e concessionário, a questão da natureza jurídica da tarifa é muito discutida. A 10 maioria dos autores que admitem a natureza mista da concessão de serviço público não hesitam em considerar a tarifa como parte das cláusulas regulamentares desta. Sem dúvida, as quantias autorizadas pelas cláusulas tarifárias correspondem a vantagens financeiras reconhecidas à concessionária a título de remuneração, mas não é menos verdade que a tarifa constitui elemento essencial das regras de funcionamento do serviço público. A tarifa deve ser instituída por decreto. A natureza regulamentar da tarifa determina que é proibido ao concessionário qualquer elevação unilateral das quantias estabelecidas. Desse modo, essa quantia paga pelo usuário não pode ser considerada contribuição fiscal (como a taxa e o imposto, por exemplo), já que não é o Fisco que impõe a cobrança. Tarifa não é um tributo. “O fato de constituir emanação da vontade do Estado não é suficiente para instituir às tarifas natureza tributária” (Cretella, 2002, p 410). Segue a distinção de Justen Filho (2006, p.528): A primeira diferença entre taxa e tarifa se relaciona com a cobrança por serviços potenciais, colocados à disposição do usuário. O regime jurídico da taxa se caracteriza pela possibilidade de exigência do pagamento da prestação tributária mesmo quando não tiver ocorrido a fruição efetiva do serviço público. Já o regime jurídico da tarifa não comporta solução exatamente idêntica – ainda que possa admitir a existência de tarifas mínimas. Não é possível o usuário ser constrangido, contra a própria vontade, a usufruir o serviço e pagar a tarifa. A segunda diferença consiste no princípio da estrita legalidade, característico do direito tributário. Consagrado no art. 150, I, traduz-se na necessidade de todos os 11 aspectos do tributo serem definidos por lei, eliminando-se a discricionariedade administrativa. Uma taxa de serviço público apenas pode ser cobrada se tiver sido instituída em lei, e é necessário que seu montante conste de um mandamento normativo legal. Já a tarifa tem regime jurídico distinto, sendo fixada na via administrativa. Não se sujeita ao princípio da estrita legalidade, seja no tocante à sua instituição, seja no relativo à sua modificação. A terceira diferença tem a ver com o princípio da anterioridade, pelo qual nenhum tributo será exigido no mesmo exercício em que tiver sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou (Constituição, art. 150, III, b). O princípio se aplica a taxas, e não a tarifas. Ainda, sobre a diferenciação de taxa e preço público na natureza do serviço, Canto apud Amaro (1999, p.89) afirma: (...) aquele que se apresentar como emanação necessária do poder soberano do Estado ensejaria a cobrança de taxa (por exemplo, a expedição de passaporte); já se cuidaria de preço se o serviço não é necessariamente público (por exemplo, serviço de telefonia). Cumprindo mandamento constitucional (art. 175, § único, III), a Lei nº. 8.987/95 regulou a matéria relativa à política tarifária (arts. 8º a 13). 1.2.2 Elementos integrantes da tarifa A prerrogativa de estabelecer e regular tarifas é considerada inerente ao poder de polícia, baseando-se “no princípio de que o Estado regula todo o serviço público sobre pontos básicos, fixados ou não, desde que não interfiram no direito de propriedade do 12 concessionário, que tem proteção constitucional efetiva dentro e fora da lei” (Cretella, 2002, p. 409). Segundo Meirelles (2006, p. 131), poder de polícia é o “mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito individual”. Explica Cretella (2002, p.409): Em toda tarifa, há elementos essenciais, que devem estar presentes, caracterizando-a, e que, ausentes, desnaturam a essência do instituto. Entre estes, pela importância, estão incluídas a igualdade, a certeza e a equidade. A igualdade do quanto que cada usuário pagará se fundamenta no pressuposto jurídico da igualdade impositiva e de seu corolário prático, a uniformidade. A certeza da estabilidade da tarifa é outro elemento do instituto, devendo para isso, revestir-se de publicidade e de autorização legal. Mediante lei ou regulamento delegado se procede à fixação da tarifa. A equidade de sua determinação é enfim, o terceiro elemento da tarifa, incluindo-se, aqui, a conveniência, a oportunidade, a razoabilidade, a justiça e a modicidade das remunerações devidas pelo usuário. Pode-se perceber claramente que a composição da tarifa com seus elementos essenciais consiste em critério legal de segurança, onde esta tarifa, calculada em critérios objetivos é uma garantia do usuário de serviço público contra possíveis atos abusivos das concessionárias. 1.2.3 Modalidades de tarifas 13 As principais modalidades de tarifa são a proporcional, gradual, única e diferencial. A modalidade de tarifa que estabelece o “preço” do serviço telefônico é a proporcional, conforme explica Cretella (2002, p. 407): Proporcional é a tarifa em que o preço varia na razão direta da utilidade usufruída, como por exemplo, nos transportes ferroviários, em que o preço varia na medida do “espaço” percorrido (metrô de Londres, por exemplo), nas transmissões telegráficas, em que o preço varia na razão direta das “palavras” utilizadas, nas comunicações telefônicas medidas em que a unidade de serviço é a “duração” da conversação. Esta modalidade de tarifa é baseada no princípio da proporcionalidade ou razoabilidade, que busca controlar os atos administrativos e legislativos, exigindo que esses atos estejam adequados entre os meios utilizados, e os fins desejados. 1.2.4 Modelo Tarifário Quanto aos modelos tarifários, é necessário fazer uma distinção entre concorrência ou monopólio. Essa modelagem se relaciona com os critérios de fixação de tarifas, cuja competência é do poder concedente. Sobre o assunto, dispõe Justen Filho (2003, p. 351): Uma questão fundamental a ser considerada a propósito do modelo tarifário reside no regime da prestação do serviço. Se houver concorrência (ausência de exclusividade), a tendência será que as tarifas sejam fixadas segundo os mecanismos de mercado. A demanda 14 e a oferta funcionarão como instrumentos autônomos para determinar os preços, incumbindo ao poder concedente uma função mais restrita – consistente em evitar práticas ofensivas à livre competição. Quando, porém, existir monopólio (natural ou não), a situação apresenta contornos muito diversos. Não se pode recorrer a uma competição no mercado para obter a determinação dos preços. A remuneração pela prestação do serviço, numa hipótese de monopólio, ou é fixada pelo único agente econômico ou o Estado assume a competência para disciplinar o preço. Ocorre que a maioria dos serviços públicos configura monopólio natural, onde a exclusividade é imprescindível para que se obtenha a menor tarifa possível, cabendo, portanto, ao Estado essa fixação tarifária (tanto na determinação do valor original, quanto nas variações produzidas ao longo do tempo). No Brasil as telecomunicações são Monopólio Privativo da União. 1.2.5 A tarifa de assinatura básica na conta telefônica A Lei n.º 9.472/97 dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, a criação e funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais, nos termos da Emenda Constitucional n. 8, de 15 de agosto de 1995, e define em seu Art. 60: Art. 60 Serviço de Telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação. § 1º Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, 15 caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza. Os usuários dos serviços de telecomunicações têm a falsa impressão de que o terminal de linha telefônica, quando instalado em sua residência, passa a ser de sua propriedade. Na realidade isso não ocorre, tanto, que se ele deixa de pagar as contas telefônicas, as concessionárias estão autorizadas a efetuar o corte do fornecimento do serviço. Assim, para manter-se habilitado, e poder usufruir, de forma permanente, mês a mês, este usuário (também denominado assinante), passa a pagar uma tarifa pública: a tarifa de assinatura básica mensal. Conforme o Art. 103, § 3º da Lei n.º 9.472/97: Art. 103. Compete à Agência estabelecer a estrutura tarifária para cada modalidade de serviço. (...) § 3º As tarifas serão fixadas no contrato de concessão, consoante edital ou proposta apresentada na licitação. O serviço de telecomunicações brasileiro é cobrado através de tarifa mensal, pela empresa concessionária conforme os termos do contrato de concessão, tema do próximo capítulo. 16 CAPÍTULO 2 A EXPLORAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS 2.1 SERVIÇO PÚBLICO Assim como determinar um conceito para tarifa não é uma tarefa fácil, definir o serviço público também é um trabalho complicado, pois sua conceituação vem sofrendo consideráveis transformações no decorrer do tempo. 2.1.1 Conceitos Alguns autores adotam conceito amplo, enquanto outros preferem um conceito restrito. Exemplo de conceito amplo é o trazido por Masagão apud Di Pietro (2008, p.90), que levando em consideração os fins do Estado, considera como serviço público “toda atividade que o Estado exerce para cumprir os seus fins”. Nesse conceito ele está incluindo a atividade judiciária e administrativa, onde nesta o Estado decide sobre o seu próprio procedimento, ao passo que, naquela desempenha função de terceiro, ao gerenciar o procedimento das partes. Para ele a atividade legislativa é própria da Administração Pública. Amplo também é o exemplo de Cretella apud Di Pietro (2008, p.91), para quem serviço público é “toda atividade que o Estado exerce, direta ou indiretamente, para a satisfação das necessidades públicas mediante procedimento típico do direito público”. Quanto aos conceitos restritos dispõe Di Pietro (2008, p.91): Restritos são os conceitos que confinam o serviço público entre as atividades exercidas pela Administração Pública, 17 com exclusão das funções legislativa e jurisdicional; e, além disso, o consideram como uma das atividades administrativas, perfeitamente distinta do poder de polícia do Estado. Parte-se da distinção entre atividade jurídica e atividade social. Meirelles (2006, p.329) define serviço público como: (...) todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, ou simples conveniências do Estado. Para melhor compreensão dos conceitos de serviço público, é necessário apresentar a evolução que o mesmo vem sofrendo. 2.1.2 Elementos da definição Quando surgiram as primeiras noções de serviço público os autores adotavam três critérios para defini-lo: o elemento subjetivo, o elemento material e o elemento formal. O elemento subjetivo explica que o serviço público é sempre incumbência do Estado, conforme está expresso no artigo 175 da C.R.F.B./88, dependendo do Poder Público a sua criação (feita por lei e correspondente a uma opção do Estado) e a sua gestão (Estado pode fazê-lo diretamente por órgãos que compõe a Administração Pública, ou indiretamente por meio de concessão ou permissão). Quanto ao elemento subjetivo, Gasparini (2004, p.277) esclarece que: (...) o serviço público é um complexo de órgãos, agentes e recursos da Administração Pública, destinados à satisfação das necessidades dos administrados. Equivale, pois, a um 18 organismo ou parte do aparelho estatal com tal precípua finalidade. Em sentido material, também chamado de objetivo, “o serviço público é uma função, uma tarefa, uma atividade da Administração Pública, destinada a satisfazer necessidades de interesse geral dos administrados”, conforme conceitua Gasparini (2004, p.277). Em sentido formal, serviço público é a atividade desempenhada por alguém (Poder Público ou seus delegados), sob regras exorbitantes do Direito Comum, para a satisfação dos interesses dos administrados. É a submissão de certa atividade a um regime de Direito Público. Explica Justen Filho (2006, p. 491): A qualificação formal é logicamente dependente das outras duas. O serviço público se peculiariza pela existência de um regime jurídico específico. Mas a aplicação desse regime depende da presença de certos requisitos. Todo serviço público está sujeito ao regime de direito público, mas nem toda atividade (estatal ou privada) é um serviço público. Uma questão fundamental, portanto, reside em determinar quando e porque uma atividade pode (ou deve) ser considerada serviço público e, desse modo, submeter-se a um regime jurídico peculiar. Complementa ainda Di Pietro (2008, p. 95): Aplica-se também o direito público no que diz respeito às relações entre a entidade prestadora do serviço e a pessoa jurídica política que a instituiu. Vale dizer, o regime jurídico, nesse caso, é híbrido, podendo prevalecer o direito público ou o direito privado, dependendo do que dispuser a lei em 19 cada caso; nunca se aplicará, em sua inteireza, o direito comum tal qual aplicado às empresas privadas. Há certos requisitos necessários para uma atividade ser qualificada como serviço público e, desse modo, sujeitar-se ao regime jurídico correspondente. É o que se verá a seguir. 2.1.3 Requisitos do serviço público Os requisitos do serviço público ou, ainda, pode-se chamá-lo de serviço de utilidade pública, são essenciais para a sua regulamentação e controle. Faltando qualquer desses requisitos em um serviço público (ou de utilidade pública), é dever da Administração intervir para restabelecer seu regular funcionamento ou retomar sua prestação, onde pode, após o devido processo legal, aplicar as penas cabíveis quando o serviço for executado por concessionários ou permissionários. Quanto aos requisitos da regularidade e da continuidade, explica Gasparini (2004, p.285): A regularidade exige que os serviços sejam prestados conforme padrões de qualidade e quantidade impostos pela Administração Pública tendo em vista o número e as exigências dos usuários, observando-se, ainda as condições técnicas exigidas pela própria natureza do serviço público e as condições de sua prestação. A continuidade impõe ao serviço público o caráter de ser contínuo, sucessivo. Não caracteriza descontinuidade da prestação do serviço público quando interrompido em face de uma situação de emergência ou quando sua paralisação se der, após competente aviso, por motivo de ordem técnica ou de segurança das instalações, ou inda, por falta de pagamento dos usuários, conforme estabelece o § 3º do art. 6º da Lei Federal de Concessões e Permissões. 20 Há ainda os requisitos da eficiência, segurança e atualidade, conforme, segue o entendimento de Gasparini (2004, p.285): A eficiência exige bom resultado prático da prestação. Deve-se buscar o máximo de resultado com um mínimo de investimento, barateando a sua prestação e, por conseguinte, o custo para os usuários. O serviço público deve ser prestado aos usuários com segurança, tendo em vista a natureza do serviço. Nada deve ser menosprezado se puder, por qualquer modo, colocar em risco os usuários do serviço público ou terceiros ou, ainda, bens públicos e particulares. Não deve haver qualquer descuido ou omissão, por menor que seja, na execução dos serviços de manutenção dos equipamentos utilizados na prestação dos serviços públicos. As falhas devem ser imediatamente corrigidas, substituindo-se as peças impróprias ou promovendo a renovação do próprio equipamento. A atualidade significa que a prestação dos serviços públicos deve acompanhar as modernas técnicas de oferecimento aos usuários. E, ainda no mesmo norte, Gasparini (2004, p.285) completa seu entendimento quanto aos requisitos da generalidade, cortesia e modicidade: A generalidade significa que o oferecimento do serviço público deve ser igual para todos. Essa generalidade é decorrente do princípio da igualdade, tracejado no art. 5º da Constituição Federal. Pelo princípio da cortesia, obriga-se a Administração Pública a oferecer aos usuários de seus serviços um bom tratamento. 21 A modicidade impõe sejam os serviços públicos prestados mediante taxas ou tarifas justas, pagas pelos usuários para remunerar os benefícios recebidos e permitir o seu melhoramento e expansão. Assim, os serviços públicos não devem ser prestados com lucros ou prejuízos, mas mediante retribuição que viabilize esses interesses. Esses requisitos do serviço público são sintetizados, modernamente, em princípios que a Administração deve ter sempre presentes, para exigi-los de quem o preste. 2.1.4 Princípios do serviço público Na prestação dos serviços públicos pela Administração Pública, sua titular, ou por terceiros, seus concessionários ou permissionários, devem ser observados os princípios da continuidade, da mutabilidade e da igualdade. Justen Filho (2006, p.498) explica: A continuidade significa que a atividade de serviço público deverá desenvolver-se regularmente, sem interrupções. Dela derivam inúmeras conseqüências jurídicas, entre as quais a impossibilidade de suspensão dos serviços por parte da Administração ou do delegatário e a responsabilização civil do prestador do serviço em caso de falha. A continuidade do serviço público também justifica a utilização do poder de coação estatal para assegurar a supressão de obstáculos a tanto ou para produzir medidas necessárias a manter a atividade em funcionamento. Há uma contrapartida para a continuidade, que se traduz na intangibilidade da equação econômico-financeira para o delegatário do serviço público, e, para o usuário, o direito a ser indenizado por todos os prejuízos decorrentes da 22 descontinuidade da prestação do serviço em situação de normalidade. Quanto ao princípio da mutabilidade, Di Pietro (2008, p.100) nos ensina: O princípio da mutabilidade do regime jurídico ou da flexibilidade dos meios aos fins autoriza mudanças no regime da execução do serviço para adaptá-lo ao interesse público, que é sempre variável no tempo. Em decorrência disso, nem os servidores públicos, nem os usuários dos serviços públicos, nem os contratados pela Administração têm direito adquirido à manutenção de determinado regime jurídico; o estatuto dos funcionários pode ser alterado, os contratos também podem ser alterados ou mesmo rescindidos unilateralmente para atender ao interesse público. Acrescenta, ainda, Justen Filho (2006, p.499): A mutabilidade retrata a vinculação do serviço público à necessidade a ser satisfeita e às concepções técnicas de satisfação. É da essência do serviço público sua adaptação conforme a variação das necessidades e a alteração dos modos possíveis de solução. Há um dever para a Administração de atualizar a prestação do serviço, tomando em vista as modificações técnicas, jurídicas e econômicas supervenientes. Isso significa a ausência de direito adquirido dos prestadores do serviço e dos usuários à manutenção das condições anteriores ou originais. Conforme Di Pietro (2008, p.100), pelo princípio da igualdade dos usuários “perante o serviço público, desde que a pessoa satisfaça às condições legais, ela faz jus a prestação do serviço, sem qualquer distinção de caráter pessoal”. 23 Ainda sobre o princípio da igualdade, dispõe Justen (2006, p.498): A igualdade envolve o tratamento não discriminatório e universal para todos os usuários. Não se pode restringir o acesso aos benefícios do serviço público para os sujeitos que se encontrem em igualdade de condições. Nesse ponto, o intérprete se depara com a conhecida dificuldade inerente ao princípio da isonomia, relacionada ao problema de identificar os limites da igualdade. Todos esses princípios e requisitos acima citados observam o inciso IV do artigo 175 da C.R.F.B./88 que obriga a prestação de “serviço adequado”. 2.1.5 Classificação dos serviços públicos Pode-se levar em conta como critério de classificação dos serviços públicos, os seguintes elementos: a entidade a quem foram atribuídos, a essencialidade, os usuários, a obrigatoriedade da utilização e a execução. Quanto à entidade a quem foram atribuídos, são: federais, estaduais, distritais e municipais. Quanto à essencialidade, podem ser: essenciais e não essenciais. Dispõe Gasparini (2004, p. 282): São essenciais os assim considerados por lei ou os que pela própria natureza são tidos como de necessidade pública, e em princípio de execução privativa da Administração Pública. (...) 24 São não essenciais os assim considerados por lei ou os que, pela própria natureza, são havidos de utilidade pública, cuja execução é facultada aos particulares. Se preferir, são os que não são de execução privativa da Administração Pública, por exemplo, os serviços funerários. Quanto aos usuários, são gerais e específicos. Explica Gasparini (2004, p. 282): São gerais os que atendem a toda população administrada, sem objetivar utentes determinados; alguns os chamam de serviços indivisíveis. São dessa natureza os serviços de segurança pública e os de segurança nacional. Específicos são os que satisfazem os usuários certos, que os fruem individualmente, designados por alguns autores, de serviços divisíveis. Como exemplos temos os serviços de telefonia, postal e de distribuição domiciliar de água. Já em razão da obrigatoriedade da utilização, são compulsórios e facultativos, conforme o entendimento de Gasparini (2004, p. 282): Compulsórios são impingidos aos administrados, nas condições estabelecidas em lei, a exemplo dos serviços de coleta de lixo, de esgoto, de vacinação obrigatória, de internação de doentes portadores de doenças de caráter infecto-contagioso. Facultativos são os colocados à disposição dos usuários sem lhes impor a utilização, a exemplo do serviço de transporte coletivo. Os compulsórios, quando remunerados, o são por taxa, enquanto os facultativos o são por tarifa ou preço. O fornecimento dos compulsórios não pode ser interrompido, mesmo que não ocorra o oportuno pagamento, enquanto o fornecimento 25 dos serviços facultativos, ante a falta do pagamento correspondente, pode ser interrompido. Tomando-se por base a forma de execução, os serviços públicos são de execução direta e de execução indireta. Di Pietro (2008, p. 100), explica que: Serviços públicos próprios são aqueles que, atendendo a necessidades coletivas, o Estado assume como seus e os executa diretamente (por meio de seus agentes) ou indiretamente (por meio de concessionários e permissionários). E serviços públicos impróprios são os que, embora atendendo também a necessidades coletivas, como os anteriores, não são assumidos nem executados pelo Estado, seja direta ou indiretamente, mas apenas por ele autorizados, correspondem regulamentados a atividades e fiscalizados; privadas e eles recebem impropriamente o nome de serviços públicos, porque atendem a necessidades de interesse geral; vale dizer que, por serem atividades privadas, são exercidas por particulares, mas, por atenderem a necessidades coletivas, dependem de autorização do Poder Público, sendo por ele regulamentadas e fiscalizadas; ou seja, estão sujeitas a maior ingerência do poder de polícia do Estado. É sobre a prestação do serviço público indireto prestado pelas concessionárias através de seu contrato de concessão que tratará o próximo tópico. 2.2 CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO Para fins de sistematização da matéria faz-se necessária uma definição de concessão. 26 Para Masagão apud Di Pietro (2004, p. 273) “concessão é uma espécie, em cujas manifestações se verifica, sempre, a incumbência de um serviço público a uma pessoa de direito privado, que em seu nome os exerça”. Para Franco Sobrinho apud Di Pietro (2004, p.274) “toda concessão implica a transferência de poderes da Administração para o particular, com vistas à execução de serviço público”. No que diz respeito ao objeto da concessão, existem várias modalidades sujeitas a regime jurídico parcialmente diferenciado: concessão de serviço público, concessão patrocinada, concessão administrativa, concessão de obra pública e concessão de uso de bem público. Para o fim específico desta pesquisa é a concessão de serviço público que interessa pois é o tema objeto da mesma. 2.2.1 Conceitos e características da concessão de serviço público A concessão de serviço público é disciplinada pela Lei nº. 8.987/95 e foi a primeira forma que o poder público utilizou para transferir a terceiros a execução de serviço público. No entendimento de Di Pietro (2008, p.278): Concessão de serviço público é o contrato administrativo pelo qual a Administração Pública delega a outrem a execução de um serviço público, para que o execute em seu próprio nome, por sua conta e risco, assegurando-lhe a remuneração mediante tarifa paga pelo usuário ou outra forma de remuneração decorrente da exploração do serviço. Para Meirelles (2006, p.385): 27 Concessão é a delegação contratual da execução do serviço, na forma autorizada e regulamentada pelo Executivo. O contrato de concessão é ajuste de Direito Administrativo, bilateral, oneroso, cumulativo e realizado intuitu personae. Com isto se afirma que é um acordo administrativo (e não um ato unilateral da Administração), com vantagens e encargos recíprocos, no qual se fixam as condições de prestação do serviço, levando-se em consideração o interesse coletivo na sua obtenção e as condições pessoais de quem se propõe a executá-lo por delegação do poder concedente. Sendo um contrato administrativo, como é, fica sujeito a todas as imposições da Administração necessárias à formalização do ajuste, dentre as quais a autorização governamental, a regulamentação e a licitação (itálico no original). O instituto da concessão apresenta características inconfundíveis, assim expostos por Cretella (2002, p. 389): (...) a) a existência de relação administrativa entre a pessoa jurídica de direito público – a Administração - e a pessoa jurídica de direito privado – o administrado -, pela qual a primeira (a concedente) incumbe a segunda pessoa (a concessionária) da gestão de um serviço público; b) a incumbência não é genérica, mas específica (intuitu personae), pois o poder público leva em conta a idoneidade da pessoa a quem transfere as atividades; c)a incumbência é feita por tempo determinado; d) o serviço público é exercido pelo concessionário, no próprio nome; e) a Administração não delega ao concessionário poderes públicos, mas o direito ao exercício desses poderes, o que lhe possibilita tomar uma série de medidas necessárias ao desempenho integral da incumbência; f) os riscos advindos da exploração do serviço público concedido, cabem, tão- 28 só, ao concessionário; g)o concessionário, ao invés de receber do Estado, recebe dos usuários, em decorrência da utilização efetiva do serviço público, as respectivas tarifas, em vigor durante o prazo da concessão e inalteráveis unilateralmente, pela empresa concessionária. Pela concessão o Estado (poder concedente) não transfere propriedade alguma ao concedente. Ele apenas delega a execução de serviço, conforme as condições legais ou contratuais estabelecidas, estando sempre sujeita a regulamentação e fiscalização do concedente. 2.2.2 Regulamentação A regulamentação dos serviços concedidos compete ao Poder Público, por determinação constitucional, conforme o art. 175, parágrafo único, que dispõe: Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II- os direitos dos usuários; III – política tarifária; IV – a obrigação de manter o serviço adequado. 29 Quanto à determinação legal, o art. 29, I, da Lei 8.987/95 determina que: Art. 29. Incumbe ao poder concedente: I - regulamentar o serviço concedido e fiscalizar permanentemente a sua prestação; Meirelles (2006, p.389) afirma que: Toda concessão, portanto, fica submetida a duas categorias de normas: as de natureza regulamentar e as de ordem contratual. As primeiras disciplinam o modo e a forma de prestação do serviço; as segundas fixam as condições de remuneração do concessionário; por isso, aquelas são denominadas leis do serviço, e estas, cláusulas econômicas ou financeiras. Como as leis, aquelas são alteráveis unilateralmente pelo Poder Público segundo as exigências da comunidade; como cláusulas contratuais, estas são fixas, só podendo ser modificadas por acordo entre as partes (itálico no original). O Poder Público possui a faculdade de, nos poderes de regulamentação e controle, modificar a qualquer tempo o funcionamento do serviço concedido, desde que vise à sua melhoria e aperfeiçoamento técnico, ou, ainda, de aplicar penalidades para que a concessionária execute o serviço que lhe foi designado, em condições satisfatórias. 2.2.3 Licitação Necessária se faz a inclusão de um conceito de licitação. No entendimento de Mello (2005, p.493): 30 Licitação é um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Estriba-se na idéia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir (itálico no original). A concessão deve ser feita sempre através de licitação, conforme o art. 175 da C.R.F.B./88. A modalidade cabível é a concorrência, segundo dispõe o art. 2º, II da Lei 8.987/95: Art. 2o Para os fins do disposto nesta Lei, considera-se: (...) II - concessão de serviço público: a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado; Porém, este dispositivo não contém a ressalva do art. 37, XXI, da Constituição, que permite contratação direta nas hipóteses previstas em lei, conforme determina o artigo: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 31 (...) XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, os serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações; Assim, não se aplicam às licitações para concessão de serviço público os casos de dispensa de licitação previstos na Lei n. º 8.666/93 que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Admite-se a declaração de inexigibilidade desde que se demonstre a inviabilidade de competição. 2.2.4 Contrato de concessão de serviço público Quanto ao contrato de concessão, Meirelles (2006, p. 392), assim o define: O contrato de concessão é o documento escrito que encerra a delegação do poder concedente, define o objeto da concessão, delimita a área, forma e tempo da exploração, estabelece os direitos e deveres das partes e dos usuários do serviço. No dizer de Cretella (2002, p. 242) “a natureza jurídica da concessão de serviço público é a de um contrato de direito público, oneroso, sinalagmático, perfeito, comutativo, realizado ‘intuitu personae’ e do tipo dos contratos de adesão”. 32 E decompondo o conceito, Cretella (2002, p.242) explica: Contrato, porque há livre acordo de vontade entre o Estado e o concessionário. De direito público, porque os princípios que informam esse acordo são princípios publicísticos, o que revela, entre as cláusulas, a existência das denominadas ‘cláusulas obrigatórias’, ou ‘cláusulas exorbitantes’ do direito comum (direito civil). Oneroso, porque o concessionário, que presta o serviço público, tem o direito de receber, em contrapartida, quantias em dinheiro, por parte dos usuários (tarifas), ao contrário do comodatário, que celebra contrato gratuito. Explica, ainda, Cretella (2002, p.242): Sinalagmático, porque gera obrigações para ambos os contratantes, Estado e concessionário. Perfeito, porque as partes se obrigam, reciprocamente, desde o início do contrato: o Estado, em várias cláusulas, promete atender ao concessionário; este, por sua vez, promete gerir o serviço público. Comutativo: as prestações de ambas as partes são eqüipolentes e equivalentes. Intuitu personae, porque a Administração indaga da idoneidade moral e financeira do concessionário. Adesão, porque o concessionário adere ‘em bloco’, às cláusulas estipuladas pelo Estado, sem discuti-las. Quanto às cláusulas essenciais do contrato de concessão, a Lei 8.987/95 as contemplou em seu art. 23: Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: I - ao objeto, à área e ao prazo da concessão; 33 II - ao modo, forma e condições de prestação do serviço; III - aos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade do serviço; IV - ao preço do serviço e aos critérios e procedimentos para o reajuste e a revisão das tarifas; V - aos direitos, garantias e obrigações do poder concedente e da concessionária, inclusive os relacionados às previsíveis necessidades de futura alteração e expansão do serviço e conseqüente modernização, aperfeiçoamento e ampliação dos equipamentos e das instalações; VI - aos direitos e deveres dos usuários para obtenção e utilização do serviço; VII - à forma de fiscalização das instalações, dos equipamentos, dos métodos e práticas de execução do serviço, bem como a indicação dos órgãos competentes para exercê-la; VIII - às penalidades contratuais e administrativas a que se sujeita a concessionária e sua forma de aplicação; IX - aos casos de extinção da concessão; X - aos bens reversíveis; XI - aos critérios para o cálculo e a forma de pagamento das indenizações devidas à concessionária, quando for o caso; XII - às condições para prorrogação do contrato; 34 XIII - à obrigatoriedade, forma e periodicidade da prestação de contas da concessionária ao poder concedente; XIV - à exigência da publicação de demonstrações financeiras periódicas da concessionária; e XV - ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais. Parágrafo único. Os contratos relativos à concessão de serviço público precedido da execução de obra pública deverão, adicionalmente: I - estipular os cronogramas físico-financeiros de execução das obras vinculadas à concessão; e II - exigir garantia do fiel cumprimento, pela concessionária, das obrigações relativas às obras vinculadas à concessão. O contrato de concessão, como os demais contratos administrativos, pode ser alterado unilateralmente pela Administração. Mas essa alteração restringe-se às cláusulas regulamentares ou de serviço, sempre para melhor atendimento do público. Além disso, toda vez que ao modificar o contrato o concedente alterar o equilíbrio econômico e financeiro, terá que reajustar as cláusulas remuneratórias da concessão, adequando as tarifas aos novos encargos acarretados ao concessionário, conforme o art. 9º, § 4º da lei 8.987/95 citado anteriormente. Assim, conclui Meirelles (2006, p. 394): Inegável é, portanto, que o contrato de concessão cria direitos e obrigações individuais para as partes. Dentre os direitos encontra-se o de o concessionário auferir as vantagens de ordem pecuniária que o contrato lhe 35 garantiu. Satisfeitas as condições contratuais pelo concessionário, a rentabilidade assegurada à empresa erige-se em direito adquirido, exigível do concedente na forma avençada. Qualquer modificação unilateral, posterior, da norma legal ou regulamentar ou de cláusula contratual pertinente ao serviço não invalida as vantagens contratuais asseguradas ao concessionário, porque tais modificações não podem ter efeito retroativo prejudicial ao direito adquirido, preservado por disposição constitucional (art. 5º, XXXVI). Em se tratando de concessões o termo de contrato é obrigatório, mesmo porque não há cabimento em notas de empenho ou documentos similares. 2.2.5 Fiscalização e intervenção na concessão A fiscalização do serviço concedido cabe ao Poder Público concedente. Segundo a doutrina de Meirelles (2006, p. 394), o Poder Público concedente “é o fiador de sua regularidade e boa execução perante os usuários”. Os serviços públicos, ou, os serviços de utilidade pública são sempre serviços para o público. Assim, Meirelles (2006, p.394) explica que “é dever do concedente exigir sua prestação em caráter geral, permanente, regular, eficiente e com tarifas módicas” (itálico no original). Essa prestação de serviço público deve atender ao respectivo regulamento e às cláusulas contratuais específicas, buscando a satisfação dos seus usuários, obedecendo, ainda, os princípios da generalidade (serviço deve ser prestado para todos os usuários); da permanência ou continuidade (impõe serviço sem interrupções na área e 36 período da sua prestação); da eficiência (prestação de serviço satisfatório em qualidade e quantidade); da modicidade (preços razoáveis ao alcance dos usuários); e da cortesia (concessionária deve oferecer um bom tratamento ao público). Ainda, no entendimento de Meirelles (2006, p. 394-395): Para assegurar os requisitos, indispensáveis em todo serviço concedido, reconhece-se à Administração Pública o direito de fiscalizar as empresas, com amplos poderes de verificação de sua administração, contabilidade, recursos técnicos, econômicos e financeiros, principalmente para conhecer a rentabilidade do serviço, fixar as tarifas justas e punir as infrações regulamentares contratuais. Sobre a fiscalização determina o art. 30, parágrafo único, da Lei 8.987/95: Art. 30. No exercício da fiscalização, o poder concedente terá acesso aos dados relativos à administração, contabilidade, recursos técnicos, econômicos e financeiros da concessionária. Parágrafo único. A fiscalização do serviço será feita por intermédio de órgão técnico do poder concedente ou por entidade com ele conveniada, e, periodicamente, conforme previsto em norma regulamentar, por comissão composta de representantes do poder concedente, da concessionária e dos usuários. Ainda, no poder de fiscalizar, está implícito o poder de intervir para regularizar o serviço se este estiver sendo prestado inadequadamente aos usuários ou em casos de paralisação, conforme determina o art. 29, III da Lei 8.987/95. 37 Este ato de intervenção deve ser expedido pelo poder concedente (Estado) e deve indicar os motivos da medida e o prazo de sua duração (art. 32, caput da Lei 8.987/95). A intervenção deve ser provisória, visto que, se definitiva, importaria encampação do serviço (retomada coativa) ou rescisão do contrato. No intuito de fiscalizar o bom andamento das concessões de serviço público, foram criadas as Agências Reguladoras, tema do próximo capítulo. 38 CAPÍTULO 3 AGÊNCIAS REGULADORAS 3.1 AGÊNCIAS REGULADORAS Em sentido amplo, no direito brasileiro, agência reguladora pode ser qualquer órgão da Administração Direta ou entidade da Administração Indireta com função de regular matéria específica. 3.1.1 Conceitos e características As agências reguladoras, no Brasil, foram constituídas como autarquias de regime especial integrantes da administração indireta, vinculadas ao Ministério competente para tratar da respectiva atividade. Conforme entendimento de Moraes A. (2002, p.24) isso ocorreu, “apesar de caracterizadas pela independência administrativa, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo e estabilidade; ausência de possibilidade de demissão ad nutum de seus dirigentes e autonomia financeira”. No entendimento de Di Pietro (2008, p. 446): As atribuições das agências reguladoras, no que diz respeito à concessão, permissão e autorização de serviço público resumem-se ou deveriam resumir-se às funções que o poder concedente exerce nesses tipos de contratos ou atos de delegação: regular os serviços que constituem objeto da delegação, realizar o procedimento licitatório para escolha do concessionário, autorizatário, celebrar permissionário ou o contrato de concessão ou permissão ou praticar ato unilateral de outorga da autorização, definir o valor da tarifa e da sua revisão ou reajuste, controlar a execução dos serviços, aplicar 39 sanções, encampar, decretar a caducidade, intervir, fazer a rescisão amigável, fazer a reversão de bens ao término da concessão, exercer o papel de ouvidor de denúncias ou reclamações dos usuários, enfim, exercer todas as prerrogativas que a lei outorga ao Poder Público na concessão, permissão e autorização. Isto significa que a lei ao criar a agência reguladora, está tirando do Poder Executivo todas essas atribuições para colocá-las nas mãos da agência. Para Justen Filho (2006, p. 475), “Agência Reguladora independente é uma autarquia especial, sujeita a regime jurídico que assegure sua autonomia em face da Administração direta e investida de competência pra regulação setorial. Já para Menezello (2002, p. 65): (...) a missão das agências é regular, normatizar, controlar e fiscalizar as atividades desenvolvidas por particulares, tendo em vista o interesse público. Com isto, podemos deduzir que as competências atribuídas às agências são apenas aquelas constantes da legislação, porque “inexiste poder para a Administração Pública” que não seja concedido pela lei: o que ela não concede expressamente, nega-lhe implicitamente. É o artigo 37, inciso XIX da C.R.F.B./88, que determina que somente por lei específica poderá ser criada autarquia, estando lá exposto que: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 40 (...) XIX – somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação; As agências reguladoras têm como função a regulação das matérias de sua área de atuação e a missão de fiscalizar a eficiência da prestação de serviços públicos pelos concessionários, permissionários e autorizados. Apesar de fazer parte da Administração Pública indireta, as agências reguladoras tem maior independência (funcional e financeira) em relação ao Poder Executivo. Ao tratar sobre o assunto, Moraes A. (2002, p. 25) discorre que: A independência funcional e financeira das Agências Reguladoras é consagrada pela presença dos seguintes preceitos obrigatórios em suas leis de criação: independência financeira; escolha dos instrumentos de regulação; e modo de nomeação de seus dirigentes. A independência financeira deverá ser assegurada pela disponibilidade de recursos humanos e infra-estrutura material fixadas em lei, além da previsão de dotações consignadas no orçamento geral da União, créditos especiais, transferências e repasses que lhe forem conferidos. Ainda sobre o assunto, Moraes A. (2002, p.26), esclarece: Em relação ao modo de nomeação de seus dirigentes, as leis instituidoras das Agências Reguladoras devem prever mandato certo e impossibilidade de demissão ad nutum 41 pelo Chefe do Poder Executivo. A escolha dos dirigentes das Agências Regulatórias pelo Presidente da República também deveria ser feita com base em critérios capacitários previstos em lei, a fim de diminuir a ingerência política das nomeações. A previsão de mandato certo também parece garantia de independência e será mais completa se sua duração não coincidir com a duração do mandato presidencial Ainda em relação ao mandato dos dirigentes das agências reguladoras é importante a previsão de “quarentena”, impossibilitando os dirigentes de assumir cargos em empresas com as quais a agência reguladora mantinha relação de fiscalização. Esse período de 40 dias é contado da exoneração ou do término do seu mandato (conforme o artigo 8º da Lei n.º 9.986/2000 que dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências Reguladoras e dá outras providências). No Brasil, as agências reguladoras, como a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), vêm sendo criadas como autarquias de regime especial, cujas leis estabelecem que seus dirigentes tenham mandatos fixos, e com definitividade de suas decisões em seu âmbito, em relação a outros órgãos ou entidades da Administração, em princípio. O Poder Executivo, autor dos projetos de criação das agências, optou, no nível federal, por agências reguladoras especializadas (baseadas no princípio da especialidade onde cada qual exerce e é especializada na matéria que lhe foi atribuída por lei) em determinado setor da economia, como, por exemplo, setores de telecomunicações, energia elétrica e petróleo. 42 Assim, afirma Gasparini (2004, p. 373) que “por serem criadas por lei, como autarquias de regime especial recebem privilégios que a lei lhes outorga, indispensáveis ao atingimento de seus fins”. Neste sentido, Menezello (2002, p. 66) expõe: (...) a especialidade de cada agência está traçada na lei que a cria e decorre das previsões legais e especiais que a adornam. Não se podem estender os mesmos elementos encontrados em relação a uma entidade para a (s) outra (s), pois isto consistiria inclusive em agressão, desconsideração da própria noção de especialidade. Assim, haverá graus diferentes de especialidade para cada autarquia a que se confere natureza especial. Dessa maneira, se confirma o estrito dever do princípio da legalidade, porque sem ele não há possibilidade de atuar conforme o Direito. 3.1.2 Controle das Agências Reguladoras O controle das agências pelos poderes constituídos do Estado confirma a necessidade de manutenção do binômio centralização governamental e descentralização administrativa. Apesar de sua independência, as agências reguladoras devem sofrer o controle dos poderes constituídos para manutenção da centralização governamental. Conforme explica Moraes A. (2002, p. 29): O Poder Executivo, além de permanecer com a iniciativa de lei para criar, alterar e extinguir, mantém a coordenação geral da Administração Pública, indicando no projeto de lei quais as funções e finalidades da 43 respectiva agência. Mantém ainda a possibilidade de fiscalização por meio de contrato de gestão e a indicação dos dirigentes da agência. Já o desrespeito ao Poder Legislativo pode acarretar sustação dos atos normativos, com base no art. 49, V da C.R.F.B./88. Art. 49 - É da Competência exclusiva do Congresso Nacional: (...) V - sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; No entendimento de Moraes A. (2002, p. 29): O art. 49, V, da Constituição Federal, tradicionalmente utilizado para as leis delegadas, deverá, a partir da incorporação das Agências Reguladoras em nosso ordenamento jurídico, servir de mecanismo de controle legislativo ao eventual exagero das Agências no exercício de seu poder normativo, pois a Carta Magna fala em controle dos “limites de delegação legislativa”. Trata-se da possibilidade de controle da descentralização administrativa pela centralização governamental. Além disso, o Congresso Nacional permanece com o poder de delegar ou não, fixando os parâmetros básicos, pois elabora a lei de criação da agência e poderá controlar as agências com base no art. 49, X, da Constituição Federal. Ainda, tem-se que ressaltar a possibilidade de o Tribunal de Contas fiscalizar a gerência do dinheiro público por parte das agências reguladoras. 44 Quanto ao Poder Judiciário, pode-se afirmar que a instituição de agências reguladoras não interferiu na possibilidade de controle judicial da Administração Pública. 3.1.3 Autonomia das Agências Reguladoras No que se refere ao conceito de autonomia ou independência, pode-se descartar o termo independência, pois, segundo Menezello (2002, p. 84), esse termo “é inadequado para as agências brasileiras, uma vez que elas estão, por força de lei, vinculadas a algum Ministério”. Com isso, as agências devem atender a todas as exigências legais no que se refere à área de recursos humanos de seus servidores, inclusive aos assuntos que foram unificados pela aplicação da Lei Federal 9.986/2000 que dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências Reguladoras e dá outras providências. Por possuir personalidade jurídica própria, a autarquia (agência reguladora) pode contratar e administrar em seu próprio nome, contrair obrigações e adquirir direitos, mas dentro das regras do ordenamento vigente, destacando-se que, como é um órgão do Estado e não de um governo, como tal, a agência deve exercer suas atribuições e competências. A autonomia financeira configura-se na possibilidade legal de constituir-se em receita da agência a cobrança, dos agentes econômicos regulados, de taxa de fiscalização durante a execução do contrato de concessão ou de parcela das participações governamentais nas atividades petrolíferas. Sendo o regime jurídico autárquico de direito público, os bens da agência são considerados, para efeitos legais, bens públicos. 45 A autonomia técnica decorre da especialização e da singularidade de cada um dos setores da economia que serão regulados pelas agências. Conforme discorre Moraes A. (2002, p. 55), “o poder normativo das agências reguladoras não abrange o poder de regulamentar leis e, especialmente não pode inovar na ordem jurídica ou contrariá-la” (itálico no original). Ainda sobre o assunto esclarece o mesmo autor que: (...) suas normatizações deverão ser operacionais apenas, regras que, às vezes aparentemente autônomas, prendemse a disposições legais efetivamente existentes. É o caso, por exemplo, das regras estabelecidas para licitações nos Editais (que não podem contrariar normas da lei n.º 8.666/93), das condições exigíveis para concessões/permissões de serviço público e os aspectos que costumam ser englobados na chamada autonomia técnica da agência reguladora ou discricionariedade técnica, para definir as regras e os parâmetros técnicos referentes a essas atividades. Mesmo assim, a definição de regras operacionais e tecnicamente discricionárias não pode contrariar normas legais e inovar na ordem jurídica (devem observar os parâmetros legais). 3.2 ANATEL A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) foi criada pela Lei n.º 9.472/97, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, a criação e funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais, nos termos da Emenda Constitucional nº. 8, de 1995, e possui sua sede estabelecida no Distrito Federal. 46 Para melhor compreensão desta agência, tem-se a seguir suas principais características e atribuições como órgão regulador e fiscalizador do setor de telecomunicações no Brasil. 3.2.1 Natureza jurídica da Anatel Conforme o art. 8º, da Lei 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações - LGT), o órgão regulador do serviço de telecomunicações constitui-se numa entidade da Administração Pública. Explica Moraes A. (2002, p. 85): A Agência Nacional de Telecomunicações configura-se em uma autarquia especial, vinculada ao Ministério das Comunicações. Portanto, trata-se de pessoa jurídica de direito público de âmbito federal, autônoma (embora sujeita ao controle estatal), criada por lei e com o objetivo de praticar de forma especializada, determinada função pública. Detém patrimônio, receitas e atribuições próprias, diferenciando-se da entidade da Administração Direta que a criou. A Anatel tem a possibilidade de estabelecer objetivos e prerrogativas adequados ao exercício das operações realizadas pelas concessionárias no setor de telecomunicações, por possuir independência decisória, conforme dispõe o art. 9º da LGT (Lei 9.472/97): Art. 9° A Agência atuará como autoridade administrativa independente, assegurando-se-lhe, nos termos desta Lei, as prerrogativas necessárias ao exercício adequado de sua competência. Quanto à organização, a Agência possui como órgão máximo o Conselho Diretor, que é composto por cinco conselheiros, com mandatos de cinco anos e seu Presidente é nomeado diretamente pelo 47 Presidente da República. Possui, ainda, um Conselho Consultivo, uma Procuradoria, uma Corregedoria, uma Biblioteca e uma Ouvidoria. Sua principal competência é a implementação da política nacional de telecomunicações. Moraes A. (2002, p. 87), discorre, ainda sobre outras atribuições consideradas de suma importância: a) expedir regras quanto a outorga, contratos de concessão, fiscalização, bem como editar atos de outorga e extinção de direitos de exploração do serviço, aplicando sanções e intervenções; b) fixar, controlar e acompanhar tarifas dos serviços prestados nos regimes público e privado; c) deliberar na esfera administrativa quanto à interpretação da legislação de telecomunicações e sobre os casos omissos, compondo conflito de interesses entre prestadoras de serviços e reprimindo infrações a direitos dos usuários; d) exercer, relativamente competências legais às em telecomunicações, matéria de as controle, prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, ressalvadas as pertencentes ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Também, à Agência compete a adoção de determinadas medidas para o atendimento do interesse público, bem como para o desenvolvimento tecnológico telecomunicações do país, sempre atuando com e das independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade. 3.2.2 Independência da Anatel social 48 Quanto à independência efetiva da Anatel, pode-se afirmar que ela é muito importante, pois permite que sejam atingidas a credibilidade e a eficiência das políticas regulatórias. Afirma Moraes A. (2002, p. 87) que “a introdução da concorrência e o cumprimento das metas de universalização dos serviços só ocorrerão, de fato, com a presença de uma agência que detenha força e independência suficientes para implementar essas políticas regulatórias”. É necessário definir-se previamente um organismo regulador, com a fixação das competências de fiscalização e controle das atividades dos agentes do setor de telecomunicações. Nesse sentido, leciona Moraes A. (2002, p. 88): A execução do modelo regulatório aprovado, bem como a aplicação das penalidades aos agentes mostram-se necessárias para garantir a credibilidade do mercado nacional de telecomunicações aos investimentos nacionais e internacionais. Nesse sentido, a natureza autárquica da Anatel, prevista na Lei Geral de Telecomunicações, atribuilhe certa independência em relação às sazonalidades políticas (alterações repentinas das regras do setor, em razão de interesses políticos) do país. Tal fato consolida a legitimidade da Agência em face da força econômica dos competidores globais do mercado de telecomunicações. Apresenta-se a seguir como ocorre a regulação da competição no setor de telecomunicações. 3.2.3 Anatel: regulação da concorrência O quadro regulatório adotado pela LGT, procurou estabelecer meios de proteção para evitar a prática de ações anticompetitivas pelas empresas de telecomunicações. A LGT permitiu aplicação da Lei de Defesa da Concorrência (Lei n.º 8.884/94), o que 49 trouxe ao setor a atuação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) buscando limitar os atos dessas empresas. Assim, segue o Art. 54 da Lei n.º 8.884/90: Art. 54. Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços, deverão ser submetidos à apreciação do Cade. Ainda, visando definitivamente consolidar a proteção do usuário diante do poder econômico das empresas de telecomunicações, a Anatel estabeleceu, através da Resolução n.º 85, de 30-12/98, normas que garantissem aos usuários o direito a ter um serviço básico de telefonia prestado de forma contínua e sem interrupções, observando que estará dentro da lei uma possível suspensão (parcial ou total) dos serviços nos casos, conforme Moraes A. (2002, p. 92), “de inadimplência, rescisão do contrato, contestação do débito pelo usuário e formas e prazo para cobrança das tarifas telefônicas”. Ainda, seguindo este raciocínio, Moraes A. (2002, p.92) entende que: (...) a interpretação desse rol normativo necessariamente deve-se voltar para a manutenção do equilíbrio na relação operadoras e usuários, a fim de garantir tanto a execução do instrumento contratual firmado entre esses dois agentes, quanto a presença de empresas capazes de fornecer equipamentos e serviços de qualidade, com uma política tarifária condizente com a realidade do país. E é a respeito desta política tarifária, que já foi definida e explicada anteriormente, desde seu objetivo (remuneração à empresa 50 concessionária pela prestação do serviço público), até a regulação dessas empresas pelas autarquias especiais, que trata o próximo e último capítulo, onde se busca compreender a legalidade da cobrança dessa tarifa. 51 CAPÍTULO 4 A LEGALIDADE DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA 4.1 ORIGEM Com as mudanças constitucionais nos artigos que previam o monopólio da União na exploração dos serviços de telecomunicações (CF, art. 21, XI e XII), houve a possibilidade de participação de capital privado em empresas que antes estavam sob o controle estatal. O texto constitucional não determinou uma retirada completa do Estado de tais atividades, apenas permitiu, também, que empresas privadas participem da exploração dos serviços, mediante contrato de concessão, e, com isso, criou uma lei para regular tais serviços e um órgão regulador próprio para a área (Anatel). É o que se viu nos capítulos anteriores. Com base nisso, pode-se entrar no tema central deste trabalho de pesquisa, qual seja: a legalidade da cobrança da tarifa de assinatura básica nas contas telefônicas. Para tanto, inicia-se apresentando breve histórico sobre o sistema de telecomunicações brasileiro. 4.1.1 O início do cenário brasileiro nas telecomunicações O primeiro quadro regulamentar específico ao setor de telecomunicações no Brasil foi implementado pelo Código Brasileiro de Telecomunicações, consubstanciado pela Lei 4.117, de 27 de agosto de 1962. 52 Esse quadro passou a surtir efeito no setor e em 1965 a Embratel – Empresa Brasileira de Telecomunicações S/A - lançou-se ao mercado nacional de telecomunicações com a missão de interligar todas as capitais e as principais cidades do país e explorar os serviços internacionais. Apresenta Moraes A. (2002, p. 62) que: Em razão das dificuldades de expansão do setor em nível nacional (chamadas locais e interurbanos), criou-se o sistema Telebrás, a partir da Lei n.º 5.792, de 11 de julho de 1972. A referida estrutura era composta pela holding Telebrás3; (...) Num primeiro momento o Sistema Telebrás apresentou notáveis resultados. A planta instalada de terminais telefônicos, num período de 20 anos após sua criação, cresceu mais de 500%. Esse fato colocou o país entre os detentores das maiores redes telefônicas de todo o mundo. Entretanto, também houve significativo aumento no tráfego telefônico. Conforme dados do Ministério das Comunicações, a demanda pelos serviços de telecomunicações, no mesmo período, aumentou cerca de 1.200% no serviço local e mais de 1.800% no serviço interurbano, demonstrando a incapacidade do sistema em suprir toda essa necessidade. Essa situação mostra a incapacidade de manutenção, pelas empresas do Sistema Telebrás, de investimentos necessários ao longo do tempo. Tal fato, deu-se, principalmente pelo tratamento inadequado dado à questão tarifária, em que as tarifas eram estabelecidas 3 Telebrás: Telecomunicações Brasileiras S.A. 53 segundo critérios totalmente dissociados dos custos dos serviços correspondentes. Nesse sentido, pode-se observar, desde já, que a cobrança da tarifa sempre foi imprescindível para a manutenção do sistema de telefonia, que, trata-se de um serviço essencial e estratégico, como, aliás, os demais serviços de interesse público. 4.1.2 A privatização Com o aumento da demanda dos serviços de telecomunicações no Brasil, a prestação dos serviços públicos tornou-se inadequada e insuficiente, tanto pelo próprio Estado, bem como, pelas empresas estatais. Assim, a Emenda Constitucional nº 8, de 1995, proposta pelo Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, flexibilizou o monopólio estatal na exploração dos serviços públicos de telecomunicações, previsto no art. 21, incisos XI e XII, a, da CF/88. Moraes A. (2002, p. 66) explica que: Justificou-se a proposta pelo fato de o Estado, diante de uma década de importantes avanços em telecomunicações, não ter conseguido suprimir a grande demanda pelos serviços do setor. Exaurido em sua capacidade de financiamento, principalmente diante das novas tecnologias e da crescente demanda de serviços por elas geradas, o Estado não tem condições de arcar sozinho com todas as necessidades de investimento. Por esse motivo a Emenda trouxe a abertura de espaço para a parceria com a iniciativa privada, o que permite a entrada de capital privado nas atividades de telecomunicações do país, mantendo, entretanto, o regime de concessão, 54 permissão e autorização da União, de modo a garantir o controle do Estado sobre o sistema de telecomunicações, por meio de um órgão regulador (...). Ainda, no mesmo entendimento de Moraes A. (2002, p. 68): (...) a privatização foi precedida da montagem de um detalhado modelo institucional, em que se criou um órgão regulador independente e com grande autonomia, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Outro marco é o fato de a reestruturação das telecomunicações no Brasil ter sido precedida por modelos adotados em outros países, como os EUA e a Comunidade Européia, o que trouxe à formulação do sistema nacional vasta experiência e significativo aprendizado. Afirma, ainda, Moraes A. (2002, p.67) que: Assemelhado ao modelo europeu, em que os serviços são prestados pelo próprio Estado ou por empresas estatais, o setor de telecomunicações no Brasil, sob a nova concepção implantada pelo processo de privatização, passa a identificar-se com o modelo norte-americano, qual seja, serviços realizados por empresas privadas submetidas a algum tipo de controle por parte do Estado. Com a privatização, fez-se necessária a implementação da cobrança de uma tarifa adequada por parte das concessionárias dos serviços de telecomunicações. 4.2 A LEGALIDADE DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA NA CONTA TELEFÔNICA 4.2.1 O Princípio da legalidade 55 Faz-se necessária uma explanação sobre a definição deste princípio da administração pública. O referido princípio está previsto na C.R.F.B./88, em seu artigo 37, caput, que assim dispõe: Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...). Meirelles (2006, p.87) define o princípio da legalidade: (...) significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. Ainda, sobre o mesmo princípio, Di Pietro (2008, p.62) expõe que: Este princípio, juntamente com o de controle da Administração pelo Poder Judiciário, nasceu com o Estado de Direito e constitui uma das principais garantias de respeito aos direitos individuais. Isto porque a lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece também os limites da atuação administrativa que tenha por objeto a restrição ao exercício de tais direitos em benefício da coletividade. É aqui que melhor se enquadra aquela idéia de que, na relação administrativa, a vontade Pública é a que decorre da lei. da Administração 56 Além de disposto no artigo 37, caput, da C.R.F.B./88, esse postulado está previsto no artigo 5º, inciso II, também da Constituição: Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I – (...) II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Em decorrência disso, Di Pietro (2008, p.63) afirma que “a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto, ela depende de lei”. As teorias criadas para fundamentar as supostas ilegalidade e abusividade da cobrança da tarifa não se sustentam quando analisadas à luz da legislação vigente e do sistema telefônico implementados no Brasil. 4.2.2 A existência de legislação específica As alegações de ilegalidade da cobrança da tarifa aparecem sempre fundamentadas na inexistência de legislação específica que autorizaria a cobrança mensal e em uma verdadeira confusão sobre os conceitos de "taxa" e "tarifa", ocasionada, na maioria das vezes, pelo profundo desconhecimento da matéria, dos princípios de direito tributário e de direito administrativo. Esta diferença entre taxa e tarifa, entretanto, já foi abordada no primeiro capítulo. 57 Ao contrário do exposto nas ações que requerem a ilegalidade da cobrança, a tarifa de assinatura é expressamente prevista na legislação concernente às telecomunicações; na regulamentação da ANATEL; no Contrato de Concessão; e no Contrato de Prestação de Serviços celebrado entre as operadoras de telefonia fixa e cada um de seus usuários. Essa previsão também já foi exposta explicada nos capítulos anteriores. Beneti4 (2004) em seu artigo afirma: (...) a cobrança da Tarifa de Assinatura durante toda a prestação do serviço é objeto do Contrato de Prestação de Serviço Telefônico Fixo Comutado. Nesse sentido, tomese como exemplo o Plano Básico de Serviços constante do Contrato firmado entre a TELESP e seus usuários e no Plano Básico de Serviços, que assim estabelece: (..) Tarifa de Assinatura: É o valor de trato sucessivo pago pelo Assinante à Prestadora durante toda a prestação do serviço, nos termos do contrato de prestação de serviço, dando-lhe direito à fruição contínua do serviço. Portanto, a tarifa de assinatura mensal, é, sim, legal, regulamentar e contratualmente prevista. 4.2.3 A efetiva prestação do serviço Os argumentos de inexistência de prestação de serviço pelas concessionárias também não se sustentam. 4 BENETI,Ana Carolina Aguiar. (2004). A legalidade da tarifa de assinatura. (Teleco, 15/11/2004). Consultado em 30-09-2008. No site Teleco Informações em Telecomunicações. Website: http://www.teleco.com.br/emdebate/anac01.asp 58 Benetti (2004) discorre: Na relação usuário-operadora, existe a prestação de serviço pela empresa de telefonia. O pagamento da tarifa mensal de assinatura básica é devido tendo em vista a infra-estrutura fornecida pela operadora, indispensável à fruição, pelos usuários, dos serviços que utilizam. Por trás de um simples terminal telefônico, há toda uma sofisticada estrutura de rede de telecomunicações interligada a inúmeras outras redes de telecomunicações que, em conjunto, percorrem toda a extensão do território brasileiro e conduzem aos pontos de interconexão com as demais redes telefônicas mundiais. Ainda, quanto à estrutura das redes telefônicas, Benetti (2004) explica: Sem aprofundar nos detalhes técnicos, para cada terminal telefônico, existe uma "placa de assinante" na central telefônica correspondente. Todas as chamadas originadas/destinadas a esse terminal são direcionadas à sua "placa de comutação". Para completar a chamada, essa "placa" tem que ser conectada fisicamente por um fio metálico até o imóvel no qual se encontra instalado o terminal telefônico. Esse conjunto de "placa de comutação da central telefônica e fio metálico até a casa do cliente" é de uso exclusivo do usuário, ou seja, não pode ser compartilhado por outro usuário. Os equipamentos que permitem o "acesso" do usuário à rede telefônica têm custos de instalação e, principalmente, de manutenção fixa o que independe da quantidade de chamadas efetuadas e esses representam os maiores custos da prestação do serviço telefônico. 59 Quanto à infra-estrutura disponibilizada, acrescenta Beneti (2004): Afora o serviço de infra-estrutura, o que inclui serviços de manutenção, atualização, modernização e demais serviços inerentes recebem, à operacionalização ainda, chamadas da no rede, os terminal usuários telefônico instalado em suas residências, podendo, ademais, desfrutar dos serviços de informação, quer eletrônico, quer impresso, conforme sua livre opção. Essa disponibilidade, no entanto, depende de uma sofisticada infra-estrutura que implica custos fixos para a operadora. Uma linha telefônica capaz de realizar e receber chamadas 24 horas por dia depende da existência de uma ligação física entre aparelhos fixos e a manutenção desta, mesmo quando a linha não está sendo utilizada. E Benetti (2004) conclui quanto à tarifação: À tarifa de assinatura mensal corresponde serviço efetivamente prestado pela operadora ao usuário, já que este se encontra permanentemente conectado à rede. A qualquer instante que retire seu telefone do gancho, o "tom" de discar deve estar disponível. Da mesma forma, o telefone tem que estar apto a receber chamadas, de forma gratuita, a qualquer instante. Esse acesso permanente à rede caracteriza um serviço efetivo, distinto do simples ato de realizar uma chamada. 60 Sobre a mesma questão, há ainda, o ponto de vista de Silva5 (2005): Os usuários têm a falsa e enganosa impressão de que o terminal de linha telefônica instalado em sua residência é propriedade sua, mas não o é, tanto não é que se ele deixar de pagar as Contas Telefônicas, as Concessionárias estarão autorizadas a proceder ao Corte do Fornecimento do Serviço, ou mesmo a declarar rescindido o contrato. Poder-se-ia concluir a pesquisa apenas com esses argumentos, mas faz-se necessário observar mais um item de suma importância. 4.2.4 A expansão dos serviços através da tarifa de assinatura É importante esclarecer o que a maioria dos utentes de serviços de telecomunicações desconhece: a possível extinção da tarifa de assinatura inviabilizaria, em médio prazo, a universalização desse serviço, bem como, privaria as camadas mais pobres da população de ter acesso a um serviço que é de direito de todos. Beneti (2004) ainda explica: No modelo vigente, parte dos custos é remunerada pela assinatura mensal e parte é remunerada pelo pulso e uso por outras operadoras. O usuário que "fala mais" em seu terminal telefônico, acaba pagando um valor maior. Neste modelo, cerca de 50% dos usuários têm uma conta mensal líquida de impostos superior ao custo médio de R$ 45 -portanto, rentáveis para a operadora--, e 50% têm uma 5 SILVA, Fábio Santos da. A abusividade da cobrança de assinatura básica residencial . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 588, 16 fev. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6273>. Acesso em: 24 abr. 2008. 61 conta com valor inferior a R$ 45 -- sendo deficitários. A concessionária é, contudo, obrigada, em razão do contrato de concessão, a atender os usuários de menor renda ou não rentáveis, em razão da política de universalização instituída telecomunicações. A pelo modelo rentabilidade brasileiro obtida de dos denominados usuários mais rentáveis acaba por subsidiar os usuários não rentáveis da operadora. Caso viesse a ocorrer o fim da cobrança, tendo em vista que as receitas dela decorrentes representam cerca de 40% das receitas das concessionárias, Beneti (2004) explica que “seria necessário um aumento estimado de 150 % nas tarifas de pulsos para que houvesse a preservação do equilíbrio econômico-financeiro do Contrato de Concessão. Com isso, a conta dos usuários que fazem muitas ligações subiria de forma expressiva, com a conseqüente redução do valor da conta daqueles que fazem poucas ligações”. Ainda, é o entendimento de Beneti (2004): Tal situação até poderia parecer mais "justa", se não fosse economicamente insustentável. O mercado, através dos competidores e que não tem a obrigação de índices de universalização, encarregar-se-ia de, rapidamente, encontrar soluções muito mais baratas para os usuários de alto consumo. Entretanto, os 50 % dos usuários não rentáveis atualmente tornar-se-iam ainda mais deficitários em função da falta de suporte daqueles usuários rentáveis anteriores. Para os usuários de baixa renda, o mercado não seria capaz de encontrar soluções de equilíbrio. Com isto, em médio prazo a prestação do serviço aos usuários menos favorecidos estaria inviabilizada, voltando-se à situação de 62 poucos anos atrás na qual telefones fixos eram exclusivos das classes mais favorecidas. Sobre a mesma matéria, discorre Silva (2005): (...) um dos maiores temores dos investidores externos, diz respeito à quebra dos contratos, à manutenção de seus ganhos, ao retorno de seus investimentos. Com o intuito de proteger o retorno desses investimentos e permitir uma expansão do setor no país, a Lei Geral de Telecomunicações estabeleceu entre as diretrizes e princípios aplicáveis à Concessão de Serviços Públicos, o do “equilíbrio econômico e financeiro do contrato”, que nada mais é do que o direito que a Concessionária tem de garantir a manutenção das bases, das cláusulas do Contrato de Concessão tais como celebradas e até o término do prazo da Concessão. Com efeito, Meirelles (2006, p.215) esclarece: Equilíbrio financeiro: o equilíbrio financeiro, ou equilíbrio econômico, ou equação econômica, ou, ainda, equação financeira, do contrato administrativo é a relação estabelecida inicialmente pelas partes entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração do objeto do ajuste. Essa relação encargo-remuneração deve ser mantida durante toda a execução do contrato, a fim de que o contratado não venha a sofrer indevida redução nos lucros normais do empreendimento. 63 Ainda sobre a universalização dos serviços de telefonia, Brincas (2006) menciona que a tarifa de assinatura básica remunera o que o consumidor não vê, ou seja: (...) toda a instalação e manutenção da infra estrutura de rede necessária a levar o serviço não apenas ao seu terminal, mas a todas aquelas pequenas comunidades nas quais, não fosse este fato, estariam isoladas do resto do mundo, como ocorria até pouco tempo atrás. Isto é a universalização do serviço. Brincas (2006) entende que “por ser a telefonia fixa comutada um serviço público de primeira necessidade, a União, através do Órgão Regulador, a ANATEL, determina as metas para que a população brasileira seja atendida pela telefonia fixa, que estão estabelecidas no Plano Geral de Metas para Universalização (PGMU)”. Assim, diante de todo o exposto, pode-se concluir pela legalidade da tarifa de assinatura básica nas contas telefônicas, pois tem suporte legal nos arts. 19, inc. VII e 103, da Lei nº 9.427/87, bem como no art. 52, da Resolução nº 85/98, da ANATEL. A Jurisprudência é neste sentido: “AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SERVIÇO DE TELEFONIA FIXA. PEDIDO DE SUSPENSÃO DA COBRANÇA DA TARIFA BÁSICA MENSAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO COM FUNDAMENTO NO ART. 295, § ÚNICO, III, DO CPC. POSSIBILIDADE. Mesmo provada a cobrança da tarifa básica mensal, a pretensão mostra-se impossível de acolhimento futuro, porquanto a cobrança encontra respaldo legal. Precedentes desta Corte e do STJ. Por conseqüência, possível a extinção. Sentença mantida. APELO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO” (Ap. Civ. nº 64 70011956661, Vigésima Câmara Cível, Rel. José Aquino Flores de Camargo, j. em 19.7.05). O Tribunal de Justiça de Santa Catarina declarou reiteradamente a legalidade da cobrança da taxa de assinatura mensal, como se pode conferir nos arestos abaixo transcritos, extraídos das Apelações Cíveis interpostas das sentenças de improcedência da ação: “PROCESSUAL CIVIL – ASSINATURA BÁSICA MENSAL. TARIFA. SERVIÇO DE TELEFONIA FIXA. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. EMBASAMENTO LEGAL. O contrato de concessão de serviço público e a Lei n. 9.472/92 autorizam a cobrança de assinatura mensal de telefone fixo, conforme disposto na Resolução n. 85/98 da Anatel e Portarias n. 217/97 e n. 226/97 do Ministério das Comunicações”. (APC 2006.013046-6, de Criciúma. 1ª Câm. Direito Público, Rel. Des. Vanderlei Romer. Julgado no dia 13/06/2006) - Grifo nosso. “APELAÇÃO CÍVEL – CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO – TELEFONIA – COMBATE À COBRANÇA DE TARIFA BÁSICA MENSAL – REMUNERAÇÃO PREVISTA EM LEI, REGULAMENTO E CONTRATO – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL – PLEITO INACOLHIDO – APELO – ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA – CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO. Consoante reiterados pronunciamentos do Superior Tribunal de Justiça, a competência para analisar a legitimidade da cobrança de tarifa em feito envolvendo usuário e empresa concessionária de serviço público de telefonia é da Justiça Estadual, em função da ausência de interesse da União no deslinde da quaestio. 65 Estando o usuário sujeito aos efeitos da concessão do serviço público facultativo de telefonia, não há que prosperar pleito que visa afastar a cobrança de tarifa legal e contratualmente prevista”. (APC 2006.018065-0, de Criciúma. 2ª Câm. Direito Público, Rel. Des. Francisco Oliveira Filho. Julgado no dia 13/06/2006) - Grifo nosso. “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA – ASSINATURA MENSAL DE TELEFONIA FIXA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DA JUSTIÇA FEDERAL – INOCORRÊNCIA – CELEUMA PACIFICADA NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – PRELIMINAR REJEITADA. PRETENSA DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE DA COBRANÇA DA ASSINATURA REPETIÇÃO BÁSICA DOS MENSAL VALORES DE TELEFONIA PAGOS ATÉ FIXA – ENTÃO – IMPOSSIBILIDADE – PREVISÃO LEGAL PARA COBRANÇA DA TARIFA – ARTS. 19, VII E 103, DA LEI N. 9.427/87 – RESOLUÇÃO N. 85/98 DA ANATEL – RECURSO DESPROVIDO. Mostra-se legal a cobrança da assinatura básica mensal de telefonia fixa porque devidamente prevista nos arts. 19, VII e 103 da Lei n. 9.427/87, bem como no art. 52 da Resolução n. 85/98 da ANATEL, não merecendo prosperar, consequentemente, o pedido de repetição dos valores já pagos”. (APC 2006.010563-8, de Criciúma. 3ª Câm. Direito Público, Rel. Des. Rui Fortes. Julgado no dia 30/05/2006) - Grifo nosso. Vale destacar o início da discussão, segundo artigo do site Lex Universal6: 6 LEX UNIVERSAL.Julgamento sobre legalidade de assinatura básica mensal nos serviços de telefonia fixa é adiado. (Lex Universal 27/06/2007).Disponível em < http://www.lexuniversal.com/pt/news/2692>. Acesso em 30 out. 2008. 66 A discussão judicial começou porque uma consumidora gaúcha moveu ação de inexigibilidade da cobrança cumulada com repetição de indébito (devolução dos valores pagos indevidamente). O objetivo da consumidora era , além de ser desobrigada do pagamento da cobrança, receber de volta, em dobro, os valores pagos pela assinatura do telefone fixo à empresa Brasil Telecom. Em primeira instância, a consumidora não teve sucesso, mas apelou ao TJ/RS, que atendeu o pedido. O Tribunal entendeu ser abusiva a exigência de contraprestação por serviço não fornecido, além de não existir previsão legal para a cobrança e terem aplicação ao caso as normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC). A discussão sobre a legalidade da cobrança teve início quando a empresa Brasil Telecom tentou reverter a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) favorável a uma consumidora impedindo a cobrança da assinatura básica mensal. A Brasil Telecom recorreu, então, ao STJ, sustentando que os direitos previstos no CDC não excluem os decorrentes da legislação ordinária preexistente, qual seja, a Lei Geral das Telecomunicações. Afirmou ainda que a tarifa mensal não é voltada apenas à cessão de linha ou de terminal telefônico, mas também à infra-estrutura fornecida. Alegou que a norma da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) autoriza a cobrança da tarifa de assinatura e que somente caberia a repetição do indébito quando demonstrado o erro do pagamento voluntário. No final de junho do corrente ano, o Supremo Tribunal de Justiça - STJ aprovou a súmula que reconheceu a legalidade da 67 cobrança da assinatura básica mensal, por considerar que a referida tarifa tem amparo na legislação. Segue a referida súmula do STJ: Súmula: 356 É legítima a cobrança da tarifa básica pelo uso dos serviços de telefonia fixa. Percebe-se, a partir da análise da referida súmula aprovada pelo Tribunal ora apresentado, que há um indicativo no entendimento da Corte no que diz respeito ao reconhecimento da legalidade da cobrança da assinatura básica mensal, sinalizando para a autorização de sua cobrança pelas concessionárias, solucionando aparentemente, as controvérsias judiciais relativas a esta possibilidade. 68 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta monografia teve como objetivo apresentar ASPECTOS DOUTRINÁRIOS E JURÍDICOS A RESPEITO DA polêmica DA assinatura básica cobrada mensalmente na conta telefônica PELAS CONCESSIONÁRIAS destes serviços de seus usuários, buscando melhorar o entendimento sobre o assunto, destacando as questões controversas acerca do reconhecimento da legalidade desta cobrança. Para tanto, primeiramente foi conceituado o termo Tarifa e, posteriormente, feita uma análise da importante distinção entre Taxa e Tarifa, já que essa é necessária á compreensão do tema central da pesquisa. Assim, foi verificada a competência para a fixação tarifária, que é indelegável, posto que somente ao Estado pertence essa prerrogativa. Também foram analisados os critérios de reajuste e revisão das tarifas, até chegar à respectiva Tarifa de Assinatura Básica. No segundo capítulo, foi abordado o Serviço Público, sua exploração, requisitos e princípios garantidores da boa prestação de serviço e da busca por um custo justo aos usuários. Após classificá-los, imprescindível foi tratar da Concessão de Serviço Público e seu contrato, já que o sistema de telefonia brasileiro é objeto de concessão. Para isso, levantou-se principais aspectos relevantes acerca da Licitação, visto que a concessão de serviços públicos deve ser feita sempre através desta. Neste capítulo, observou-se que, visando o bom andamento dos serviços concedidos, foram criadas as Agências Reguladoras da Concessão de Serviços Públicos, órgão responsável pela fiscalização das atividades inerentes a esta prática, sendo este o objeto da pesquisa do terceiro capítulo. O terceiro capítulo abrangeu as Agências Reguladoras, como autarquias de regime especial, integrantes da Administração Pública Indireta. Essas Agências são de suma importância, 69 já que carregam a missão de normatizar, fiscalizar, regular e controlar as atividades desenvolvidas pelas concessionárias. Não menos importante, foi tratar da autonomia financeira e técnica dessas agências. No final do terceiro capítulo, apresentou-se a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, que é o órgão regulador do serviço de telefonia nacional. No quarto e último capítulo, foi feito um breve histórico do cenário brasileiro nas telecomunicações, cujo setor, em seu início, passou por inúmeras dificuldades de expansão, até porque, na época o valor da tarifa mensal cobrada era irrisório. Com o aumento da demanda dos serviços de telecomunicações no Brasil a prestação deste serviço tornou-se inadequada, tornando-se necessária a privatização do setor, fato que ocorreu no ano de 1995 durante o governo do Presidente da República Fernando Henrique Cardoso. Com a privatização, fez-se premente a implementação da cobrança de uma tarifa adequada por parte das concessionárias. Em conseqüência disso, no ano de 2004, uma consumidora gaúcha moveu ação, reclamando que a tarifa mensal seria indevida. Após o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ter dado sentença favorável a ela, milhares de processos neste sentido, foram ajuizados em todo o país. Ocorre que em 2007 o STJ decidiu através de súmula, pela legalidade da referida tarifa mensal, posto que possui amparo legal e decorre de uma efetiva prestação de serviço. Destaca-se, por fim, que, restaram confirmadas as hipóteses iniciais levantadas para o desenvolvimento desta pesquisa, quais sejam: 70 a) Tarifa é uma prestação pecuniária cobrada em decorrência da vontade do cidadão em obter, ou não, determinados serviços . b) Determinados serviços públicos podem ser prestados através do regime da concessão ; c) No Brasil os serviços de telecomunicação são devidamente fiscalizados pelas Agências Reguladores; d) A cobrança da tarifa de assinatura básica pelas empresas concessionárias nas contas telefônicas é pautada pela legalidade. Assim, espera-se que o presente estudo venha contribuir para uma melhor compreensão acerca da necessidade da cobrança mensal da tarifa de assinatura básica nas contas telefônicas de todos os usuários visto que, além da necessidade da cobrança para que as concessionárias possam manter o nível de qualidade exigido pelo consumidor, as súmulas aprovadas pelo Tribunal são indicativas do entendimento da Corte para as demais instâncias e este entendimento tem reconhecido a legalidade da cobrança da assinatura básica mensal, autorizando, portanto, sua cobrança pelas concessionárias. REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS AMARO, Luciano da Silva. Direito tributário brasileiro. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 1999. BENETTI, Ana Carolina Aguiar. A legalidade da tarifa de assinatura. Teleco, 15 nov. 2004. Disponível em: <http://www.teleco.com.br/emdebate/anac01.asp>. Acesso em 30 de setembro de 2008. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2003. CRETELLA JÚNIOR, José. 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