Resumo do que foi dito durante a apresentação Introdução teórica O glicogénio é um polissacarídeo de reserva nos animais e em muitos fungos, sendo constituído por monómeros de glicose (20.000 a 30.000 moléculas) unidos entre si por ligações glicosídicas α-1,4 e α-1,6 nas ramificações. Encontra-se essencialmente armazenado no fígado e nos músculos, onde o seu metabolismo é mais acentuado, quer através de reacções de síntese, quer de degradação do glicogénio, com o objectivo de manter os níveis de glicose no sangue dentro dos valores normais. No fígado, esta regulação ocorre para enfrentar as necessidades de todo o organismo, enquanto que no músculo ocorre para enfrentar as necessidades glicémicas do próprio músculo (em situações de emergência). E como se processa, então, este metabolismo? A síntese de glicogénio começa com a conversão de glicose a glicose-6-fosfato (G6P), pela acção de uma hexocinase. De seguida, uma fosfoglicomutase isomeriza a G6P em glicose1-fosfato, que por sua vez é convertida em uridina-difosfoglicose (UDP-glicose). Esta tem um elevado potencial de transferência de fosfato, o que lhe permite adicionar glicose à extremidade 4’ de uma cadeia de glicogénio, numa reacção catalisada pela glicogénio sintetase. Por outro lado, em situações de jejum, quando a concentração de glicose no sangue diminui, o glicogénio armazenado é, então, degradado, convertendo-se em glicose, num processo conhecido como glicogenólise. A G6P tem 3 destinos possíveis: - pode dar início à glicólise - pode ser processada pela via das pentoses fosfato (produzindo NADPH e derivados de ribose) - pode ser convertida em glicose livre (neoglicogénese e glicogenólise) para libertação na corrente sanguínea (o que ocorre principalmente no fígado), através da G6Pase. E é através de mensageiros químicos que a glicogenólise é estimulada: a partir da ligação das hormonas glucagina (no fígado) e adrenalina (no músculo) aos respectivos receptores membranares, a adenilciclase é estimulada a produzir AMPc que, por sua vez, vai ser responsável por activar a fosforilase do glicogénio, que é a principal enzima de degradação do glicogénio, decompondo-o em glicose-1-fosfato. Como devem estar recordados, estas são hormonas que estimulam a glicogenólise no fígado e músculos, ao contrário da insulina, que estimula as células do fígado e dos músculos a armazenarem glicose na forma de glicogénio (estas acções opostas permitem a regulação do metabolismo do glicogénio). De seguida, após a isomerização da G1P a G6P, por acção da fosfoglucomutase, no fígado, vai ser produzida glicose através da enzima G6Pase, para ser exportada, pela veia porta, para todo o organismo; enquanto que no músculo, como não há glicose-6-fosfatase, a G6P (que não pode sair da célula, devido ao facto da membrana plasmática ser impermeável a ela) não vai ser convertida em glicose, mas sim metabolizada pela glicólise para a produção de ATP no músculo. Também a neoglicogénese (ou gliconeogénese – reacção inversa da glicólise, como se devem recordar) tem como passo final a transformação da G6P em glicose, por acção da G6Pase. Quando o glicogénio não consegue ser degradado, devido à deficiência de algumas das enzimas envolvidas, acumula-se no órgão, e a não libertação de glicose para a circulação acarreta uma série de consequências para a saúde. Parte Clínica As glicogenoses são doenças decorrentes de erros metabólicos hereditários que resultam em anormalidades da concentração ou da estrutura do glicogénio em qualquer tecido do organismo. São denominadas de doenças do armazenamento do glicogénio. Existem mais de 10 diferentes tipos de glicogenoses, dependendo do defeito enzimático encontrado, pois há defeitos enzimáticos específicos para cada tipo. E dependendo da distribuição da enzima específica nos tecidos ou órgãos, o armazenamento de glicogénio, nestas patologias, pode ser limitado a poucos tecidos ou ser mais difundido, havendo manifestações clínicas variadas (ver slides da apresentação). Glicogenose tipo I (doença de van Gierke, autossómica recessiva, corresponde a cerca de 25% das glicogenoses) Caracteriza-se por uma deficiência do complexo da G6Pase, que é responsável pela hidrólise da G6P nos órgãos que a possuem (fígado, rim, intestino…), o que faz com que na glicogenose tipo I não se forme a glicose a partir da G6P, que se acumula, assim, nas células. A G6Pase é um complexo funcional do RE, constituído por uma unidade catalítica com o centro activo no lúmen do RE e por transportadores que permitem, quer a entrada do substrato, G6P, quer a saída dos produtos da reacção, glicose e Pi. E, dependendo do tipo de defeito na G6Pase, distinguem-se essencialmente 2 subtipos de glicogenose tipo I (ver slides – acredita-se que o tipo I b seja mais grave…). Diagnóstico O gene da G6Pase humana localiza-se no braço longo do cromossoma 17. Assim, através da análise de DNA (PCR e RFLP) passou a ser possível fazer o diagnóstico desta doença de uma maneira rápida, precisa e não invasiva e abandonar metodologias anteriores que exigiam biopsia hepática e o estudo da actividade enzimática. Actualmente, só se fazem estudos enzimáticos em casos raros, em que o diagnóstico genético não é possível. Tratamento Não há cura para a GSD I (Glicogen Storage Disease type I). O controlo glicémico constitui a base do tratamento: - Dieta: amido de milho não cozinhado permite manter os níveis de glicose normalizados. - Transplante hepático ou renal (quando o tratamento dietético falha) - Fármacos: alopurinol – hiperuricemia; bicarbonato – acidémia - Terapêutica génica usando adenovírus parece ser promissora…