revista médica ano 1 | edição 1 | junho - julho 2013 e mais... endocrinologia ginecologia neurologia gastroenterologia medicina fetal oncologia PETER LIBBY revela em entrevista seus estudos em aterosclerose Aos poucos, você vai ver a nova marca do Fleury nas nossas unidades, nos seus exames e onde mais o Fleury estiver. Ela representa a união das características a partir das quais nos tornamos referência em medicina e saúde: dedicação e conhecimento. E é por você que vamos continuar inovando e buscando sempre o melhor. Tudo com um atendimento sempre próximo e caloroso. Nossa nova marca é muito mais que um novo desenho. É o reflexo da nossa vocação em surpreender e inovar sempre. Fleury. Um centro de referência em você. Use seu leitor de QR Code e assista a uma animação surpreendente sobre a história do Fleury. Ou acesse www.youtube.com/fleurymedicinaesaude www.fleury.com.br FleuryMedicinaeSaude fleury_online Dr. Celso Francisco Hernandes Granato – Responsável Técnico – CRM-SP 34.307 2 O boletim virou revista Você está recebendo a primeira edição da Revista Médica Fleury. Ela surge renovada no mesmo momento em que lançamos a nova plataforma de marca do Fleury Medicina e Saúde. Desde nossa criação, em 1926, valorizamos dois pilares: dedicação e conhecimento. Doutor Gastão Fleury e Doutor Walter Leser, nossos fundadores, nos ensinaram muitas coisas. Entre elas, duas se destacam: sempre olhar para o outro e fazer bem feito. É assim que construímos nossa história há 87 anos e são esses valores que estão traduzidos na nossa nova marca. Inspirada neste novo Fleury, esta revista é, na verdade, uma evolução do conhecimento médico compartilhado há mais de 20 anos. No fim dos anos 1990, o Fleury crescia na oferta de soluções em exames e serviços e o aumento do envio de informes científicos ao público médico acompanhava esse ritmo. Da necessidade de juntar, em um só veículo, todas as publicações que então circulavam surgiu o fleury.com.br, que recebeu esse nome em vista de sua ligação com o site do Fleury, no qual os leitores podiam encontrar mais informações sobre cada notícia divulgada – uma inovação para a época. Em 2007, o periódico passou a ser simplesmente Boletim Científico Fleury Medicina e Saúde, uma vez que o apelo à internet já estava perfeitamente consolidado. De lá para cá, houve algumas poucas alterações no projeto gráfico da publicação. Paralelamente, porém, outros informes foram criados. Reestruturado internamente em especialidades médicas, o Fleury, há cerca de dois anos, passou a editar também boletins específicos em que discutia casos clínicos e mostrava a integração entre suas diferentes áreas para fornecer, ao médico solicitante, um serviço diagnóstico o mais completo possível. Novamente, o volume de papel aumentou. Por que não, então, concentrar tudo num só veículo e oferecer mais serviço e informação aos leitores? Foi resgatando todo esse histórico que emergiu o conceito da Revista Médica Fleury, que temos o prazer de lhe apresentar. Em suas páginas, você vai poder conferir o mesmo conteúdo científico de qualidade que caracterizou os 13 anos do boletim, mas bastante ampliado e disposto de forma mais dinâmica, inclusive em novas seções que permitirão uma maior interação entre você e nosso corpo clínico. Esperamos que goste do resultado e, sobretudo, que continue nos abastecendo com suas sugestões, comentários e críticas. Boa leitura! Dra. Kaline Medeiros Costa Pereira Gerente de Relacionamento Médico Fleury Medicina e Saúde BRUÑEL GALHEGO Caro Colega, nesta edição 6 MURAL Programa de webmeetings traz atualização científica ao alcance de um clique 8 9 DÊ O DIAGNÓSTICO O qu cirurgia sem angina nem dor torácica? OPINIÃO DO ESPECIALISTA Tomografia tem sinal verde no rastreamento do câncer de pulmão PRÁTICA CLÍNICA Triagem da clamídia ajuda a prevenir sequelas à saúde reprodutiva da mulher 13 CAPA 18 O cardiologista Peter Libby fala de seus estudos e percepções no combate à doença aterosclerótica RELATÓRIO INTEGRADO Testes moleculares podem identificar perdas de resposta no tratamento da LMC 22 mural Eventos Atualize-se sem sair do consultório O Fleury mantém, desde 2011, um programa de aulas interativas, ministradas por seus assessores médicos e transmitidas pela internet, com o objetivo de levar informação científica à comunidade médica de forma prática e rápida, sem limites geográficos. Uma vez que são transmitidos ao vivo, esses eventos ainda permitem que os espectadores interajam com os palestrantes, com o envio de comentários e dúvidas em tempo real. Acesse já o site dos webmeetings (www.aulasfleury.webmeeting.com.br), cadastre-se gratuitamente para participar dos próximos encontros e aproveite a visita para conferir também algumas das aulas já gravadas: • Diabetes mellitus: o que há de novo no diagnóstico • Coqueluche: nova epidemiologia de uma nova doença • Cuidados pré-analíticos para a interpretação correta de exames • Refluxo gastroesofágico • Avanços no diagnóstico e na prevenção do HPV • Prematuridade e hipertensão na gestação • Avaliação dos nódulos de tiroide HIV/aids Prevalência de HIV em adultos entre 15 e 49 anos, em 2011 Prevalência (%) por região da OMS: Pacífico Ocidental: 0,1 [0,1-0,1] Mediterrâneo Oriental: 0,2 [0,1-0,3] Sudeste Asiático: 0,3 [0,2-0,4] Europa: 0,4 [0,4-0,5] Américas: 0,5 [0,4-0,6] África: 4,6 [4,4-4,8] Prevalência global: 0,8 [0,7-0,8] FONTE: OMS 6 Obesidade 488 milhões de reais... ...são os custos anuais do SUS com o tratamento de doenças associadas à obesidade, o que mostra mais concretamente o impacto dessa epidemia no gerenciamento da nossa Saúde Pública. Não é para menos. As taxas de sobrepeso e obesidade vêm crescendo de forma contínua no Brasil, tendo passado de 42,7% e 11,4%, respectivamente, em 2006, para 48,5% e 15,8%, respectivamente, em 2011. A população mais afetada é a que tem renda inferior a três salários mínimos e menos de oito anos de estudo. Em vista desse cenário, começam a surgir iniciativas para combater o excesso de peso e evitar suas consequências com a importância que essa questão requer. Em 19 de março de 2013, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, assinou uma portaria que criou a Linha de Cui- dados Prioritários do Sobrepeso e da Obesidade no SUS, a qual prevê atividades que vão desde a atenção básica até o atendimento em serviços especializados. O documento também reduz de 18 para 16 anos a idade mínima para realizar a cirurgia bariátrica em casos de risco para o paciente e altera a idade máxima para o procedimento, que pode ultrapassar o limite hoje estabelecido, de 65 anos, de acordo com a avaliação de risco-benefício. Outras mudanças previstas com a portaria incluem ainda o aumento no valor pago em cinco exames ambulatoriais pré-operatórios, o reajuste médio em 20% das técnicas de cirurgia bariátrica feitas pelo SUS, a autorização para a realização de mais uma técnica cirúrgica e a cobertura para mais uma intervenção plástica reconstrutiva pós-gastroplastia. Crescimento do sobrepeso e da obesidade no Brasil, de 2006 a 2011 60 50 46,6 48,1 48,5 13,0 13,9 15,0 15,8 2008 2009 2010 2011 43 43,4 43,3 11,4 12,9 2006 2007 40 Porcentagem 30 20 10 0 Sobrepeso FONTE: PESQUISA VIGITEL, DE 2006 A 2011 Obesidade dê o diagnóstico Dispneia súbita após cirurgia recente na ausência de angina ou dor torácica Em que diagnóstico você pensaria diante da história clínica e das imagens? Qual o diagnóstico provável? Paciente do sexo feminino, 66 anos, chegou ao prontosocorro com quadro de “falta de ar” e tosse, iniciado seis horas antes. Negava febre, dor torácica, náusea e vômito. Era extabagista de 30 anos-maço – fumou dois maços de cigarros ao dia por 15 anos – e tinha parado havia dez anos. Possuía antecedente de HAS, obesidade e DPOC. Duas semanas antes, havia sido submetida a uma hemicolectomia direita, devido a um adenocarcinoma de cólon ascendente. Ao exame físico, tinha estado geral decaído, estava taquidispneica (FR = 24 irpm) e cianótica e apresentava turgência jugular, edema (2+/4+) em MMII, hiperfonese de B2 em foco pulmonar, FC = 120 bpm e PA = 90/50 mmHg, além de ausculta pulmonar sem RA. Dentre os exames laboratoriais solicitados, o BNP e o D-dímero estavam elevados e a troponina T, positiva. Por sua vez, a angiotomografia de tórax também mostrou alterações (setas). Exacerbação da DPOC de causa a esclarecer Choque: instabilidade hemodinâmica Cor pulmonale: crônico (pela DPOC) ou agudo Câncer de cólon recente: pós-operatório de hemicolectomia D HAS Obesidade ARQUIVO FLEURY Veja a resposta da assessora médica em Imagem, Viviane Baptista Antunes, na pág. 33. Angiotomografia de tórax 8 opinião do especialista Sinal verde para a tomografia no rastreamento do câncer de pulmão Em cenários selecionados, o método tem impacto na redução da taxa de mortalidade ARQUIVO FLEURY DR. GUSTAVO MEIRELLES* Não é de hoje que se pesquisa a validade da tomose a TC de tórax para rastreamento anual de câncer de pulmão. grafia computadorizada (TC) no rastreamento da Nesses casos, o grau de recomendação é 2B. neoplasia pulmonar, mas sem que daí tenham saí- • Para pessoas fora dessa faixa etária ou com tabagismo acumulado de menos de 30 anos-maço ou que pararam de fumar há mais de do novas recomendações. No entanto, entre 2007 15 anos ou, ainda, que tenham comorbidades cuja gravidade possa e 2009, um grande estudo multicêntrico com mais impedir o tratamento desse câncer ou ser fator independente de 50 mil participantes, o National Lung Cancer de redução da expectativa de vida, a TC não deve ser utilizada Screening Trial, trouxe novidades nesse cenário. rotineiramente para rastreamento. Nessas situações, o grau de reO trabalho comparou a TC com a radiografia para comendação é 2C. a detecção precoce de câncer pulmonar em paAs diretrizes da National Comprehensive Cancer Network acrescencientes de alto risco, que foram divididos em dois grupos e submetidos a rastreamento de nódulos tam a essas recomendações outros fatores para a estratificação de risco, por três anos. Nesse período, a taxa de mortalida- como a história familiar de câncer de pulmão e a exposição ocupacional de específica por câncer de pulmão foi de 247/100 a agentes carcinogênicos. Diante disso, o uso da TC de tórax pode ser benéfico em cenários selemil indivíduos ao ano no grupo rastreado por TC e cionados, desde que inclua indivíduos de alto risco, motivados à adesão de 309/100 mil no grupo que fez radiografia. Esses resultados representam uma redução e avaliados em serviços de referência que adotem protocolos padronida mortalidade pela doença da ordem de 20% (IC zados de obtenção e interpretação de imagens tomográficas de nódulos 95% 6,8-26,7; p = 0,004) no grupo em que a tomo- pulmonares, além de contarem com uma equipe multidisciplinar envolgrafia foi usada. A mortalidade geral também caiu vida na avaliação do paciente antes e depois da realização da tomografia em 6,7% em tais pacientes, sugerindo que o empre- computadorizada. Ademais, o impacto do diagnóstico precoce sobre a go desse método, ainda que incorra em mais falso- mortalidade pressupõe o acesso às estratégias terapêuticas recomenpositivos, possa trazer efeitos benéficos em po- dadas. Por outro lado, a aplicação dessa abordagem para grupos de baixo risco ou em cenários distintos é capaz de inverter a relação riscopulações selecionadas. Tais achados foram confirmados em uma revisão benefício observada nos estudos que embasam tal conduta. sistemática da literatura que envolveu várias entidades internacionais de Oncologia. Com base em oito ensaios randomizados controlados e em 13 estudos *Radiologista com atuação de coorte, os pesquisadores concluíram que a TC principal em Radiologia Torácica anual pode beneficiar indivíduos com alto risco de e PET/CT, fez residência médica, desenvolver câncer de pulmão, embora ainda paiespecialização em Radiologia rem incertezas sobre os danos dessa abordagem e a Torácica e doutorado no possibilidade de generalização dos resultados. Departamento de Diagnóstico De qualquer modo, essa revisão serviu de pilar por Imagem da Unifesp-EPM, para as novas recomendações da American Society além de pós-doutorado no of Clinical Oncology, divulgadas em maio de 2012, Memorial Sloan-Kettering sobre o diagnóstico precoce da neoplasia pulmonar: Cancer Center. Atualmente é • Para indivíduos com idade entre 55 e 74 anos assessor médico em Imagem do e história de tabagismo de, pelo menos, Tórax e PET/CT do Fleury. 30 anos-maço, seja atual, seja pregressa [email protected] (interrompida há menos de 15 anos), sugere- prática clínica medicina fetal Ressonância magnética fetal faz ampla avaliação anatômica do cérebro em desenvolvimento O principal método de imagem para examinar rotineiramente o sistema nervoso central (SNC) do feto é a ultrassonografia (US). Entretanto, com sua capacidade de imagem multiplanar e alta capacidade de resolução anatômica, a ressonância magnética (RM) configura um importante método complementar na demonstração de alterações morfológicas do SNC em desenvolvimento. Com o advento das técnicas de aquisição rápida, a RM tornou-se uma ferramenta valiosa na avaliação pré-natal, na medida em que fornece informações anatômicas relevantes, em especial quando a US prévia mostra-se limitada pela apresentação do feto ou por acentuado oligoâmnio. Além disso, a calvária não restringe a avaliação do cérebro fetal por esse método. Em comparação com a US, a RM ainda permite melhor análise de áreas como córtex, ventrículos, espaço subaracnoide, corpo caloso e estruturas da fossa posterior. Considerando-se o cérebro em desenvolvimento, os parâmetros técnicos do exame devem ser otimizados, evidentemente. Assim, as sequências ponderadas em T2 são as mais úteis para estudar as mudanças no conteúdo de água do tecido cerebral do feto. A obtenção de imagens, por sua vez, exige planos ortogonais – sagital, coronal e axiais – em relação à cabeça fetal e à coluna vertebral. Vale salientar que a integração apropriada da ressonância magnética em algoritmos de avaliação pré-natal pode facilitar a tomada de decisões e o acompanhamento das gestantes. No Fleury, a revisão sistemática dos achados por uma equipe multidisciplinar de assessores médicos, que inclui radiologistas, obstetras, neuropediatras e geneticistas, permite ao médico solicitante receber apropriado aconselhamento nesse sentido. Malformação de Dandy-Walker. Imagens axiais (A e B) e sagital (C) de um feto com 27 semanas de gestação. Note a marcada hipoplasia do verme do cerebelo, associada a aumento das dimensões da fossa posterior, com volumoso cisto dorsal em comunicação com o quarto ventrículo. A tórcula, o seio reto e o tentório encontram-se em topografia alta. Agenesia calosal. Imagens coronal (A), axial (B) e sagital (C) de um feto com 26 semanas de gestação. Observe a ausência do corpo caloso, associada à dilatação dos cornos occipitais dos ventrículos laterais (colpocefalia). 10 QUANDO A RM É MAIS SEGURA PARA O FETO? A maioria dos estudos experimentais não demonstrou efeitos colaterais deletérios em embriões em desenvolvimento que tenham sido submetidos ao exame após 21 semanas de gestação. Diante disso, costumase solicitar a RM fetal uma vez finda a organogênese, ou seja, no segundo e terceiro trimestres, quando o exame não representa nenhum risco conhecido para o feto. A utilização de contraste endovenoso ou sedação é dispensável e contraindicada. Apesar de a segurança do método não ter sido positivamente estabelecida, qualquer perigo parece insignificante e é superado pelo benefício potencial do correto diagnóstico. O fato é que, diante de uma forte indicação clínica, a RM é preferível a qualquer estudo envolvendo radiação ionizante. ARQUIVO FLEURY ASSESSORIA MÉDICA Teste rápido detecta indícios de rotura prematura de membranas com alta sensibilidade Já está disponível, no Fleury, um teste capaz de identificar, na secreção vaginal de gestantes, a alfa-1-microglobulina placentária (PAMG-1), uma proteína que normalmente é encontrada no líquido amniótico em altas concentrações, mas que, no fluido vaginal, tem níveis extremamente baixos, da ordem de 50-220 picogramas/mL. Com isso, a detecção da PAMG-1 nesse material é altamente sugestiva de rotura prematura de membranas, que responde por 20-40% dos casos de prematuridade, muitas vezes em associação com corioamnionite e com consequente risco de infecção neonatal. Denominado AmniSure®, o exame utiliza anticorpos monoclonais que detectam a proteína em questão mesmo em quantidades mínimas de líquido amniótico nas secreções vaginais (até 0,005 de uma gota), com precisão de aproximadamente 99%, o que elimina de forma eficaz os resultados falso-positivos e falso-negativos. Feito da 12ª semana gestacional até o fim da gravidez, o novo método pode ser combinado à ultrassonografia obstétrica para a avaliação da redução de volume de líquido amniótico. Da coleta até a emissão do laudo pelo assessor, obstetra e gestante têm de esperar, no máximo, 30 minutos. PASSO A PASSO DO AMNISURE®: 1. O conteúdo vaginal é obtido do fundo de saco posterior por meio de um swab de poliéster estéril, o qual, a seguir, permanece descansando numa solução solvente dentro de um tudo específico. 2. A seguir, sai o swab e entra a fita-teste, que efetivamente aponta a presença da PAMG-1 na solução. Perdas significativas de líquido amniótico produzem resultados visíveis mais cedo, após cinco minutos, enquanto perdas menores demoram até dez minutos. Neuroimagem Dr. Antonio M. Maia Jr. [email protected] Medicina Fetal Dr. Mário Henrique Burlacchini de Carvalho [email protected] ASSESSORIA MÉDICA Dr. Mário Henrique Burlacchini de Carvalho [email protected] oncologia Dosagem de HE4 abre novas perspectivas no diagnóstico do câncer de ovário ALGORITMO PREDIZ RISCO DE MALIGNIDADE COM BASE EM HE4 E CA125 Pesquisadores da Escola de Medicina de Alpert, da Universidade de Brown, desenvolveram há pouco tempo o Algoritmo de Risco de Malignidade Ovariana, ou Roma, na sigla em inglês, o qual se baseia justamente nas dosagens do HE4 e do CA125, assim como no estado menopausal da paciente. A ferramenta, que tem sido utilizada no auxílio à discriminação de massas anexiais, classifica os tumores ovarianos em baixo e alto risco para doença ovariana maligna, funcionando como um instrumento de predição de malignidade. Afinal, apesar dos avanços no diagnóstico e no tratamento do câncer na mulher, o tumor epitelial de ovário prossegue como a mais letal das neoplasias ginecológicas. Quando a doença tem diagnóstico e tratamento precoces, a taxa de sobrevida em cinco anos pode chegar a 93,5%, mas apenas 15% dos casos são identificados em fase inicial. Dentro ou fora do algoritmo, portanto, o HE4 promete contribuir para modificar esse cenário. ASSESSORIA MÉDICA Microscopia eletrônica de varredura mostra células cancerígenas em ovário humano. 12 Dr. Gustavo Arantes Rosa Maciel [email protected] SCIENCE PHOTO LIBRARY Um novo marcador vem se juntar ao CA125 para fortalecer a investigação de tumores ginecológicos malignos diante do achado de uma massa anexial. Trata-se do HE4, sigla de human epididymis protein 4, uma glicoproteína expressa em neoplasias epiteliais de ovário, mas não no epitélio ovariano normal. O marcador está presente em até 100% dos adenocarcinomas endometrioides, em 93% dos adenocarcinomas serosos e em 50% dos carcinomas de células claras, embora não seja encontrado em casos de tumores mucinosos. De modo semelhante ao que ocorre com o CA125, o HE4 aparece aumentado em mais de 80% das pacientes com câncer de ovário. Alguns estudos recentes testaram a acurácia da dosagem dessa glicoproteína e de sua associação com o CA125 na discriminação de massas anexiais para posterior indicação de tratamento oncológico especializado. Os resultados mostraram-se bastante promissores, uma vez que o HE4 apresenta sensibilidade de 83% e especificidade de 90%. Quando combinado ao CA125, portanto, esses índices tornam-se ainda mais elevados. SCIENCE PHOTO LIBRARY Microscopia eletrônica de transmissão evidencia tuba uterina infectada pela C. trachomatis. ginecologia Como prevenir o impacto da clamídia à saúde reprodutiva da mulher A infecção causada pela Chlamydia traNa prática, o fator tubário responde chomatis é uma das doenças sexual- por 15% a 35% dos casos de infertilidade mente transmissíveis mais prevalentes e está altamente relacionado à presenem todo o mundo, com 90 milhões de ça de sorologia positiva para C. tracho- EM BUSCA DO DNA DA casos novos a cada ano. Apesar de afe- matis, sugerindo fortemente que infec- CHLAMYDIA TRACHOMATIS tar ambos os sexos, tem maior impacto ções silenciosas por esse agente são Apesar de a infecção pela bactéria na saúde reprodutiva das mulheres. causa comum da impossibilidade de ser detectada por cultura e sorologia, Mesmo sem determinar sintomas engravidar. Daí por que os Centros para os métodos moleculares mostramna maioria dos casos, pode ocasionar Controle de Doenças e Prevenção, dos se hoje os mais sensíveis para essa uretrite e cervicite, com chance de pro- Estados Unidos, preconizam a triagem finalidade, com destaque para a PCR gredir e atingir o trato genital superior, para essa infecção em mulheres jovens em tempo real, a técnica de eleição resultando em doença inflamatória pél- sexualmente ativas, bem como sua no- para a pesquisa desse patógeno. vica (DIP) em 20% das pacientes. Tanto tificação, justamente com o propósito Recentemente, avanços importantes aumentaram a sensibilidade (94,5%), é assim que a clamídia é considerada de reduzir o risco de sequelas futuras. a maior causa de DIP não associada à Com isso, é possível não somente a especificidade (99,5%) e os valores gestação ou a procedimentos cirúrgicos. realizar a prevenção primária da doença, preditivos negativo e positivo desse Entre as consequências da DIP estão, mas também a secundária, que, afinal, teste. Ademais, a PCR possibilita a principalmente, a obstrução tubária, a permite a identificação das portadoras detecção da clamídia em amostra de endometrite, a salpingite, os abscessos assintomáticas e o tratamento desse urina, o que é mais confortável para tubo-ovarianos, a peritonite e, claro, a grupo, evitando complicações como DIP, os homens. Como se não bastasse, há possibilidade de identificar outros gravidez ectópica. Mulheres com his- infertilidade e gravidez ectópica. agentes na mesma amostra, a tória de DIP têm de sete a dez vezes exemplo da N. gonorrhoeae. mais risco de gestação tubária, o qual aumenta cumulativamente a cada episódio, podendo chegar até 75%. ASSESSORIA MÉDICA Ginecologia e Biologia Molecular Dr. Gustavo Arantes Rosa Maciel [email protected] Microbiologia Dr. Jorge Luiz Mello Sampaio [email protected] neurologia Cintilografia com Trodat pode diagnosticar precocemente a doença de Parkinson Paciente normal O diagnóstico da doença de Parkinson (DP) é essencialmente clínico e baseia-se na presença de sintomas motores característicos, como bradicinesia, rigidez, tremor de repouso e anormalidades posturais. A condição ainda não pode ser detectada na sua fase pré-clínica ou pré-motora, porém já existe a possibilidade de diagnosticá-la precocemente e até mesmo de confirmá-la por neuroimagem funcional – mais precisamente com a cintilografia com Trodat marcado com 99mTc, um traçador que se liga seletivamente aos receptores de dopamina pré-sinápticos (DAT) na substância negra do mesencéfalo. A perda de tais receptores tem correspondência com a perda dos neurônios dopaminérgicos, sendo demonstrada de forma muito sensível nas imagens Spect, mesmo nas fases iniciais da doença. Além disso, a redução da densidade desses receptores está associada com a gravidade e com a progressão da DP. Por outro lado, imagens normais afastam essa hipótese diagnóstica. Nos pacientes com quadro clínico típico e boa resposta à terapia com levodopa, nem sempre há necessidade de confirmação com exames funcionais. Contudo, nos indivíduos com indicação de procedimentos terapêuticos agressivos ou, ainda, no diagnóstico diferencial entre outras síndromes parkinsonianas e a DP, o uso da cintilografia com Trodat pode ser útil, já que existem semelhanças nos sinais e sintomas dessas doenças em seus estágios iniciais, mas o tratamento e o prognóstico diferem. Na DP, vale assinalar, a redução da captação estriatal é mais assimétrica e acomete o putâmen de forma preferencial. O exame também contribui com a diferenciação entre a primeira causa de demência, a doença de Alzheimer, na qual a captação se mostra normal, e a segunda, a demência por corpúsculos de Levy, na qual há diminuição da captação no putâmen e no caudado. Dra. Paola Smanio [email protected] Dr. Marco Antonio Condé Oliveira [email protected] Paciente com Parkinson 14 ARQUIVO FLEURY ASSESSORIA MÉDICA ARQUIVO FLEURY Nova ultrassonografia revela achado altamente prevalente em pacientes com doença de Parkinson idiopática Ampliando os recursos para a abordagem do paciente com Parkinson, o Fleury acaba de incorporar à sua rotina a ultrassonografia (US) transcraniana para avaliação do parênquima cerebral, um exame ainda pouco conhecido e oferecido no Brasil, que detecta o aumento da ecogenicidade da substância negra, alteração que os aparelhos de ressonância magnética convencionais não conseguem ver. Esse achado está presente em pouco mais de 90% dos indivíduos com doença de Parkinson (DP) idiopática, mas tem prevalência muito baixa nos idosos hígidos (em torno de 8%), da mesma forma US transcraniana de mulher de 59 anos, com parkinsonismo, apresenta hiperecogenicidade marcada da substância negra à direita (área de 0,43 cm2). que em outras formas de parkinsonismo. A relevância dessa descoberta, feita em 1995 pelo neurossonologista Georg Becker, foi corro- PRINCIPAIS INDICAÇÕES DA US borada por Berg e cols. em estudos prospectivos TRANSCRANIANA DO PARÊNQUIMA CEREBRAL: publicados em 2011 e 2012. Após avaliar uma corte de 1.500 idosos saudáveis, os pesquisadores com- • Diagnóstico diferencial entre parkinsonismo, DP, quadros atípicos de parkinsonismo, ou Parkinson-plus provaram que a presença de hiperecogenicidade • Diagnóstico diferencial das etiologias de tremor, da substância negra eleva em cerca de 22 vezes o tremor essencial e tremor relacionado à DP risco de desenvolvimento de DP, o que tem confe• Auxílio ao diagnóstico diferencial dos distúrbios de rido a esse achado o status de provável marcador marcha em idosos que apresentam quadro atípico pré-clínico da doença. Avanços dos estudos que da DP, com alteração da marcha e bradicinesia utilizam o método também conseguiram associar tais alterações da ecogenicidade, dos núcleos da base e da rafe mediana com outros transtornos ASSESSORIA MÉDICA do movimento, como tremor essencial, coreias, Dra. Maramélia Araújo de Miranda Alves distonias e outras síndromes parkinsonianas. [email protected] Dr. Aurélio P. Dutra [email protected] endocrinologia Composição corporal por densitometria tem laudo diferenciado O Fleury agora emite um novo laudo para o estudo de composição corporal por densitometria por DXA. Devido às várias aplicações clínicas desse exame, que avalia o conteúdo de gordura corporal e as massas magra e óssea, o documento traz mais detalhes para permitir uma melhor avaliação de condições como obesidade, anorexia e lipodistrofias, da reabilitação motora de doenças neuromusculares e de acompanhamentos nutricionais, entre outros casos. Veja, no quadro abaixo, os principais parâmetros considerados no exame e descritos no novo laudo. ASSESSORIA MÉDICA Dr. Sergio S. Maeda [email protected] PARÂMETROS ESTUDADOS PELO NOVO LAUDO DE COMPOSIÇÃO CORPORAL AVALIAÇÃO Gordura corporal Massa magra Massa óssea PARÂMETRO UTILIDADE Índice de massa corporal (IMC) Avalia o excesso de peso, mas não distingue gordura de massa magra Índice de gordura corporal, ou fat mass index (FMI) (gordura total em kg/altura em m2) Avalia exclusivamente gordura corporal e categoriza valores para ambos os sexos Distribuição de gordura central (androide) e periférica (ginoide) Conforme o tipo de gordura, ajuda a estratificar risco cardiovascular, já que a gordura androide, armazenada na região abdominal, correlaciona-se com maior probabilidade de hipertensão, dislipidemia, diabetes e doença arterial coronariana, ao contrário da ginoide, que fica na região inferior do corpo, ao redor dos quadris e coxas Appendicular lean mass (ALM) Corresponde à massa magra dos braços e pernas, sem incluir o tronco (exclui vísceras), e representa a melhor medida da musculatura apendicular Índice de massa magra, ou índice de Baumgartner (ALM/altura2) Funciona como auxiliar na avaliação da sarcopenia, sendo indicativo de baixa massa muscular quando ≤7,26 kg/m2 para homens e ≤5,5 kg/m2 para mulheres Densidade mineral óssea total (DMO) Avalia a massa óssea total, embora, valha a pena lembrar, os sítios oficiais para a análise da massa óssea em adultos sejam coluna e fêmures 16 gastroenterologia ARQUIVO FLEURY RM pode ser feita com contraste exclusivo para avaliação hepatobiliar Desde o ano passado, o ácido gadoxético, um novo meio de contraste exclusivo para a avaliação hepatobiliar por ressonância magnética (RM), foi aprovado para uso no Brasil. Sempre procurando incorporar os mais avançados recursos em Medicina Diagnóstica, o Fleury passou também a oferecer esse produto para os exames de RM realizados em suas unidades de São Paulo. Baseado no gadolínio, esse meio de contraste é hepatoespecífico porque, além de sua distribuição extracelular, tem também um momento intra-hepatocitário, ou seja, um percentual da dose administrada ao paciente é captado pelos hepatócitos e excretado pelos ductos biliares. Desse modo, serve como um marcador de células hepatocitárias viáveis ou com função parcial ou totalmente preservada. Na prática, a captação do ácido gadoxético ocorre nas lesões que contenham hepatócitos ou nas quais persista algum grau de arranjo normal do parênquima hepático, como nódulos regenerativos, nódulos displásicos e hiperplasia nodular focal. Por outro lado, as lesões sem hepatócitos, a exemplo de metástases, carcinoma hepatocelular indiferenciado e colangiocarcinoma, não o captam. Do ponto de vista de execução, o exame com o ácido gadoxético não muda de forma significativa a rotina na sala da ressonância magnética, durando 15-25 minutos, mesmo porque mantém todas as informações do estudo convencional por RM. Sua grande vantagem é agregar informação clínico-radiológica específica, de forma não invasiva, anatômica e funcional, sempre com o propósito de permitir um diagnóstico mais acurado e o mais precoce possível e, em última instância, uma melhor abordagem dos pacientes. ASSESSORIA MÉDICA Dr. Dario A. Tiferes [email protected] FONTE Dr. Antonio Luís Eiras de Araújo Hiperplasia nodular focal (HNF) exofítica no lobo hepático esquerdo (setas vermelhas). A imagem coronal em T2 (A) mostra o nódulo exofítico interpondo-se entre o lobo hepático esquerdo e a parede gástrica. A imagem axial em T1 précontraste (B) apresenta o nódulo com sinal semelhante ao parênquima hepático adjacente. Já as imagens axial (C) e coronal (D) em T1 pós-contraste (ácido gadoxético) evidenciam aumento do sinal do parênquima hepático e também do nódulo, caracterizando sua origem primária hepática. INDICAÇÕES DA RM COM ÁCIDO GADOXÉTICO: • Investigação primária e follow-up de pacientes com cirrose, em especial dos que tenham nódulos indefinidos com o protocolo convencional do exame • Abordagem de indivíduos com metástases hepáticas que sejam candidatos à ressecção cirúrgica, sobretudo no carcinoma colorretal • Avaliação de complicações pós-cirúrgicas envolvendo as vias biliares • Auxílio à diferenciação entre adenoma e hiperplasia nodular focal • Especulação da função hepática segmentar em pacientes com proposta de hepatectomias capa Logo que começou a se debruçar sobre o assunto, há 25 anos, Peter Libby já observou que moléculas de adesão às células endoteliais liberam citocinas pró-inflamatórias, atraindo glóbulos brancos para sua superfície. “Achávamos que o início da placa se devia à resposta aos fatores de risco já conhecidos, como aumento do LDL e hipertensão arterial, e que haveria um mecanismo de transdução do sinal do fator de risco, levando à inflamação”, conta o cardiologista, que é chefe do Serviço de Medicina Cardiovascular do Brigham and Women’s Hospital, em Boston, Massachusetts, e professor titular da Harvard Medical School. Em sua recente visita ao Brasil, aonde veio para participar de um curso de atualização em aterosclerose promovido pelo Fleury, Libby falou à nossa reportagem sobre os estudos que vem desenvolvendo nesse campo e as perspectivas para a abordagem diagnóstica e terapêutica da doença aterosclerótica, além de ter aproveitado para defender avidamente o papel da comunidade médica na prevenção da mortalidade cardiovascular. “Nós, devendo diminuir a obesidade nos jovens, lutar contra as bebidas com açúcar nas escolas e contra o tabagismo, aumentar a atividade física e reduzir a poluição.” Leia a entrevista nas páginas a seguir. ISM/SCIENCE PHOTO LIBRARY/LATINSTOCK médicos, temos responsabilidade social, Contra as doenças cardiovasculares, conhecimento e responsabilidade social Estudioso do conceito da inflamação no desenvolvimento e na complicação da placa aterosclerótica, o cardiologista norte-americano Peter Libby revela suas descobertas e defende uma maior participação dos médicos na prevenção da mortalidade cardiovascular Angiograma mostra estenose em ramo anterior descendente da artéria coronária esquerda. Mesmo nos pacientes que usam estatinas em altas doses, eventos recorrentes nos infartados podem ser observados em 20% dos casos, no prazo de dois anos. Segundo estudos observacionais, o MTX em doses utilizadas para o tratamento da artrite reumatoide é capaz de diminuir a taxa de eventos cardiovasculares que ocorrem mesmo nos indivíduos que estão sendo tratados para a doença aterosclerótica. Um novo estudo prospectivo, que está sendo realizado pelo professor Paul Ridker, vai tratar os sobreviventes do infarto com essa medicação, com o intuito de reduzir a inflamação diretamente. Peter Libby é chefe do Serviço de Medicina Cardiovascular do Brigham and Women’s Hospital e professor da Harvard Medical School Que outras perspectivas se mostram para o tratamento da aterosclerose? Que descobertas dentro desse campo mais vêm contribuindo para o desenvolvimento de novas tecnologias voltadas ao diagnóstico e ao tratamento da doença aterosclerótica? Trabalhamos atualmente num outro estudo, o Cantos (sigla do inglês Canakinumab Anti-inflammatory Thrombosis Outcomes Study), com o apoio dos colegas brasileiros, o qual usa um anticorpo monoclonal para neutralizar a interleucina-1-beta, que é importante na sinalização inflamatória da placa aterosclerótica. Estamos estudando 17.200 sobreviventes de IAM, tratados com toda a medicação indicada, com PCR de alta sensibilidade acima de 2 mg/dL, e lhes damos três doses desse anticorpo, enquanto um grupo controle recebe placebo. Esperamos ter uma resposta entre quatro e cinco anos. Esses estudos clínicos vêm avaliando novas terapias para diminuir a taxa de eventos residuais. Não é para substituir a terapêutica atual, mas, sim, para agregar. Essa doença possui um grande período de evolução subclínica, podendo durar 20-40 anos, o que nos faz questionar o motivo de ela se transformar subitamente de uma afecção silenciosa em um evento agudo, como o infarto agudo do miocárdio (IAM) ou o acidente vascular cerebral (AVC). O fato é que estamos, no cotidiano, familiarizados com esse mal e perdemos de vista o motivo que causa a manifestação dramática na camada íntima da artéria. Sabemos que a aterosclerose começa nos adolescentes, visto que os fatores de risco estão aumentando em todos os países. Mas a aterogênese apresenta três fases, ou seja, início, progressão e complicação. Nossos estudos indicam que, em algum momento da progressão, ocorre uma degradação do colágeno que forma a capa fibrosa da placa ateromatosa, enfraquecendo-a e deixando-a passível à ação dos fatores de coagulação. Essa degradação é provocada pelo fator tissular, produzido nos macrófagos, que tem seus níveis aumentados na camada íntima das artérias pela ação dos mediadores inflamatórios. 20 ARQUIVO PESSOAL O senhor participa de um estudo baseado no uso do metotrexato (MTX) em baixa dose para reduzir eventos cardiovasculares em indivíduos com doença coronariana estabelecida. Se os resultados forem positivos, representarão a quebra de um paradigma no tratamento da doença cardiovascular. Quais são suas expectativas em relação a essa pesquisa? “O modelo clássico da relação entre médico e paciente não é suficiente para reduzir os fatores de risco cardiovascular. Nós, médicos, temos responsabilidade social, devendo diminuir a obesidade nos jovens, lutar contra as bebidas com açúcar nas escolas e contra o tabagismo, aumentar a atividade física e reduzir a poluição. A prevenção é necessária.“ Qual é sua opinião sobre a disseminação do uso das estatinas? Acha que deveriam se tornar over the counter (OTC), dado o benefício dessas drogas na redução do risco cardiovascular? Não acho que as estatinas devam ser colocadas na água de cada cidade porque os estudos mostram que, na prevenção primária, envolvendo pacientes sem doença cardíaca, com LDL abaixo de 130 mg/dL e sem sinais de inflamação (PCR de alta sensibilidade abaixo de 0,5 mg/dL), o tratamento com estatinas não adianta, não previne. O screening precisa ser feito por meio de um escore de risco que leve em conta a história familiar e a presença de marcadores da inflamação para indicação do uso ou não dessas medicações. Ademais, no estudo Jupiter (sigla de Justification for the Use of Statins in Primary Prevention: an International Trial Evaluating Rosuvastatin), observamos um discreto aumento da glicemia em pessoas tratadas com essa classe de medicamentos, o que foi confirmado em outras pesquisas. Tais resultados sugeriram que estatinas poderiam provocar diabetes mellitus (DM), o que levou muitos médicos a temer a prescrição desse tratamento. Contudo, constatamos, no mesmo estudo, que a glicemia se elevou apenas nos indivíduos que já tinham predisposição à doença. Os participantes sem fatores de risco para diabetes não o desenvolveram. Nessa análise, nosso achado mais importante foi que a queda nos eventos cardíacos foi igual em diabéticos e não diabéticos. Minha interpretação desses resultados é a de que nós não devemos contraindicar o tratamento com as estatinas por medo do diabetes. Pelo contrário: acho que os diabéticos merecem uma consideração especial para a terapêutica com estatinas pelo seu maior risco de desenvolver doença cardiovascular. A despeito de todos esses estudos e avanços que já conhecemos, a doença aterosclerótica continua sendo a que mais mata no mundo. O que falta para reduzirmos mais drasticamente a mortalidade cardiovascular no mundo? Primordialmente, precisamos mudar o estilo de vida e trabalhar com o público e com o governo para reduzir os fatores de risco. O modelo clássico da relação entre médico e paciente não é suficiente. Nós, médicos, temos responsabilidade social, devendo diminuir a obesidade nos jovens, lutar contra as bebidas com açúcar nas escolas e contra o tabagismo, aumentar a atividade física e reduzir a poluição. A prevenção é necessária. Uma vez que o paciente seja diagnosticado com aterosclerose, já será tarde. No Brasil, bem como nos Estados Unidos, muitos indivíduos não recebem tratamento para a dislipidemia e para a hipertensão arterial sistêmica. Portanto, o papel do médico é vital no sentido de assegurar que cada pessoa seja tratada de acordo com as diretrizes atuais. Entrevista concedida à Dra. Barbara Gonçalves da Silva, consultora médica do Fleury SCIENCE PHOTO LIBRARY relatório integrado Cromossomo Philadelphia Leucemia mieloide crônica Testes moleculares são decisivos para acompanhar o tratamento da doença e, sobretudo, para identificar precocemente falhas terapêuticas e perdas de resposta O CASO Paciente do sexo feminino, 57 anos, comerciante, foi encaminhada ao hematologista por apresentar, na avaliação ginecológica de rotina, aumento do baço e leucocitose (102.000 leucócitos/mm3) com desvio à esquerda no hemograma. Ao exame físico, tinha apenas baço palpável a 5 cm do rebordo costal esquerdo, sem outras anormalidades. Para a confirmação da provável leucemia mieloide crônica (LMC), o hematologista solicitou mielograma, biópsia de medula óssea, cariótipo e pesquisa do rearranjo BCR-ABL1 por Rq-PCR. O mielograma demonstrou medula hipercelular, com relação G:E de 20:1. A série eritrocítica estava hipoplásica, com maturação preservada, e a granulocítica, intensamente hiperplasiada, com predomínio de células maduras, além de discreta eosinofilia e basofilia. Havia hipoplasia da série lin- fomonoplasmocitária e alguns elementos hipolobulados na série megacariocítica. A biópsia da medula ratificou a intensa hipercelularidade à custa da série granulocítica e apontou proliferação reticulínica grau 1 do estroma, compatível com LMC. O resultado do cariótipo com bandas G no aspirado da medula, por sua vez, foi 46,XX,t(9;22)(q34;q11.2)[20], tendo demonstrado, assim, o cromossomo Philadelphia (Ph), derivado da translocação equilibrada entre os cromossomos 9 e 22, que confirma o diagnóstico de LMC. Para completar, a pesquisa do rearranjo BCR-ABL1 demonstrou informações importantes para a monitoração terapêutica, como o transcrito tipo e13a2 e uma relação BCR-ABL1/ABL1 igual a 2,9. 22 POR DENTRO DA LMC O tratamento começou com mesilato de imatinibe (MI)(veja boxe), após a redução da leucocitose com hidroxiureia por 40 dias, e a paciente recebeu estreito seguimento laboratorial para a avaliação da resposta imediata e posterior. Nesse contexto, os métodos moleculares tiveram participação fundamental na identificação de perda de resposta no segundo ano de acompanhamento. A DISCUSSÃO Seguimento laboratorial do tratamento A maioria dos pacientes com LMC responde de forma excelente ao MI, mas alguns indivíduos têm resistência primária ou secundária a essa medicação. Por isso mesmo, todos devem ser avaliados dos pontos de vista hematológico, citogenético e molecular, numa periodicidade que varia conforme a resposta apresentada inicialmente. O hemograma é necessário a cada 15 dias até que seja atingida a resposta hematológica completa (RHC) e, a seguir, a cada três meses. Já o cariótipo da medula óssea entra em cena depois de três e seis meses, a partir do início do tratamento, e semestralmente, até que se obtenha a resposta citogenética completa (RCC), quando pode se tornar anual. Contudo, evidências de que o paciente deixou de responder ao medicamento ou mesmo a presença de anemia, leucopenia ou trombocitopenia inexplicadas justificam a solicitação desse exame a qualquer momento do seguimento. Na avaliação medular com três meses, podese utilizar a hibridação in situ por fluorescência (FISH), com análise de 200 interfases por meio de sonda de dupla fusão, também indicada quando o cariótipo não é possível, já que pode ser realizada em sangue periférico. Uma vez constatada a RCC, há necessidade de efetuar o monitoramento quantitativo dos transcritos de BCR-ABL1 por Rq-PCR trimestralmente, até a remissão molecular maior (RMM), e semestralmente, a partir de então. A LMC é uma neoplasia hematológica clonal, proveniente de uma célula progenitora multipotente. Representa 15% das leucemias de adultos e incide preferencialmente na quinta década de vida, ainda que, no Brasil, a mediana de idade dos acometidos seja menor. A doença evolui em duas ou três fases clínicas. A inicial, ou fase crônica, caracteriza-se por sintomas causados pela anemia e por esplenomegalia. O hemograma demonstra leucocitose com importante desvio à esquerda. Basofilia, eosinofilia e trombocitose podem estar presentes. Se não tratada, em quatro anos, em média, a LMC progride para a crise blástica, com ou sem manifestações de uma fase acelerada. Nesses estágios, as células não se diferenciam, há predomínio de blastos linfoides ou mieloides e os pacientes, em geral, são sintomáticos, com febre, dor óssea, sangramento e sudorese. Fisiopatologia A LMC deriva de uma translocação entre os cromossomos 9 e 22 – t(9;22)(q34;q11.2) –, uma anormalidade adquirida que justapõe os genes BCR e ABL1. Na maioria dos casos, o gene de fusão BCR-ABL1 resulta na justaposição dos éxons 13 (e13) ou 14 (e14) do gene BCR ao segundo éxon do gene ABL1 (a2), originando os transcritos e13a2 e e14a2, respectivamente. Seus produtos de RNA mensageiro codificam uma proteína quimérica de 210 kDa (p210BCR-ABL ou major-BCR), a mais comum nessa doença. Entretanto, em uma pequena parcela dos pacientes, a quebra ocorre em regiões distintas do gene BCR, dando origem a proteínas com fragmento maior (p230BCR-ABL) ou menor (p190BCR-ABL) do BCR do que o habitual, embora mantenham o mesmo tamanho de fragmento do ABL. Essas proteínas partilham a propriedade de induzir constitutivamente as vias de sinalização intracelular dependentes de tirosinoquinase. Por outro lado, diferenças sutis em seu efeito biológico podem ser cruciais no fenótipo da LMC. Assim, quanto menor a porção do BCR envolvida no rearranjo, maior a agressividade da doença, de modo que a p190BCR-ABL é comum na leucemia aguda e a p230BCR-ABL relaciona-se a formas mais indolentes de LMC. Tratamento de escolha Uma vez desvendadas as bases genéticas da LMC relacionadas à elevada atividade de tirosinoquinase do gene BCR-ABL1, ficou demonstrado o alvo terapêutico, visto que o rearranjo é a lesão única e o evento patogênico, crítico. Essa descoberta levou à era da terapia molecular alvo-específica, inaugurada pelo mesilato de imatinibe, droga antitirosinoquinase (ATK) liberada para uso em 2001, que se tornou a primeira opção terapêutica para a fase crônica da LMC. Seu lançamento mudou a história da doença, com benefício para o aumento de sobrevida. Estão disponíveis, atualmente, medicamentos ATK de segunda geração, como dasatinibe e nilotinibe, que são ativos contra várias mutações resistentes ao MI e até têm evidência de superioridade como primeira opção terapêutica, conforme alguns trabalhos recentes. Tipos de resposta hematológica, citogenética e molecular na LMC tratada Hematológica Completa (RHC) Normalização do hemograma, com leucometria <10.000/mm3 e plaquetas <450.000/ mm3; ausência de células imaturas, mielócitos, promielócitos ou blastos no sangue periférico, bem como de sinais e sintomas da doença, com desaparecimento do baço palpável Parcial Presença dos critérios de resposta descritos acima, porém com células imaturas no sangue periférico e/ou plaquetas >450.000/mm3, mas em número 50% menor que o anterior ao diagnóstico, e/ou persistência de esplenomegalia, mas 50% menor que ao diagnóstico Citogenética Completa (RCC) Ausência de metáfases Ph+ Parcial (RCP) De 1% a 35% de metáfases Ph+ Menor De 36% a 65% de metáfases Ph+ Mínima De 66% a 95% de metáfases Ph+ Ausente >95% de metáfases Ph+ Molecular Completa (RMC) Ausência de transcritos BCR-ABL1 Maior (RMM) Redução do RNAm BCR-ABL1 >3 log (0,1% do inicial)* Mínima Redução do RNAm BCR-ABL1 em 1 a 2 log (de 1% até 10% do inicial)* Perda Aumento do RNAm BCR-ABL1 em 0,5 log (confirmado por análise subsequente) *De acordo com a escala internacional Na avaliação de três meses, a paciente já apresentava exame físico normal e resposta hematológica completa, tendo sido mantido o tratamento. No retorno após um semestre, ela estava bem, sem alterações ao exame físico e com hemograma normal, exceto pelo VCM aumentado (secundário ao uso da medicação). Mas o cariótipo evidenciou 46,XX,t(9;22) (q34;q11.2)[2]/46,XX[18], o que configurou RCP, razão pela qual o hematologista prosseguiu com a conduta. Aos 12 meses de tratamento com MI, o exame físico e o hemograma mantinham-se inalterados e o novo cariótipo apontou ausência do Ph nas 20 metáfases analisadas, tendo indicado RCC. A relação BCR-ABL1/ABL1, determinada por Rq-PCR, ficou em 0,9 nesse momento e caiu para 0,05 aos 18 meses, o que representou RMM. Dessa forma, sua resposta terapêutica foi classificada como ótima. 24 SCIENCE PHOTO LIBRARY Classificação da resposta Como o paciente pode responder ao tratamento da LMC Resposta Tempo ÓTIMA SUBÓTIMA FALHA TERAPÊUTICA 3 meses RHC e pelo menos RC menor (<65% Ph+) Sem RC (>95% Ph+) Sem RHC 6 meses Pelo menos RC parcial (≤35% Ph+) RC menor que parcial (>35% Ph+) Sem RC (>95% Ph+) 12 meses RCC (0 Ph+) RCP (de 1% a 35% Ph+) RC menor que parcial (>35% Ph+) 18 meses RMM Menos que RMM Sem RCC A qualquer momento RM estável ou em melhora Perda da RM, mutações com sensibilidade mantida ao MI Perda de RHC e RCC, mutações com sensibilidade prejudicada ao MI, alterações clonais/Ph+ Fonte: European LeukemiaNet O que fazer diante de mutação Apesar do sucesso inicial do tratamento, a monitoração se- no domínio da tirosinoquinase Manejo da falha terapêutica quencial do BCR-ABL1 demonstrou, um ano depois, elevação da relação BCR-ABL1/ABL1 para 0,15 e, portanto, perda da resposta molecular. Essa situação constitui uma indicação de realização do sequenciamento do gene BCR-ABL1, a fim de detectar possíveis mutações no domínio da tirosinoquinase que justifiquem resistência aos inibidores da enzima. Em geral, a resposta subótima e a falha terapêutica em três a seis meses correlacionam-se à resistência primária decorrente da concentração plasmática inadequada ou da concentração intracelular baixa de MI em pacientes portadores do gene MDR. Diante disso, uma alternativa para suplantar esse tipo de resistência é escalonar a dose do medicamento. Por outro lado, podem ocorrer perdas de resposta decorrentes de resistência secundária, cujos mecanismos mais comuns incluem o surgimento de mutação no domínio da tirosinoquinase do BCR-ABL1, a amplificação desse transcrito, com aumento de sua expressão, e a evolução clonal, com ativação de vias de transformação adicionais. Há várias condutas para contornar essa situação, como a elevação da dose de MI ou sua substituição por outra droga ATK ou, ainda, o transplante de células-tronco hematopoéticas (TCH). Diversas mutações no BCR-ABL1 foram descritas e as que conferem resistência considerada leve às drogas ATK – como M244V, M351T e F359V – podem ser suplantadas com uma dose maior de MI. As mutações 315I, E255K/V ou H396P/R, por sua vez, induzem alta resistência a todos os inibidores ATK disponíveis, tornando o TCH uma opção para tais pacientes. ASSESSORIA MÉDICA Dra. Maria de Lourdes Chauffaille [email protected] MUTAÇÃO RECOMENDAÇÃO T315I TCH V299L, T315A, F317L/V/I/C Nilotinibe Y253H, E255K/V, F359V/C/I Dasatinibe Qualquer outra Alta dose de MI, dasatinibe ou nilotinibe No caso aqui discutido, detectou-se uma mutação no gene BCR-ABL1, que se mostrou responsiva a inibidores de tirosinoquinase de segunda geração. O fato é que, após seis meses de uso do novo medicamento, a paciente entrou em segunda remissão molecular, mantendo-se clinicamente bem até o momento. CONCLUSÃO Os recursos moleculares, aliados aos exames clássicos que empregam a citomorfologia e a citogenética por banda G para a definição da conduta nos casos de LMC, são essenciais para o tratamento desses pacientes, não apenas por terem propiciado o desenvolvimento da estratégia terapêutica alvo-específica, mas também por integrarem os critérios de classificação da resposta. Possibilitam igualmente acompanhar a remissão da doença, já que detectam, de forma precoce, possíveis falhas terapêuticas ou perdas da resposta e oferecem informações preciosas ao planejamento da intervenção, muitas vezes propiciando a segunda remissão. assessoria médica responde IgM positiva para toxoplasmose antes da gestação Uma paciente me consultou para conhecer seu estado de saúde, a fim de planejar uma gravidez nas melhores condições possíveis. Pedi os exames de rotina e não tivemos surpresas, a não ser os resultados de uma sorologia para toxoplasmose, cujos títulos para anticorpos da classe IgM vieram positivos. Em quanto tempo vocês estimam que esse exame deva se negativar para a paciente começar a tentar a gravidez? AP Martins, Recife - PE Devido à alta sensibilidade dos atuais métodos de pesquisa de IgM, é possível detectar, no plasma, baixas concentrações de anticorpos dessa classe por mais de um ano, o que, para uma futura gestante, pode configurar motivo de preocupação. Nesse momento, entra a contribuição dos testes de avidez de IgG, uma vez que servem para confirmar se, diante de um resultado positivo de IgM, a infecção materna é recente ou não. Isso porque, com o passar do tempo, os anticorpos IgG produzidos pelo sistema imunológico apresentam avidez cada vez mais alta e, consequentemente, quanto maior a avidez, maior o tempo transcorrido desde a infecção inicial e menor o risco de transmissão para o feto. Na suspeita de toxoplasmose, e mesmo de rubéola e citomegalovirose, nas quais pode haver impacto para a saúde fetal, índices baixos de avidez de IgG, ou seja, menores que 30%, sugerem doença aguda ou recente, iniciada há menos de três meses. Já valores maiores que 60% sinalizam infecção pregressa, ocorrida há mais de três meses, com pequeno ou nenhum risco para o feto. Entretanto, porcentagens intermediárias, entre 30% e 60%, não possibilitam a definição do provável período do processo infeccioso. Claro que esse marcador é indireto e existem variações individuais consideráveis, razão pela qual todos os dados têm de ser avaliados em conjunto, podendo até ser recomendável repetir os testes de avidez para observar sua dinâmica e tomar decisões mais bem fundamentadas. No caso apresentado, a simples presença da IgM para toxoplasmose não deve ser interpretada de forma isolada para planejar a gravidez adequadamente. Convém avaliar o nível de IgG, realizar o teste de avidez e, eventualmente, repeti-lo até que o conjunto de resultados permita conclusões mais consistentes e seguras para o planejamento e o desenvolvimento da gestação. Dr. Celso Granato, assessor médico em Infectologia [email protected] MANDE TAMBÉM A SUA DÚVIDA SOBRE DIAGNÓSTICO E INTERPRETAÇÃO DE EXAMES PARA: [email protected] 26 Reprodução computadorizada de uma molécula de imunoglobulina (Ig) atacando uma célula infectada. SCIENCE PHOTO LIBRARY doenças raras Microscopia óptica do timo humano mostra vasos sanguíneos cercados pela cápsula fibrosa e a medula com corpúsculo de Hassal. SCIENCE PHOTO LIBRARY Síndrome poliglandular autoimune tipo 1 Também conhecida como poliendocrinopatia autoimune candidíase-distrofia ectodérmica (Apeced), a síndrome poliglandular autoimune tipo 1 (APS1) é uma doença autossômica recessiva rara, causada por mutações no gene regulador autoimune (AIRE1), que está localizado no cromossomo 21q22.3 e é expresso nas células do timo. O AIRE1 desempenha papel único no desenvolvimento da tolerância imunológica, atuando na seleção negativa de linfócitos T autorreativos. A perda dessa função, portanto, favorece o desenvolvimento de autoimunidade. As primeiras manifestações dessa síndrome são, geralmente, a candidíase mucocutânea crônica e o hipoparatiroidismo, que aparecem antes dos 20 anos. Existe a possibilidade de ocorrerem também outras manifestações autoimunes, sobretudo em órgãos endócrinos, como a adrenal, as gônadas, as células betapancreáticas e as células parietais gástricas. Em menor proporção, pode haver processo autoimune de órgãos e tecidos não endócrinos (veja tabela). O quadro clínico é frequentemente associado com sintomas ectodérmicos, a exemplo de distrofia de unhas e dentes. Diante dessa suspeita, é possível fazer o diagnóstico da APS1 por meio de um teste genético, incorporado à rotina do Fleury desde fevereiro de 2013. O exame faz o sequenciamento completo do gene AIRE1, incluindo a região codificadora e as junções éxon-íntron, tendo seu resultado acompanhado por um relatório interpretativo. PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES AUTOIMUNES DA APS1: Hipoparatiroidismo Insuficiência adrenal Hipogonadismo primário Alopecia Diabetes tipo 1 Ceratite Hepatite autoimune Vitiligo Gastrite autoimune Má-absorção Asplenia ou hipoesplenia Hipotiroidismo 85% 70% 60% 40% 20% 20% 15% 15% 30% 10% 20% 6% ASSESSORIA MÉDICA Imunologia Dr. Luis Eduardo Coelho Andrade [email protected] Endocrinologia Dra. Maria Izabel Chiamolera [email protected] atualização O que esperar das vacinas contra o HPV? Especialista fala, em evento virtual, da segurança dos imunizantes e da proteção duradoura que eles proporcionam contra as doenças causadas pelo vírus Dentro de seu programa de webmeetings para médicos, o Fleury promoveu uma aula interativa sobre as vacinas contra a infecção pelo papilomavírus humano, o HPV, uma das doenças sexualmente transmissíveis mais diagnosticadas nos Estados Unidos. A iniciativa teve, como palestrante, a pesquisadora Luisa Lina Villa, do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia das Doenças do Papilomavírus Humano, e, como moderador, o assessor médico do Fleury na área de Infectologia, Celso Granato. Confira, a seguir, os principais highlights desse encontro virtual e não deixe de assistir à aula completa em www.aulasfleury.webmeeting.com.br. Segurança A vacina não é feita com vírus vivo nem atenuado e não contém o DNA viral, mas, sim, partículas recombinantes, semelhantes ao HPV, o que lhe confere substancial segurança, já que as pessoas não recebem nenhum fragmento de um agente potencialmente oncogênico. Existem, por enquanto, duas versões do produto, uma bivalente, contra os tipos 16 e 18 do HPV, de alto risco para câncer, e outra quadrivalente, que inclui também os tipos 6 e 11, relacionados com verrugas genitais. Imunogenicidade O esquema vacinal exige a aplicação de três doses via intramuscular, após o qual são gerados, nos pacientes, elevados níveis de anticorpos capazes de neutralizar partículas virais antes que atinjam as camadas basais da mucosa e infectem esses tecidos. A proteção oferecida tanto pelo produto bivalente quanto pelo quadrivalente é mantida por, pelo menos, nove anos, período em que o imunizante reduz em 70% o risco de infecções e doenças causadas pelo HPV em mulheres e homens. Indicações consensuais Dezenas de países já adotaram a vacinação em seus planos nacionais de imunização, embora as recomendações de implementação dessa estratégia preventiva possam variar em diferentes locais do mundo. De qualquer modo, há consenso de que é necessário vacinar meninas e adolescentes de 9 a 14 anos antes do início da atividade sexual. Já está demonstrado, da mesma forma, que existe benefício em imunizar mulheres de 26 a 45 anos, bem como homens de 9 a 26 anos. Por último, estudos igualmente provaram a segurança e a efetividade de prevenir novas infecções com o imunizante em pacientes com exposição prévia ao HPV e mesmo na vigência de anormalidades citológicas. ASSESSORIA MÉDICA Vacinas Dr. Jessé Reis Alves [email protected] Infectologia Dr. Celso Granato [email protected] 28 SCIENCE PHOTO LIBRARY Perspectivas As vacinas contra o HPV são exclusivamente profiláticas, razão pela qual não se esperam, de tais produtos, benefícios terapêuticos. As pesquisas seguem, portanto, a linha de prevenção. Tanto é assim que atualmente se encontra em desenvolvimento um imunizante nonavalente, que oferecerá cobertura contra sete tipos de HPV de alto risco oncogênico, além dos dois de baixo risco já presentes na quadrivalente. Estima-se que esse produto poderá prevenir cerca de 90% dos cânceres de colo do útero. Microscopia eletrônica de transmissão evidencia um grupo de HPV com sua forma icosaédrica. pesquisa fleury Algoritmo para a detecção de anticorpos anti-ENA garante agilidade sem prejuízo da especificidade Depois de realizar uma pesquisa que comparou a performance diagnóstica do método imunoenzimático (Elisa) e da imunodifusão dupla (IDD) para detectar anticorpos contra antígenos extraíveis do núcleo (anti-ENA), a equipe de Imunologia do Fleury constatou que o Elisa é a metodologia mais rápida e precisa para identificar os casos negativos, enquanto à IDD, altamente específica, cabe a confirmação dos positivos. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores confrontaram a IDD com diferentes kits comerciais de Elisa em amostras de 144 pacientes que preenchiam critérios para doença reumática autoimune e de 121 indivíduos hígidos. Além disso, testaram um algoritmo que combina os dois métodos numa rotina de grande volume de amostras. O Elisa foi mais sensível para todos os anti-ENA (antiSm, anti-Scl-70, anti-Jo1, anti-RNP, anti-SS-A/Ro e anti-SS-B/La), embora tenha apresentado menores valores preditivos positivos que a IDD. A estratégia de associar a triagem de anti-ENA por Elisa à identificação dos autoanticorpos por IDD mostrou-se bastante acertada, uma vez que, das quase 16,5 mil amostras testadas, 80% foram negativas e liberadas em menos de 24 horas, já que o ensaio imunoenzimático é feito em estação de trabalho automatizada, e 18% foram positivas e, portanto, submetidas à IDD. “Diante desses resultados, implantamos esse algoritmo na rotina do nosso Setor de Imunoensaios, o que vem garantindo agilidade na investigação, sem prejuízo da especificidade do resultado”, assinala o assessor médico do Fleury em Imunologia e Reumatologia, Luis Eduardo Coelho Andrade. SCIENCE PHOTO LIBRARY Autores: Pereira, KMC; Dellavance, A; Andrade, LEC. Execução da pesquisa de anti-ENA por meio do método imunoenzimático. 30 Mesmo vivendo em áreas subtropicais, muitos brasileiros têm níveis inadequados de vitamina D Já é sabido pelos especialistas que, deA dosagem de 25(OH)D foi feita por Outros estudos desenvolvidos na vido à redução da exposição solar pelo cromatografia líquida acoplada à es- cidade de São Paulo já haviam demaior uso de protetores solares e pelo pectrometria de massas em tandem, monstrado que a hipovitaminose D é próprio estilo de vida nos grandes cen- tendo adotado, como critérios diag- altamente frequente tanto em idosos tros urbanos, a prevalência de hipovi- nósticos, níveis acima de 30 ng/dL como quanto em indivíduos jovens. “Nossa taminose D vem aumentando. Mas de suficiência da vitamina D, entre 20 e 29 pesquisa também conclui que, mesmo quantos indivíduos estamos falando? ng/dL como insuficiência e abaixo de 20 com radiação solar adequada ao longo Pois bem, num estudo realizado pela ng/dL como deficiência. Os resultados de todo o ano, o Brasil tem uma alta preequipe de Endocrinologia do Fleury, a apontaram que exatamente 59% das valência de níveis inadequados de vitafrequência de níveis inadequados de dosagens encontravam-se entre 10 e mina D, além de destacar o fenômeno 25-hidroxivitamina D (25(OH)D) chegou 30 ng/mL e, mais ainda, mostraram-se de sazonalidade, geralmente encona quase 60% em um grande contingente sazonais, ou seja, durante a primavera trado em países de latitudes maiores”, de pessoas, a maioria dos Estados de foram, em média, 27% inferiores aos destaca a endocrinologista Cynthia M. São Paulo e Rio de Janeiro. Os pesqui- obtidos no outono. A. Brandão, assessora médica do Fleury sadores analisaram nada menos que na área de Endocrinologia. 59.812 amostras de pacientes de 18 a 70 anos de idade, obtidas entre janeiro de 2011 e julho de 2012. Autores: Dinhane, SRM; Brandão, CMA; Nakamura, OH; Bezerra, MGT; Sá, J; Carvalho, VM; Vieira, JGH; Biscolla, RPM. Estudo valida teste molecular para detectar M. tuberculosis e cepas resistentes à rifampicina em plataforma automatizada Há pouco mais de dois anos o Fleury M. tuberculosis resistente ao antimicroEm relação à susceptibilidade à rivem utilizando o GeneXpert®, a pri- biano, para determinar a sensibilidade fampicina, o GeneXpert concordou com meira plataforma baseada em PCR do teste, além de outros agentes para o método da macrodiluição automatiem tempo real completamente auto- estabelecer sua especificidade. Foram zada (Bactec 960) em 100% dos casos, matizada e integrada. Essa tecnologia ainda analisadas amostras do Colégio corroborando, inclusive, os achados do tem permitido esclarecer, no contexto Americano de Patologistas. maior estudo multicêntrico já publicado hospitalar, suspeitas de colite por ClosOs resultados do GeneXpert coincidi- sobre o assunto (Boehme et. al., 2010). tridium difficile, bem como a etiologia ram com os das culturas, exceto em uma “Em vista desses resultados, o método de meningites por enterovírus em ape- amostra de escarro que, embora tenha é potencialmente de grande utilidade nas duas horas. Ampliando o uso dessa sido positiva na cultura, mostrou-se ne- para o diagnóstico de tuberculose tanto plataforma, a equipe de Pesquisa e De- gativa pelo kit Xpert MTB. “Uma vez que em ambiente hospitalar quanto na saúde senvolvimento do Fleury realizou, no tal amostra apresentou baciloscopia ne- pública”, arremata Sampaio. ano passado, um estudo para validar gativa, é provável que o resultado negao teste para a detecção do Mycobacte- tivo do teste molecular tenha se devido rium tuberculosis e de sua resistência à à carga bacteriana inferior ao limite de rifampicina. Na oportunidade, os pes- detecção do método, de 350 bacilos/mL”, Autores: Miyashiro, K; Marques, quisadores usaram cepas ATCC de M. explica o assessor médico em Microbiotuberculosis e M. bovis, assim como de logia do Fleury, Jorge Luiz Mello Sampaio. RMFR; Zamarrenho, DF; Sampaio, JLM. roteiro diagnóstico Como investigar um caso de tosse crônica? O quadro pode ter etiologia infecciosa, alérgica e até gástrica, requerendo uma anamnese criteriosa e exames indicados de acordo com cada contexto História e exame físico Não tabagista Não usuário de IECA Não tabagista Usuário de IECA Persistência da tosse Parar com inibidor de ECA Normal ou inalterado Evitar irritantes ambientais Melhora Anormal Melhora da tosse Outras avaliações devem ser consideradas: Persistência - TC tórax - Broncoscopia - Avaliação cardiovascular - Exame de escarro - pH-metria de 24h Persistência do quadro de tosse após o tratamento Avaliar: - Rinorreia posterior (tratamento/ TC seios paranasais/nasoendoscopia) - Asma posterior (broncoprovocação/ PFP pré e pós-BD) Todos os exames normais: rever história e exame físico - RGE (pH-metria/endoscopia) Considerar tosse pós-infecciosa Melhora com o tratamento específico Tosse crônica idiopática Considerar tosse psicogênica Diagnóstico final específico de acordo com o tratamento (padrão-ouro) ASSESSORIA MÉDICA Dra. Márcia Jacomelli [email protected] 32 ARQUIVO FLEURY RX tórax e de seios paranasais dê o diagnóstico Resposta do caso de dispneia súbita Angiotomografia de tórax As imagens de angiotomografia pulmonar apontam falhas de enchimento nos ramos arteriais pulmonares para os lobos inferiores (setas), que são compatíveis com tromboembolismo pulmonar (TEP) agudo. O indivíduo com DPOC pode apresentar exacerbação por causas infecciosas, de origem viral ou bacteriana, ou não infecciosas, a exemplo de pneumotórax, TEP, arritmias e câncer de pulmão, entre outras. A paciente do caso em discussão possuía alto risco para TEP por conta da história de neoplasia abdominal e de cirurgia de grande porte recente, do antecedente de HAS, obesidade e DPOC e da taquicardia. O D-dímero fica aumentado no tromboembolismo, embora a inflamação também cause essa elevação, assim como o próprio procedimento cirúrgico. A angiotomografia com aparelhos multidetectores é o método de imagem de escolha na suspeita de TEP, com sensibilidade de 83% e especificidade de 96%. O ecocardiograma pode auxiliar a investigação, mas está mais indicado para a avaliação prognóstica, da mesma forma que o BNP e a troponina. Portanto, o diagnóstico correto do caso é exacerbação da DPOC por TEP. ASSESSORIA MÉDICA Dra. Viviane Baptista Antunes [email protected] outros olhos Ledo engano! A técnica de micrografia eletrônica flagrou uma Giardia lamblia em mitose durante o último estágio da divisão celular. Para o hospedeiro, é o começo de uma doença que vai lhe causar dores abdominais, náusea e diarreia. Contudo, mais fácil de curar, quando corretamente diagnosticada, do que um coração partido... 34 SCIENCE PHOTO LIBRARY Coração apaixonado? Médicos graduados nas melhores universidades, exames que ninguém mais faz e sempre um sorriso pra receber você. É assim que nos tornamos especialistas na ciência da Fleury. Um centro de referência em você. Use seu leitor de QR Code e assista a uma animação surpreendente sobre a história do Fleury. Ou acesse www.youtube.com/fleurymedicinaesaude www.fleury.com.br FleuryMedicinaeSaude fleury_online Dr. Celso Francisco Hernandes Granato – Responsável Técnico – CRM-SP 34.307 36 www.fleury.com.br