Joana Maria Gouveia Franco Duarte - PUC-SP

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Joana Maria Gouveia Franco Duarte
DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL NO ÂMBITO DO
SUAS: uma contribuição ao debate
Mestrado em Serviço Social
SÃO PAULO
2012
2
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Joana Maria Gouveia Franco Duarte
DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL NO ÂMBITO DO
SUAS: uma contribuição ao debate
Mestrado em Serviço Social
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre
em Serviço Social sob a orientação da
Profª. Dra. Maria Lúcia Martinelli
SÃO PAULO
2012
3
Banca Examinadora
___________________________
___________________________
___________________________
4
A Ziza (in memorian) que me garantiu a
maior das proteções: o afeto.
Ao meu filho Arthur,
a quem afeto nunca faltará.
5
AGRADECIMENTOS
Nomear é sempre uma tarefa arriscada, pois podemos cair na armadinha de
abreviar a importância de alguém. Por outro lado, na mesma medida, não enaltecer
a minha profunda gratidão aos citados seria deixar de ressaltar sujeitos
fundamentais na minha história e nesse processo do mestrado.
Ao meu companheiro Rogério, meu amor, que compartilha comigo as dores e
delícias do cotidiano de um casal que traz em sua história muita luta para ficar
juntos. Obrigada por me incentivar a escrever desde sempre, pela atenção às
minhas elaborações e angústias deste processo nos momentos mais inapropriados,
pela solidariedade em abdicar da minha companhia, e mesmo sofrendo com a minha
ausência, não deixou de me apoiar neste projeto. Você esteve de mãos dadas
comigo em todo o trajeto para que eu chegasse ao final desta etapa que é muito
mais que um título para mim. Esse momento é nosso.
À professora doutora Maria Lucia Martinelli pela acolhida, o conhecimento, o rigor
teórico, a disponibilidade e pelo amparo respeitoso e atencioso aos meus anseios
acadêmicos, me conduzindo de forma tão generosa e afetiva no meio de um clarão
de idéias. Martinelli mostra na prática o que é viver em uma sociedade sob a égide
do respeito e da igualdade e por quem eu passei a nutrir um profundo respeito e
admiração.
À minha família, com seus contornos contemporâneos, que me ensinou na prática
que os laços de afeto valem muito mais do que os de sangue. Em particular, ao meu
pai, Ivone, Glô, Gui, Bruno e Rodriguinho.
Aos meus avós, Tereza e Nenê, que vibram comigo a cada conquista.
Aos meus padrinhos tão amados, Marcia e Paulo, por botar força nessa coisa, como
diz Chico Buarque. E ao Gabi que mesmo de longe, me deu uma super força.
A todos os meus amigos, e aos sempre próximos: Lolô, Carina, Giselle, Italo,
Silvana, Rachel, Xande, que compartilham comigo, cada um a sua maneira, o sonho
de uma sociedade mais justa e igualitária.
À família de Rogério e, sobretudo, ao meu cunhado Gelson Guibu meu amigo e
colega da PUC-SP, grande incentivador deste projeto.
Ao Otto, meu enteado, que acordou mais cedo, muitas vezes, para que eu pudesse
usar o computador no quarto dele e, sentindo a minha ausência, tentava interagir de
6
maneira muito interessada, no alto dos seus 9 para 10 anos, para entender o que eu
tanto escrevia, e, ao meu lado, lia seus gibis e livros infantis e dizia que também era
um intelectual.
A Zuleica, que me acolheu na cidade vermelha e me indicou para coordenação da
Proteção Social Especial, obrigada pela oportunidade.
Aos amigos que fiz na Secretaria de Assistência Social e Cidadania. Sintetizo meus
agradecimentos na figura do secretário da pasta da Assistência Social e Cidadania,
Pedro Soares, que prontamente me liberou para a concretização deste sonho.
Aos companheiros que trabalham na Proteção Social Especial (PSE) da prefeitura e
das entidades, que vivenciam comigo os dilemas e desafios da PSE e por me
impulsionarem ao estudo para buscar respostas mais consistentes como
coordenação para as demandas cotidianas, principalmente no que diz respeito à
qualidade dos serviços prestados e às condições de trabalho.
A Valquíria Longo, Sueli Luzo e Jana Leslão, coordenadoras, respectivamente, do
Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), Creas POP e
Casa Beth Lobo, por segurar comigo as agruras do cotidiano e vestir a camisa da
PSE.
Aos sujeitos de minha pesquisa, pela disponibilidade e afetividade com que me
receberam.
Aos colegas do Programa e a todas as pessoas tão queridas que conheci
e
reencontrei nesta etapa da minha vida.
Aos professores do Programa de Pós-graduação em Serviço Social, especialmente
os que estiveram mais próximos: Maria Lucia Barroco, Rachel Raichelis, Maria
Beatriz Abramides, José Paulo Netto.
À professora doutora Maria Carmelita Yazbek, que fez parte de minha banca de
qualificação e de maneira muito afetiva me trouxe imprescindíveis contribuições.
À professora doutora Aldaíza Sposati, agradeço ter aceitado fazer parte da minha
banca examinadora e pelas provocações que me fizeram mergulhar mais fundo na
Assistência Social. Com essa imersão, examinei meus fundamentos: aprendi, revi e
fixei conceitos e sinto o reflexo, no meu cotidiano profissional, no desenvolvimento
de meu estudo sobre a proteção especial e na defesa intransigente da assistência
social enquanto política pública.
A Neiri Bruno, que prontamente aceitou o convite de fazer parte de minha banca e
se dispôs a contribuir num momento tão importante.
7
Aos super gentis José Carlos e Vânia, que tiraram pacientemente todas as minhas
dúvidas.
À Capes que financiou a realização do mestrado.
Aos usuários da Proteção Especial da Assistência Social, que tem seus direitos
violados, esse trabalho é para e por vocês.
8
“No sinal fechado
Ele vende chiclete
Capricha na flanela
E se chama Pelé
Pinta na janela
Batalha algum trocado
Aponta um canivete
E até
Dobra a Carioca, olerê
Desce a Frei Caneca, olará
Se manda pra Tijuca
Sobe o Borel
Meio se maloca
Agita numa boca
Descola uma mutuca
E um papel
Sonha aquela mina, olerê
Prancha, parafina, olará
Dorme gente fina
Acorda pinel
Zanza na sarjeta
Fatura uma besteira
E tem as pernas tortas
E se chama Mané
Arromba uma porta
Faz ligação direta
Engata uma primeira
E até
Dobra a Carioca, olerê
Desce a Frei Caneca, olará
Se manda pra Tijuca
Na contramão
Dança pára-lama
Já era pára-choque
Agora ele se chama
Emersão
Sobe no passeio, olerê
Pega no Recreio, olará
Não se liga em freio
Nem direção
No sinal fechado
Ele transa chiclete
E se chama pivete
E pinta na janela
Capricha na flanela
Descola uma bereta
Batalha na sarjeta
E tem as pernas tortas”
Pivete (Chico Buarque)
9
RESUMO
A presente dissertação tem como objeto de estudo a Proteção Social Especial (PSE)
e alguns dos seus dilemas e desafios contemporâneos na reconfiguração da política
de assistência social brasileira. O objetivo geral visou um aprofundamento teórico
sobre as questões que envolvem a PSE bem como oferecer subsídios para a
reflexão, os debates e as estratégias de ação aos trabalhadores do Sistema Único
de Assistência Social (Suas) para sua efetivação, contribuindo para a concretização
da perspectiva crítica do Serviço Social posta no projeto ético-político
contemporâneo.
Formulou-se, como pergunta norteadora, quais os dilemas e desafios hoje postos à
PSE e como se pode avançar na qualidade da atenção à violação de direitos e do
risco previstos na Política Nacional de Assistência Social (PNAS). As principais
referências conceituais foram fundamentadas em obras e autores que privilegiam a
perspectiva crítica. A metodologia abrangeu pesquisa bibliográfica, pesquisa
documental e aproximação empírica com os sujeitos da pesquisa, além da
observação participante, uma vez que a pesquisadora coordena a Proteção Social
Especial no Município de Diadema.
Centrou-se em delimitar o lugar da PSE e a ambiência da violação de direitos na
PNAS, o que a caracteriza, trilhando o percurso de como se chegou na PSE, e
trazendo à baila questões contemporâneas como: as exigências de se pensar o
novo na PSE, as múltiplas determinações do Proteção e Atendimento Especializado
à Famílias e Indivíduos (Paefi), as atuais exigências profissionais para os
trabalhadores da PSE, a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, a
interface com o direito e a expressão de idéias conservadoras na atenção prestada
por alguns profissionais da PSE.
Os sujeitos da pesquisa foram: assistentes sociais, psicólogos e educadores, todos
trabalhadores do Suas. As referências conceituais principais foram: Política Social,
Assistência Social, Proteção Social no Brasil e Direitos Sociais, Direitos
Socioassistenciais, Seguranças Sociais.
A pesquisa corroborou a hipótese da necessidade de aprofundamento das questões
que envolvem a PSE por processos de qualificações mais duradouros para entender
e conduzir esse processo de reordenamento da PSE.
Palavras-chaves: Assistência Social, Proteção Social Especial, Reordenamento da
PSE.
10
ABSTRACT
This dissertation object of study is the Special Social Protection (PSE) and some of
its dilemmas and challenges in the contemporary reconfiguration of social assistance
policy in Brazil. The general objective aimed to deepen theory on issues surrounding
the PSE and to offer subsidies for reflection, discussion and action strategies to
employees of the SUAS to put in effect, in order to achieve the critical perspective of
Social Service in the contemporary ethnical project.
The driving question of such study was the definition of what are the current
dilemmas and challenges to PSE and how one can improve quality of attention to
violation of rights and risks observed in the National Social Police Plan (PNAS). The
main conceptual references were based on works and authors that emphasize critical
perspective. The methodology included a literature review, documental research and
empirical approach to the research subjects, and participant observation, since the
author of this dissertation coordinates a Special Social Protection in the city of
Diadema.
The study focused on defining the PSE area of action and the ambience of PNAS
rights violation that characterizes it, defining the path that led to PSE and shedding
light contemporary issues such as: requirements for the new thinking in PSE; the
multiple determinants of Specialized Care and Protection of Families and Individuals
(PAEFI); current requirements for PSE professionals; the National Grading of Social
Services; the interface with Law and the expression of conservative ideas by some
PSE care providers
The subjects of this study were: social service workers, psychologists and educators,
all employees of SUAS. The main conceptualreferences were: Social Policy, Social
Assistance, Social Protection in Brazil and Social Rights, Social Aid Rights, Social
Security.
The research confirmed the hypothesis of the need to go deeper on issues related to
PSE through durable qualification processes in order to understand and lead this
process of reordering PSE.
Keywords: Social Assistance, Special Social Protection, PSE Reorganization.
11
LISTA DE TABELAS
TABELA 1: Nome dos Funcionários e Local de Trabalho................................. 21
TABELA 2: Funções dos Sujeitos de Pesquisa................................................
21
TABELA 3: Nome dos Funcionários E Local de Trabalho................................
64
TABELA 4: Funções dos Sujeitos de Pesquisa................................................
64
TABELA 5: RH Creas........................................................................................ 74
TABELA 6: RH Creas POP...............................................................................
76
TABELA 7: RH Casa Beth Lobo ....................................................................... 77
TABELA 8: Tempo de Trabalho na PAS........................................................... 78
TABELA 9: Qualificação Profissional ...............................................................
79
TABELA 10: Caracterização da Violação.......................................................... 80
TABELA 11: Domínio do Conjunto de Defesa................................................
81
TABELA 12: Identeficação de Expressões Conservadoras.............................. 86
TABELA 13: Tipificação....................................................................................
93
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1: Funções dos Sujeitos de Pesquisa............................................... 22
GRÁFICO 2: Funções dos Sujeitos de Pesquisa............................................... 65
GRÁFICO 3: Tempo de Trabalho na PAS.........................................................
78
GRÁFICO 4: Qualificação Profissional............................................................... 79
GRÁFICO 5: Caracterização da Violação..........................................................
80
GRÁFICO 6: Domínio do Conjunto de Defesas.................................................
81
GRÁFICO 7: Identificação de Expressões Conservadoras................................ 86
GRÁFICO 8: Tipificação..................................................................................... 94
LISTA DE MAPAS
MAPA 1: Mapa da Exclusão /Inclusão Social Diadema....................................
67
12
LISTA DE SIGLAS
BPC – Benefício de Prestação Continuada
CAPS-AD_ Centro de Apoio Psicossocial-Álcool e Drogas
CEDEST- Centro de Estudos de Desigualdades Sócio-Territoriais
CLT- Consolidação das Leis do Trabalho
CMAS – Conselho Municipal de Assistência Social
CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
CMI – Conselho Municipal do Idoso
CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CR – Centro de Referência
Cras – Centro de Referência de Assistência Social
Creas – Centro de Referência Especializado de Assistência Social
CRI – Centro de Referência do Idoso
CT – Conselho Tutelar
Eca – Estatuto da Criança e do Adolescente
IAPs-Instituto de Aposentadorias e Pensões
IBGE – Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IEE Instituto de Estudos Especiais
LA-Liberdade Assistida
LBA - Legião Brasileira de Assistência
LGBT – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
Loas – Lei Orgânica da Assistência Social
MDS – Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
Nepssas - Núcleo de Estudos de Seguridade Social e Assistência Social
NOB – Norma Operacional Básica
NOB/SUAS – Norma Operacional Básica/ Sistema Único de Assistência Social
NOB/RH – Norma Operacional Básica/ Recursos Humanos
ONG – Organização Não Governamental
OG – Organização Governamental
Paif – Proteção e Atendimento Integral à Família
Paefi – Proteção e Atendimento Especializado às Famílias e Indivíduos
13
PAS- Política de Assistência Social
PAF- Plano Atendimento a Família
PBF – Programa Bolsa-Família
PIA- Plano Individual de Atendimento
Peti – Programa para Erradicação do Trabalho Infantil
PMD – Prefeitura Municipal de Diadema
PNAS - Política Nacional de Assistência Social
PNCFC – Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária
PSB – Proteção Social Básica
PSC Prestação de Serviço a Comunidade
PSE – Proteção Social Especial
PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
SGD – Sistema de Garantia de Direitos.
Sasc – Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania
Senai – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
Sesc – Serviço Social do Comércio
Sesi – Serviço Social da Indústria
Suas – Sistema Único de Assistência Social
TNSS - Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais
VIJ – Vara da Infância e Juventude
14
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................
15
CAPÍTULO I – REFERÊNCIAS HISTÓRICO-CONCEITUAIS...........................
23
1.1 Política Social e Proteção SocialZZZZZZZZZZZZZZZZZ. 23
1.2 Direitos Sociais, Pobreza, Vulnerabilidade e Risco ................................. 28
CAPÍTULO II – A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL............
33
2.1 Assistência Social como Direito...............................................................
33
2.2 Seguranças
Sociais,
Direitos
Socioassistenciais
e
Serviços
Socioassistenciais............................................................................................... 39
CAPÍTULO III – A AMBIÊNCIA DA VIOLAÇÃO DE DIREITOS NA POLÍTICA
NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL: PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL...
44
3.1 Caracterização da Proteção Social Especial............................................
44
3.2 Alguns Desafios Postos à Proteção Social Especial................................
48
CAPÍTULO IV – DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL
ESPECIAL: APROXIMAÇÃO EMPÍRICA AOS SUJEITOS DE PESQUISA.....
63
4.1 A pesquisa................................................................................................ 63
4.2 Breve Caracterização de Diadema e da Estrutura da Proteção Social
Especial............................................................................................................... 66
4.3 As Exigências de se Pensar o Novo na PSE: As Novas Formas de
Atendimento e as Novas Exigências aos Profissionais......................................
78
4.4 Expressões de Ideias Conservadoras na Atuação dos Profissionais da
PSE.....................................................................................................................
85
4.5 Tipificação como Caminho Concreto para Avançar na Política...............
93
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 100
REFERÊNCIAS .................................................................................................. 104
ANEXO................................................................................................................ 110
15
INTRODUÇÃO
“A Proteção Social Especial e sua estrutura
ainda carecem de maturação e compreensão”
(Couto et. al., 2010, p. 252)
Estar à frente da coordenação da Proteção Social Especial (PSE), na
Secretaria de Assistência Social e Cidadania, na Prefeitura do Município de Diadema
(PMD), num momento histórico da Assistência Social, em que se faz necessário o
reordenamento estatal dos níveis de média e alta complexidade, exigidos para
operacionalização do Sistema Único de Assistência Social (Suas), suscitou nosso
interesse em ter como objeto de estudo os desafios e dilemas da PSE enfrentados
neste processo dialético de efetivação da assistência social enquanto política pública
para afiançar as seguranças sociais aos sujeitos que tem seus direitos violados, em
pleno século XXI.
O Suas hierarquizou as proteções em dois níveis de atenção: Proteção Social
Básica e Proteção Social Especial, em média e alta complexidade. Porém, os
estudos sobre a Proteção Social Básica apresentam-se em grande quantidade 1,
enquanto a Proteção Social Especial não possui esse aporte teórico e se apresenta
de forma segmentada em temáticas como violência, população de rua, adolescente
em cumprimento de medidas, abrigamento, entre outras.
A questão problematizada sobre a segmentação ainda é tão latente que,
quando se buscou referências para amparar os estudos sobre violação de direitos,
na época do ingresso no mestrado, encontrou-se apenas uma dissertação de
mestrado2 sobre a Proteção Social Especial, mas nenhum estudo apreendendo-a
como um nível de segurança que abrange a média e a alta complexidade.
Esta lacuna mobiliza-nos a contribuir com sistematizações sobre a temática
em questão.
Construir estratégias para encarar os desafios enfrentados no reordenamento
dos serviços dentro da PSE parece ser questão desafiante do Suas, demandando
1
Em pesquisa na plataforma lattes, localizamos 242 pesquisas de produtividade pelo CNPQ
atualmente vigente com o assunto Proteção Social Básica.
2
Sertório, Leniter.Um estudo sobre a implantação da proteção social especial de média
complexidade: contribuição à efetividade do Suas. 2002/2010. Tese (Mestrado)- PUC-SP,
Campinas/SP, 2010.
16
competências da administração pública e dos trabalhadores do SUAS, concursados
e/ou de entidades sociais, para que estejam preparados teórica e tecnicamente para
os novos rumos trazidos pela Política Nacional de Assistência Social (PNAS), pelo
Suas, e na recente Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (TNSS).
Outra questão, que parece ser original e relevante, é pensar o impacto das
práticas conservadoras ainda hoje encontradas na PSE e investigar se as
dificuldades do reordenamento residem nessa herança da assistência social que
tratava quem demandava de sua função protetiva como figuras historicamente
estereotipadas negando-lhes as condições de sujeitos de direitos e tendo como
lócus os orfanatos, asilos e educandários.
Iamamoto (2009, p. 17) aponta para a necessidade de competência crítica,:
Os rumos e estratégias de ação são estabelecidos a partir da
elucidação das tendências presentes no movimento da própria
realidade, decifrando suas manifestações particulares no campo
sobre o qual incide a ação profissional. Uma vez decifradas, essas
tendências podem ser acionadas pela vontade política dos sujeitos,
de modo a extrair estratégias de ação reconciliadas com a realidade
objetiva, de maneira a preservar a sua viabilidade, reduzindo assim a
distância entre o desejável e o possível.
Partir da elucidação dessas questões, é o que se pretende com esta
pesquisa, estudando toda essa complexidade e diversidade da PSE como forma de
aprofundar a reflexão, ampliando as possibilidades de debate e intervenção, para
romper de vez com práticas conservadoras, ultrapassando os velhos modelos de
assistência social com a radicalidade necessária, para o modelo de assistência
social atual.
Ainda se quer mostrar que a problemática não tem sido contemplada na
produção acadêmica e chamar a atenção para a ambiência do risco e violação de
direitos.
O objetivo é aprofundar as questões que envolvem a PSE como lócus
essencial para afiançar as seguranças sociais a quem tem direitos violados,
desenvolvendo reflexões sobre alguns dos desafios e dilemas enfrentados nesse
processo dialético de reordenamento exigidos para operacionalização do Suas;
oferecer subsídios
para
a reflexão, os debates
e as estratégias de ação aos
17
trabalhadores do Suas, contribuindo para a concretização da perspectiva crítica do
Serviço Social posta no projeto ético-político contemporâneo3.
Percebe-se a necessidade de aprofundar a reflexão sobre o lugar da PSE no
Suas e da ambiência da violação de direitos e risco na PNAS, as exigências de se
pensar o novo em relação ao serviços tipificados, as questões suscitadas pela
implantação da Proteção e Atendimento Especializado às Famílias e Indivíduos
(Paefi)
e como se dá a incorporação dos diferentes segmentos na política de
assistência social.
É importante conhecer também as novas exigências postas aos profissionais
da PSE num serviço especializado, como o Creas, e até que ponto o profissional
tem domínio de quais aspectos caracterizam a violação e o conjunto de defesas, a
interface com o Judiciário, a expressão de ideias conservadoras na atuação de
alguns profissionais do Creas e quais as mediações necessárias para ultrapassar
com a radicalidade necessária o velho modelo de assistência social, ainda
introjetado em algumas práticas que estão em desacordo com a PNAS e com a
construção do momento histórico contemporâneo.
Destaca-se a relevância da pesquisa sobre o tema para a PSE,
especialmente para a Assistência Social, como uma forma de contribuir para o
debate das questões elencadas acima, para as quais não se encontra bibliografia.
Trata-se de um estudo acadêmico que procura trazer contribuições efetivas e
inovadoras, por ser um estudo inédito, que trata das múltiplas determinações da
PSE no sentido de elucidar os dilemas e desafios por meio das experiências
concretas dos sujeitos e da pesquisadora.
A pesquisa rege-se pela pergunta norteadora: Quais os dilemas e desafios
hoje postos à PSE e como se pode avançar na qualidade da atenção da violação de
direitos e do risco na PNAS?
Tal pergunta permitiu definir como hipótese que, para se avançar na
efetivação do Suas, deve-se garantir o aprofundamento sobre as questões da PSE,
principalmente com o aprimoramento das equipes interdisciplinares por meio de
capacitações e outros processos de qualificação mais duradouros.
3
O projeto ético-político materializa-se no Código de Ética de 1993 e fundamenta a ação profissional
dos assistente sociais. Os códigos profissionais anteriores (1947/65/75), tinham perspectivas
conservadoras, que pregavam harmonia, neutralidade, e foram deixados para trás pelas mudanças
no interior da profissão. Essas mudanças foram expressas no Código de 1986, simbolizando a virada.
E com o amadurecimento dos debates, culminou no código atual.
18
Privilegia-se a tradição marxista e a possibilidade de uma leitura critica da
assistência sem desqualificá-la enquanto política pública, articulando a análise
ideológica com questões concretas do cotidiano, na direção da práxis.
Trabalha-se com referências histórico-conceituais como: Política Social,
Assistência Social, Proteção Social, Seguridade Social , Direitos Humanos, Direitos
Sociais, Conservadorismo, privilegiando autores inseridos na tradição marxista, que
trabalham com a dimensão da totalidade histórica sob a multiplicidade de
determinações da constituição dos sujeitos sociais.
Para aproximar-se desse objeto de estudo, entende-se que é preciso
estabelecer
mediações
necessárias,
como,
prioritariamente,
direitos
socioassistenciais, serviços socioassistenciais, risco, vulnerabilidade, exclusão e
seguranças sociais.
Para trabalhar as referências conceituais e as mediações com o objeto, assim
como no estudo da política de assistência social, a presente pesquisa partiu de
estudos dos marcos legais e de autores que trabalham a construção de um
momento histórico contemporâneo, como Aldaíza Sposati, Carmelita Yazbek,
Berenice Couto, Raquel Raichelis, Maria Lúcia Martinelli e dos textos trabalhados no
Programa de Pós-graduados em Serviço Social da PUC-SP, na disciplina Assistência
Social: Política e Gestão e no Núcleo de Estudos de Seguridade Social e Assistência
Social (Nepssas) ambos conduzidos pela professora doutora Aldaíza Sposati.
Quanto à leitura do conservadorismo, utilizou-se como referencial a obra de
Leila Escorssim Netto4, que trabalha a origem do conservadorismo clássico. Em sua
interface com o Serviço Social, utilizam-se Iamamoto5 e Netto6.
Na aproximação da assistência social ao conservadorismo, utiliza-se a obra
de Maria Luiza Mestriner7, que retoma a forte presença da filantropia, como irmã
siamesa da assistência social.
Para a análise dos direitos humanos e construção da ambiência do trato à
violação de direitos, parte-se de José Damião Trindade8.
A intenção é mostrar que, a partir desse arcabouço teórico e conceitual, é
possível estabelecer mediações necessárias, bebendo na fonte do materialismo
4
O conservadorismo clássico - Elementos para caracterização e crítica. Cortez, 2011.
Renovação e conservadorismo no serviço social – ensaios críticos. Cortez, 2000.
6
Ditadura e serviço social. Cortez, 2001.
7
O estado entre a filantropia e a assistência social. Cortez, 2011.
8
História social dos direitos humanos. Petrópolis, 2011.
5
19
dialético e fazer avançar a assistência social a serviço da classe trabalhadora, como
posto no projeto ético-político contemporâneo e em direção à emancipação humana,
carregando em si a proposta marxista.
A metodologia adotada é a pesquisa bibliográfica, pesquisa documental,
aproximação empírica aos sujeitos de pesquisa, além da observação participante,
uma vez que atuamos como profissional na área da Assistência Social.
A estrutura da dissertação compõe-se de quatro capítulos, que se articulam.
No primeiro capítulo, expressa-se a base histórico-conceitual, como chão da
pesquisa. No segundo capítulo, abordam-se os marcos da Assistência Social no
Brasil até sua institucionalização como direito,
passando pela Lei Orgânica da
Assistência Social (Loas), PNAS e construção do desenho, pela primeira vez na
história do País, de um Sistema Único de Assistência Social (Suas) que hierarquizou
as proteções e garantiu seguranças sociais, direitos socioassistenciais e serviços
socioassistenciais.
O terceiro capítulo trata da ambiência da violação de direitos e risco na PNAS
- a PSE -, trazendo questões importantes, como sua caracterização; os níveis de
complexidade; a necessidade de compreensão e maturação da PSE; a discussão
dos serviços socioassistenciais em face dos benefícios; o ocultamento do usuário da
PSE; a articulação em rede e a intersetorialidade; as múltiplas determinações do
Paefi, especialmente sobre como este incorpora os segmentos.
O quarto capítulo elucida o processo de pesquisa; fornece breve
caracterização de Diadema e da estrutura da PSE; aborda as considerações críticas
dos sujeitos de pesquisa e da pesquisadora sobre alguns dilemas e desafios da
PSE, sendo eles: a exigência de pensar o novo na PSE pelas novas formas de
atenção e exigências profissionais, as
expressões de ideias conservadoras na
atuação dos profissionais da PSE e sobre a Tipificação Nacional dos Serviços
Socioassistenciais. Nas Considerações Finais, destacam-se os principais resultados
da pesquisa.
Norteia-nos para o estudo uma pesquisa bibliográfica, iniciada antes mesmo
da inserção no curso de mestrado, que assegura o rigor científico requerido pela
pesquisa, e que tem sido central para estabelecer as mediações necessárias para o
objeto, bem como a sustentação teórico-acadêmica para o estudo. Assim como o
envolvimento profissional no processo de reordenamento institucional, vivenciando o
20
impacto dos novos modelos e das práticas conservadoras ainda identificados no
cotidiano da proteção social especial.
A pesquisa documental foi importante, para o presente estudo, exigindo da
pesquisadora conhecer a política de Assistência Social, os documentos oficiais do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), como a
PNAS/2004, Suas/2005, a Norma Operacional Básica (NOB)/2005, NOB/RH, Guias
Técnicos, especialmente a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais e as
orientações técnicas para os serviços para a PSE.
A dificuldade encontrada para a realização da pesquisa relaciona-se com a
escassa bibliografia sobre a PSE e suas questões atuais, sobre a dificuldade de
implantação de novos modelos que de fato garantam
as seguranças sociais
necessárias para garantir direitos, principalmente através dos serviços desse nível
de complexidade.
Neste sentido, seguindo a tradição de pesquisa do programa, através do
Nepssas9, a nossa proposta consiste em uma aproximação empírica com o uso de
questionários com alternativas.
A pesquisa de campo envolveu doze profissionais técnicos e coordenadores
do Creas, do Centro de Referência da Mulher - Casa Beth Lobo e Creas POP.
Os sujeitos da pesquisa foram escolhidos pelos seguintes critérios:
1. Abarcar técnicos de todas as áreas (assistentes sociais, psicólogos e
educadores) de todos os serviços vinculados à PSE de Média Complexidade e Alta
Complexidade (Tab. 1).
2. Profissionais com funções diversificadas em exercício na PSE.
9
Núcleo de Estudos de Seguridade Social e Assistência Social da PUC–SP.
21
Tabela 1 - Nome dos funcionários e local de trabalho
Setor de Trabalho/Segmento em que
Nome
Atua
Maria Helena da Silva de Lima
Abordagem Social
Valkiria Martins de Oliveira
Idoso e Deficiente
Edina Aparecida Mendes
Peti
Janaina Braga Domingues Correa Fecher
Abordagem Social
Ivone Aparecida de Freitas Caetano
Alta Complexidade
Tania Machado Aires
MSC/LA
Centro
de
Referência
Janaina Leslao Garcia
Situação de Violência
Renata Palombo
Paefi
Maria de Lourdes Merenda
Peti
Eloisa Gabriel dos Santos
Creas POP
Maria Cristina de Oliveira
Idoso e Deficiente
Sueli Luzo Costa Garcia
Creas POP
à
Mulher
em
Do universo de doze entrevistados, com relação à profissão e natureza das
funções, 58% atuam como assistentes sociais, 25% são educadores, 8%
educadores e 8% têm cargo de coordenador (Tab. 2 e Gráfico 1).
Tabela 2 - Funções dos sujeitos de pesquisa
3. Função (assinale apenas uma alternativa)
ABS
%
Assistente social
7
58%
Psicólogo
1
8%
Educador
3
25%
Coordenação
1
8%
Outros
0%
22
Gráfico 1 - Funções dos sujeitos de pesquisa
Após a realização da pesquisa, as respostas aos questionários foram
sistematizadas. Posteriormente, lançadas em planilhas e transformadas em tabelas,
tendo em vista a construção da análise. Os dados coletados foram organizados e
tabulados, possibilitando a análise das considerações dos sujeitos e a construção de
eixos analíticos básicos.
Outra técnica foi a da observação participante tanto no espaço institucional
quanto no acadêmico, e os registros feitos de forma sistemática, em caderno de
campo. A receptividade dos sujeitos da pesquisa para com a pesquisadora se deu
de forma acolhedora. A realização da pesquisa ocorreu entre setembro e outubro de
2012.
23
CAPÍTULO I - REFERÊNCIAS HISTÓRICO-CONCEITUAIS
1.1 Política Social e Proteção Social
A origem das políticas sociais emana da luta dos trabalhadores por proteção
social do Estado aos operários que compunham o contingente de desempregados
criado pela concorrência na Revolução Industrial.
A Revolução Industrial inicia-se em meados do século XVIII, caracterizada
pela introdução do maquinário no processo produtivo impactando sobremaneira a
vida dos trabalhadores daquela época e pelo liberalismo econômico, que
conformava um processo no qual havia liberdade total para o capital, sem nenhuma
intervenção do Estado, mas aprisionava os trabalhadores em condições cada vez
piores: os ambientes de trabalho eram péssimos, as jornadas mais do que abusivas,
havia exploração de mão de obra infantil, entre outros.
A partir do século XIX, há um crescimento do movimento operário
reivindicando melhores condições de trabalho, principalmente na Inglaterra.
Nesse momento histórico do capitalismo industrial, era marcado ainda pelo
desemprego e, por consequência, o não acesso às necessidades básicas que fazia
com que os trabalhadores demandassem a intervenção do Estado.
As políticas sociais, como resposta do Estado, operam sempre no bojo das
contradições oriundas da relação entre capital e trabalho.
Ao mesmo tempo em que a política social se constitui numa “modalidade de
intervenção do Estado no âmbito do atendimento das necessidades sociais básicas
dos cidadãos” (YAZBEK, 2008, p. 82), cumpre a função de amenizar os possíveis
conflitos sociais que poderiam se acirrar contra a ordem vigente.
No âmbito de um espaço contraditório, no qual podem se reforçar tanto os
interesses do capital, mantendo a acumulação e reproduzindo a força de trabalho,
quanto os processos organizativos da população, é que a política social se localiza.
Desde as poor laws (Lei dos Pobres) na Inglaterra, o Estado tentou amenizar
a pobreza percebendo que a caridade e filantropia seriam insuficientes. Para a
população pauperizada que perambulava em busca de ocupações, encontram-se as
Poor houses (1576) e as Workhouses, no modelo de instituições totais,a primeira
24
para a população pauperizada apta e a segunda para os inaptos ao trabalho. Desde
então, é possível verificar modelos de proteção calcados no trabalho.
No começo do século XVII, ocorre a primeira experiência em assistência com
a Irmandade de Misericórdia em São Paulo10, que instala pequena enfermaria,
denominada
de
hospital,
mas
que
funcionava
como
uma
instituição
de
acolhimento,os antigos albergues.Posteriormente, são implantadas as Hospedarias
do Imigrante (1888) que era responsável pela vacinação e quarentena dos
imigrantes que chegavam.
Já no século XIX, em Salvador, para o acolhimento de crianças que não
tinham como ter os cuidados providos, estas eram deixadas na Roda dos Expostos
(1825), peça cilíndrica presa a parede, onde era possível colocar a criança e girar ,
fazendo com que ela chegasse ao outro lado sem identificar quem o fez.Esse
mecanismo foi extinto somente pelo Código de Menores.
O Estado passa a ter legitimidade para regular a economia e o social com o
Welfare State, potencializando as políticas sociais, até idos dos anos 1970.
O Estado de Bem-Estar Social caracterizava-se por sua fundamentação no
keynesianismo, ou seja, num modelo de capitalismo regulado, que era alicerçado
pela social-democracia, e pelo fordismo.
Esse periodo é marcado também pela introdução do modelo bismarkiano de
direitos mediados pelo trabalho, que hoje algumas formas estão postas na
Seguridade Social.
Historicamente, há uma diferença nas respostas dadas pelo Estado entre os
países que adotaram o Welfare State, ou em países, como é o caso do Brasil, que
nunca alçaram, sequer, esse patamar, mesmo não sendo exatamente o modelo
almejado, mas apenas um parâmetro melhor do que os estabelecidos no País.
No Brasil, o período da República Velha, que antecede os anos 30, é
marcado por uma incipiente legislação trabalhista. Embora as condições de
trabalhos fossem absolutamente precárias, as expressões da questão social eram
tratadas como caso de polícia e como disfunção individual.
Os cidadãos pressionaram o governo por medidas de proteção através da
organização de partidos políticos e sindicatos, organizações estas apreendidas a
partir da vivência com os imigrantes chegados na década de 1920. Assim, o sistema
10
Para aprofundar :Sposati, Aldaíza. “História da pobreza assistida em São Paulo” Tese de
Doutorado defendida na Pontíficia Universidade Católica – PUC-SP -1996
25
de proteção social brasileiro foi se constituindo a partir da década de 1920-30, a Lei
Eloi Chaves (1923) que cria as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs), mais
tarde transformadas em Instituto de Aposentadorias e Pensões( IAPs) e de práticas
assistencialistas.
Nesse contexto, se dá a origem do Serviço Social, no interior do bloco
católico, para operar nas sequelas do capitalismo industrial e amenizar os conflitos
entre as classes.
No período do Estado Novo, no governo Vargas, para os trabalhadores com
carteira assinada, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) entra em vigor,
respondendo aos anseios de forma legalista, nos moldes do modelo bismarkiano,
em que os benefícios sociais têm caráter seletivo, que, como o próprio nome já diz,
não se constituem em direitos.
As respostas para os trabalhadores sem vínculo formal são calcadas em
formas populistas representadas por obras sociais e filantrópicas.
Nos idos dos anos 40 e 50, para atender ao processo de industrialização, os
trabalhadores migram do campo para a cidade e, com isso, surge a necessidade de
qualificação dessa mão de obra que anteriormente era rural, e adequação à ordem
vigente. São criadas escolas de formação profissional e orientação social, ligadas ao
empresariado nacional, como o Serviço Social da Indústria (Sesi), Serviço Nacional
de Aprendizagem Industrial (Senai), Serviço Social do Comércio (Sesc).
No ano de 1942, é fundada, pela primeira-dama Darcy Vargas, a Legião
Brasileira de Assistência (LBA), com o objetivo de atender às famílias dos soldados
enviados às batalhas na Segunda Guerra Mundial.
Com o fim da guerra, a LBA passa a atender às famílias em situação de
miserabilidade, com foco nas áreas de maternidade e infância.
A LBA marca a história das práticas de assistência social no Brasil como a
primeira instituição social do País de âmbito nacional, pelas suas características
paternalistas, de auxílio emergencial e compensatório
e pela relação público-
privada, por meio de convênios com instituições sociais. Viabilizou, ainda, o
surgimento de várias escolas de serviço social pelo País.
A LBA, historicamente, foi presidida pelas primeiras-damas, cultuando suas
figuras como operadoras de assistência social, e foi extinta somente em 1995.
Assim, surge com força o primeiro-damismo no Brasil, assegurando em seu
estatuto a obrigatoriedade da presidência ser exercida pela primeira-dama do País,
26
reforçando assim a ligação estreita entre as ações públicas na área da assistência
social com a caridade e a benemerência. Sposati et. al (2010, , p. 45) afirmam que:
Representa a simbiose entre a iniciativa privada e a pública, a
presença da classe dominante enquanto poder civil e a relação
benefício/caridade X beneficiário/pedinte, conformando a relação
básica entre Estado e classes subalternizadas.
Vargas foi destituído em 1945, mas o período que se sucedeu possuía
características semelhantes em relação à orientação trabalhista e à populista. Podese dizer que, nesse período, o grande marco é a promulgação da Constituição de
1946, que regulamenta o direito à greve e a liberdade de associação sindical.
Como sistematizado por Vieira (1995), posteriormente, constiui-se a política
social o Brasil, traduzindo-se ora em interesse do capital, através do controle, ora
em interesse do povo, por meio da conquista de direitos, apresentando-se como
espaço contraditório.
1951-64 – estratégias de mobilização e controle das populações carentes;
1957-64 – representação do conjunto de direitos da população perante o
Estado;
1957-64 – Espaço de representação de interesses populares.
Em tempos de “geração 68” e suas bandeiras, num contexto de dívida pública
e crise fiscal, alta do petróleo e severas críticas ao modelo de Welfare State, o
neoliberalismo constitui-se, privilegiando todos os interesses do capital e antagônico
às políticas sociais.
O neoliberalismo tem suas bases doutrinárias no Consenso de Washington e
constitui-se em um processo de reestruturação do capital, ajustando-os as suas
necessidades, por mudanças, não só no capital financeiro, mas no mundo do
trabalho e na reconfiguração do Estado.
Contraditoriamente, o Brasil, com a chegada tardia do neoliberalismo11,
conseguiu avançar na universalização dos direitos sociais, num contexto histórico
em que o neoliberalismo já avassalava os direitos sociais pelo mundo.
11
Para saber mais recomendamos o texto de Sposati “Regulação Tardia:característica das políticas
sociais latino americanas na passagem entre o segundo e o terceiro milênio.”
27
Esse avanço no campo dos direitos sociais tem início com o processo de
abertura democrática e se consolida pós ditadura na progressista Constituição
Federal de 1988, que estabelece os Direitos Sociais para garantir o conjunto de
necessidades sociais, como a educação, saúde, o trabalho, lazer, a segurança,
previdência social,
proteção à maternidade
e à infância,
assistência aos
desamparados, que devem ser garantidos pelo Estado.
Por garantir condições de vida, a Assistência Social integra o sistema de
proteção social brasileiro previsto na Constituição de 1988.
Uma política de proteção social compõe o conjunto de direitos de
civilização de uma sociedade e/ou o elenco das manifestações e das
decisões de solidariedade de uma sociedade para com todos os seus
membros. Ela é uma política estabelecida para a preservação, a
segurança e respeito à dignidade de todos os cidadãos. (SPOSATI,
2009, p.11).12
Como Política Pública de Proteção Social, num conjunto de iniciativas para
proteger os riscos inerentes às condições humanas, institui-se, a seguridade social,
sobre três pilares: Previdência Social, Saúde e Assistência Social, sendo a
Assistência Social e a Saúde não contributivas.
Em estudo de Sposati13, é apresentado que, para a assistência social se
constituir como política pública, é necessário assumir a socialização dos riscos
sociais e que isso depende do padrão de civilidade e solidariedade da sociedade,
implica também retirar as diretrizes do campo privado, o que não significa estatizar,
mas operar em parceria, assegurando o dever do Estado e a responsabilidade
pública.
A assistência na política social brasileira, como direito, não por acaso, é a
última a ser regulamentada:
O exame da política de assistência social, como de outras políticas
sociais, significa tratar de uma mediação estatal na relação de
classes em uma sociedade de mercado que tem por objetivo
construir novos parâmetros e alcances na luta pela efetivação de
direitos sociais e ampliação do alcance do dever de Estado com o
12
Modelo brasileiro de proteção social não contributiva: concepções fundantes. In: Concepção e
gestão da política social não contributiva no Brasil. Brasília, Ministério do Desenvolvimento Social
e Combate à Fome (MDS) e Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(Unesco). Brasília-DF, 2009. p.13-56. Disponível em: aplicações. mds.gov.br/sagi
13
Assistência Social como Seguridade Social, texto trabalhado em sala de aula na disciplina
ministrada pela professora doutora Aldaíza Sposati.
28
social. Tem-se à frente a possibilidade de fazer avançar, em alguns
aspectos, um processo constituinte ainda inconcluso, mesmo que
sua completude seja, muitas vezes, mais desejo do que
possibilidade. Trata-se do campo da dívida social brasileira, face às
exclusões sociais, onde os serviços de assistência social são
importantes, quer para suprir demandas de proteção e reprodução
social, quer para a desconstrução/reconstrução da sociabilidade
cotidiana de várias camadas da população sob uma nova relação de
igualdade/eqüidade de direitos perante a sociedade e o Estado
brasileiro e perante a ética sócio-política fundada na dignidade
humana. (SPOSATI, 2007, p. 440).
1.2 Direitos Sociais, Pobreza, Vulnerabilidade e Risco
No campo dos direitos, onde a assistência social se localiza, destacam-se
dois documentos que os preanunciam: Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão, de 1789, e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, que
incorporou direitos sociais, econômicos e culturais aos direitos civis e políticos.
O campo de lutas por direitos humanos(DH) vem se constituindo
historicamente e encampando lutas contra suas violações:
Na década de 60, os movimentos de luta e de defesa de DH
alcançaram várias conquistas no âmbito dos direitos civis e políticos:
os chamados movimentos das minorias, de mulheres, negros,
homossexuais, o movimento estudantil, desencadearam uma série
de lutas específicas, dando visibilidade a diferentes aspectos da
violência e da exclusão social. (BARROCO, 2008, p. 5).14
Bandeiras importantes, nesse campo, vão se objetivando em marcos legais e
constituindo-se em referências no conjunto de defesas para o campo das políticas
sociais, principalmente em segmentos específicos, como criança e adolescentes,
gênero, orientação sexual, discriminação etária, entre outras.
Alguns autores, como Barroco (2008) e Trindade (2011), alertam para
insuficiência das declarações e para as contradições entre a realização dos DH e as
condições adversas do capitalismo:
14
O Significado Sócio-histórico dos Direitos Humanos e o Serviço Social. Palestra apresentada na
mesa sobre Conflitos Globais e a Violação dos Direitos Humanos: A Ação do Serviço Social em
18/8/2008. CONFERÊNCIA MUNDIAL DE SERVIÇO SOCIAL DA FEDERAÇÃO INTERNACIONAL
DE TRABALHO. Salvador (BA).
29
Uma das maiores dificuldades de objetivação do conjunto dos DH
reside na realização dos direitos sociais econômicos e culturais, pois,
como já assinalamos, eles exigem maior enfrentamento da
contradição entre os direitos e os limites da realidade burguesa.
(BARROCO, 2008, p.11).
Os direitos sociais somente são consagrados pela Constituição de 1988,
passando a ocupar lugar central como elemento fundante da relação pública entre
os cidadãos e o Estado, como aponta Martinelli (2011, p. 5)15:
Na esteira das conquistas democráticas que vão se instituindo após
a Constituição Federal de 1988, e que vão alargando o campo dos
direitos sociais no Brasil, sem dúvida temos de mencionar o SUS
(1990), o ECA (1990), a Loas (1993), o Estatuto do Idoso (1994), a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), e mais
recentemente, já nos anos 2000, a Política Nacional de Assistência,
em 2004, a Norma Operacional Básica, em 2005, com vistas à
implantação do Sistema Único de Assistência Social, daí a sua
denominação NOB/Suas, enfim, todo um conjunto de leis
regulamentadoras de cada política, num esforço concentrado de
implantar um Sistema de Proteção Social no Brasil.
Mediados por políticas públicas, os direitos sociais têm caráter redistributivo
de acesso e decorrem do reconhecimento das desigualdades sociais oriundas na
ordem vigente.
A concretização dos direitos sociais depende da intervenção do
Estado, estando atrelada às condições econômicas e à base fiscal
estatal para ser garantida. Sua materialidade dá-se por meio de
políticas públicas, executadas na órbita do Estado. Essa vinculação
tem de dependência tem sido a principal causa dos problemas de
viabilização de direitos sociais, que, não raro, são entendidos como
produto de um processo político, sem expressão no terreno da
materialidade das políticas sociais. (COUTO, 2010, p.48).
Sob a égide neoliberal, nos domínios do capital, a ausência da materialidade
dos direitos sociais, com a retração e desconfiguração de políticas sociais, que
supostamente deveriam ser universalizantes, acarretam dificuldade de objetivação
dos direitos humanos:
[...] a brutal defasagem entre os princípios igualitários da lei e a
realidade das desigualdades e exclusões - e nesse caso, falar dos
direitos sociais seria falar de sua impotência em alterar a ordem do
15
O serviço social e a consolidação de direitos: desafios contemporâneos. Revista Serviço Social e
Saúde, n. 12, 2011
30
mundo, impotência que se arma no descompasso entre a
grandiosidade dos ideais e a realidade bruta das discriminações,
exclusões e violências que atingem maiorias. Além disso, e talvez o
mais importante, não poderíamos ir muito além do que constatar – e
lamentar - os efeitos devastadores das mudanças em curso no
mundo contemporâneo, demolindo direitos que, em que pesem todos
os seus limites, mal ou bem garantem prerrogativas que compensam
a assimetria de posições nas relações de trabalho e poder, e
fornecem proteções contra as incertezas da economia e os azares da
vida. (TELES,1997, p. 2).
Nesse contexto, a assistência social localiza-se na luta pelos direitos
humanos e contra suas violações; por direitos sociais, por dignidade. Dentro dessa
magnitude é que a assistência social se constitui na possibilidade de um avanço
civilizatório16:
A assistência social ingressa no campo dos direitos pelo direito
humano à dignidade. A questão é transformar direitos humanos no
que for compatível a acessos sociais e, portanto, em direitos
sociais, isto é, direito a determinados acessos que a assistência
social deva prover e garantir. (SPOSATI, 2009, p. 14).
A política de assistência social está inserida no combate às circunstâncias
que aviltem a dignidade e que não se reduzem à pobreza. Embora a pobreza, nesse
sentido, constitua-se numa violação de direitos humanos, a política de assistência
não se restringe ao seu combate. Adotaremos o conceito de pobreza de Yazbek
(2001, p. 63).
A pobreza br asileira const itui-se de um conjunt o
heterogêneo, cuja unidade buscamos encontrar na renda
lim itada, na exclusão e na subalt ernidade. Do ponto de
vista da renda, o que se evidencia é que para a grande
maior ia dos trabalhadores, com registr o em carteira ou
não, com contrato ou por conta pr ópr ia, predom inam os
baixos rendimentos e a conseqüent e privação mater ial
daí advinda.
Do ponto de vista da exclusão e da
subalternidade, a experiência da pobreza constrói
ref erências e def ine um lugar no mundo, onde a ausência
de poder de mando e decisão, a pr ivação de bens
materiais e do pr óprio conheciment o dos processos
sociais
que
explicam
essa
condição
ocorrem
simultaneamente a práticas de resistência e luta.
16
Horizontes da e para a Política de Assistência Social no Brasil de 2009: elementos para discussão.
Pobreza, Vulnerabilidade, Desigualdade/Risco e Exclusão.
31
Partir da pobreza como acesso à assistência social aviltaria direitos sociais
universais e renega-se a dívida histórica com uma camada da população:
O conceito de pobreza não é o mais adequado quando se quer
superar o caráter neoliberal da política social. Categorizar carente ou
pobre esconde, avilta e impede uma linguagem plena dos direitos do
cidadão, do acesso universal a estes direitos, que devem ser
garantidos pelo Estado. Da mesma forma discriminatória a política de
assistência social é designada como compensatória a partir de
concepção tributária do pensamento liberal. O sentido de
compensatória é vinculado ao não ingresso no mercado de trabalho
e conflita com a concepção de direitos sociais universais. (SPOSATI,
2010, p. 5).17
Cabe à assistência social objetivar seu campo de ação, alinhada à luta por
direitos humanos e contra sua violações, e prover determinados acessos com ações
preventivas e protetivas, em face da vulnerabilidade e do risco.
A política de assistência social adota então a noção de vulnerabilidade
18
que
traz outros elementos anteriores à questão econômica, e vão muito além do que ela
determina:
[...] para além das condições socioeconômicas, as vulnerabilidades
devem ser entendidas como um somatório de situações de
precariedade entre as quais se incluem a composição demográfica
da família, os agravos à saúde, a gravidez precoce, a exposição à
morte violenta e as próprias condições cotidianas de vida.
Compondo com o que o risco19 traz em outras dimensões para a política de
assistência social :
O risco, como grave ameaça ou perigo iminente constitui-se num
evento que traz consequências diretas para as condições e
circunstâncias da vida dos indivíduos e de suas famílias, rompendo
laços de sociabilidade e comprometendo sua capacidade de
assegurar por si mesmo sua independência social. Nessa
perspectiva, remete à ruptura de pertencimento, do vínculo societal,
17
SPOSATI, Aldaíza. O desafio da universalização In: GUIMARÃES, Juarez. (Org.). As novas bases
da cidadania: políticas sociais, trabalho e previdência social. São Paulo: Fundação Perseu Abramo,
2010. p. 35-41.
18
Conceito de vulnerabilidade trabalhado em Mapa de Vulnerabilidade Social da Cidade de São
Paulo (SÃO PAULO, 2004, p.12), no texto O Conceito de Serviços Socioassistenciais: uma
Contribuição para o Debate, trabalhado na VI CONFERÊNCIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL.
19
Conceito de risco trabalhado no texto O Conceito de Serviços Socioassistenciais: Uma
Contribuição para o Debate. VI CONFERÊNCIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL.
32
da participação social e do usufruto da riqueza socialmente
construída (YAZBEK, 2001) ocasionando, portanto, a violação de
direitos e de dignidade humana.
O âmbito de ação em que a assistência social se move como campo de
desproteção social,é o que está
fora do alcance da “rede de segurança” com
fundamentação na defesa dos direitos sociais e humanos, como contextualiza
Raichelis (2008, p. 56)20:
Trata-se de riscos a que estão expostos indivíduos, famílias,
coletividades quase encontram fora do alcance da “rede de
segurança” propiciada pela proteção social pública e que, por isso,
se encontram em situações de vulnerabilidade e risco social gerados
por uma cadeia complexa de fatores: a ausência ou precariedade da
renda, o trabalho informal, precário e o desemprego; o frágil ou
inexistente acesso aos serviços sociais públicos; a perda ou
fragilização de vínculos de pertencimento e de relações sociais e
familiares;as discriminações e estigmas sociais, o não direito, que
engendram múltiplas situações de desproteção social
Sobre esse chão, a assistência social se materializa como política pública,
como se tratará no capítulo que segue.
20
RAICHELIS, R. (Coord.); MESTRINER, M. L.; PAZ, R. D. O. da; NERY, V. Planos de assistência
social: diretrizes para elaboração. Brasília: MDS, 2008.
33
CAPITULO II – A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL
2.1 Assistência Social como Direito
O avanço da Assistência Social enquanto política pública, integrante da
seguridade social, de responsabilidade do Estado e direito do cidadão, responde a
demandas históricas de luta de movimentos sociais organizados, setores críticos das
categorias profissionais e dos trabalhadores da política de assistência social.
Historicamente, a Assistência Social foi se maturando do contexto da nãopolítica, às voltas com o clientelismo, benevolência e primeiro- damismo, ao campo
público da seguridade social e da proteção social pública, de caráter não
contributivo, através da Constituição de 88 e da Loas, como sintetiza Yazbek (apud
COUTO et.al, 2010, p. 33):
[...] campo dos direitos, da universalização dos acessos e da
responsabilidade estatal, iniciando um processo que tem como
horizonte torna-la visível como política pública e direitos dos que
dela necessitarem. Sem dúvida um avanço, ao permitir que a
assistência, assim posta transite do assistencialismo clientelista para
o campo da Política Social .
A Loas, Lei 8.742/1993, institui a assistência como política pública, não
contributiva, em todo o território nacional:
[...] a assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é
Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos
sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de
iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às
necessidades básicas (art. 1o).
A Loas institui o Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado aos
idosos e às pessoas com deficiência, no valor de um salário-mínimo, e, ainda, os
benefícios eventuais. O BPC é implantado com limitações e os benefícios eventuais,
de caráter provisório, em virtude de morte, nascimento, calamidade pública e
vulnerabilidade temporária, até hoje não ganharam a devida concretude.
34
Outra questão relevante é o controle social na formulação, gestão e execução
da política de assistência social pela Loas, embora nos anos que a sucederam ela
não ganhe a materialidade necessária.
Surge a primeira Política Nacional da Assistência Social (PNAS), em 1998,
mas que se mostra insuficiente e confrontando o preconizado pela Loas. No governo
FHC, em paralelo, é instituída a Comunidade Solidária21, que, longe de ser política
pública, reitera um processo de refilantropização das políticas sociais.
Num processo acentuado, desde os anos 90, com as políticas sociais
subordinadas
à
ordem
econômica,
o
desmonte
de
políticas
públicas,
a
reestruturação produtiva22, o enxugamento da força de trabalho, a terceirização, a
baixa remuneração e as condições de trabalho precárias, as políticas sociais se
constituem cada vez mais como possibilidade concreta de construção de direitos23.
O aumento da pobreza e da desigualdade e a nova face da questão social no
País, intensifica-se o processo de aviltamento de direitos e privações para a classe
que vive do trabalho e passa a gerar novas demandas e requisições para a política
de assistência social, através de serviços e benefícios:
As necessidades e possibilidades humanas que se colocam para a
operação das políticas de assistência social são, sem dúvida,
marcadas pelas profundas desigualdades socioeconômicas e
políticas agravadas pela miserabilidade. A assistência social como
política pública deve ofertar a provisão de necessidades fora do
mercado, isto é, sustentadas pelo orçamento público na qualidade de
garantia social. Para tanto, aqui se entende a assistência social
como: - política de garantias de direitos de prevenção e proteção
social através de serviços, benefícios, programas, projetos,
monitoramento e trabalhos sociais que: - previnem/reduzem
situações de risco social e pessoal; - protegem pessoas e famílias
vulneráveis e vitimizadas, independente de idade, sexo, raça, etnia,
renda; - criam medidas e possibilidades de ressocialização,
reinserção e inclusão social; - monitoram exclusões, vitimizações,
vulnerabilidades e riscos sociais da população. (SPOSATI, 2007, p.
450).
Como resposta política à agenda neoliberal e seus desmontes, frente à
retração dos direitos sociais, a nova PNAS entra em cena, fruto de intenso processo
de lutas e debate nacional.
21
o
Medida Provisória 813, de 1 de janeiro de 1995.
Para saber mais, Antunes(2005)
23
YAZBEK. Carmelita. Fundamentos históricos e metodológicos do serviço social. In: Direitos
sociais e competências profissionais. Coletânea Cfess.
22
35
A PNAS é aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS),
em 15 de outubro de 2004, expressando a materialidade das diretrizes da Loas.
Como se vê nos princípios da PNAS:
I – Supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as
exigências de rentabilidade econômica;
II – Universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário
da ação assistencial alcançável pelas demais políticas públicas;
III – Respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu
direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como à convivência
familiar e comunitária, vedando-se qualquer comprovação vexatória
de necessidade;
IV – Igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem
discriminação de qualquer natureza, garantindo-se equivalência às
populações urbanas e rurais;
V – divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos
assistências, bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público
e dos critérios para sua concessão. (MDS, 2004, p.25).
Assim como nas diretrizes:
I –- Descentralização político-administrativa para os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios e comando único das ações em cada
esfera de governo, respeitando-se as diferenças e características
socioterritoriais locais;
II – Participação da população, por meio de organizações
representativas, na formulação das políticas e no controle das ações
em todos os níveis;
III – Primazia da responsabilidade do Estado na condução da política
de assistência social em cada esfera de governo;
IV – Centralidade na família para concepção e implementação dos
benefícios, serviços, programas e projetos. (MDS, 2004, p. 26).
Um ano após a aprovação da PNAS, a Norma Operacional Básica do Sistema
Único da Assistência Social (NOB/Suas) é aprovada pela Resolução 130, de 15 de
julho de 2005, do mesmo Conselho – para a implementação do Suas, modelo de
organização da Assistência Social determinado pela PNAS, pela primeira vez na
história do País.
36
As ações da Política de Assistência Social são organizadas por meio
do Suas. O Suas constitui-se na regulação e organização em todo
território nacional dos serviços, programas, projetos e benefícios
socioassistenciais, de caráter continuado ou eventual, executados e
providos por pessoas jurídicas de direito público sob critério universal
e lógica de ação em rede hierarquizada e em articulação com
iniciativas da sociedade civil. Define e organiza os elementos
essenciais e imprescindíveis à execução desta Política,
possibilitando a normatização dos padrões nos serviços, qualidade
no atendimento aos usuários, indicadores de avaliação e resultado,
nomenclatura dos serviços e da rede prestadora de serviços
socioassistenciais. Trata-se de um sistema público não contributivo,
descentralizado e participativo que tem por função a gestão do
conteúdo específico da assistência social no campo da proteção
social brasileira. (MDS,PNAS, 2004).
A PNAS e implementação do
Suas situam o papel da assistência social
dentro do sistema de proteção social, delimitando sua matéria-prima na ambiência
da vulnerabilidade, dos riscos sociais e das violações, seja pelo ciclo de vida,
fragilização dos vínculos ou pelas circunstâncias da vida, e os caminhos para sua
efetivação como política pública, via de acesso aos diretos sociais:
A política de assist ência social assum e a cobertura de
determinadas necessidades sociais, cumprindo o dever
constit ucional de compor o sistema público de seguridade
social, const ituído para segurança social dos cidadãos,
sendo o Estado o provedor de proteções colet ivas e
redutor de r iscos. Opera na pr oteção às vulnerabilidades
próprias do ciclo de vida, proteção às f ragilidades da
convivência f amiliar, proteção à dignidade humana e
combate às suas violações ( MUNIZ et al, 2007, p. 38).
Para se constituir efetivamente como direito de cidadania e responsabilidade
do Estado, e garantidores de políticas universalizantes, no campo da seguridade
social, a PNAS e o Suas trazem profundas alterações em seu bojo, no que diz
respeito às matrizes conceituais e à lógica de gestão.
Sob essa perspectiva, a PNAS objetiva:
•
prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção
social básica e, ou, especial para famílias, indivíduos e grupos que
deles necessitar;
•
contribuir com a inclusão e a eqüidade dos usuários e grupos
específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços sócio assistências básicos e especiais, em áreas urbana e rural;
37
•
assegurar que as ações no âmbito da assistência social
tenham centralidade na família, e que garantam a convivência
familiar e comunitária. (MDS/PNAS, 2004, p. 27).
A PNAS materializa o conteúdo da assistência social como política pública,
explicitando seus princípios, diretrizes, objetivos, hierarquizando as proteções,
trazendo conceitos como vigilância social, de defesa de direitos socioassistenciais e
eixos protetivos.
Os eixos protetivos vão demonstrar onde se particulariza a atenção que deve
ser provida pela assistência social, a partir da realidade e necessidade de proteção:
O paradigma de proteção social (básica e especial) rompe com a
noção dos cidadãos como massa abstrata e os reconstrói a partir da
realidade de suas vidas. Opera a partir de potencialidades, talentos,
desejos, capacidades de cada um dos grupos e segmentos sociais. A
proteção social da assistência social opera sob três situações:
proteção às vulnerabilidades próprias ao ciclo de vida; proteção às
fragilidades da convivência familiar; proteção à dignidade humana e
combate às suas violações.
A proteção social da assistência social tem por primeiro eixo protetivo
a proteção ao ciclo da vida do cidadão, isto é, a oferta de apoios às
fragilidades dos diversos momentos da vida humana, como também
de apoios aos impactos dos eventos humanos que provocam
rupturas e vulnerabilidades sociais. A assistência social, ao ter por
eixo protetivo as fragilidades e vulnerabilidades etárias próprias ao
ciclo da vida, as coloca em diálogo com os direitos de crianças,
adolescentes, jovens e idosos. Opera sob as matrizes dos direitos ao
desenvolvimento humano e a experiência humana.
O segundo eixo protetivo da assistência social decorre do direito à
dignidade humana, expresso pela conquista da eqüidade, isto é, o
respeito à heterogeneidade e à diferença sem discriminação e
apartações. No caso, a ruptura com as discriminações para com
mulheres, índios, afrodescendente, entre outros, é central na
dinâmica dessa política. (SPOSATI, 2007, p. 450).
O Suas, para operacionalizar a gestão da política, consolidou-se como
proteção social, em dois níveis de atenção: Proteção Social Básica (PSB) e
Proteção Social Especial (PSE). Tais funções guardam estreita conexão e
complementaridade entre si, embora cada uma delas se organize a partir de um
conjunto de ações e serviços.
O Suas, pela primeira vez, hierarquiza as proteções sociais. Deixa de
entender assistência social somente como uma área que atua depois
de ocorrida uma situação de risco, uma violência. Introduz-se o
38
conceito preventivo de um trabalho social nessas áreas, polarizadas
pelo Cras por meio de um serviço de Proteção e Atendimento
Integral à Família (Paif). (SPOSATI, 2010, p.7).
A PSB tem caráter preventivo de situações de risco e de processamento de
inclusão social por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o
fortalecimento de vínculos familiares e comunitários.
Prevê o desenvolvimento de serviços, programas e projetos locais de
acolhimento, convivência e socialização de famílias e de indivíduos,
conforme identificação da situação de vulnerabilidade apresentada.
Deverão incluir as pessoas com deficiência e ser organizados em
rede, de modo a inseri-las nas diversas ações ofertadas. Os
benefícios, tanto de prestação continuada como os eventuais
compõem a proteção social básica, dada a natureza de sua
realização. (MDS, 2004).
Os serviços de PSB são realizados sob forma de execução direta, em Centros
de Referência da Assistência Social (Cras), ou de forma indireta, nas entidades e
organizações de Assistência Social, sob a coordenação do órgão gestor.
A PSE volta-se a famílias e indivíduos em situação de risco pessoal ou social,
cujos direitos tenham sido violados ou ameaçados, enfrentando situações de
violência, abuso ou exploração sexual; abandono, rompimento ou fragilização de
vínculos ou afastamento do convívio familiar, entre outras.
Além de privações e diferenciais de acesso a bens e serviços, a
pobreza associada à desigualdade social e a perversa concentração
de renda, revela-se numa dimensão mais complexa: a exclusão
social. O termo exclusão social confunde-se, comumente, como
desigualdade, miséria, indigência, pobreza (relativa ou absoluta),
apartação social, dentre outras. Naturalmente existem diferenças e
semelhanças entre alguns desses conceitos, embora não exista
consenso entre os diversos autores que se dedicam ao tema.
Entretanto, diferentemente de pobreza, miséria, desigualdade e
indigência que são situações, a exclusão social é um processo que
pode levar ao acirramento da desigualdade e da pobreza e, enquanto
tal, apresenta-se heterogênea no tempo e no espaço. (MDS, PNAS,
2004)
A PNAS reforça que o escopo da violação de direitos é oriundo de um
contexto de privação, já “riscos e vulnerabilidades não decorrem de
responsabilidade individual, mas de um conjunto de desigualdades
estruturais, socioeconômicas e políticas e da ausência de proteções
39
sociais” (CEM, 2004, p.12), que acabam, por vezes, induzindo à violação de
direitos de seus membros, e que passam a requerer uma atenção especializada da
política de assistência social.
Esse novo desenho, que articula níveis de complexidade, com escopo de
atuação especificada pela PNAS, provê um conjunto de seguranças, colocando-se
em campos antagônicos a qualquer prática assistencialista ou de tutela, alçando um
patamar de efetiva proteção aos seus usuários da assistência social :
Estar protegido significa ter forças próprias ou de terceiros, que
impeçam que alguma agressão/precarização/privação venha a
ocorrer, deteriorando uma dada condição. Porém, estar protegido
não é uma condição inata, ela é adquirida não como mera
mercadoria, mas pelo desenvolvimento de capacidades e
possibilidades. No caso ter proteção e/ou estar protegido não
significa meramente portar algo, mas ter uma capacidade de
enfrentamento e resistência. Dois campos de forças se apresentam:
um é o campo da agressão, precarização, privação e outro é o
campo da resistência e do enfrentamento. E a política de assistência
social se faz - ou pode se fazer - presente em suas medidas,
dispositivos, atividades, serviços, em ambos os campos de ação,
sem que com isso, seja a única que penetre tais campos. (SPOSATI,
2007, p.17). 24
2.3 Seguranças
Sociais,
Direitos
Socioassistenciais
e
Serviços
Socioassistenciais.
“É preciso um conjunto de ações para garantir um conjunto de
seguranças que se contraponha às incertezas sociais.”
(SPOSATI, 2007, p. 453)
Sob a égide da PNAS, para estar protegido, é preciso que se afiancem
seguranças sociais que iram cubrir, reduzir ou prevenir riscos e vulnerabilidade
(SPOSATI apud COUTO, p.43)25 São elas: segurança de acolhida, da segurança do
24
Texto apresentado por Sposati na VI Conferência Nacional de Assistência Social: Proteção e
Desproteção Social na Perspectiva dos Direitos Socioassistenciais(2007).
25
Utiliza-se aqui o referencial construído no Nepsass/PUC-SP, que inclui segurança na travessia,
excluído pela PNAS.
40
convívio social, da segurança de autonomia/rendimento, da segurança da equidade
e da segurança da travessia.
A segurança da acolhida vai além da provisão habitacional incluindo a
produção de serviços de recuperação, reabilitação e retorno à normalidade do
habitar... oferta de condições que impeçam as pessoas de não ter referência,
endereço, paradeiro e localização, além, é claro, do próprio abrigo.
A segurança de convivência familiar e societária supõe políticas de incentivo e
de criação de recursos, como centros de convivência onde as pessoas com
situações comuns ou diversificadas possam criar laços, encontrar saídas para sua
situação de vida e resguardo para os riscos que têm pela frente.
A segurança de sobrevivência, como explicitado pela PNAS-2004, supõe a
garantia de renda mínima ou de renda cidadã como política de seguridade social,
A defesa da segurança de equidade para apoio às questões discriminatórias
relacionadas a gênero, raça e etnia.
A segurança de travessia visa destacar com a autonomia um “conjunto de
capacitações básicas para que o cidadão possa ter potencializadas suas
capacidades, seu empowerment para confrontar-se com as exigências que lhe são
feitas na vida em sociedade”. (SPOSATI, 2007, p. 455).
A concretude dessas seguranças sociais e seu processamento dar-se-á
através dos direitos socioassistenciais que conformam benefícios e serviços
compondo as provisões ofertadas pelo Suas, reclamáveis ao Estado.
Utiliza-se como referência a definição que Sertório26 (2010) adota em sua
dissertação de mestrado apresentada a PUC-SP,para direitos socioassistenciais:
[...] é a proteção social afiançada pelo Estado ao indivíduo e sua
família em situação de vulnerabilidade e risco social, através da
Política Pública de Assistência Social operacionalizada pelo Suas
(Sistema Único da Assistência Social), por meio dos serviços
socioassistenciais, especialmente os Cras e Creas, com
assentamento legal na CF/88 (art.203 e 204) e na Loas.
Os direitos socioassistenciais foram aprovados na V Conferência Nacional de
Assistência Social, realizada em dezembro de 2005:
26
Um estudo sobre a implantação da proteção social especial de média complexidade:
contribuição a efetividade do Suas. 2002/2010.Dissertação (Mestrado)- Pontifícia Universidade
Católica (PUC-SP), Campinas/SP, 2010.
41
1.
Todos os direitos de proteção social de assistência social
consagrados em lei para todos: Direito, de todos e todas, a usufruir
os direitos assegurados pelo ordenamento jurídico brasileiro à
proteção social não contributiva de assistência social efetiva com
dignidade e respeito.
2.
Direito à eqüidade rural-urbana na proteção social não
contributiva: direito, do cidadão e cidadã, ao acesso às proteções
básica e especial da política de assistência social, operadas de modo
articulado para garantir completude de atenção no meio rural e no
urbano.
3.
Direito à equidade social e de manifestação pública: direito, do
cidadão e da cidadã, de manifestar-se, exercer protagonismo e
controle social na política de assistência social, sem sofrer
discriminações, restrições ou atitudes vexatórias derivadas do nível
pessoal de instrução formal, etnia, raça, cultura, credo, idade,
gênero, limitações pessoais.
4.
Direito à igualdade, do cidadão e cidadã, de acesso à rede
socioassistencial: direito à igualdade e completude de acesso nas
atenções da rede socioassistencial, direta e conveniada, sem
discriminação ou tutela, com oportunidades para a construção da
autonomia pessoal dentro das possibilidades e limites de cada um.
5.
Direito do usuário à acessibilidade, qualidade e continuidade:
direito, do usuário e usuária, à rede socioassistencial, à escuta, ao
acolhimento e de ser protagonista na construção de respostas
dignas, claras e elucidativas, ofertadas por serviços de ação
continuada, localizados próximos à sua moradia, operados por
profissionais qualificados, capacitados e permanentes, em espaços
com infra-estrutura adequada e acessibilidade, que garantam
atendimento privativo, inclusive para os usuários com deficiência e
para os idosos.
6.
Direito de ter garantida à convivência familiar, comunitária e
social: direito, do usuário e usuária, em todas as etapas do ciclo da
vida, a ter valorizada a possibilidade de se manter sob convívio
familiar, quer seja na família biológica ou construída, e à precedência
do convívio social e comunitário às soluções institucionalizadas.
7.
Direito à proteção social por meio da intersetorialidade das
políticas públicas: direito, do cidadão e cidadã, à melhor qualidade de
vida garantida pela articulação intersetorial da política de assistência
social com outras políticas públicas, para que alcancem moradia
digna, trabalho, cuidados de saúde, acesso à educação, à cultura, ao
42
esporte e lazer, à segurança alimentar, à segurança pública, à
preservação do meio ambiente, à infra-estrutura urbana e rural, ao
crédito bancário, à documentação civil e ao desenvolvimento
sustentável.
8.
Direito à renda: direito, do cidadão e cidadã e do povo
indígena, à renda individual e familiar, assegurada através de
programas e projetos intersetoriais de inclusão produtiva,
associativismo e cooperativismo, que assegurem a inserção ou
reinserção no mercado de trabalho, no meio rural e urbano.
9.
Direito ao co-financiamento da proteção social não contributiva:
direito, do usuário e usuária da rede socioassistencial, a ter garantido
o co-financiamento estatal, federal, estadual, municipal e do Distrito
Federal para operação integral, profissional, contínua e sistêmica da
rede sócio-assistencial no meio urbano e rural.
10. Direito ao controle social e defesa dos direitos
socioassistenciais: direito, do cidadão e cidadã, a ser informado de
forma pública, individual e coletiva, sobre as ofertas da rede
socioassistencial, seu modo de gestão e financiamento e sobre os
direitos socioassistenciais, os modos e instâncias para defendê-los e
exercer o controle social, respeitados os aspectos da individualidade
humana, como a intimidade e a privacidade.
A garantia de acesso aos direitos socioassistenciais pode se dar pelos
serviços socioassistenciais, que devem oferecer respostas de responsabilidade do
Estado, por ente público ou privado, através de um conjunto de atividades de caráter
continuado. Não devem ser também confundidos com programas, de caráter
completar, ou projetos, com duração determinada.
O serviço compreende um conjunto de atividades que, por sua vez,
se desdobram em atos profissionais - que agregam competências
técnicas e especialidades - e que são organizados para atingir um
fim. Assim, a atividade é uma unidade menor, mais específica do que
o serviço e nele está contida. Os serviços socioassistenciais ofertam
apoios, atenções e cuidados que garantem aquisições ao cidadão,
não apenas materiais e institucionais como também sociais e
socioeducativas. (MUNIZ et al, 2007, p.40).
Os serviços devem oferecer um padrão de atenção e, para tal, em 2009,
foram normatizados pela Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais,
demarcando o campo de atuação da assistência social.
43
Essa padronização não se reduz a mera homegeinização, mas diz respeito à
qualidade da oferta dos serviços em todo o território nacional, para transformar um
conjunto disperso de ações em serviços socioassistenciais.
Nesse sentido, é preciso pensar em estratégias de consolidação desses
direitos e sua processualidade. Para Sposati (2009, p. 42)27, “os direitos
socioassistenciais ainda permanecem no campo das ideias, sem uma legislação que
abrigue sua aplicação e a instauração de uma processualidade jurídica quando de
sua infringência”.
Deste modo, os frutos mais recentes da assistência como política pública,
advindos da
aprovação da PNAS, em 2004, o Suas, em 2005, a
Nacional de Serviços
Socioassistenciais
em 2009, e a Lei
Tipificação
12.465, em 2011,
trazem em seu bojo grandes desafios para sua processualidade: “[...] os novos
marcos regulatórios da assistência social [...] introduziram significativas inflexões
neste campo, entre elas a exigência de novos modos de organização e gestão do
trabalho [...]”. (COUTO, YAZBEK, SILVA e SILVA e RAICHELIS, 2010, p. 57).
Como se vê, esses desafios dizem respeito a novos conceitos, novas formas
de organização e de arquitetura da política, que subverteram a lógica da filantropia e
da caridade, demandando um processo de ressignificação da assistência social e
das competências perante as novas exigências profissionais
dos trabalhadores
nesse campo.
Diante do reconhecimento da extensão dos avanços históricos colocados não
só na PNAS mas nos marcos regulatórios que a sucederam, entende-se que só
saindo do campo de operação para o campo da
práxis com direção social da
política de assistência social como direito que ela se efetivará como tal.
No capítulo a seguir, trata-se especificamente de alguns dos desafios
colocados para a PSE.
27
SPOSATI, Aldaíza. Modelo brasileiro de proteção social não contributiva - concepções
fundantes.
44
CAPÍTULO III – A AMBIÊNCIA DA VIOLAÇÃO DE DIREITOS NA PNAS – PSE
3.1 Caracterização da Proteção Social Especial
Como visto, a PSE volta-se a famílias e indivíduos em situação de risco
pessoal ou social, cujos direitos tenham sido violados ou ameaçados, enfrentando
situações de violência física ou psicológica, abuso ou exploração sexual;
negligência, tráfico de pessoas, abandono, situação de rua, trabalho infantil,
rompimento ou fragilização de vínculos ou afastamento do convívio familiar, entre
outras.
Para a atenção a essas situações, os serviços de PSE são diferenciados
entre média e alta complexidade, sendo que ambos com vistas à violação de
direitos. Contudo, a alta complexidade caracteriza-se pelo atendimento de situações
em que haja o rompimento dos laços familiares e comunitários.
O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS, 2011)
distingue os níveis de complexidade e detalha a competência de cada um deles:
Diferentemente da Proteção Social Básica que tem um caráter
preventivo, a PSE atua com natureza protetiva. São ações que
requerem o acompanhamento familiar e individual e maior
flexibilidade nas soluções. Comportam encaminhamentos efetivos e
monitorados, apoios e processos que assegurem qualidade na
atenção...( Disponível em: <www.mds.gov.br>
A PSE de Média Complexidade:
[...] oferta atendimento especializado a famílias e indivíduos que
vivenciam situações de vulnerabilidade, com direitos violados,
geralmente inseridos no núcleo familiar. A convivência familiar está
mantida, embora os vínculos possam estar fragilizados ou até
mesmo ameaçados. Estes serviços demandam maior especialização
no acompanhamento familiar e maior flexibilidade nas soluções
protetivas. Requerem, ainda, intensa articulação em rede para
assegurar efetividade no atendimento às demandas da família e sua
inserção em uma rede de proteção necessária para a potencialização
das possibilidades de superação da situação vivida. (MDS, 2011.
Disponível em: <www.mds.gov.br>.
45
Para os serviços de PSE de Alta Complexidade,
[...] oferecem atendimento às famílias e indivíduos que se encontram
em situação de abandono, ameaça ou violação de direitos,
necessitando de acolhimento provisório, fora de seu núcleo familiar
de origem.
Esses serviços visam a garantir proteção integral a indivíduos ou
famílias em situação de risco pessoal e social, com vínculos
familiares rompidos ou extremamente fragilizados, por meio de
serviços que garantam o acolhimento em ambiente com estrutura
física adequada, oferecendo condições de moradia, higiene,
salubridade, segurança, acessibilidade e privacidade. Os serviços
também devem assegurar o fortalecimento dos vínculos familiares
e/ou comunitários e o desenvolvimento da autonomia dos usuários.
(MDS, 2011, Disponível em: <www.mds.gov.br>.
A PSE constitui-se de serviços, programas e projetos especializados, nesses
níveis de complexidade, que demandam uma estrutura técnico-operativa e
competências compatíveis com a complexidade da demanda, tanto por parte dos
técnicos quanto dos gestores, para atenção no âmbito do risco e da violação de
direitos:
A Proteção Social Especial (PSE) organiza a oferta de serviços,
programas e projetos de caráter especializado, que tem por objetivo
contribuir para a reconstrução de vínculos familiares e comunitários,
o fortalecimento de potencialidades e aquisições e a proteção de
famílias e indivíduos para o enfrentamento das situações de risco
pessoal e social, por violação de direitos. Na organização das ações
de PSE é preciso entender que o contexto socioeconômico, político,
histórico e cultural pode incidir sobre as relações familiares,
comunitárias e sociais, gerando conflitos, tensões e rupturas,
demandando, assim, trabalho social especializado. (CREAS, 2011,
p.18).
Os serviços de PSE devem ser ofertados no Creas:
[...] é a unidade pública estatal que oferta serviços da proteção
especial, especializados e continuados, gratuitamente a famílias e
indivíduos em situação de ameaça ou violação de direitos. Além da
oferta de atenção especializada, o Creas tem o papel de coordenar e
fortalecer a articulação dos serviços com a rede de assistência social
e as demais políticas públicas. (CREAS, 2011, p.18).
Segundo as orientações técnicas para o Creas:
46
Alguns grupos são particularmente vulneráveis à vivência destas
situações, tais como crianças, adolescentes, idosos, pessoas com
deficiência, populações LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e
transexuais), mulheres e suas famílias. (MDS, 2011. Disponível em:
<www.mds.gov.br>.
No
Creas,
está
previsto,
pela
Tipificação
Nacional
dos
Serviços
Socioassistenciais (2009), os serviços de proteção especializada aos indivíduos e
famílias (Paefi), de proteção social a adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de Liberdade Assistida (LA)
e de Prestação de Serviços à
Comunidade (PSC), Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com
Deficiência, Idosas e suas Famílias; Serviço Especializado para Pessoas em
Situação de Rua.
O papel do Creas no Suas define suas competências que, de modo
geral, compreendem:continuado para famílias e indivíduos em
situação de risco pessoal e social, por violação de direitos, conforme
dispõe
a
Tipificação
Nacional
de
Serviços
Socioassistenciais;coordenação técnica e administrativa da equipe, o
planejamento,monitoramento e avaliação das ações, a organização e
execução direta do trabalho social no âmbito dos serviços ofertados,
o relacionamento cotidiano com a rede e o registro de informações,
sem prejuízo das competências do órgão gestor de assistência social
em relação à Unidade. (ORIENTAÇÕES TÉCNICAS: CREAS, 2011,
p. 23).
Já nos serviços de PSE de Alta Complexidade estão previstos: Serviço de
Acolhimento Institucional nas modalidades abrigo institucional; Casa-Lar; Casa de
Passagem; Residência Inclusiva, Serviço de Acolhimento em República; Serviço de
Acolhimento em Família Acolhedora; Serviço de Proteção em Situações de
Calamidades Públicas e de Emergências.
A Proteção Social Especial de Alta Complexidade, por sua vez, tem
como o objetivo ofertar serviços especializados, em diferentes
modalidades e equipamentos, com vistas a afiançar segurança de
acolhida a indivíduos e/ou famílias afastados temporariamente do
núcleo familiar e/ou comunitários de origem. Para a sua oferta, devese assegurar proteção integral aos sujeitos atendidos, garantindo
atendimento personalizado e em pequenos grupos, com respeito às
diversidades (ciclos de vida, arranjos familiares, raça/ etnia, religião,
gênero e orientação sexual). Tais serviços devem primar pela
preservação, fortalecimento ou resgate da convivência familiar e
comunitária - ou construção de novas referências, quando for o caso
- adotando, para tanto, metodologias de atendimento e
47
acompanhamento condizente com esta finalidade. (CREAS, 2011, p.
21).
Os serviços da PSE de média e de alta complexidade requisitam
especializações, estudos qualificados e acompanhamentos continuados, articulação
da rede, principalmente com o Sistema de Garantia de Direitos (SGD) e, para tal,
conhecimento das leis e normativas que fundamentam não só a política mas o
conjunto de defesas construídos historicamente, diante da complexidade em que as
situações se apresentam.
Alguns eixos são apontados para nortear o trabalho (ORIENTAÇÕES
TÉCNICAS: CREAS, 2011, p.26): “atenção especializada e qualificação do
atendimento;
território
e
localização;
acesso
a
direitos
socioassistenciais;
centralidade na família; mobilização e participação social; e trabalho em rede”.
Sobre a necessidade de qualificação no atendimento ressalta aspectos
importantes:
As situações vivenciadas pelas famílias e indivíduos atendidos no
CREAS podem ter repercussões diferenciadas, que podem ser
agravadas ou não em função de diversos aspectos (contexto de vida,
acesso à rede e direitos, ciclo de vida, deficiência, rede social de
apoio, gênero, orientação sexual, deficiência, uso, abuso ou
dependência de álcool ou outras drogas, condições materiais, etc).
Isso implica reconhecer que, diante das situações vivenciadas, cada
família/indivíduo atendido no CREAS demandará um conjunto de
atenções específicas, de acordo com suas singularidades, o que
deverá orientar a construção do Plano de Acompanhamento
Individual e/ou Familiar. (ORIENTAÇÕES TÉCNICASCREAS, 2011,
p. 26).
Ainda a centralidade da família na PSE como lócus privilegiado de atenção
calcado na matricialidade sociofamiliar “permite compreender a gênese e os
impactos das situações de risco pessoal e social, por violação de direitos, e as
dificuldades de exercício das funções de proteção, cuidado, socialização,
protagonismo e participação” (CREAS, 2011, p.19), No entanto, também vai
requerer olhar despido de preconceitos e provido de capacidade crítica para
entender a heterogeneidade das famílias, como se tratará mais à frente.
Dentro dessa ambiência de risco e violações de direitos da PSE, destacam-se
algumas questões que chamam à reflexão.
48
3.2 Alguns Desafios Postos à Proteção Social Especial
Percebe-se que, a partir do redesenho da PNAS, em 2004, em dois níveis de
atenção, PSB e PSE, esta última pouco recebeu de aprofundamento e
sistematização.
Antes de mais nada, para abordar a PSE é preciso assumir como verdade
que “este nível de complexidade carece de atenção e maturação”, como afirma
Couto (2010,p.252).
Os estudos sobre a violação de direitos apresentam-se, em sua quase
totalidade, de forma segmentada em temáticas: violência, população de rua,
adolescente em medidas de abrigamento, entre outras.
Essa segmentação, reflete
o que se delineou na história da política de
assistência social, já que a lógica de atendimento das demandas hoje atendidas na
PSE era pautada numa estrutura de programas por segmentos, como, por exemplo,
o Programa de Combate ao Abuso e Exploração Sexual (Sentinela) e Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), e por entidades privadas.
Nesse sentido, os estudos não demostram acompanhar o mesmo
amadurecimento da política, como nível de proteção social, que aglutina
especificidades, na ambiência da atenção ao risco e da violação de direitos, como é
preconizado pelo Suas.
Não foram localizados espaços de discussão e produção bibliográfica
voltados para a apreensão da função protetiva da PSE e seu papel restaurador em
face da violação de direitos, e ao risco, e suas atribuições de restauração de
vínculos,
prevenção
dos
agravos,
defesa
de
direitos,
fortalecimento
das
potencialidades e aquisições e proteção a famílias e indivíduos.
Assim como não acessamos problematizações consistentes sobre questões
como: as novas requisições da média e alta complexidade e, com isso, as novas
exigências profissionais, as dificuldades concretas do PSE e o reordenamento
institucional, dos novos serviços socioassistenciais, que constituem a única via de
acesso para os direitos socioassistenciais na PSE, as múltiplas determinações do
Paefi, e a dimensão na política e operativa da PSE na assistência social.
Tampouco sobre a herança de práticas conservadoras de serviços que foram
reordenados na PSE, de práticas ainda carregadas de assistencialismo que não
fizeram o trânsito para a política de assistência colocada hoje.
49
Não encontrou-se aporte para as discussões, nesse nível de complexidade,
da articulação em rede e intersetorialidade, principalmente com a PSB, relação
com a Justiça,
metodologias de trabalho com famílias na proteção especial
e
ocultamento do usuário nesse nível de complexidade.
Essas questões tem nos mobilizado e convocado a uma reflexão, pois tem
sido latentes no cotidiano profissional, principalmente para quem está trabalhando
nesse nível de atenção, no âmbito do Suas, vivenciando os dilemas e desafios da
PSE.
Por outro lado, entende-se que há um tempo histórico para a maturação de
forma que se acumule conhecimento e que se criem referências, já que a PNAS tem
apenas oito anos e, a tipificação, quatro anos.
No entanto, é importante que se caracterize a PSE, decodificando quais as
seguranças sociais que devem ser afiançadas, estabelecendo mediações para
apreender qual a especificidade de sua função protetiva.
Ou seja, que conjunto de seguranças sociais, dentre as existentes como
segurança de acolhida, da segurança do convívio social, da segurança de
autonomia/rendimento, da segurança da equidade e da segurança da travessia,
devem ser dispostas para o significado de “estar protegido”, no enfrentamento ao
risco e à violação de direitos na PSE.
Concomitante a isso, o que se chama aqui de dilemas e desafios da PSE
deve ser problematizado e as questões que vêm demandado um aprofundamento na
PSE devem ser enfrentadas.
A ausência dessas mediações no cotidiano profissional tem gerado
insegurança ao trabalhadores e, muitas vezes, impedido que os serviços ganhem a
concretude necessária para atender à violação de direitos na política, dentro de um
padrão de qualidade e de diretrizes comuns, embora as bases estejam colocadas
na PNAS e na tipificação para tal.
Assim, será possível minimizar as inquietudes dos sujeitos com o “novo” da
política de assistência e garantir a incorporação dos novos preceitos e melhorar a
atenção prestada a questões tão complexas postas no cotidiano da PSE.
Uma das questões que merece destaque são os serviços, que se
constituem como a única via de acesso para os Direitos Socioassistenciais na
PSE.
50
Nesse nível de proteção, não há remuneração e nem condicionalidades, já
que os benefícios que exigem o corte de renda estão na PSB.
A PSE é constituída por serviços, o que a particulariza. Assim, a discussão da
PSE passa necessariamente pelos Serviços Socioassistenciais.
Entende-se que é pelos serviços que a assistência social pode operar a sua
universalização a todos que apresentam necessidades, pois independe do corte de
renda.
No entanto, percebe-se que os serviços ainda não ganharam a importância e
visibilidade necessárias em relação aos benefícios, em face da sua representação
na política de assistência social. “A proteção social não é obtida apenas da
substituição da renda. Ela exige cuidados, restaurações e aquisições pessoais.
Esses acessos só ocorrem por meio dos serviços.” (SPOSATI, 2009, p.10 ).28
Os serviços são lócus para a garantia de direitos, na política de assistência
social, aqui tratados na sua relação com os benefícios, pelo que representam dentro
da política de assistência social e na sua importância para o usuário da política.
Parte-se da hipótese de que o motivo pelo qual a abordagem marginal dos
serviços em relação aos benefícios é porque eram, em sua maioria, até serem
tipificados, prestados por entidades não governamentais.
A conjuntura política e a necessidade histórica clamavam pelo fortalecimento
da dimensão pública estatal, e os serviços anteriormente não eram
assumidos
como dever do Estado.
A partir da violação dos direitos, e do lócus que se estabelece a concretude de
sua atenção, pode-se entender que se lê a política de assistência social de forma
reducionista, quando se olha para todo um sistema somente através dos benefícios
e não dos serviços.
A violação de direitos acentua-se numa condição de desigualdade
socioeconômica mas não é só pelas privações socioeconômicas, que ela se define,
mas também por circunstâncias relacionais.
Ou seja, a violação de direitos, embora acirrada pelo recorte de classes, não
precede dele, mostrando com mais precisão que o pobre e a pobreza não definem a
política de assistência social, mais uma vez os reportando à especificidade da
assistência social.
28
Texto-base originalmente publicado na Revista Le Monde Diplomatique, janeiro de 2009.
(Disponível em: <http://www.polis.org.br/utilitarios/editor2.0/UserFiles/File/12-13.aldaiza.pdf>.
51
Efetivamente, o poder público tem sido reconhecido na assistência como
operador de benefícios. Isso posto, os benefícios vêm tomando
uma dimensão
maior que o serviço, na compreensão do que é assistência social.
Como a PSE caracteriza-se pelos serviços, esse cenário demonstra, mais
uma vez, sua face inexplorada.
Em relação aos benefícios, críticas os consideram residuais, compensatórios.
Outro campo de análise redistributivo e necessário ao sistema de proteção social,
onde nos localizamos. Entende-se que os benefícios compõem com os serviços um
conjunto de provisões, no campo da política de assistência social.
Não se apreende os benefícios de nenhuma maneira como compensatórios
e/ou conservadores. Quando se depara com tais análises, tem-se a clareza de que
cabe à distribuição de renda superar as desigualdades socioeconômicas, e não aos
benefícios, e o erro histórico de apreensão e desqualificação do direito à assistência
social enquanto política pública.
Contudo, os benefícios não serão objeto de nosso estudo, mas vale demarcar
posição, principalmente para aqueles que tratam a política de assistência social
como secundária:
Analistas progressistas reagem negativamente a esse alargamento
da proteção social taxando-o de assistencialista, sem esclarecer se
tal adjetivo advém da sua vinculação com a assistência social ou
pelo fato de seu acesso não ser de caráter securitário, embora
indiretamente contributivo. Alguns afirmam que se trata de medida
neoliberal difundida pelo Banco Mundial para fortalecer a alternativa
da previdência privada. Pelo regime de capitalização individual,
caberia ao Estado apenas os benefícios assistenciais voltados “aos
mais pobres”. A presença de benefícios socioassistenciais pautados
na proteção da cidadania, mesmo ao lado da previdência pública
brasileira, seria, para esses “progressistas”, uma manifestação
neoliberal de “assistencialização” da previdência social. Por esse
modo restrito de entender a complexa realidade brasileira, termina
por defender a máxima da formiga29. A consolidação e, consequente
expansão, da política de assistência social seria uma ameaça à
previdência social. (SPOSATI, 2009, p.10-11).
29
Definições do texto original publicado no Le Monde Diplomatique: “Vence a máxima da “formiga”. O
trabalho com “carteira assinada” e contributivo não só é vencedor, mas é aniquilador das condições
de vida da “cigarra”. A informalidade de seu trabalho, embora tivesse alegrado o ambiente com
música e canto, foi considerada como “inútil” à produção de commodities. Que morra de frio ou de
fome!” ( SPOSATI, 2009, p.3).
52
Isso posto, não se pode deixar de apontar a contradição de compreender a
assistência social como mera expressão do conservadorismo e da manutenção de
exploração do capital, já que se propõe a proteger os cidadãos, independentemente
de sua contribuição, como preconiza o modelo bismarkiano,
e não somente para
os inseridos no mercado formal - as ditas formigas.
Ainda, os rearranjos do capital recente vêm impactando sobremaneira a
classe que vive do trabalho30 e as seguranças sociais afiançadas pela assistência
social, seja pelos benefícios, ou serviços, têm provido acessos indispensáveis à
dignidade humana.
Outra questão refere-se ao lugar onde se afiançariam as seguranças sociais
necessárias a quem tem direitos violados, quando não se considera a dimensão dos
serviços?
Esse reducionismo analítico, além de desqualificar a política, pela visão
genérica de assistência através dos benefícios, vem demonstrando a dimensão que
secundariza os serviços, mesmo que sejam a grande massa de trabalho da
assistência social, onde se materializa o direito, numa perspectiva universalizante.
É nesse lócus que a assistência social explicita sua heterogeneidade, pois a
aplicabilidade dos benefícios é homogênea; é nos serviços que a assistência se
diferencia se especifica, se regionaliza e se universaliza.
Nesse sentido, é necessário trazer os holofotes para os serviços
socioassistenciais, ampliar a discussão sobre sua importância e efetiva implantação,
dirimindo e potencializando sua capacidade operativa e protetiva, sempre em face
da desproteção do estado e da violação de direitos.
Outro tema que vem chamando nossa atenção é o ocultamento do usuário
da proteção especial.
Embora seja na PSE que, de forma mais contundente, a assistência social
tem a capacidade reveladora de colocar luz em ângulos esquecidos ou que ninguém
quer ver – como da violência intrafamiliar; do abuso sexual a crianças e
adolescentes; dos idosos negligenciados por suas famílias; de crianças trabalhando
arduamente para prover sustentos; de meninos que cometem pequenos furtos; de
gente vivendo na rua, comendo lixo e sendo tratadas como tal; da intolerância por
30
Adotaremos como referencial a definição de classe-que-vive-do-trabalho trabalhada por Antunes no
conjunto de sua obra, que compreende “totalidade dos assalariados, homens e mulheres que vivem
da venda de sua força de trabalho e que são despossuídos dos meios de produção”.
53
causa de raça ou orientação sexual; a assistência social não tem revelado quem são
esses sujeitos de direitos.
Por motivos diversos, esses sujeitos não têm se revelado: o fato é que o
usuário da especial nos parece o maior ausente do processo de construção da
política, o que certamente despolitiza a discussão da política e de seus paradigmas.
Já que essa é uma perspectiva que foi reforçada na construção da PNAS e
vem sendo valorizada e emerge de estratégias para o fortalecimento e protagonismo
dos usuários e, concomitantemente, para o controle social do poder público.
Não é de hoje a escassa presença dos usuários na política de assistência
social e a equivocada compreensão do que lhes é de direito, este parece ser um
grande desafio a ser enfrentado na consolidação do Suas.
Outra questão que trabalhamos como hipótese é o constrangimento que
permeia a violação de direito por parte do usuário. Muitas vezes, esse usuário não
quer se expor, por receio da
sua condição individual. Cabe um trabalho social
consistente, reforçando o papel do usuário como sujeito coletivo31, incentivando a
participação social.
E nos remete a uma questão importante, sobre qual é o trabalho
desenvolvido na PSE em relação à participação e protagonismo dos usuários e
questionamos se esta dimensão foi incorporada no cotidiano profissional, uma vez
que o controle social constitui-se não só numa prerrogativa do Suas como num
importante instrumento para o conhecimento e a defesa coletiva de direitos e, por
conseguinte, para o exercício do protagonismo dos usuários
Como é destacado nas orientações técnicas do Creas (2011, p.36), existem
algumas possibilidades de “participarem e/ou organizarem associações, movimentos
sociais e populares, comissões locais; de participação nas instâncias de controle
social, como conselhos de direito e de políticas públicas, que são importantes
espaços de decisão e deliberação”.
Além desses, os espaços de conferências, fóruns, audiências públicas e
composição de mecanismos de vigilância social.
É preciso, ainda, que se centrem esforços na implantação das ouvidorias
públicas, o que não vem ocorrendo, como um espaço valioso de interlocução com o
31
MARTINELLI, Maria Lúcia.
contemporâneos. p.3.
O serviço social e a consolidação de direitos: desafios
54
usuário do serviço para abarcar a voz e a vez desse usuário e que ele possa
reivindicar o direito à assistência social.
Outro aspecto importante, é romper com a prática de se “falar pelo usuário”,
tão comumente encontrada em alguns conselhos de direitos, reforçando o papel de
subalternidade dos usuários.
Ainda como temos como perspectiva romper com a velha assistência social,
ficar atento às novas formas de coronelismo e clientelismo que estão postas nos
dias atuais, combatendo práticas nas quais os usuários são feitos de fantoches de
currais eleitorais, passando ao largo da representatividade da população prevista no
Suas.
É necessário que se criem estratégias para envolver o usuário da PSE como
sujeitos políticos, assim como para aferir a qualidade dos serviços e refletir sobre
como a assistência social se configura para o usuário. “É no âmbito destas práticas
de resistência e luta que se instituem os sujeitos políticos capazes de expressarem
suas demandas e colocá-las na pauta dos debates contemporâneos.” (MARTINELLI
apud EGLI et al, 2007, p.37 ).
Outro desafio identificado na arquitetura de um sistema único que deve
funcionar integrado para garantir a proteção aos seus usuários, é a necessidade de
articulação em rede e a intersetorialidade, sobretudo nos serviços ofertados pela
PSE.
Diante da complexidade das situações postas à PSE, práticas que
obstaculizam a integralidade podem impedir que sejam afiançadas as seguranças
sociais necessárias nos casos de violação de direitos por ocorrência do risco.
Na PSE, essa articulação em rede deve se dar em diversas esferas. Citamse, aqui, somente alguns exemplos, para ilustrar onde ela impera necessariamente:
Em algumas situações atendidas pelo Paefi/Média Complexidade e no
acolhimento institucional de criança e adolescente/Alta Complexidade com SGD, nas
situações de violência sexual/Paefi/Média Complexidade com a política de saúde,
no serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de MSC/LA com
programas e projetos de preparação para o trabalho e inclusão produtiva e acesso à
educação, nas Instituições de Longa Permanência de idosos/Alta Complexidade
com a política de saúde.
55
Nesse sentido, práticas fragmentadas, desarticuladas e descontínuas são
antagônicas à possibilidade de superação da violação e seus agravos e de proteção
integral.
[...] o trabalho em rede pode ser compreendido como: um processo
que cria e mantém conexões entre diferentes organizações, a partir
da compreensão do seu funcionamento, dinâmicas e papel
desempenhado, de modo a coordenar interesses distintos e
fortalecer os comuns. (MDS, 2009, p.21).
Nesse âmbito, destaca-se o distanciamento que vem ocorrendo entre a PSB e
a PSE, que muitas vezes se consolidam como práticas estanques e dissociadas de
trabalho.
[...] a instalação dos Cras e Creas é estratégica para organizar e
qualificar a rede socioassistencial e potencializar os seus resultados.
Nesse processo a construção de fluxos e conexões e apontada como
requisitivo e como tarefa a ser desenvolvida com prioridade, de forma
a construir competência e mobilidade dos usuários no sistema , sem
promover encaminhamentos e esforços desnecessários de baixa
resolutividade e com grande desgaste para os mesmos. (COUTO et
al, 2010, p.187).
A política aponta para a integralidade entre as proteções, assim como as
orientações técnicas,
aos serviços para esses níveis de complexidade,
que
reforçam a necessidade de articulação para a proteção integral. A tipificação dos
serviços socioassistenciais inclusive padroniza essa necessidade de articulação:
[...] sinaliza a completude da atenção hierarquizada em serviços de
vigilância social, defesa de direitos e proteção básica e especial da
assistência e dos serviços de outras políticas públicas e de
organizações privadas.Indica a conexão de cada serviço com outros
serviços, programa, projetos e organizações do Poder Executivo e
Judiciário e organizações não governamentais. (MDS,TNSS,2009)_
Muitas vezes, o que vem se estabelecendo são estruturas setorizadas, de
caráter isolado, em que a tônica da discussão de rede é apenas em qual serviço a
família deve ser referenciada, se é Cras ou Creas, se é risco ou não, como se não
houvesse a premissa na assistência de um trabalho articulado com vistas à proteção
integral.
56
Por outro lado, trabalha-se com a hipótese de que um dos motivos que
restringe a discussão ao lócus de atendimento são as próprias estruturas deficitárias
dos serviços, em seus quadros mínimos, e falta de capacitação dos gestores e das
equipes, que acabam propiciando uma perversa disputa às avessas por “menos
trabalho”, onde a atenção ao usuário fica em segundo plano.
Como sistema único, aponta-se a necessidade de aprofundar o diálogo entre
os níveis de complexidade para estabelecimento de articulação, fluxo, contrafluxo,
reciprocidade entre básica e especial.
Outra possibilidade, é reforçar a articulação em rede pelos Planos Individuais
de Atendimento (PIAS) e
Planos de Atendimento Familiar (PAFs), importantes
ferramentas que vêm sendo utilizadas hoje para a construção da proposta de
atendimento com o usuário, e que também pode ser utilizada para direcionar e
pactuar objetivos comuns entre a rede.
Uma questão é se as famílias que são atendidas pelo Creas, e estão em
busca de um serviço especializado, não deveriam estar todas referenciadas no Cras,
para compor um atendimento integral.
Entende-se que a complexidade do fenômeno da violação de direitos, por si
só, já evidencia a importância do desenvolvimento de ações conjuntas, fundadas na
intersetorialidade, pela articulação de saberes técnicos, da integração de agendas
coletivas e de compartilhar objetivos comuns, enfrentando os desafios para superar
a fragmentação, e a articulação das políticas públicas e de definição de fluxos e
papéis.
Outro aspecto, é a importância de “assumir coletivamente os riscos” para
consolidar a assistência social como política pública não só da porta para fora mas
entre os seus níveis hierárquicos de proteção.
Para enfrentar problemas tão complexos, na PSE, parece valer a máxima de
Simone de Beauvoir “Não há nada em meu caminho que não passe pelo caminho do
outro”.
Trabalhar na PSE pressupõe a dimensão e o conceito de multidisciplinar e de
intersetorialidade. Contudo, é necessário ter clareza do trabalho essencial para não
virar um balcão de encaminhamentos.
Sposati (2009, p. 37) nos chama a atenção para a intersetorialidade:
57
A intersetorialidade é tão substantiva para a assistência social como
o é para as demais políticas ao se considerar que nenhuma delas
guarda resolutividade plena em si mesma. Deve ser construída uma
relação de complementariedade entre as políticas. O modelo de
intersetorialidade de resposta é indicado como de melhor efetividade
para qualquer política social. A caracterização de setorialidade da
assistência social não é nem a negação da intersetorialidade nem a
onipotência da assistência social. Aliás, a versão da onipotência
tende a ser segregadora. Existem aquelas que consideram que cabe
à assistência social resolver toda e qualquer necessidade dos pobres
ou dos mais pobres. A intersetorialidade é para além de um princípio
um modelo de gestão que supõe o entendimento do princípio da
convergência da ação.32
No caso de situações tão complexas, como postas no cotidiano da PSE,
agregar políticas públicas em torno de um objetivo comum deve prevalecer na
atenção ao risco e à violação de direitos pela própria incompletude institucional,
pois, como refere Sposati (2009, p.37 ), a “onipotência tende a ser segregadora”.
Constitui-se numa das articulações mais importantes na ambiência do risco e
da violação de direitos: a articulação com o SGD.
É na Proteção Especial que se dá a construção do campo jurídico social na
assistência social, uma vez que os serviços da PSE devem funcionar em estreita
articulação com o Poder Judiciário, Ministério Público, a Defensoria Pública, os
Conselhos Tutelares e outras Organizações de Defesa de Direitos, com os demais
serviços socioassistenciais e demais políticas públicas, no intuito de estruturar uma
rede efetiva de proteção social.
A estreita relação da PSE com o campo jurídico materializa-se nas Medidas
Socioeducativas de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à
Comunidade (PSC); Audiências Concentradas, Acolhimento Institucional, Famílias
Acolhedoras e Famílias Guardiãs, no ciclo da violência, nos conflitos com a polícia,
com a justiça e com a família, entre outros.
Aqui se apresenta um papel de extrema importância da PSE na política de
assistência social, que é convocada a se pronunciar sobre as situações que tem
interface com o SGD, constituindo-se em
mediação privilegiada na garantia de
direitos sociais.
Muitas vezes, cabe, aos serviços da PSE, o encaminhamento, ao SGD, de
relatórios sobre o atendimento e acompanhamento às famílias e aos indivíduos.
Baseados nessas comunicações e estudos, decisões judiciais são tomadas em
32
Modelo Brasileiro de Proteção Social – Concepções Fundantes.
58
direção da garantia de direitos, ou não, demonstrando a amplitude do papel do
Creas na rede socioassistencial.
Nesse sentido, é importante observar a sua função protetiva que não pode ser
confundida com a de órgãos do sistema de defesa e responsabilização, a exemplo
de delegacias e órgãos do Poder Judiciário.
Chama-se a atenção para a importância do Creas no SGD como serviço
decisivo na garantia dos direitos das famílias que atende, tendo a possibilidade de
vigiar e defender e não de vigiar e punir.
Enfatiza-se ainda a função social da Justiça que, em algumas de suas
deliberações neste campo, vai na contramão de direitos sociais e dos marcos
regulatórios da Assistência Social, sendo forte a presença do conservadorismo em
alguns desses atores do SGD. Destaca-se, por exemplo, o Poder Judiciário.
Diante de tal responsabilidade, percebe-se que o profissional deve ter um
perfil qualificado, dos pontos de vista técnico-operativo, ético-político, teóricometodológico, que não se acovarde diante da pressão das togas e consiga criar
estratégias para
garantir seus posicionamentos como possibilidade concreta de
viabilizar direitos.
A judicialização da questão social, que media a violação de direitos, pela mão
repressora, no Estado, tem sido uma realidade frequente vivenciada pelos
profissionais da PSE.
Em algumas circunstâncias, percebe-se que há uma revitimização das
famílias e indivíduos. Um exemplo é na alta complexidade, explicitados nos
processos de audiência concentrada, que em vez de garantir a capacidade protetiva
do Estado, manifestam uma visão tradicional de família, reproduzindo o discurso das
famílias desestruturadas, tratando as questões como morais e lançando mão de
decisões punitivas.
Além de vista a olhos nus, no Judiciário, em algumas situações, depara-se
com a conivência de alguns profissionais, que deveriam estar a serviço da proteção.
Embrenhar-se nessas questões parece-nos relevante, para afastar de vez as
armadilhas de uma perspectiva moralizante, psicologizante, culpabilizando o
indivíduo e responsabilizando as famílias, resignada ao tradicionalismo covarde de
práticas conservadoras.
59
Outro desafio posto no cotidiano que tem nos convocado à reflexão, são as
questões que emergem da processualidade
do
Paefi como serviço
socioassistencial, em sua padronização e na conformação dos segmentos.
Todo Creas deve, obrigatoriamente, ofertar o Paefi, que foi tipificado como:
Serviço de apoio, orientação e acompanhamento a famílias com um
ou mais de seus membros em situação de ameaça ou violação de
direitos. Compreende atenções e orientações direcionadas para a
promoção de direitos, a preservação e o fortalecimento de vínculos
familiares, comunitários e sociais e para o fortalecimento da função
protetiva das famílias diante do conjunto de condições que as
vulnerabilizam e/ou as submetem a situações de risco pessoal e
social.
O atendimento fundamenta-se no respeito à heterogeneidade,
potencialidades, valores, crenças e identidades das famílias. O
serviço articula-se com as atividades e atenções prestadas às
famílias nos demais serviços socioassistenciais, nas diversas
políticas públicas e com os demais órgãos do Sistema de Garantia
de Direitos. Deve garantir atendimento imediato e providências
necessárias para a inclusão da família e seus membros em serviços
socioassistenciais e/ou em programas de transferência de renda, de
forma a qualificar a intervenção e restaurar o direito. (MDS.
TIPIFICAÇÃO NACIONAL DOS SERVIÇOS SOCIOASSISTENCIAS,
2009).
O Paefi é o serviço do Creas que provê a atenção especializada
em
situações de: Violência física, psicológica e negligência; Violência sexual: abuso
e/ou exploração sexual; Afastamento do convívio familiar devido à aplicação de
medida socioeducativa ou medida de proteção; Tráfico de pessoas; Situação de rua
e mendicância; Abandono; Vivência de trabalho infantil; Discriminação em
decorrência da orientação sexual e/ou raça/etnia; Outras formas de violação de
direitos decorrentes de discriminações/submissões a situações que provocam danos
e agravos a sua condição de vida e os impedem de usufruir autonomia e bem-estar;
Descumprimento de condicionalidades do PBF e do Peti em decorrência de violação
de direitos.
Antes de ações dispersas serem organizadas sob a configuração do Paefi, a
lógica do atendimento era pautada em programas específicos, por segmentos,
como, por exemplo, o Sentinela e o Peti, e por entidades privadas.
As práticas eram dispersas por ocorrência da violação ou pela faixa etária.
Com a tipificação conformando essas práticas no Paefi, o serviço passa a ser
padronizado para todos os indivíduos e famílias que vivenciam a ocorrência da
60
violação de direitos, desvinculando da caracterização de programa por segmento,
superando o trabalho setorizado e fragmentado.
Essa lógica reforça a centralidade na família, na política, a partir da
matricialidade familiar como eixo estruturante do Suas.
Essa centralidade presente no Suas, traz em sua base, a concepção
de que todas as outras necessidades e públicos da assistência social
estão, de alguma maneira, vinculados à família, quer seja no
momento de utilização dos programas, projetos e serviços da
Assistência, quer seja, no início do ciclo que gera a necessidade do
indivíduo vir a ser alvo da atenção da política. A família é o núcleo
social básico de acolhida, convívio, autonomia, sustentabilidade e
protagonismo social. (NOB/05, p. 17).
A família no centro da política reporta à atuação integral e não fragmentada,
visto que os processos de exclusão social e vulnerabilidade aos quais os usuários
dos programas, projetos e serviços da assistência social são submetidos, atingem
não só o indivíduo, mas toda a família.
Para isso, a PNAS propõe assumir a família na condição de sujeito de
direitos, como espaço contraditório, de diversas configurações e demandatária de
proteção social.
A
operacionalização
aprofundamento
da
das
discussão
mudanças
do
impacto
reforça
das
a
necessidade
leituras
da
de
um
matricialidade
sociofamiliar, como a possibilidade de um retorno de práticas conservadoras, com o
foco na família, no centro do reordenamento e das polêmicas. O tema merece ser
aprofundado, subsidiando críticas mais consistentes e esclarecendo que a
matricialidade familiar não se reduz a uma perpectiva famililsta.
Nesse caso, é necessário discutir profundamente que a responsabilidade com
o risco das famílias é estreito com o risco de responsabilização das famílias.
Com isso, estão colocados alguns desafios. Um deles diz respeito aos
serviços que anteriormente atendiam à violação de direitos de segmentos, como, por
exemplo, os Centros de Referência (de Idosos, Mulheres, LGBT, entre outros).
Alguns municípios encontraram a solução adequando-se a Creas temáticos,
outros mantiveram seus Centros de Referências e, ainda, há municípios que
incorporam serviços que atendiam demandas específicas ao Creas. O fato é que
essa discussão ainda não está esgotada e merece atenção nesse processo de
reordenamento.
61
Sem contar a polêmica com os Centros de Referência que atendem violência
contra a mulher, e negam as diretrizes na assistência, assumindo como norte as
diretrizes da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) que não convergem
com as da política de Assistência Social pois são focalizadas somente nas
necessidades das mulheres, movimento este que merece estudo específico.
No que diz respeito ao reordenamento, está posto outro desafio, que é como
não desconsiderar as boas experiências no processo de adequação, respeitando os
processos históricos e as conquistas de movimentos sociais organizados, na
conjuntura em que os serviços foram implantados, anteriormente às normatizações
da assistência social.
É salutar que se explicitem os conflitos entre os conteúdos propostos pela
política e o que foi constituído pelos segmentos. Ressalta-se aqui a experiência dos
municípios do Grande ABC, que, através do Consórcio do Grande ABC,
organizaram-se reuniões periódicas entre o Grupo de Trabalho (GT) de Gênero e
do GT de Assistência Social, para discutir o atendimento à violência contra a mulher,
quando
foram
debatidas
as
divergências,
de
forma
propositiva,
para
a
operacionalização do serviço.
Contudo, para nós, a questão central da processualidade do Paefi é como
garantir a atenção qualificada às demandas específicas, hoje reordenadas no Paefi
(como violação de direitos da mulher, do idoso, LGBT), reconhecendo suas
necessidades, fruto das diferenças, integrando-as às diretrizes do Paefi e
a
centralidade da família na política?
Sobre essa questão, é possível refletir sobre múltiplas determinações: É
interessante pensar se a ruptura com o modelo anterior ao Suas foi radical: em que
medida o reordenamento do Paefi homogeneiza, se torna funcional e se moderniza
e dá a forma ilusória de que se está criando o novo?
Por outro lado, na prática, em muitos municípios continuam se reproduzindo
modelos segmentados. Assim, perguntamo-nos se a fragmentação contribui com o
avanço neoliberal, encontrando espaço em suas capilaridades.
Iamamoto (2009, p. 22-23) sinaliza:
Verifica-se a tendência de fragmentar os usuários dessas políticas
segundo características de geração – jovens, idosos, crianças e
adolescentes -,de gênero e étnico-culturais - mulheres, negros e
índios -, abordados de forma transclassista e em sua distribuição
62
territorial, o que ocorre em detrimento de sua condição comum de
classe. Essas dimensões multiculturais e multiétnicas fundam
efetivamente as assimetrias nas relações sociais, que potencializam
as desigualdades de classes, necessitando ser consideradas como
componente da política de transformação das classes trabalhadoras
em sujeitos coletivos Mas a fragmentação do sujeito, descoladas de
sua base comum, pode ser incorporada no âmbito do Serviço Social
de forma acrítica em decorrência direta das classificações efetuadas
pelas políticas publicas. É nesse contexto que a família passa a
ocupar o lugar central na política social governamental, tida como
célula básica da sociedade, mediando a velha relação entre “homem
e meio”, típica das formulações profissionais ultra conservadoras.
Sobre estas supostas segmentação e homogenização, é importante destacar
que qualquer nova diretriz exige de nós uma reflexão e, assim, decodificar qual
forma reitera uma abordagem segmentada e o que demanda de fato uma
segmentação.
Em outras palavras, fugimos de um modelo homogeneizador, funcionalista,
que encaixa e ajusta, nesse processo de reorganização, se privilegiarmos uma visão
dialética calcada na realidade e enfrentando as contradições.
Entendemos que se pode garantir os serviços especializados para cada
segmento desde que articulados sob as diretrizes do Paefi
e da política de
assistência social.
Não é propriamente no lócus, que se vai garantir, ou não, os objetivos da
política.
E, sim, a direção social que se imprime ao reordenamento das ações
preexistentes ao cotidiano do serviço.
O importante é reconfigurar as práticas em serviços socioassistenciais e que
elas sejam encorpadas para atender às necessidades sociais, afiançando as
seguranças sociais, garantindo padrões de qualidade
e uma
identidade aos
serviços, tendo o Estado como responsável pela política.
Isso seria garantir a padronização dos serviços e o direito à diferença,
reconhecendo a diversidade e a equidade, sem negar as necessidades diferentes
oriundas das especificidades.
63
CAPÍTULO IV – DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL:
APROXIMAÇÃO EMPÍRICA AOS SUJEITOS DE PESQUISA
4.1 Pesquisa de Campo
A reflexão e análise, neste capítulo, tem como base a aproximação empírica
com os sujeitos de pesquisa. Buscou-se entrevistar os sujeitos com a aplicação de
questionário com múltipla escolha, com vistas à coleta de elementos e informações
a partir de caracterização valorativa já formatada previamente.
O roteiro foi aplicado pessoalmente ou por e-mail, de acordo com a
conveniência dos sujeitos de pesquisa.
Realizar essa aproximação empírica teve como objetivo captar a percepção
do sujeito pois “é no cotidiano que as determinações conjunturais se expressam e se
coloca o desafio de garantir o sentido e a intencionalidade da ação profissional
(MARTINELLI, 2009, p. 152).
A aproximação empírica envolveu 12 profissionais técnicos e coordenadores
do Creas, do Centro de Referência da Mulher Casa Beth Lobo e
do Creas POP
(Tab. 3). Os sujeitos da pesquisa concordaram previamente com a divulgação de
seus nomes e foram escolhidos conforme os seguintes critérios:
1.
Abarcar técnicos de todas as áreas (assistentes sociais, psicólogos e
educadores), de todos os serviços vinculados à Proteção Social Especial de
Média Complexidade e de Alta Complexidade;
2.
Profissionais com funções diversificadas em atividade na PSE.
64
Tabela 3 – Nome do funcionário e local de trabalho
Nome
Setor de Trabalho/Segmento em que Atua
Maria Helena da Silva de Lima
Abordagem Social
Valkíria Martins de Oliveira
Idoso e Deficiente
Edina Aparecida Mendes
Peti
Janaína Braga Domingues Corrêa Fecher
Abordagem Social
Ivone Aparecida de Freitas Caetano
Alta Complexidade
Tânia Machado Aires
MSC
Centro de Referência da Mulher em Situação de
Janaína Leslao Garcia
Violência
Renata Palombo
Paefi
Maria de Lourdes Merenda
Peti
Eloísa Gabriel dos Santos
Creas POP
Maria Cristina de Oliveira
Idoso e Deficiente
Sueli Luzo Costa Garcia
Creas POP
Quanto
às
funções,
foram
entrevistados
assistentes
sociais
(58%),
educadores (25%), psicólogos (8%), e coordenadores (8%) (Tab. 4 e Gráfico 2).
Tabela 4 - Funções dos sujeitos de pesquisa
3. Função (assinale apenas uma alternativa)
ABS
%
Assistente social
7
58%
Psicólogo
1
8%
Educador
3
25%
Coordenação
1
8%
Outros
0%
65
Gráfico 2 - Funções dos sujeitos de pesquisa
Após a aplicação dos questionários, as respostas foram sistematizadas.
Posteriormente, lançadas em planilhas, transformadas em tabelas, tendo em vista
a construção da análise. Os dados coletados foram organizados e tabulados,
possibilitando a análise das considerações dos sujeitos e realizada a construção
dos eixos analíticos básicos que foram:
1.
As exigências de pensar o novo na PSE: novas formas de atenção e
novas exigências profissionais;
2.
As expressões de ideias conservadoras na atuação dos profissionais
da PSE;
3.
A tipificação como caminho concreto para avançar na política.
Outra técnica que foi utilizada é a da observação participante, tanto no
espaço institucional quanto no acadêmico, com registros feitos de forma sistemática
em caderno de campo.
A receptividade dos sujeitos da pesquisa com a pesquisadora se deu de
forma acolhedora. As pesquisas foram realizadas entre setembro
e outubro de
2012.
Os sujeitos de pesquisa responderam sobre o tempo de trabalho na
Assistência Social, pois se considera dado relevante para contextualizar a
experiência na PAS na análise da apropriação dos conteúdos da assistência social
66
e do conjunto de defesas que aporta o trabalho. Por se tratar de um nível de
complexidade que requer certo grau de especialização, essa também nos pareceu
questão importante.
Em relação às exigências de pensar o novo pelas novas formas de ofertar a
assistência social
e as novas exigências profissionais, as questões formuladas
abrangem a percepção sobre a própria qualificação relacionada às demandas, a
capacidade de caracterizar a violação de direitos e o conhecimento sobre o conjunto
de defesas.
Em relação à questão sobre as expressões do pensamento conservador na
atuação dos profissionais da PSE, esta deveria ser respondida em relação ao
próprio respondente e aos outros profissionais, sendo ela a única de múltipla
escolha.
Para a pesquisa a respeito das expressões típicas do pensamento
conservador elencaram-se: a assistência como favor, a culpabilização do indivíduo,
leituras moralizantes da realidade, responsabilização da família, prevalência de
interesses políticos, clientelismo, fisiologismo, primeiro-damismo e filantropia.
Aos sujeitos de pesquisa, foram perguntadas se todas essas expressões
estavam claras e, posteriormente, dirimidas as eventuais dúvidas. Por último,
perguntou-se a opinião dos sujeitos entrevistados sobre a tipificação em relação ao
reordenamento dos serviços.
Optou-se por apresentar o resultado sob forma de tabela e gráficos para
melhor visualização.
4.2 Breve Caracterização de Diadema e da Estrutura da Proteção Social
Especial
Embora a implantação do Suas em Diadema não seja objeto de nosso
estudo, apresenta-se
breve caracterização do município no qual
atuamos na
coordenação da PSE, onde trabalham os nossos sujeitos de pesquisa e nossos
usuários são atendidos, contextualizando, na história da política de assistência
social na cidade, a estrutura da PSE nos dias de hoje (Mapa 1).
67
MAPA 1 - Mapa da Exclusão/Inclusão Social – Diadema
Fonte: (SPOSATI et AL. Topografia social de Diadema. Cedest/PUC-SP, 2009)
O resgate da história da assistência social no Município de Diadema foi
possibilitado pela topografia social desenvolvida pelo Cedest/PUC-SP, em 2009, que
traz esse significativo olhar para a cidade:
Diadema, em seu processo de urbanização, particulariza a luta de
um trabalhador migrante e de mais baixa capacitação profissional,
para afiançar condições de reprodução social para si e sua família. A
cidade nasceu em 1958 pelo desdobramento de São Bernardo do
Campo onde, pelo nominado “milagre econômico brasileiro”
instalaram-se filiais de indústrias automobilística estrangeiras que
provocaram, ao mesmo tempo, o afluxo de trabalhadores e o
fortalecimento do seu processo de sindicalização ao lado da busca
de assentamento de suas famílias.
68
À Diadema, localizada na periferia de São Bernardo do Campo,
grande centro de acumulação do capital industrial e de densidade de
oferta de empregos dos anos sessenta, estava reservado o espaço
de luta pelo social. A luta pela cidadania organizava as lutas locais,
quer por condições de vida, quer pela dignidade do viver. O território
da cidade se adensava à medida em que crescia o parque industrial
do município vizinho. Cidade-dormitório teve seu início adensado por
ex-moradores da favela Vergueiro de São Paulo o que contribuiu
para a condensação de forças locais na luta pela moradia e, ao
mesmo tempo, pelo acesso a serviços públicos como saúde,
educação, habitação, transporte e segurança.
A cidade de Diadema expressa hoje, uma das maiores densidades
do país, e como tal, já registrava no início dos anos 80, 207 núcleos
habitacionais sem habitação digna e sem legalização. A questão da
moradia estendida à condição da dignidade do lugar, enquanto parte
do território, foi eixo de luta social no processo de urbanização da
cidade em meio a interesses conflitantes.
A participação popular no modo de governar a cidade tornou-se
condição fundamental reforçada pelo exemplo do processo de
negociação das lutas sindicais vivenciadas pelos trabalhadores nas
fábricas de São Bernardo.
Desde 1982 a este 2009, em pouco mais de 25 anos, a cidade de
Diadema registra sete gestões municipais disputadas e, em cinco
delas, o Partido dos Trabalhadores saiu-se vitorioso, ratificando o
modelo de gestão democrático popular.
O relevo social de Diadema foi sendo alterado. Foram pavimentadas
cerca de 99% de suas ruas. Esse novo relevo marcado por
intervenções da política pública (na verdade um processo de
redistribuição de condições de vida) trouxe forte efeito na saúde,
reduzindo o índice de mortalidade infantil de 82,93 por mil nascidos
vivos para 12,3 em 2007. (CEDEST/PUC-SP. Topografia social de
Diadema. 2009)
Em 1972, a Prefeitura de Diadema inaugura o Departamento de Promoção
Humana que conta com dois assistentes sociais e 14 estagiários, funcionando em
estreita interface com o Juizado de Menores e o Pronto-Socorro. Posteriormente, o
departamento incorpora às suas funções a distribuição de cestas básicas e
medicamentos,
cursos
profissionalizantes
para
as
mulheres,
provisão
de
documentos e de passes, transporte para pessoas com deficiência, e creches.
Em 1989, o Departamento de Promoção Humana é extinto pelo
então
prefeito José Augusto. Com a promulgação da Loas, em 1993, um grupo de
assistentes sociais pleiteia o restabelecimento de um lócus que garantisse o
atendimento das demandas da política de assistência social.
Em 1994, em atendimento a essa demanda, o Departamento de Ação Social
e Cidadania (Dasc) é estabelecido e estruturado em três áreas: criança e
adolescente, mulher, e assistência.
69
A 1ª Conferência Municipal de Assistência Social ocorre em 1995 e, em 1996,
são criados o Conselho e o Fundo Municipal de Assistência Social.
No período de 1997 a 2000 foram municipalizados serviços estaduais
de assistência social para a Prefeitura de Diadema e são reforçadas
as práticas de convênio com entidades sociais. Não foi investido na
provisão direta de serviços socioassistenciais pela gestão da
Prefeitura. (SPOSATI et al, 2009, p.72 ).
Em 2002, o Dasc é transformado em Secretaria, a Sasc. Em 2005/2006, são
municipalizadas as medidas socioeducativas
em meio aberto, destinadas aos
adolescentes em conflito com a lei.
Em 2007, é contratado o IEE/Cedest para construir a Topografia Social da
cidade. Este trabalho constitui-se num marco da história da assistência social,
conforme apresentação:
- ferramenta que permite hierarquizar os territórios da cidade a partir
de um padrão básico de condições de vida.
- Estabelece a relação comparativa das partes (os territórios) com o
todo (a cidade) e permite uma nova leitura das necessidades.
- Instrumento de decisão política participada que facilita pactos e
negociações de gestão a partir da leitura das necessidades da
cidade.
- Construção de ferramentas para auxílio no planejamento da gestão
da cidade .
- Construção de referências para desenvolver ação integrada nos
territórios da cidade pelas várias áreas de atuação da prefeitura.
- Criação de referências para que a Secretaria de Assistência Social
e Cidadania de Diadema pudesse melhor decidir sobre as
prioridades de demandas para implantação de sua rede de Centros
de Referência e de Referência Especializado de Assistência Social –
Cras e Creas.
O Mapa da Exclusão-Inclusão Social permitiu:
- identificar os territórios mais suscetíveis à condições riscos frente à
oferta
instalada de serviços públicos e não públicos.
- Permitiu verificar baixa discrepância entre os 13 territórios do OPP, o
que sugere maior homogeneidade das condições de vida da
população, mas também baixos índices de inclusão social, o que
revela que essa homogeneidade tende a se dar mais sob condições
de exclusão, do que de inclusão social.
- Propiciou ainda mapear o local de moradia de famílias expostas à
situações de risco e vulnerabilidades e, portanto, tidas com menores
oportunidades no enfrentamento à pobreza.
70
- Indicou a necessidade de implantação de 13 Cras até 2014,
considerados os índices de vulnerabilidade social das famílias.
- Propôs a instalação estratégica de 2 novos Cras, considerando a
localização das áreas de moradia onde se concentram as famílias do
Programa Bolsa: Cras Norte e Centro-Oeste.
- Permitiu verificar se a rede de serviços está localizada de forma
compatível com as famílias que recebem benefícios
E indicou providências básicas:
PREFEITURA MUNICIPAL DE DIADEMA 2007
- Constituir na Prefeitura uma equipe capacitada para informatizar e
georreferenciar banco de dados, ter máquinas e acessar a
digitalização do território da cidade.
- Assessoria técnica da equipe local por consultores que transfiram a
capacidade para a Prefeitura, durante o tempo definido pela própria,
para constituir os bancos de dados.
- Produção do Mapa da Exclusão e Inclusão Social, Construção da
Topografia Social da cidade, Definição dos territórios de gestão da
proteção social básica da cidade.
A consultoria do IEE/PUC-SP (CASTANHO OLIVEIRA, 2008) ainda propõe a
reorganização da secretaria em duas áreas: Departamento de Gestão do Suas com
a proteção básica e especial e o Departamento de Vigilância Social, Defesa de
Direitos de Cidadania com o trabalho de defesa dos direitos humanos e sociais e o
monitoramento e avaliação de ação. Além do Observatório Vigilante a ele agregado.
Aa PMD instalou quatro Cras e um Creas, além do que estava previsto. O
mapa não vem sendo utilizado como ferramenta de gestão na SASC. A estrutura
posta hoje na Sasc é enxuta e centralizada no gestor a quem respondem
diretamente os serviços de proteção básica e especial, assim como o monitoramento
e a avaliação, que acumula as responsabilidades de regulação de parceria. O
Departamento de Gestão do Suas e o Departamento de Vigilância Social, Defesa de
Direitos de Cidadania não foram consolidados. Em 2011, a diretoria de proteções
sociais foi extinta e as coordenações dos serviços assumiram as atividades
correlatas às suas proteções.
Em 2009, é inaugurado o Creas. Os serviços de alta complexidade, que antes
eram coordenados no gabinete, passam a ser geridos pelo Creas, em 2010. Ainda
em 2010, o Centro de Referência do Idoso (CRI) é incorporado ao Creas.
Posteriormente, em setembro de 2010, assumimos a coordenação da PSE. A
partir de maio de 2011, propusemos o reordenamento institucional da Casa Beth
Lobo para integrá-la efetivamente ao Suas. Em 2011, a atenção à população em
71
situação de rua deixa de ser prestada no Creas e é inaugurado o Creas POP. Em
2012, o serviço de abordagem social passa a ter execução direta.
A PSE, hoje, é responsável pelos serviços de média e de alta complexidade:
Creas, Casa Beth Lobo, Creas POP e tem referenciada uma média de 1.100 famílias
e indivíduos em situação de violação de direitos, operando 15 convênios.
Desde então, do período de maio de 2011 a maio de 2012, acumulamos a
coordenação técnica do CR a Mulheres em Situação de Violência e, desde maio
deste ano, a coordenação técnica do Creas, escancarando um dos maiores
problema enfrentados hoje no município para consolidar a política de assistência: o
exíguo quadro de Recursos Humanos (RH).
Segue a apresentação dos serviços da PSE com breve contextualização:
Centro de Referência Especializado em Assistência Social (Creas)
O Creas hoje abarca os níveis de média e de alta complexidade, exceto
violação de direitos da mulher e serviço especializado para pessoas em situação de
rua, que são prestados em outros serviços.
Tem referenciado uma média de 800 famílias e recebe 40 novos casos por
mês, parte delas atendidas por 13 convênios. Os casos são encaminhados por rede
de atendimento, Cras, Conselho Tutelar, Vara da Infância e Juventude, Serviços de
Saúde (Unidade Básica de Saúde - UBS, Caps, Hospital Municipal - HM) ou
demanda espontânea.
Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi)
A prestação dos serviços do Paefi é organizada por técnicos de referência e
segmentos que nele atuam; parte é executada de forma direta e outra
por
entidades.
Violação de direitos da criança e do adolescente: a equipe de referência é
constituída por uma assistente social e uma psicóloga, para operar a referência e
contrarreferência do serviço, que é prestado por duas entidades: o Centro Regional
72
de Atenção aos Maus-Tratos na Infância (Crami), com previsão de atendimento
mensal de 100 família, e Acer-Soaif, com previsão de atender 100 famílias por mês.
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti)
A equipe de referência constitui-se de uma assistente social, uma educadora
e uma estagiária, para o serviço que é prestado por meio de convênio firmado com
organizações sociais: Centro Cultural Afro-brasileiro Francisco Solano Trindade,
Associação de Apoio à Criança em Risco (Acer), ONG MAI, Sociedade Batista de
Beneficência Tabea e Lar Escola Jesue Frantz, Abenco. A previsão de atendimento
mensal é de 250 famílias.
Violação de direitos dos idosos: a equipe de referência constitui-se de três
assistentes sociais e três estagiários.
Em relação ao Paefi, aponta-se que há que se caminhar ainda para romper
com a lógica segmentada, embora os técnicos operem sob as diretrizes do trabalho
social essencial ao serviço.
Porém, pela tipificação, esses serviços deveriam ser ofertados por execução
direta. As entidades ainda não estabeleceram os padrões de qualidade tipificados.
Ainda, o número de oferta de vagas é menor do que a demanda que chega no
serviço.
Em relação à violação de direitos dos idosos, o serviço de atendimento aos
idosos com os direitos violados, no município, que era prestado pelo CRI, foi
incorporado ao Creas, o que gerou desgaste na equipe pela perda na estrutura que
poderia ter sido transformada efetivamente em Serviço de PSE para pessoas com
deficiências, idosas e suas famílias, o que não ocorreu.
Contudo, significou um avanço, do ponto de vista de articulação do Paefi, no
município. Na época, o segmento atendia uma média de 80 casos por mês e
precisava ser adequado a uma diretriz única da política de assistência social
conformada no Creas.
Hoje, o segmento atende mais de 200 casos por mês, num serviço de
execução direta, dentro de uma estrutura inadequada e insuficiente.
73
Essa é uma situação discrepante, principalmente quando se compara com a
estrutura de atendimento à violação de direitos da mulher, que é prestada em outro
serviço.
Outra distorção é que o equipe de referência de violação de direitos dos
idosos acabam por operar a referência e contrarreferência com o
serviço de
acolhimento institucional, já que a alta complexidade não se consolidou como um
nível hierárquico estruturado, no município.
Serviço Especializado em Abordagem Social
O serviço do Creas é ofertado sob a forma de execução direta, de maneira
continuada, desde 2012. Tem o foco em criança e adolescente e a finalidade de
assegurar o trabalho social de abordagem e busca ativa que identifique, nos
territórios, a incidência de trabalho infantil, exploração sexual de crianças e
adolescentes, em situação de rua, dentre outras.
A equipe de referência constitui-se de duas educadoras que trabalham em
estreita articulação com a equipe do Peti.
Embora tenham sido contratadas por concurso público, o que se considera
um grande avanço, a equipe passou por capacitação insuficiente, realizada pelas
coordenações do Creas/PSE
e não possui estrutura adequada para o serviço
(transporte, meios de comunicação, RH, entre outras).
Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida
Socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à
Comunidade (PSC)
A equipe do Creas, composta de uma educadora e uma assistente social,
atende em parceria com a entidade social Dom Décio Pereira, de forma integrada,
os adolescentes em cumprimento das medidas de PSC e LA.
A equipe da entidade social ocupa o mesmo espaço físico do Creas, o que
facilita a definição de fluxo com a Vara da Infância e Juventude e possibilita a gestão
74
do Creas. A previsão de atendimento mensal é de 170 adolescentes e jovens e 150
famílias.
Serviço de Acolhimento Institucional
A equipe técnica lotada no
assistente social
Creas, e composta por um psicólogo, uma
e um estagiário,
realiza o acompanhamento dos serviços de
acolhimento institucional para crianças e adolescentes, que é realizado por três
entidades: Lar São José, Mãos Pequenas e Raio de Luz (Tab. 5).
Como já apontado, há uma distorção aqui, já que os serviços de proteção
especial de alta complexidade deveriam ter estrutura e coordenação próprias.
De qualquer forma, esse serviço tem sido prioritário no trabalho de
reordenamento institucional, com vistas a garantir o trabalho essencial ao serviço,
pois aqui está um dos maiores desafios da PSE, hoje, não constituindo em objeto do
nosso estudo.
Tabela 5 – Recursos Humanos do Creas
Quantidade Função
33
Carga Horária Semanal
33
7
Assistente Social
30 horas
1
Auxiliar de Serviços Gerais
40 horas
1
Auxiliar Administrativo34
40 horas
1
Coordenadora35
30 horas
4
Educador Social
40 horas
1
Estagiário de Psicologia
30 horas
3
Estagiário de Serviço Social
30 horas
2
Psicólogo
30 horas
Uma encontra-se em licença-maternidade e a outra é comissionada.
Comissionada.
35
Em licença-maternidade até janeiro de 2013, motivo pelo qual a pesquisadora acumula a
coordenação técnica do serviço.
34
75
Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua
(Creas POP)
O Creas POP é a unidade pública e estatal de referência e atendimento
especializado à população adulta em situação de rua, no âmbito da Proteção Social
Especial de Média Complexidade do Suas, inaugurado em agosto de 2011.
A unidade foi alocada
no mesmo prédio que o Centro de Atenção
Psicossocial para Álcool e Drogas (Caps AD), facilitando a mobilidade dos usuários.
Contudo, como o serviço tem atendido a uma média de 250 pessoas em situação de
rua e recebe 30 novos casos por mês, o espaço tornou-se inadequado.
O Creas POP dispõe parcialmente do que foi tipificado como Serviço
Especializado para população em situação de rua.
Oferece apenas parte do
trabalho social previsto, não ofertando alimentação, nem espaço de convivência,
devido ao baixo investimento no serviço e ao reduzido quadro de funcionários.
O serviço conta com apenas duas assistentes sociais, e uma acumula o
cargo de coordenação, sem remuneração para tal.
O serviço opera a referência e contrarreferencia com a entidade que presta
acolhimento institucional para a população em situação de rua a Transitória Casa do
Caminho (TCC). A previsão de atendimento mensal é de 40 indivíduos.
Serviço Especializado em Abordagem Social
O serviço de abordagem social, voltado à população em situação de rua, é
lotado no Creas POP e realizado por dois educadores (Tab. 6).
Conforme apontado em relação à equipe de abordagem que é lotada no
Creas, os educadores foram contratados por concurso público, porém a equipe
passou por capacitação insuficiente, realizada pelas coordenações do Creas/PSE e
não possui estrutura adequada para o serviço (transporte, meios de comunicação,
RH, entre outras). Importante ressaltar que as equipes trabalham em estreita
articulação.
76
Tabela 6 – Recursos humanos do Creas POP
Quantidade Função
Carga Horária Semanal
2
Assistente Social
30 horas
2
Estagiárias
30 horas
1
Auxiliar de Serviços Gerais
40 horas
2
Educador Social
40 horas
Casa Beth Lobo
Criada em 1991, e primeira da região do ABCDMRR36, a Casa Beth Lobo é
um Centro de Referência da Mulher, que atende mulheres em situação de violência
de gênero de todo o município (Tab. 7).
Como citado anteriormente, a atenção à violação de direitos das mulheres, na
Política Nacional de Assistência Social, está dentro do escopo do Paefi. No entanto,
em alguns municípios, o atendimento às mulheres em situação de violência, através
dos Centros de Referência, antecede a tipologia da Assistência Social e
desenvolveu metodologias específicas.
A discussão desses novos formatos tem gerado grande polêmica entre
Assistência Social e movimentos feministas.
A partir de maio de 2011, a coordenação da Proteção Especial assumiu
interinamente a coordenação técnica da Casa, por falta de RH. Aproveitou-se o
ensejo para conduzir um reordenamento institucional com vistas à adequação à
política de assistência social.
Discute-se a centralidade da família da assistência social, a importância do
atendimento ser extensivo à violação de direitos de outros membros da família, da
garantia das especificidades de cada demanda, a necessidade de pactuação de
fluxos com o Creas, e entendeu-se que se avançou na garantia das seguranças
sociais previstas na assistência social com a manutenção do Centro de Referência
em espaço próprio. Porém, esse é um processo inacabado.
36
Sigla utilizada para definir as cidades do Grande ABC
77
Tabela 7 – Recursos humanos da Casa Beth Lobo
Quantidade Função/Regime
Carga Horária Semanal
1
Coordenação técnica 37
1
Coordenação administrativa
1
Assistente Social
30 horas
1
Estagiária
30 horas
1
Auxiliar de Serviços Gerais
40 horas
1
Educador Social
40 horas
1
Oficial Administrativo
40 horas
1
Agente Administrativo II
40 horas
30 horas
38
40 horas
Apresentados os serviços de forma sucinta, avalia-se que os principais
desafios hoje na PSE são:
•
Estruturação
dos
Serviços
de
Proteção
Social
Especial
–
principalmente do Paefi, Creas POP e Alta Complexidade.
•
Garantia de equipes mínimas, conforme NOB-RH, incluindo advogado.
•
Readequação
da
estrutura
organizacional
-
infraestrutura
e
equipamento adequados e principalmente recursos humanos, em quantidade e
qualidade, ou seja, com perfil adequado, capacitados e com vínculo permanente.
•
Capacitação e supervisão técnicas das equipes.
•
Regulamentação de padrões de qualidade para o atendimento da
população usuária dos serviços socioassistenciais.
•
Regulamentação e estruturação dos serviços de proteção básica e
especial em rede, com definição de fluxos de referência e contrarreferência.
•
Acesso aos recursos financeiros repassados a Sasc.
•
Definição de papeis, organograma e comunicação institucional.
•
Garantir remuneração das coordenações.
•
Utilização da Topografia Social e estudos realizados pela PUC/Cedest
como ferramenta de gestão.
37
38
A coordenadora técnica não é remunerada pela atribuição.
Comissionada.
78
4.3 As Exigências de Pensar o Novo na PSE: As Novas Formas de
Atendimento e as Novas Exigências Profissionais
Para iniciar a aproximação empírica aos sujeitos de pesquisa, perguntamos o
tempo de trabalho na política de assistência social (Tab. 8 e Gráfico 3).
Do universo de 12 entrevistados, com relação ao tempo de serviço, 42%
atuam há menos de um ano; seguidos de 25% que estão de 1 a 3 anos; e 33% há
mais de 3 anos. Ou seja, 77%, a maioria, conta com menos de 3 anos.
Tabela 8 - Tempo de trabalho na PAS
4. Há quanto tempo trabalha na política de
assistência social?
ABS
%
Menos de 1 ano
5
42%
De 1 a 3 anos
3
25%
Mais de 3 anos
4
33%
Gráfico 3 - Tempo de trabalho na PAS
Quando perguntamos se os profissionais da proteção social especial
entrevistados se sentem qualificados para atender à demanda com a qual atuam, a
pesquisa revelou que a maioria se sente insuficientemente qualificado, totalizando
58%. Já 42% dos entrevistados responderam que estão suficientemente qualificados
para a atenção que prestam (Tab. 9 e Gráfico 4).
79
Tabela 9 - Qualificação profissional
5. Você se sente qualificado para atender à demanda com a qual
atua?
ABS
%
Superior ao necessário - 0%
0
0%
Suficiente
5
42 %
Insuficiente
7
58 %
Muito insuficiente, comprometendo o trabalho - 0%
0
0%
Gráfico 4 - Qualificação profissional
Os dados expressam que a maioria dos entrevistados não se sente
qualificado o suficiente para a demanda que atende.
Sobre as novas exigências aos profissionais da PSE, até que ponto os
profissionais tem o domínio da caracterização da violação de direitos e do conjunto
de defesas, a pesquisa capturou, ao perguntar sobre a caracterização da violação
de direitos que competem ao Creas-Paefi, que 75% apresentam alguma dificuldade,
seguidos de 17% que apresentam facilidade e apenas um entrevistado que sempre
consegue caracterizar a violação de direitos (Tab. 10 e Gráfico 5).
80
Tabela 10 - Caracterização da violação
6. Em relação à caracterização da violação de direitos que competem
ABS
%
Não consegue caracterizar - 0%
0
0%
Apresenta muito dificuldade - 0%
0
0%
Apresenta alguma dificuldade
9
75%
Apresenta facilidade
2
17%
Sempre consegue
1
8%
ao Creas/Paefi,você
Gráfico 5 - Caracterização da violação
Identificou-se, quanto à apropriação do conjunto de defesas de direitos, que
58% dos entrevistados conhecem o conjunto de defesas de direitos da demanda
com a qual atua, já 42% consideram insuficiente o seu conhecimento (Tab. 11 e
Gráfico 6).
81
Tabela 11 - Domínio do conjunto de defesas
7. Em relação à demanda do segmento com o qual atua, você
conhece o conjunto de defesas de direitos?
ABS
%
Superior ao necessário - 0%
0
0%
Suficiente
7
58%
Insuficiente
5
42%
Muito insuficiente, comprometendo o trabalho - 0%
0
0%
Gráfico 6 - Domínio do conjunto de defesas
Dentro do desafio das exigências de se pensar o novo na PSE, quando
perguntamos o tempo de atuação na política de assistência social, os dados
apontam para a predominância de um quadro novo, em que é possível evidenciar,
além da pouca experiência na política de assistência social, a trajetória curta para
assumir as atribuições desse nível de complexidade que requer.
Por serem profissionais recentes, é possível que ainda não tenham se
apropriado de todo o arcabouço teórico que orienta a política, inclusive por não
terem sido submetidos a processos de qualificação mais duradouros. Isso posto,
ainda pode haver um desconhecimento da demanda e da oferta na política de
assistência social.
82
Ao serem indagados sobre se sentem qualificados para atender à
demanda do segmento em que atuam, mais da metade se sente insuficientemente
qualificado. Esse é um aspecto significativo, pois o trabalho na assistência social
está apoiado no conhecimento dos profissionais.
Por ser uma área de prestação de serviços cuja mediação principal,
é o próprio profissional, o trabalho da assistência social está
estrategicamente apoiado no conhecimento e na formação teórica e
técnica e política
do seu quadro pessoal, e nas condições
instituicionais de que dispõe para efetivar sua intervenção. (COUTO
et al, 2010, p. 57).
Assim como em relação à caracterização da violação de direitos que
compete ao Creas/Paefi, é relevante assinalar que a maioria apresenta alguma
dificuldade.
Essa dificuldade pode advir tanto da inexperiência aclarada pelos dados, do
desconhecimento da demanda e da oferta da assistência, da falta de qualificação
reconhecida pelos profissionais ou da dificuldade da incorporação dos novos
preceitos da assistência social.
Interessante ressaltar que a inespecificidade dessa área sempre gerou
retardamento na sua efetivação como política pública. Atualmente, com os serviços
tipificados, ainda se aponta grande dificuldade na caracterização.
Por outro lado, aponta elementos para a vigilância socioassistencial, quanto à
dimensão coletiva da violação por ocorrência do risco que deve ser melhor
explicitado para e pelo Paefi.
Outro aspecto a ser considerado refere-se à ambiência da violação de direitos
e risco que não é exclusivo da política de assistência, podendo produzir
generalismo e confusões. Nesse sentido, a própria orientação técnica é para tratar
como violação de direitos por ocorrência do risco.
Importante salientar que é a própria política de assistência social que deve
apontar qual o seu escopo de atuação e não seus demandatários. No entanto, é
necessário assinalar a compreensão do escopo de atuação do Paefi como decisiva
para o desempenho da política.
As orientações técnicas do Creas dão algumas pistas:
83
A compreensão e a delimitação das competências do Creas são
determinantes para o desempenho efetivo de seu papel no Suas, representando
elemento fundamental, ainda para:
• clarificar o papel do Creas e fortalecer sua identidade na rede;
• evitar sobreposição de ações entre serviços de naturezas e até
mesmo áreas distintas da rede que, evidentemente, devem se
complementar no intuito de proporcionar atenção integral às famílias
e aos indivíduos;
• evitar a incorporação de demandas que competem a outros
serviços ou unidades da rede socioassistencial, de outras políticas ou
até mesmo de órgãos de defesa de direito;
• qualificar o trabalho social desenvolvido
Interessante que delimitam, também, o que não cabe ao Creas:
• Ocupar lacunas provenientes da ausência de atendimentos que
devem ser ofertados na rede pelas outras políticas públicas e/ou
órgãos de defesa de direito;
• Ter seu papel institucional confundido com o de outras políticas ou
órgãos, e por conseguinte, as funções de sua equipe com as de
equipes interprofissionais de outros atores da rede, como, por
exemplo, da segurança pública (Delegacias Especializadas,
unidades do sistema prisional, etc.), órgãos de defesa e
responsabilização (Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria
Pública e Conselho Tutelar) ou de outras políticas (saúde mental,
etc.);
• Assumir a atribuição de investigação para a responsabilização dos
autores de violência, tendo em vista que seu papel institucional é
definido pelo papel e escopo de competências do Suas
O reconhecimento do papel e da delimitação das competências do Creas
pode ser fortalecido com o mapeamento da rede e a construção de fluxos e
protocolos
intersetoriais
de
atendimento,
com
definição
de
papéis
e
responsabilidades. Essa construção pode, inclusive, contribuir para identificar
lacunas e, até mesmo, conflitos de papéis e competências na rede.
Outra questão relaciona-se com o domínio do conjunto de defesas em
relação ao segmento em que atua, onde quase a metade dos profissionais
entrevistados refere dominar o conjunto de defesas de forma insuficiente.
A bibliografia que hoje ampara a PSE apresenta-se por segmentos, tratando
da violência contra a criança e o adolescente; contra a mulher; do adolescente em
conflito com a lei; acolhimento institucional; população em situação de rua. Nesse
âmbito, importantes obras tratam dos temas do escopo da Especial.
84
Ainda existem os marcos legais, construídos historicamente, que não são
legislações estanques, mas trazem consigo a história da luta por direitos sociais e
humanos.
Além das orientações técnicas e os planos nacionais, como as orientações
técnicas para o Creas, Creas POP, Peti, Sinase, Planos Nacionais.
De qualquer forma, na medida em que encontra-se à disposição todo esse
arcabouço conceitual, os dados coletados alertam para um risco de certa lógica
operativa, práticas tecnicistas e lógicas produtivistas.
Ainda, estamos nos referindo a um conjunto de categorias que fazem parte do
Suas e que devem construir um trabalho coletivo, aportados em conhecimentos que
façam avançar a assistência social no Brasil.
Chama a atenção, nesse sentido, a dimensão política do trabalho.
Não basta superar a cultura histórica do ativismo e de ações
improvisadas, substituindo- as por um produtivismo quantitativo ,
medido pelo número de reuniões, número de visitas domiciliares,
número de atendimentos, se os profissionais não detiverem o sentido
e a direção social, do trabalho coletivo, se não forem garantidos
espaços coletivos de estudo e reflexão, que possam por em debate
concepções orientadoras e efeitos sociais e políticos das práticas
desenvolvidas. (COUTO et al, 2010, p. 61).
Como apontado anteriormente, embora haja uma bibliografia que ampara a
PSE, faltam publicações sobre violação de direitos por ocorrência do risco nesse
campo e, assim, identifica-se uma lacuna que nos mobiliza a contribuir com
sistematização sobre as questões que estão postas hoje na consolidação da PSE
como nível de complexidade para efetivação do Suas.
Outro aspecto é a parcela do profissional, que deve também buscar sua
formação e qualificação para lidar com as questões do seu cotidiano profissional,
não se acomodando , embora essa não seja uma responsabilidade individual.
Não há dúvida de que é dever da gestão garantir formações continuadas e
capacitações permanentes, assim como condições institucionais adequadas.
É sabido, ainda, que, pela própria desvalorização da política por algumas
administrações,
ela vem sendo executada com
quadros exíguos de RH, em
estruturas improvisadas e com reduzidos investimentos.
85
Também é preciso destacar que a assistência social não passa incólume pelo
processo de desregulamentação e precarização do trabalho no Brasil. Nas entidades
que compõem a rede socioassistencial, esse processo se evidencia.
Nesse contexto, pode-se deparar com profundas defasagens técnicas que
requerem formação permanente e qualificada.
Nesses termos, ter a NOB-RH é esforço significativo que deve nos amparar
nesse processo de construção.
As exigências de pensar o novo na PSE é um desafio a ser enfrentado na
política de assistência social, que foram traduzidas em inquietações importantes
trazidas pelos trabalhadores:
O momento atual é de redefinição do trabalho, das formas de
organização e gestão institucional que incorporem mecanismos
permanentes de formação e educação continuada, como questão
estratégica para a qualificação dos recursos humanos no Suas. E
finalizando, é possível afirmar: quanto mais qualificados os
servidores e trabalhadores da assistência social, menos sujeitos a
manipulação mais preparados para enfrentar os jogos de pressão
política e de cooptação dos espaços institucionais, conferindo a
qualidade e consistência teórica, técnica e política ao trabalho
realizado. (COUTO et al, 2010, p. 63).
4.4 Expressões de ideias conservadoras na atuação dos profissionais da
PSE
A pergunta em questão foi de múltipla escolha, e os entrevistados puderam
marcar mais de uma alternativa. Ainda, havia a possibilidade de uma resposta
aberta que se distinguia das demais. Os dados expressaram que 75% referem
leituras moralizantes da realidade vivida pela demanda; 58%
identificam, na
atuação dos profissionais da PSE, culpabilização dos indivíduos que atendem; 58%
apontam responsabilização da família; 25% revelam a presença de interesses
políticos; 17% identificam a assistência como favor; 17% destacam a filantropia;
17% o clientelismo; e 8% o fisiologismo. Somente não foi identificado primeirodamismo.Na especificação de outras respostas que totalizou 25%, indicam
“conformismo do profissional com alguns aspectos da realidade, sem considerar o
histórico
de
vida”,”fatalismo
“paternalismo/assistencialismo.”
em
realização
a
situação
atendida”
e
86
Tabela 12 – identificação de expressões conservadoras
ABS
%
A concepção de assistência como favor
2
17%
Culpabilização do indivíduo que atende
7
58%
Leituras moralizantes da realidade vivida pela demanda
9
75%
Responsabilização da família
7
58%
Prevalência de interesses políticos
3
25%
Clientelismo
2
17%
Fisiologismo
1
8%
9. Você identifica, na atuação dos profissionais da Proteção Social Especial
Primeiro-damismo
0%
Filantropia
2
17%
Outras
3
25%
Gráfico 7 – identificação de expressões conservadoras
Os dados expressam condutas e posturas, a partir do olhar dos profissionais
para os próprios profissionais, que acabam reiterando traços conservadores.
Embora esses traços não estejam contidos na política e todas as bases já
estejam lançadas não só nos princípios como nas diretrizes da PNAS e também nas
normatizações, há um trânsito capacitador a percorrer.
87
Na análise do que foi expresso pelos sujeitos, incide uma série de fatores. O
escopo da violação de direitos que hoje foi ordenado na PSE, principalmente através
da tipificação, não nasce com o PNAS, nem com a Loas, nem com a Constituição de
1988, mas é anterior a esses marcos regulatórios da política.
É preciso lembrar que as ações dispersas, organizadas na PSE, eram quase
em sua totalidade desenvolvidas por entidades privadas sem fins lucrativos, e as
forças conservadoras sempre estiveram presentes na assistência social, assim como
em outras políticas públicas.
Em um passado não muito distante, as práticam eram
assistencialistas,
tratando o que era direito, muitas vezes, pelas primeiras-damas, como filantropia,
clientelismo e favor. Na atenção que era prestada pelos orfanatos, internatos,
educandários, asilos, é possível identificar todo o conservadorismo.
[...] deste quadro de organizações sociais repousam sobre as bases
da Igreja (principalmente católica) e depois pelo Estado, passou por
fases de alianças que lhes deixaram marcas difíceis de superar. Da
filantropia caritativa a higiênica, disciplinadora, pedagógica
profissional, vigiada e de clientela39, foi se construindo uma
estratégia de intervenção no espaço urbano, de controle da pobreza
e das “classes desviantes”, que reduziu indigentes, abandonados,
inválidos, doente e deliquente, à categoria de “assistidos sociais”,
paras os quais foram se acumulando espaços institucionais
próprios.(MESTRINER, 2011, p.39).
Atualmente, ainda é possível identificar o lastro contido na PSE como
tributária de um passado histórico conservador, na atenção prestada por alguns
profissionais, conforme demonstrado na pesquisa, e há necessidade de ele se
libertar, como a PNAS já o fez.
A exemplo da orfandade, que sempre foi justificativa de assistência social, a
proteção especial é que vai absorver demandas antigas da assistência social e
continuar provendo a atenção às figuras historicamente estereotipadas dos
mendigos, pivetes, menor abandonado, trombadinhas, órfãos, bastardos e mulheres
de malandro.
Essa visão equivocada, perpetuada pelo conservadorismo, principalmente
através da mídia datenística40 continua, até os dias de hoje, escamoteando e
39
Grifos nossos.
Trocadilho nosso para definir alguns tipos de mídias, expoentes do pensamento conservador, que,
por exemplo, negam direitos constituídos, como a vida, defendendo pena de morte; negam os
40
88
negando, aos demandatários da função protetiva da assistência social, a condição
de sujeitos de direitos.
Tratamento, este, aos sujeitos de direitos, típico da construção do
pensamento conservador, que tem em suas bases a valorização do preconceito,
segundo Nisbet “...o preconceito é resumo, na mente individual, da autoridade e da
sabedoria contidas na tradição...” (1987, apud ESCORSIM 2010 ,p. 58).
Escorsim Netto (2010, p.16), em sua obra O Conservadorismo Clássico,
sobre o tema, por tratar-se de uma sinopse histórico-crítica do pensamento
conservador, alerta, logo em suas primeiras páginas, que o conservadorismo “não
se apresenta como conservadorismo e, portanto oculta e escatomeia sua raiz e seus
conteúdos conservadores.
Segundo a perspectiva histórico-crítica, entende-se que alguns técnicos ainda
não romperam com o passado e trazem em sua atuação a perspectiva
conservadora. Daí os dados apontarem para práticas em que ainda se identificam a
filantropia, o fisiologismo, o clientelismo e a concepção de assistência como favor.
Outra questão é que, embora a política se coloque progressista, pela
perspectiva de alguns técnicos, o lastro conservador não é erradicado, pois, em sua
essência, está o reformismo e a não subversão da ordem, escamoteando seus
conteúdos conservadores, com uma nova roupagem, recuperando valores
tradicionais, como a leitura moralizante da realidade vivida pelas famílias, a
culpabilização do individuo que atende, a concepção de assistência como favor,
entre outros.
Isso remete a um dado importante, pois se está diante de forças sociais
importantes
que, se não observadas, podem usurpar da política o seu caráter
emancipador.
Cre-se que, se não houver uma direção social clara, remeteria a um processo
similar ao da “modernização conservadora”41 da década de 1970. A modernização
conservadora trazia em seu bojo “abordagens funcionalistas, estruturalistas e mais
tarde sistêmicas (matriz positivistas) [...] os recursos para alcançar esses objetivos
direitos da criança e do adolescente constituídos no ECA, defendendo a diminuição da maioridade
penal; negam os direitos humanos, além de culpabilizar o indivíduo e não fazer nenhuma espécie
de leitura critica dos impactos da vulnerabilidade, das expressões da questão social, ou
minimamente da violação de direitos.
41
Tese defendida por Netto, em sua obra Ditadura e Serviço Social, Cortez, 2001.
89
são buscados na modernização tecnológica e em processos e relacionamentos
pessoais [...]”( IAMAMOTO,2009, p.149).
Sem falar na modernização tecnológica proposta por diversos sistemas de
informação, e a influência de alguns segmentos da psicologia que compõe o campo
profissional do Suas.
A autora, na mesma obra, ao falar da psicologização das relações sociais,
refere que, sob esse prisma, as questões de desintegração e adaptação eram
tratadas com diálogos e que essa perspectiva permitia preservar um julgamento
moral da clientela, dado muito expressivo identificado na pesquisa por 75% dos
entrevistados na atuação dos profissionais da PSE.
Então, está se tratando de “um processo de mudanças permeado de lutas e
resistências entre o novo e velho, entre permanências e ruptura, que precisam ser
apreendidas na dinâmica das forças sociais e políticas que atuam historicamente no
chamado campo assistencial. (COUTO et. al., 2010, p.140).
Percebe-se a ausência de estudos, nesse sentido, embora alguns se
autoproclamem
conceitualmente
um
perfil arrojado
de
análise
e
acabam
reproduzindo, do ponto de vista teórico, “o mais do mesmo” e, da prática, uma
atenção com traços conservadores.
É na PSE que se apresentam questões como escolhas, prazer, medo, riscos,
dinâmicas familiares complexas e contraditórias, permeadas por muita subjetividade,
o que a faz a mais complexa e desafiadora, e nos parece um terreno fecundo para a
psicologização das sequelas da questão social e despolitização nos discursos e nas
práticas.
Nesse sentido, nos deparamos, no cotidiano, com as armadilhas de uma nova
perspectiva conservadora, que sobrecarrega e culpabiliza os indivíduos, numa ação
moralizadora e disciplinadora, como reafirma a pesquisa, traços estes identificados
por 58% dos entrevistados na atuação dos profissionais da PSE.
Outra questão é o risco da matricialidade sociofamiliar mal interpretada. A
família adquiriu centralidade na PNAS por ser o foco da proteção social. Entretanto,
não foi suficientemente explicitada a concepção de família na política, permitindo
interpretações e condutas profissionais conservadoras e a retomada de modelos já
superados, como, por exemplo, supervalorizar e onerar as mulheres em seu papel
materno.
90
[...] a questão de gênero e família é fundamental para o debate da
Política Nacional de Assistência Social. Isso nos remete à
necessidade de buscar entender a família na atualidade, visando
superar aquelas concepções estereotipadas e naturalizadoras de
família, visões que, muitas vezes, culpabilizam os modos de vida da
população empobrecida da nossa sociedade. A compreensão que se
passa, tônica das falas anteriores, é que essa instituição social é
historicamente marcada.
Tem sobre si reflexos da vida social mais ampla, em suas dimensões
política, econômica, cultural e ideológica.42(TAVARES, 2011, p.135).
Para avançar com o novo modelo, é preciso elucidar com o que exatamente
se quer romper e particularizar as críticas.
De forma equivocada, alguns profissionais tem sobrecarregado ainda mais
essas famílias e tornado a possibilidade cada vez mais real, através de uma ação
disciplinadora, de uma avalanche de práticas conservadoras, relacionadas às
famílias, no centro do reordenamento e das polêmicas.
Nesse caso, é necessário debater profundamente que a responsabilidade
com o risco das famílias é estreito, com o risco de responsabilização das famílias,
explicitado pela pesquisa que identificou 58% dos profissionais responsabilizam-na.
Percebe-se que não ecoa nem a discussão de como está posta a questão do
“reconhecimento do grupo familiar como referência afetiva e moral” (PNAS, p.38. ),
referindo-se à matricialidade sociofamiliar.
Deparamo-nos com linhas críticas de análise que têm apontando para o
perigo de cair numa prática conservadora através da matricialidade sociofamiliar,
preocupação esta que partilhamos. Contudo, os discursos são amplificados em
demasia e não estabelecem as mediações necessárias para o concreto; tampouco
apontam para o horizonte de um trabalho “progressista” com as famílias, que estão
no foco da atenção provida pela assistência social.
Nesse sentido, parece-nos que um dos caminhos é que se amplie a base
científica, como vem fazendo, por exemplo, a pesquisa Protege Vínculos,
coordenada pela professora Aldaíza Sposati, para definir o que compõe a
capacidade protetiva da família, e que, nesse caminho, se
aprofundem as
especificidades da proteção nas situações de violação de direitos.
42
Debates Simultâneos sobre Família, Gênero e Assistência Social- sistematizados no caderno O
trabalho do/a Assistente Social no Suas: seminário nacional / Conselho Federal de Serviço Social Gestão Atitude Crítica para Avançar na Luta. –Brasília: CFESS, 2011.
91
Para nós, é necessário perguntar o que efetivamente contribuirá para
emancipar essa família: A função protetiva é da família? Ou do Estado? Qual o peso
que cada uma tem?Uma está substituindo a outra?
Este tema deve ser ainda aprofundado, subsidiando críticas mais consistentes
sobre o que significa uma leitura equivocada da matricialidade sociofamiliar, e, por
outro lado, o que significa negar a dimensão da família e a discussão da
metodologia do trabalho.
Suspeita-se que a negação do conceito de família, por estar no centro das
formulações tipicamente conservadoras, tem sido o motivo para abandonar a
discussão do trabalho com famílias e não se estabelecer as mediações necessárias.
Perpetuando um discurso amplificado da crítica, colabora-se muito pouco com
análises propositivas sobre a concretude da prática.43
Nessa direção de análise, não se pode perder de vista a importância da
vinculação das questões de classe e de visão crítica de família. Netto (1996 ) já
alertava, na década de 1990, sobre
“uma reação neoconservadora aberta e/ou
disfarçada em aparências que a dissimulam, apoiada no lastro da sua produção pós
moderna e sua negação da sociedade de classes”.
É importante que se anuncie quanto as questões estruturais, como a pobreza,
embora não precedam, são determinantes na violação de direitos e quanto está
presente na realidade com que nos deparamos na proteção especial, facilmente
lidas quando o risco quase sempre se apresenta imbricado com a vulnerabilidade.
A história só vem confirmando o movimento do capital de escamotear o
recorte de classes e sua antiga tentativa de impingir as responsabilidades às
famílias:
[...]
a ambiência pós-moderna que caracteriza o capitalismo
neoliberal na cena contemporânea alimenta a tendência de
deslocamento dos conflitos e contradições que tem fortes raízes
societárias, como os de classe, gênero ou etnia, para os âmbitos
privados da esfera doméstica, das relações intrafamiliares. (COUTO
et. al, 2010, p.55).
43
Aliás, a ausência de mediações concretas, a prevalência dos discursos amplificados, a negação de
algumas reflexões, relegando ao ostracismo discussões fundamentais para a atuação profissional,
dentro da perspectiva crítica, como, por exemplo, família, instrumentais, enaltecendo sempre o
método e secundarizando a discussão operativa e dos caminhos possíveis a se trilhar, pela via
institucional, na prática cotidiana do assistente social, demonstra dificuldade da travessia de uma
análise ideológica para a concretização do trabalho e, consequentemente, essa cenário empobrece a
pratica profissional e nos distanciam, contraditoriamente, do projeto ético-político, mas este tema não
é objeto de nosso estudo.
92
Na alternativa “outras” que possibilitou que os sujeitos se expressassem com
respostas que se distinguissem das demais, apareceram: ”fatalismo em relação a
situação atendida” , “conformismo com alguns aspecto da realidade, sem considerar
o histórico de vida” e ainda “paternalismo/assistencialismo”
Em relação ao “fatalismo” e “conformismo” diante das situações, ambas nos
alertam para uma possível resignação a respeito da complexidade apresentada, mas
também para um olhar político mais fragilizado, endógeno, que considera só as
necessidades da instituição, e um certo comodismo que pode estar havendo por
parte dos profissionais.
Onde aparece “paternalismo/assistencialismo” o sujeito de pesquisa refere-se
a uma suposta tutela dos usuários que se coloca antagônica a autonomia dos
usuários assumirem suas próprias escolhas, que igualmente merece ser olhado.
Por fim, mais uma hipótese trabalhada para analise da pequisa, advém do
encontro do lastro conservador da assistência social com a emergência do Serviço
Social que é, em sua origem, reacionária44 como estratégia do capital de controle e
amortização dos anseios dos trabalhadores, tratando de questões como a ação
missionária, a influência da Rerum Novarum, a individualização dos casos, a
abordagem moral e os ditos desajustamentos sociais.
Essa origem conservadora da assistência, em articulação com a “ilusão do
servir” de alguns profissionais do Serviço Social, a ausência de construção de uma
identidade profissional e as amarras da alienação, distanciando a assistência das
questões da luta de classe, e quanto a um “percurso alienado, alienante e
alienador”45 converge com a trajetória de alguns profissionais, na assistência, que
parecem não ter passado nem pelo
ares do Congresso da Virada, negando o
projeto ético-político contemporâneo, nem pelo processo de construção da
Assistência como direito.
Não estamos aqui confundindo Serviço Social com Assistência Social, nem
tampouco reduzindo o quadro de profissionais da assistência a assistentes sociais.
Porém,
é
inegável,
que
o
Serviço
Social
é
uma
demanda
de
profissionalização da assistência, e, historicamente, sempre esteve à frente da
Política de Assistência, nos palcos de luta e operacionalização, na e pela política.
44
Tratados por Netto, em Ditadura e Serviço Social, e Iamamoto, em Renovação e
Conservadorismo.
45
Utiliza-se, como referência, a obra Serviço Social: Identidade e Alienação, Martinelli, 2000.
93
“[...] Como não há ruptura definitiva com o passado, a cada passo este se
reapresenta na cena histórica e cobra o seu preço, [...]”. (FERNANDES apud
MESTRINER, 2011, p. 55).
As questões apontadas aqui não têm a intenção, de maneira nenhuma, de
desqualificar a política por um pretenso cunho conservador, mas alertar para
questões, postas no cotidiano, que podem retardar a sua efetivação enquanto
política pública.
4.5 Tipificação como caminho concreto para avançar na política
As respostas destacam, em relação à Tipificação Nacional dos Serviços
Socioassistenciais, que 92% dos trabalhadores entrevistados entendem que ajudou
no reordenamento institucional, e apenas um profissional aponta que gerou algum
tipo de confusão (Tab. 12 e Gráfico 7).
Tabela 13 – Tipificação
8. A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, na sua
ABS
%
Ajudou no reordenamento da política de assistência social
11
92%
Atrapalhou - 0%
0
0%
Não fez diferença - 0%
0
0%
Não consigo dimensionar - 0%
0
0%
Gerou confusão
1
8%
opinião,
94
Gráfico 8 – Tipificação
Do que se pode apreender, a tipificação atinge seus objetivos, uma vez que
é vista como facilitadora
para quase a totalidade dos profissionais, no
reordenamento das ações preexistentes na política de assistência social.
Essa é uma avaliação muito positiva, na medida em que os profissionais não
vinculam as dificuldades e inquietudes que expressaram em relação à qualificação e
caracterização aos serviços tipificados no reordenamento.
O impacto da tipificação no reordenamento dos serviços sociossistenciais e
sua particular contribuição à PSE como um nível de complexidade da Política
Nacional de Assistência Social vem sendo de suma importância para a consolidação
do Suas.
Entre as normativas mais impactantes, do ponto de vista operativo, na política
de assistência social, está a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais,
pois vem demarcar o campo de atuação da assistência social e definir a
padronização dos serviços oferecidos em todo o território nacional, seja por
execução direta ou unidade referenciada, já que todos devem atuar dentro dos
princípios e diretrizes do Suas.
95
Fruto de uma das principais deliberações da VI Conferência Nacional de
Assistência, objetiva “tipificar e consolidar a classificação nacional de Serviços
Socioassistenciais” e, conforme o art. 23 da Loas o “caráter continuado dos serviços,
supõe atenções sistemáticas, planejadas e com qualificação profissional envolvida”,
a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais46, publicada ao final de 2009,
vem dar a resposta da necessidade de regulamentação do escopo das proteções
sociais e da padronização os serviços em todo o território nacional.
Cada serviço foi definido quanto a nomenclatura, descrição, usuários,
objetivos, provisões, aquisições dos usuários, condições e formas de acesso,
unidade, período de funcionamento, abrangência, articulação em rede e impacto
social esperado. (BRASIL, 2009a).
Para a PSE, a tipificação organizou:
Serviços de Proteção Social Especial de Média Complexidade:
a) Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e
Indivíduos (Paefi);
b) Serviço Especializado em Abordagem Social;
c) Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de
Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida (LA), e de Prestação
de Serviços à Comunidade (PSC);
d) Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com
Deficiência, Idosas e suas Famílias;
e) Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua.
Serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade:
a) Serviço de Acolhimento Institucional, nas seguintes modalidades:
- abrigo institucional;
- Casa-Lar;
- Casa de Passagem;
- Residência Inclusiva.
b) Serviço de Acolhimento em República;
c) Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora;
d) Serviço de Proteção em Situações de Calamidades Públicas e de
Emergências.
46
A tipificação foi instituída por meio da Resolução 109, de 11 de novembro de 2009, e aprovada
pelo Conselho Nacional de Assistência Social (Cnas), previamente pactuada na Comissão
Intergestores Tripartite (CIT) de Assistência Social.
96
A PNAS e a recente tipificação trazem concretude ao Suas e profundas
inovações. Contudo, as mudanças devem ser incorporadas de forma crítica.
O ganho com a tipologia no processo de reordenamento dos serviços e sua
especial contribuição aos níveis de média e de alta complexidade é de extrema
relevância, como apontado pelos profissionais.
De maneira geral, a tipificação organiza um conjunto de ações preexistentes
para assegurar direitos, transformando-os, de fato, em serviços socioassistenciais.
Os serviços prestados na assistência social, outrora campo difuso e sem
identidade, ganham concretude para atender a necessidades sociais, na medida em
que cria uma identidade em nível nacional. Com essa regulamentação, o Estado,
como responsável pela política, expõe o que é de sua competência.
A tipificação aumenta a capacidade de gestão da assistência social e passa a
ser uma referência para a adequação dos serviços.
O conteúdo dessa norma técnica propicia a politização do processo e pode
mobilizar uma leitura crítica da conjuntura a partir dos serviços e ações existentes e
concretiza a atenção ao usuário, sanando inclusive algumas lacunas da política
nacional.
Com a regulamentação, os serviços de caráter misto que não asseguravam
seguranças sociais podem ser remetidos para outros ministérios de competência.
As matrizes propostas podem conduzir a critérios e indicadores que facilitam
o monitoramento por meio da construção de indicadores de padrões mínimos de
qualidade dos serviços tipificados, e facilitam ainda a produção de dados,
principalmente no que diz respeito à cobertura dos serviços.
Com os serviços tipificados, é possível mensurar o custo de serviço com os
padrões mínimos necessários. Com isso, também facilita a construção de editais
direcionados para a qualidade dos serviços socioassistenciais. Contudo, ao
mensurar um padrão mínimo de qualidade, novos custos serão exigidos e,
consequentemente, novos financiamentos serão demandados, o que vai onerar os
orçamentos previstos aos serviços.
Nesse bojo, é a PSE que abarca, quase na sua totalidade, os serviços
desenvolvidos por entidades, onde estão lotadas as experiências mais tradicionais,
organizações centenárias, em sua maioria de cunho altamente conservador, de
motivações sob diferentes matrizes, especialmente de cunho religioso, orientadas
pela lógica da caridade.
97
A tipificação estabelece mediações concretas para alcançar padrões mínimos
de qualidade, ou seja, traz a concretude necessária para identificar se essas ações e
serviços estão ou não em consonância com a política de assistência social.
Tipificar colocando os Creas como polos de entrada e articuladores dos
serviços prestados, reforça a sua legitimidade e facilita a gestão sobre as entidades
e, consequentemente, o processo de integrá-las à política de assistência social.
Todo esse esforço normativo pode impulsionar a oferta de serviços
socioassistenciais na PSE que, de fato, afiance seguranças sociais de acolhida, do
convívio social, de autonomia, de equidade e de travessia.
A tipificação parece ser um esforço consistente em estabelecer parâmetros de
qualidade nos serviços, afrontando os serviços de baixa qualidade ou de qualidade
desconhecida que vinham sendo prestado. Contudo, a tipificação não é dogmática, e
não se propõe a impor padrões de qualidade descolados das necessidades e da
realidade local.
A regulamentação não garante a leitura municipalista da política nacional, daí
a necessidade de apreender os processos históricos e as conquistas de movimentos
sociais organizados no que diz respeito aos serviços e não estigmatizar as boas
experiências no processo de adequação.
Esse movimento de entender o que cabe à assistência social não pode
parecer restritivo. Não é para engessar, burocratizar, e sim organizar e aprimorar a
qualidade dos serviços prestados.
Convém ressaltar que, nesse sentido, a discussão sobre a tipificação não
acaba em sua publicação. Impõe-se a continuidade do debate sobre o
processamento da tipificação, a publicação de textos conceituais, explicitando suas
bases para não dar margem a leituras estanques do processo de reordenamento.
Pode ser que nem todos os serviços estejam suficientemente caracterizados
e que alguns possam não ter sido contemplados. Assim, paira a dúvida de como
podem ser reconhecidos legalmente. Essa resolução responde a ofertas básicas da
assistência social e a um conjunto de serviços previamente existentes sob várias
formas de prestação. Outros podem ser reconfigurados, conforme as necessidades
que assim o determinarem.
Ao tipificar os serviços, o poder público deve conduzir, de forma habilidosa, o
reordenamento das unidades que compõem o sistema. Mudanças, muitas vezes,
são encaradas com resistência e mobilizam forças políticas. Existem focos de
98
resistência às novas normativas, seja por parte das entidades sociais, pelos próprios
servidores que têm diferentes compreensões da Assistência Social, muitas vezes,
descoladas das novas diretrizes da PNAS.
Detecta-se, no front de resistência, alguns grupos organizados, como
segmentos feministas e organizações que militam pelos direitos das crianças e dos
adolescentes.
É dentro dessa toada segmentada, por vezes arcaica e corporativista,
que
vamos operar e criar estratégias, de modo a qualificar e organizar os serviços que
atendem a
segmentos específicos
sob as diretrizes do Suas e garantindo o
atendimento das necessidades oriundas das diferenças, ou seja, numa perspectiva
de equidade.
Assim, é preciso que não se finde a discussão sobre seu processamento,
para a garantia de efetivação e continuidade de correção das distorções.
Questiona-se, ainda, em que medida a tipificação perpetua a segmentação na
divisão dos serviços ou homogeneiza demais as demandas específicas, dentro dos
respectivos níveis de complexidade, como estratégia para atingir os objetivos da
política de assistência no que diz respeito à violação de direitos.
Como tratado no capítulo anterior, qualquer nova diretriz exige reflexão e,
assim, decodificar qual é a melhor forma de estruturação dos serviços
socioassistenciais, desde que articulados sob as diretrizes do Suas e da política de
assistência social, garantindo não só a centralidade na família como afastando
perspectivas focalistas, mas reconhecendo a diversidade e a equidade, sem negar
as necessidades diferentes oriundas das especificidades.
O importante é reconfigurar as práticas em serviços socioassistenciais, numa
visão dialética calcada no cotidiano, para atender a necessidades sociais,
afiançando as seguranças sociais, garantindo padrões de qualidade e uma
identidade aos serviços, tendo o Estado como responsável pela política.
Ainda sobre a PSE, o controle social aparece de forma muito tímida, na
tipificação, falando apenas em exercício de cidadania, sem citar explicitamente
algumas possibilidades, como a articulação com os movimentos sociais, já que o
seu usuário parece ser o maior ausente do processo de construção da política, o
que certamente despolitiza o processo.
Diante do exposto, fica claro que a melhoria na qualidade nos serviços
prestados ainda está muito centrada na forma em que for apropriada pelo gestor.
99
É preciso caminhar agora com as formas de controle de implantação das
readequações propostas e trabalhar para a concretização da tipificação.
100
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os dilemas e desafios na PSE trazem consigo a exigência de pensar o novo,
que
foram
reforçadas
por
inquietações
importantes
apresentadas
pelos
trabalhadores.
A pesquisa mostrou que os estudos e reflexões sobre a PSE precisam
acompanhar o processo de amadurecimento da política, elucidando os desafios
postos no cotidiano de trabalho dos profissionais.
O próprio cotidiano de trabalho nos mostra quantas violações e
violências ocorrem na vida dos sujeitos que são demandantes e/ou
usuários da Assistência pela mediação das intervenções
socioinstitucionais. A rigor, nenhum de nós está imune a tais
violações na sociedade do capital, sejamos profissionais ou usuários
das políticas. (MARTINELLI, 2011, p. 8).
Uma das estratégias é trazer os holofotes para os serviços socioassistenciais,
que particulariza a PSE, e ampliar a discussão sobre sua efetiva implantação,
reconfigurando e padronizando as práticas dispersas em serviços socioassistenciais,
porém reconhecendo a diversidade e a equidade dos segmentos em que atua,
garantindo o direito à diferença.
Dentre as questões apresentadas, reforça-se o ocultamento dos usuários da
especial nos espaços de participação e construção da política. Contribuir com o seu
protagonismo, na compreensão dos seus direitos e de seu papel enquanto sujeito
político, constitui mais um desafio para o trabalho social na PSE.
Outro aspecto levantado pelo estudo foi a importância da articulação em rede
e intersetorialidade na PSE , principalmente com a PSB e com o Judiciário.
Em relação à PSB percebe-se que os próprios espaços institucionais
deficitários em RH e qualificação, acabam contribuindo para esse distanciamento,
mas, que assumir coletivamente os riscos, deve ser imperioso, não só da porta para
fora, na assistência.
Na construção do campo jurídico social, ressalta-se a importância do Creas
como mediação privilegiada para concretizar direitos e a necessidade de um perfil
profissional qualificado para lidar com as pressões institucionais diante da presença
101
forte do conservadorismo no Judiciário, que acaba por vezes revitimizando as
famílias e os indivíduos.
A aproximação empírica dos sujeitos da pesquisa mostrou que se está diante
de um quadro de profissionais recentes, na política de assistência, com pouca
experiência, e que ainda não se sentem qualificados diante da demanda que
atendem, apresentam dificuldades quanto à caracterização das especificidades do
Paefi e tem pouco domínio do
conjunto de defesas que sustenta a prática
profissional na PSE.
O momento histórico que vivemos, de consolidação da PSE no Suas, nos
remete para a construção de estratégias para encarar os desafios que estão
colocados no cotidiano, principalmente nas novas formas de atendimento e nas
novas exigências profissionais.
Ressignificar a assistência social passa não só pela reconfiguração dos
serviços, mas pela compreensão de delimitações e competências na política e de
redefinições de práticas profissionais, que são decisivas para o desempenho da
política em seu papel afiançador e restaurador em face da violação de direitos.
Para isso, pensar em processos de qualificação mais duradouros, para o
preparo teórico, técnico e político dos profissionais diante dos desafios da PSE e de
garantir condições institucionais adequadas para a execução do trabalho à luz da
NOB-RH nos remete prioritariamente à responsabilidade da gestão.
Um novo modelo exige muito esforço e a PSE como nível especializado mais
ainda, contudo, percebe-se pouco empenho dos entes federativos em relação a
esse nível de complexidade.
Aqui identificamos alguns dos temas que tem nos convocado à reflexão: Em
quais espaços temos avançados nessas discussões? Que bibliografias nos
permitem avançar nessas discussões? E as capacitações promovidas pelo MDS,
têm contemplado essas questões do cotidiano da PSE? Que identidade enquanto
trabalhadores da PSE estamos construindo?
A pesquisa mostrou que existem ainda práticas conservadoras identificadas
na atuação dos profissionais, demonstrando dificuldade de incorporação dos novos
preceitos da política de assistência.
E nos coloca à frente do desafio de definir em que medida a PSE traz em
seus serviços o ranço histórico mais difícil de ser enfrentado. Ainda, se o processo
de mudança não for amplamente discutido, corre-se o risco de reproduzir
102
expressões típicas do pensamento conservador, como despolitizar, moralizar,
culpabilizar o individuo, ajustar os desajustados e só mudar nomenclaturas,
colorindo a velha roupa.
Nestas quase duas décadas pós CF-88, as lutas pela transição das
ações e práticas de assistência social para a condição de política
pública tem apresentado inúmeros percalços, na medida em que esta
direção supõe consolidar a assistência social como responsabilidade
estatal distinta de sua histórica configuração enquanto prática
eventual e subsidiária da sociedade, em geral, de iniciativa
doutrinário-religiosa. Denomino esse processo de mudança de
paradigma político na política de assistência social. (SPOSATI, 2007,
p. 437).
Sendo assim, como a filantropia se apresenta hoje no campo assistencial,
especialmente na PSE? O Suas nos emancipou da filantropia? Ou temos hoje uma
filantropia escamoteada, mesmo com toda a nova organização proposta por seus
serviços? As entidades, por um âmago conservador, de fato afiançam as
seguranças sociais aos demandatários da PSE ou continuam reproduzindo um
modelo assistencialista? E os profissionais, onde se localizam nesse contexto?
Entende-se que a ruptura com modelos que não afiancem seguranças sociais
pode ser efetiva, na medida em que os gestores e os trabalhadores do Suas fizerem
a leitura e a operacionalização de forma radical, compreendendo efetivamente o que
significa a política de assistência social, examinando minuciosamente seus
fundamentos, em um processo subsidiado por estudos, socialização de experiências
e garantia do controle social.
Séculos de práticas sociais fragmentadas individualizadas
tuteladoras que foram sendo designadas como de assistência social
geram grande confusão no senso comum entre práticas
assistencialistas e a proposição da política pública de assistência
social presente na CF-88. (SPOSATI, 2007, p.436).
Toda transição impõe reflexão e a necessidade de dimensionar o significado
da mudança e coerência entre o que se quer e o que se pode, avaliando o que há de
inovação e que o novo tem de trazer consigo a crítica ao velho.
Fica a tarefa de estabelecer as mediações necessárias para entender e
conduzir
esse
socioassistenciais.
processo
de
reordenamento
da
PSE
e
dos
serviços
103
A pesquisa mostrou a ampla aceitação da tipificação como indutora desse
processo de reordenamento.
Arrisca-se a dizer, então, que a tipificação assume lugar central no que cabe à
assistência social como política pública de proteção social de garantir e prover,
contribuindo com a consolidação, em todo o País, dos serviços de assistência social,
que
constituem
materializando
a
um
mediação
conjunto
de
privilegiada
dos
seguranças;
direitos
promovendo
socioassistenciais,
a
cobertura
de
necessidades sociais; e padronizando a oferta de atenções, assim possibilitando a
redução de riscos e vulnerabilidades sociais.
Num processo de reflexão crítica, pode-se afirmar que a tipificação representa
um avanço institucional de relevância para a consolidação do Suas e da política de
assistência no Brasil e de combate das práticas conservadoras, principalmente na
PSE.
Considero que são as heranças nos procedimentos da assistência
social que devem ser rompidas e resignificadas sob novo paradigma,
e não propriamente sua nomenclatura. (SPOSATI, 2007, p. 436).
Chamamos a atenção, ainda, para a necessidade de encampar a luta contra
a visão equivocada que se tem da assistência, a ser vista como afiançadora de
defesa dos direitos sociais, e não como é propagada por aqueles que a
desqualificam como proteção social não contributiva, com um pretenso cunho
assistencialista.
As bases estão postas nos princípios e nas diretrizes na PNAS e em sua
direção social. Cabe, agora, enfrentar os desafios e dilemas do percurso nesse
trânsito
capacitador.Ajeitar
aquiEsta
pesquisa
pretendeu
reiterar
conteúdos
importantes e trazer à baila discussões contemporâneas da PSE. Finalizamos com
Antonio Machado:
Caminhante, as tuas pegadas
São o caminho e nada mais;
Caminhante não há caminho,
O caminho faz-se ao andar.
Ao andar faz-se o caminho
E ao olhar-se para trás,
Vê-se a senda que jamais,
Se há-de voltar a pisar.
104
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110
1.
ANEXOS
Questionário
I- Identificação
1. Nome_____________________________________________________________
2. Setor de Trabalho:___________________________________________________
3. Função (assinale apenas uma alternativa):
( ) assistente social
( ) psicólogo
( ) educador
( ) coordenação
( ) outras. Especificar___________
4. Há quanto tempo trabalha na Política de Assistência Social: _________________
II – Em relação às novas formas de ofertar o serviço e as novas exigências de
se pensar o novo pela Política Nacional de Assistência Social, Orientações
Técnicas, Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais,entre outros:
5. Você se sente qualificado para atender a demanda com a qual atua:
( ) superior ao necessário
( ) suficiente
( ) insuficiente
( ) muito insuficiente, comprometendo o trabalho.
6. Em relação à caracterização da violação de direitos que competem ao
CREAS/PAEFI,você:
( ) não consegue caracterizar
( ) apresenta muito dificuldade
( ) apresenta alguma dificuldade
( ) apresenta facilidade
( ) sempre consegue
111
7. Em relação à demanda do segmento com o qual atua, você conhece o conjunto
defesas de direitos?
( ) superior ao necessário
( ) suficiente
( ) insuficiente
( ) muito insuficiente, comprometendo o trabalho.
8. A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, na sua opinião:
(
) ajudou no reordenamento da política de assistência social
(
) atrapalhou
(
) não fez diferença
(
) não consigo dimensionar
(
) gerou confusão
9. Você identifica na atuação dos profissionais da Proteção Social Especial:
(
) a concepção de assistência como favor
(
) culpabilização do individuo que atende
(
) leituras moralizantes da realidade vivida pela demanda
(
) responsabilização da família
(
) prevalência de interesses políticos
(
) clientelismo
(
) fisiologismo
(
) primeiro damismo
(
) filantropia
(
) outras Especifique ________________________________________________
112
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Declaro, por meio deste termo, que concordei em responder às perguntas do
questionário da pesquisa de campo referente a pesquisa intitulada “Dilemas e
Desafios da Proteção Social Especial no âmbito do SUAS: uma contribuição ao
debate”, desenvolvida por Joana Maria Gouveia Franco Duarte . Fui informado(a),
ainda, de que a pesquisa é orientada por Maria Lúcia Martinelli e que poderei
contatar a pesquisadora a qualquer momento que julgar necessário por meio do
telefone nº: 11 99890-2557 ou 963721267 ou e-mail: [email protected]
Afirmo que aceitei participar por minha própria vontade, sem receber qualquer
incentivo financeiro e com a finalidade exclusiva de colaborar para o sucesso da
pesquisa. Fui informado(a) dos objetivos estritamente acadêmicos do estudo, que,
em linhas gerais é analisar os dilemas e desafios que estão postos na Proteção
Social Especial.
Fui também esclarecido(a) de que o uso das informações por mim oferecidas estão
submetidos às normas éticas destinadas à pesquisa envolvendo seres humanos, da
Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) do Conselho Nacional de
Saúde, do Ministério da Saúde.
Minha colaboração se fará de forma identificada , por meio de respostas assinaladas
no questionário e ocorrerá a partir da assinatura desta autorização. O acesso e a
análise dos dados coletados se farão apenas pela pesquisadora e sua orientadora.
Estou ciente de que, caso eu tenha dúvida ou me sinta prejudicado(a), poderei
contatar a pesquisadora responsável ou sua orientadora no Programa de Estudos
Pós Graduados em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC/SP, situado na Rua Ministro Godoy, 969 - Perdizes CEP 05015-000- São Paulo
- SP telefone (x-11) 3670-8000
A pesquisadora principal da pesquisa me ofertou uma cópia assinada deste Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme recomendações da Comissão
Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP).
Fui ainda informado(a) de que posso me retirar dessa pesquisa a qualquer
momento, sem prejuízo para meu acompanhamento ou sofrer quaisquer sanções ou
constrangimentos
São Paulo, ____ de _________________ de _____
Assinatura do(a) participante: ______________________________
Assinatura da pesquisadora: _______________________________
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