UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GENÉTICA E BIOLOGIA MOLECULAR Metabolismo de Drogas e Implicações na Farmacogenômica AUTOR: Gustavo Nunes de Oliveira Costa ORIENTADOR: Fabrício Rios Santos CO-ORIENTADOR: Giuliano Di Pietro A utilização de substâncias obtidas de vegetais e minerais pelo homem com a finalidade de cura é muito antiga. Os egípcios já recorriam a substâncias como o ópio, com função hipnótica, ou a beladona, como narcótico grego. Historicamente, a todas essas substâncias chamadas pelos gregos de pharmako, poderia significar simultaneamente veneno, medicamento ou poção mágica. Nos dias atuais, apesar do uso dos termos de droga ou fármaco significar uma substância capaz de provocar alterações fisiológicas no organismo, na prática, todas podem apresentar alto grau de toxicidade com o seu aumento no organismo, não se diferenciando da clássica visão de “veneno”. O estudo dessas substâncias abrange a Farmacocinética, que trata de como o organismo absorverá e eliminará esse agente, e da Farmacodinâmica, que se apropriará dos mecanismos pelos quais essas moléculas atuam. Desses, de particular interesse para determinar a quantidade ideal para administração de um medicamento, a farmacocinética caracterizará a evolução temporal da liberação, absorção, distribuição, metabolização (ou biotransformação) e excreção desses agentes, conhecido como sistema LADME pelas suas iniciais (GARCIA, 2008). Contudo, ainda que se estabeleça uma forma e quantidade ideal a ser administrada do medicamento (a forma farmacêutica final do fármaco), na prática clínica, a mesma dose poderá desencadear um efeito tóxico ou mesmo, paradoxalmente, nenhum efeito farmacológico em um segundo indivíduo. Logo, um das principais razões concebidas que justificasse esse tipo de resposta dual, foi o processo de eliminação de muitos desses medicamentos: o metabolismo. As primeiras observações a respeito de metabolismo datam de 510 anos a.C. quando o filosofo Hipócrates já não recomendava a fava como alimento, pois o mesmo sofria de um mal denominado favismo. Hoje sabe-se estar o favismo relacionado a um “erro inato do metabolismo”, decorrente da deficiência na síntese da glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD), envolvida no ciclo das pentoses (MELETIS, 2004). Sua inatividade leva ao acúmulo de espécies reativas de oxigênio, levando a lesão de hemácias e conseqüentemente a anemia hemolítica. Contudo, foi somente em 1902, que Garrod levanta a hipótese da existência de uma predisposição familiar de doenças que afetam o metabolismo humano. Nasce assim a Farmacogenética, formalmente estabelecida por Vogel em 1959, e elegantemente fundamentada pelos trabalhos clássicos de Motulsky, “Drug reactions, enzymes and biochemical genetics”, Beutler (1959), e Kalow com o livro “Farmacogenética, hereditariedade e resposta a drogas”. A biotransformação é uma etapa primordial no processo de eliminação e diminuição da toxicidade. Enzimas que podem detoxificar esses poluentes ou fármacos são conhecidas como “enzimas de biotransformação” (COLEMAN, 2005). Contudo, dentro da mesma população é possível observar concentrações plasmáticas de drogas variando em até trinta vezes (SILVA, 2006), podendo estas diferenças serem decorrentes da substituição de um simples aminoácido ou mudança em sua ordem na estrutura da proteína formada. As reações de metabolização de drogas são divididas em dois grupos: reações não sintéticas ou catabólicas, conhecidas como reações de fase I e reações sintéticas ou anabólicas, conhecidas como de fase II. Dentre os tipos de reação de fase I encontram-se as reações de oxidação, redução, hidrólise, ciclização e desciclização. Muitas das enzimas envolvidas encontram-se na membrana lipofílica do retículo endoplasmático dos hepatócitos, a principal família de enzimas envolvida é a do citocromo P450, conhecidos como CYPs, encontrado em quase todos os tecido e em maiores concentrações no fígado e intestino. Outra família de enzimas importante é a álcool desidrogenase, encontrada no citoplasma das células e responsável por 90% da metabolização do álcool (COLEMAN, 2005). As reações de fase II envolvem as conjugações com glicuronídios, sulfatos, glicina, e glutation, acetilação, metilação e síntese de ribonucleosídio e ribonucleotídio. Uma das famílias enzimas envolvidas neste tipo de reação encontra-se a N-Acetil transferase 1 e 2 (NAT1 e NAT2), as quais utilizam a acetil CoA como cofator. A isoniazida, medicamento primordial do tratamento da tuberculose, é metabolizada pela NAT2 e excretada principalmente pelos rins (WEBER, 1985). O perfil metabólico de cada indivíduo pode ser alterado por polimorfismos, assim caracterizando os seguintes fenótipos: metabolizadores lentos, em geral, são indivíduos com diminuição ou ausência da enzima metabolizadora; intermediários, que apresentam metabolismo “normal”, comum a maioria da população e rápidos, decorrente de um aumento na produção da enzima metabolizadora associado a uma ou múltiplas duplicações do gene que codifica a enzima. Apesar dos conhecimentos em nível de receptores, um medicamento é raramente efetivo e seguro para todos os pacientes tratados, geralmente segue-se um esquema posológico orientado pela indústria farmacêutica ou pelos manuais de Farmacoterapia e, mesmo assim, 100.000 indivíduos morrem anualmente por reações adversas graves. Sendo assim, a presença de polimorfismos genéticos pode afetar a atividade de uma significativa parte dessas famílias de enzimas, assim como proteínas transportadoras e sinalizadoras (RIOS-SANTOS, 2007). Neste contexto a Farmacogenômica apresenta-se como uma ciência que, utilizando os novos conhecimentos da biologia molecular, permitirá uma melhor compreensão dos mecanismos envolvidos nos diferentes procedimentos terapêuticos com a otimização e aumento de eficácia do tratamento, reduzindo custos com internações hospitalares e conseqüentemente melhorando a saúde coletiva. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: COLEMAN, M. D. Human Drug Metabolism: An Introduction. Birmingham: Jhon Wiley & Sons. 2005, 274p. GARCIA, A. R.; BERMEJO, M.; MOSS, AARON.; CASABO, V. G. Pharmacokinetics in Drug Discovery. Journal of Pharmaceutical Science, Vol. 97, no. 2, February 2008. INNOCENTI, F. Pharmacogenomics: Methods and Protocols. Totowa, New Jersey: Humana Press Inc. 2005, 214p. MELETIS, J.; KONSTANTOPOULOS, K. Favism - from the .avoid fava beans. of Pythagoras to the present. Haema 2004; 7(1): 17-21. MEYER, U. A. Pharmacogenetics – five decades of therapeutic lessons from genetic diversity. Nature Reviews Genetics 5, 669-676. 2004 RIOS-SANTOS, F.; DI PIETRO, G. Farmacogenômica: Curiosidade Científica ou necessidade? CRF-BA em Revista: Salvador BA. p. 11-13. Ano XIII - Nº 1Janeiro/Março/2007 SILVA, P. Farmacologia. Ed.7. Rio de janeiro: Guanabara Koogan. 2006, 1369p WEBER, W.; HEIN, D. W. N-Acetylation Pharmacogenetics. Pharmacological Reviews. Vol. 37, nº 1. 1985