AS POLÍTICAS DE PROTEÇÃO A INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA E

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AS POLÍTICAS DE PROTEÇÃO A INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA E A
EDUCAÇÃO: REFLEXÕES A PARTIR DA DÉCADA DE 1920
Ana Carolina Pontes Costa 1
Resumo
Este artigo é resultado da dissertação de mestrado intitulada Trajetórias Sociais de jovens
que vivenciaram o processo de institucionalização por maioridade em abrigos institucionais
e tem como objetivo refletir sobre como foram construídas, ao longo dos anos, as políticas
de atendimento à crianças e adolescentes marginalizados, como também visa tecer
relações com as transformações ocorridas na educação brasileira, tendo como enfoque as
mudanças econômicas, políticas e sociais sofridas pelo Brasil no inicio e meados do século
XX. Para tanto, será apresentado um breve estudo bibliográfica sobre estas no Brasil, a
partir da década de 1920, tendo como foco a evolução da legislação específica e os estudos
produzidos e que abordam essa temática.
Palavras-chaves: Políticas Sociais, Educação, Infância.
ABSTRACT
This article is the result of the dissertation entitled Social Trajectories of young people who
have experienced the process of institutionalization by age in institutional shelters and aims
to reflect on how they were built, over the years, the policies of assistance to marginalized
children and adolescents, as also aims at establishing relations with the transformations in
the Brazilian education, with emphasis on the economic, political and social suffered by
Brazil in the early and mid-twentieth century. To this end, we present a brief survey of the
literature on these in Brazil, from the 1920s, focusing on the evolution of specific legislation
and studies produced and addressing this issue.
Keywords: Social Policy, Education, Childhood.
Introdução
1
Mestre em Educação - Á rea de Conc entraç ão em Educação Social pela Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul - UFMS (2012). Atualmente é professora da Educação Básica da P refeitura
Municipal de Corumbá e coordenadora técnica da Secret aria de Estado de Educação de Mato Grosso
do Sul
A problemática da infância e da adolescência institucionalizada tem sido
contemplada por estudos e pesquisas (SILVA, 1997; MARCÍLIO, 1998; VENÂNCIO,
1999; RIZINNI & PILOTTI, 2009) que procuraram descrever e analisar a história,
tanto das políticas sociais, como de crianças e adolescentes abandonados que
vivenciaram a institucionalização, demonstrando uma tendência de criminalização da
pobreza, da exclusão, da desigualdade e da violência.
Ao percorrer a história é possível perceber que a educação e as políticas
de atendimento a crianças e adolescentes estão de certa forma, interligadas por se
constituírem políticas sociais, e que emergem, ora como uma resposta do Estado
para amenizar os conflitos de classe, ora como conquista dos movimentos sociais
que eclodem no Brasil durante toda a sua história.
O desafio deste está no exercício, ainda de maneira incipiente, de olhar
para as transformações ocorridas na sociedade brasileira, como resultado de fatores
que
se
inter-relacionam, e
determinações.
não
como
fatos
isolados, mas
de
múltiplas
Quando pensamos a realidade da assistência a criança e ao
adolescente marginalizado, como a educação no Brasil, percebemos
a descoberta de complexas relações presentes no processo de
transformação de uma realidade, constituídas pelas contradições
próprias ao modo de produção capitalista, vigente internamente, e ao
mesmo tempo articulada, dependente e subordinada as contradições
geradas pelo avanço das relações econômicas internacionais
(XAVIER, 1994, p.299)
Estas complexas relações, e que a principio englobam fatores
econômicos e políticos como principais determinantes, corroboram para as reflexões
deste estudo, que permitiram entender que os investimentos nas áreas sociais estão
diretamente ligados ao percurso histórico do nosso país. Tanto as políticas de
atendimento a criança e ao adolescente, como a educação passaram por processos
de lutas e conquistas, a princípio, deixando de ter um caráter assistencialista para se
constituir um dever do estado e um direito para o cidadão, mesmo que antigas
práticas não sejam superadas ao longo dos anos.
A construção a política de atendimento a criança e ao adolescente e a
educação na história do Brasil – 1920/1990
O Brasil, nos anos finais da década de 1920, enfrentava um dos
momentos de muitas mudanças econômicas e sociais e sérios problemas políticos.
Com o crescimento da população e o desenvolvimento econômico dos grandes
centros urbanos formaram-se sérias contradições sociais, fazendo com que normas
de controle social passassem a ser estabelecidas no campo das relações entre o
público e do privado.
No que diz respeito às relações sociais construídas no Brasil, a história
registra que no final da década de 1920 e início da década de 1930, os grandes
centros urbanos foram marcados pelo crescimento descontrolado da população,
entre as consequências causadas por este processo, verificamos o aumento do
desemprego, da prostituição, de mendigos e de crianças que passaram a morar e
trabalhar nas ruas das grandes cidades. Estes problemas sociais comprometiam o
projeto econômico em ascensão da burguesia da época, considerando que este
projeto visualizava as ruas dos centros como espaço de circulação de dinheiro, uma
vez que eram nestes locais que as mercadorias eram efetivamente comercializadas.
Em relação ao cenário político e econômico deste período, o Brasil
apresentava um momento de consolidação do capitalismo industrial e de intensas
lutas políticas, resultando em importantes marcos históricos como por exemplo a
Revolução de 1930, a Revolução Constitucionalista de 1932 e o início do Estado
Novo em 1937.
Na área política, importantes alterações ocorrem quando em Getúlio
Vargas assume o poder, após da chamada Revolução de 1930. Durante o período
do seu governo foi promulgada a Constituição de 1934 e alguns anos depois, em
1937, foi iniciado o que chamamos de Estado Novo. Neste período, Vargas passou a
governar com poderes ditatoriais, tornando sua forma de governo centralizadora e
controladora.
A educação neste momento, envolvida por estas agitações políticas e
econômicas, inicia um processo de reformas educacionais visando atender aos
anseios do processo de modernização, dando a escola segundo Andreott (s/d) um
projeto de ascensão e inserção social.
Pode-se considerar neste momento, no campo educacional o Manifesto
dos Pioneiros da Escola Nova como o grande marco da educação que se
caracterizou por ser
Um movimento que se empenhou em dar novos rumos a educação
nacional e aos embates da Igreja no seu confronto com o
estabelecimento de novos modelos da educação, tornando evidente
a diversidade de interesses que abrangia a educação escolarizada.
(ANDREOTTI, s/d, p.01)
Este manifesto foi fruto de movimento por reformas educacionais tendo à
frente Fernando de Azevedo e outros 26 educadores com ideias pedagógicas dos
Estados Unidos da América e Europa e procurava uma organização do sistema
educacional brasileiro, que até então não havia se estruturado com o fim do império.
O mesmo contribuiu também para demonstrar um esgotamento da Pedagogia
Tradicional e uma necessidade de mudanças na forma de ensinar, procurando uma
adequação do ensino ao desenvolvimento capitalista industrial.
A
República
neste
momento
permanecia
com
um
governo
descentralizado em relação a educação elementar, porém “é o momento em que o
poder público assume a tarefa de organizar integralmente as escolas, tendo como
objetivo a difusão do ensino para toda a população” (SAVIANI, 2004, p.18).
Assim, a educação neste período começa a tomar forma de acordo com a
política nacionalista do país. Assim, o período da década de 1930 até 1960 foi
importante tanto para a consolidação do capitalismo no Brasil, como a
industrialização, como também para a penetração efetiva de uma nova ideologia
educacional, que proclamava a importância da escola como via de reconstrução da
sociedade brasileira.
Mesmo com este entusiasmo pela educação no Brasil neste momento e
com o aumento no número de matrículas, a demanda não foi atendida – após 1930,
continuava a ampliação de vagas nas escolas primárias, principalmente nos grandes
centros, porém a maioria dos alunos não frequentava os cursos primários.
No que diz respeito às minorias excluídas da sociedade, como do
processo de escolarização, neste momento encontravam-se crianças e jovens, que
enfrentavam o mundo do abandono, da mendicância ou de outras formas de
marginalidade. Desse modo, respeitando os interesses econômicos e políticos da
burguesia da época, o Estado passou a criar formas de controle e repressão sobre
esses meninos e meninas.
É neste contexto que surge o Código de Menores em 1927, o primeiro
documento legal para a população menor de 18 anos, conhecido como Código Mello
Mattos. Segundo Silva (2002, s/p),
[...] este código destinava-se a legislar sobre as crianças de 0 a 18
anos, em estado de abandono, quando não possuíssem moradia
certa, tivessem os pais falecidos, fossem ignorados ou
desaparecidos, tivessem sido declarados incapazes, estivessem
presos há mais de dois anos, fossem qualificados como vagabundos,
mendigos, de maus costumes, exercessem trabalhos proibidos,
fossem prostitutos ou economicamente incapazes de suprir as
necessidades de sua prole.
Ainda, de acordo com o autor,
O Código de Menores de 1927, que consolidou toda a legislação
sobre crianças até então emanada por Portugal, pelo Império e pela
República, consagrou um sistema dual no atendimento à criança,
atuando especificamente sobre os chamados efeitos da ausência,
que atribui ao Estado a tutela sobre o órfão, o abandonado e os pais
presumidos como ausentes, tornando disponível os seus direitos de
pátrio poder. (idem, s/p)
O Código de Menores de 1927 foi aprovado após a criação do primeiro
Juizado de Menores em 1924, respondendo a sociedade que cobrava ações do
Estado, quanto à situação “perigosa” de crianças pobres nas ruas, entendidas como
conseqüência do abandono e da falta de proteção da família, por isso necessitando
de proteção do Estado.
O Código criava uma diferença entre a criança e o menor que, que a
princípio não estava relacionada à idade, pois o termo “menor” era dado às crianças
e adolescentes marginalizados e delinqüentes das camadas mais pobres, enquanto
as crianças das famílias mais abastadas não recebiam este termo.
Estas leis possibilitaram que o Estado exercesse a tutela que até então
era das famílias, pois deveria intervir naquelas onde o “poder familiar” estava
ausente ou que não estava sendo realizado segundo os modelos estabelecidos, ou
seja: nas famílias das camadas populares. Assim, as famílias que não seguiam o
modelo da burguesia (classe em ascensão e dominante da época) tinham seus
filhos classificados como crianças em “situação irregular”. Segundo Venâncio (1999,
p. 13)
[...] as normas, as leis e as práticas assistenciais, que além de
estigmatizarem os pobres com acusações de irresponsabilidade e de
desamor em relação à prole, deram origem a uma perversidade
institucional que sobrevive até nossos dias: paradoxalmente, desde
os séculos XVIII e XIX, a única forma de as fam ílias pobres
conseguirem apoio público para a criação de seus filhos era
abandonando-os.
Dentro desse contexto, a questão econômica tornou-se o principal motivo
para que fosse tirado da família a autonomia e autoridade sob seus filhos. Assim,
são caracterizadas como incompetentes para cuidar dos filhos, sendo justificada
uma intervenção do Estado.
O mito criado em torno da família das classes empobrecidas serviu
de justificativa para a violenta intervenção do Estado neste século.
Com o consentimento das elites políticas da época, juristas
delegaram a si próprios o direito de suspender, retirar e restituir o
Pátrio Poder, sempre que julgassem uma família inadequada para
uma criança (RIZZINI; PILOTTI, 2009, p. 25).
Neste contexto, é preciso considerar que, mesmo com a República
institucionalizada no Brasil, e com um considerável enfraquecimento da Igreja, a
mesma ainda tinha um papel importante na época, pois contribuía para o reforço
deste modelo, difundindo a importância do casamento, estabelecendo normas de
conduta dentro deste sistema. Contrariando as normas estabelecidas pela Igreja,
que defendia o casamento, parte das mulheres das camadas populares estava
inserida num cenário familiar caracterizado pela ausência dos maridos. A elas,
cabiam o sustento e o cuidado com os filhos, e que a conseqüência deste cenário
muitas vezes era o abandono ou a mendicância dos mesmos.
Em relação ao abandono, até a década de 1920 era a Igreja que
desenvolvia ações para as crianças através da criação da Roda dos Expostos,
Orfanatos, Patronatos, Seminários, sendo iniciada a participação do setor público,
através da legislação, somente na década de em 1924 com criação do primeiro
Juizado de Menores e com o Código de Menores de 1927.
As famílias, nesta legislação eram representadas de forma negativa,
consideradas inabilitadas para de manter seus filhos junto a si para educar e
discipliná-los Este mito que estava apenas em torno da família pobre sendo
construído paralelamente a constituição da assistência social no país por parte do
Estado, tendo por prática a desqualificação pessoal e familiar em suas ações e
atendimentos sociais aos que precisavam de auxilio.
Ainda, com a ideia de mantê-los fora da sociedade é mantida a política de
institucionalização e em 1942 foi criado o Serviço de Assistência ao Menor (SAM),
que segundo Berger e Gracino (2005, p.172) consolidou uma política assistencialista
e repressiva para a criança e o adolescente, que correspondia a um sistema
penitenciário para a população de menor idade.
A implantação do SAM tem mais a ver com a questão da ordem
social que da assistência propriamente dita. [...] Vinculada ao
Ministério da justiça e do juizado de menores, tem como competência
orientar e fiscalizar educandários particulares, investigar os menores
para fins de internação e ajustamento social, proceder ao exame
médico-psicopedagógico, abrigar e distribuir os menores pelos
estabelecimentos, promover a colocação dos menores, incentivar a
iniciativa particular de assistência a menores e estudar as causas do
abandono (FALEIROS, 2009, p. 55).
Nota-se com a citação que o SAM, ainda possuía uma visão reducionista
da assistência ao menor, quando em seus objetivos priorizava o abrigamento e a
“distribuição” dos menores em estabelecimentos. Segundo Moreno e Saraiva (2006,
p. 04) afirmam que “o SAM veio a se constituir no precursor das atuais e fracassadas
políticas de confinamento dos e das jovens em instituições totais”.
Vizualiza-se já neste momento havia uma intencionalidade de procura de
parcerias privadas para a realização deste atendimento. Ou seja, ao mesmo tempo
em que o Estado chamou para si a responsabilidade da assistência, procura
também parceiros para que, na prática, seja apenas o regulador e fiscalizador das
ações. Essa parceria, a princípio, ocorria através do compromisso financeiro, na
forma de auxílios e repasses de verbas pelos serviços prestados, caracterizando
que o governo não havia assumido diretamente e exclusivamente o atendimento ao
menor.
Durante o seu funcionamento, o SAM foi alvo de inúmeras denuncias,
conforme aponta o autor:
A instituição desenvolveu péssima reputação à vista do público e da
imprensa, que passou a chamá-la de “universidade do crime” e
“sucursal do inferno”, com verdadeiras prisões onde imperavam
torturas, drogas, violência, abuso sexual e corrupção administrativa
(GOMES DA COSTA, 1991 apud OLIVEIRA, 2007, p. 138).
Neste período, o Brasil enfrentava a decadê ncia do Estado Novo
impulsionado pelo fim da Segunda Guerra Mundial. As repercussões da Segunda
Guerra, por si só, não explicam a transformação política no Brasil. Na verdade, elas
se entrelaçaram à crise política interna, formando uma complexa rede de
contradições que resultou na criação de um cenário favorável para o fim do Estado
Novo.
Na verdade neste momento, começam a emergir discussões sobre a
redemocratização do pais. No entanto, a população não participou efetivamente
deste processo, cabendo em grande parte aos opositores do governo de Getúlio
Vargas a responsabilidade pelo seu fim.
No campo educacional este período da década de 1940 ficou
caracterizado por diversas reformas parciais no ensino, no entanto considera-se que
nesse momento toda a estrutura educacional foi reorganizada, principalmente
através das Reformas Capanema, que entre outras ações: criou o SENAI, o SENAC
as Leis Orgânicas do Ensino Secundário, Ensino Comercial, Ensino Primário, Ensino
Normal e Ensino Agrícola. Estas Reformas, segundo Savianni (2008, p. 269)
Do ponto de vista da concepção, o conjunto das reformas tinha
caráter centralista, fortemente burocratizado; dualista, separando o
ensino secundário, destinado as elites condutoras, do ensino
profissional, destinado ao povo conduzido e concedendo apenas ao
ramo secundário a prerrogativa de acesso a qualquer carreira de
nível superior; corporativista, pois vinculava estreitamente cada ramo
ou tipo de ensino às profissões e ofícios requeridos pela organização
social.
Assim, com esta afirmação, ficam claras as intencionalidades para a
educação nesse momento, que era o de fomentar o modelo econômico que
necessitava de mão de obra qualificada para a manutenção do desenvolvimento no
país. Enquanto havia uma dualidade no acesso aos cursos do ensino superior, para
as camadas mais favorecias, cabia aos filhos dos membros das camadas populares
os ensinos técnicos e profissionalizantes, para alimentar a demanda do país.
No período que vai da queda do Estado Novo, em 1945, até a Revolução
de 1964, o sistema educacional brasileiro passou por mudanças significativas,
destacando-se entre elas o surgimento, em 1951, da atual Fundação CAPES, que é
a Coordenação do Aperfeiçoamento do Pessoal do Ensino Superior, a instalação do
Conselho Federal de Educação, em 1961, campanhas e movimentos de
alfabetização de adultos, além da expansão do ensino primário e superior. Na fase
que precedeu a aprovação da LDB/61, ocorreu um grande movimento em defesa da
escola pública, universal e gratuita.
No cenário político, a Revolução de 1964 instaurou no país novamente o
regime militar, chefiado do Getúlio Vargas. Como após a Segunda Guerra Mundial, o
mundo havia se dividido em dois grandes blocos: dos comunistas e dos capitalistas,
os militares alegaram que o país esta va se a afiliando aos países comunistas,
rompendo com a tradição histórica do país de aliança aos países capitalistas,
cabendo então, uma interferência dos militares, que destituíram o Governo Goulart.
Em relação a política de proteção a criança e ao adolescente, em
especial, a marginalizada, na segunda metade dos anos 1960, ocorreu a extinção do
SAM, sendo implantada a Política Nacional de Bem-Estar do Menor (PNBEM).
Institui-se então a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM) como
instrumento político e de propaganda da ditadura militar, sendo inaugurada no dia 1º
de dezembro de 1964, com a atribuição de coordenar uma Política Nacional de
Bem-Estar do Menor. Surgem então, as instituições para Recolhimento Provisório de
Menores (RPM), precursoras das Unidades de Triagem e Atendimento Provisório
(UAPs) da Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor (FEBEM), que em 2000
passaram a ser denominadas de Unidades de Internação Provisória (UIPs)
(SPOSATO, 2005, p. 2 e 3).
Anos mais tarde, após longo período de discussões acerca do Código de
Menores Melo Matos, o mesmo foi alterado pela Lei nº. 6.697, aprovada em 10 de
outubro de 1979, em plena vigência das diretrizes da Política Nacional do Bem-Estar
do Menor implantadas pela FUNABEM, “[...] onde as alterações contidas nesta lei
buscavam atender aos anseios dos Juízes de Menores no que diz respeito ao
atendimento do adolescente em conflito com a lei, passando agora, a ser chamado
de adolescente em “situação irregular” (JUNIOR, 2007, p. 3-4).
As políticas sociais até o momento refletiam a necessidade do grupo
dominante em excluir, abolir, e esconder a massa de pessoas que eram tidas como
“perigosas” para a sociedade.
Afirmava- se um sistema de classes, e a intenção de se retirar do
espaço público as classes inferiores, retornando-os à invisibilidade –
às prisões, aos manicômios e às instituições correcionais.
Estabelecia-se um pacto ideológico favorecendo o cumprimento da
profecia que coloca os filhos dos pobres como futuros marginais,
desatinados e sociopatas (Oliveira, 2007, p. 140).
As pessoas empobrecidas representavam uma ameaça, conforme aponta
o autor:
Os pobres e seus filhos representavam contraste nocivo e ameaça
aos cidadãos ‘decentes’ e às outras crianças – as das classes
econômicas mais abastadas. A salvação, para os pobres, era a
resignação – aceitarem os papéis que lhes são socialmente
destinados, como exército de reserva de mão-de-obra, empregados
ou desempregados conforme a conveniência do mercado, escravos
virtuais, cuja ambição maior não pode ir além do subemprego, da
economia informal e do salário mínimo. Seriam, assim, aceitos pela
sociedade decente, ordeira e trabalhadora (idem, 2007, p. 140).
A década de 1980 ficou marcada pelo Brasil extinguir a ditadura militar e
instaurar um processo de redemocratização da política, tendo vários aliados como: a
sociedade civil e outras instituições. Estas lutas culminaram com a promulgação da
Constituição Federal Brasileira de 1988, promulgada após amplo movimento pela
redemocratização do País, que procurou introduzir inovações e compromissos, com
destaque para a universalização do ensino fundamental e erradicação do
analfabetismo. Já em 1989, após intensas conquistas políticas e econômicas, foi
eleito pelo o voto direto o Presidente da República Fernando Collor como o primeiro
presidente eleito pelo povo desde 1960.
A educação neste momento, inserida no contexto neoliberal, passa a ser
vista como pertencendo a esfera do mercado e, portanto, objeto das políticas
neoliberais. Dentro da postura neoliberal deste governo, um dos elementos
principais é a ideia de estado mínimo e de competitividade. Assim, a ideia de estado
mínimo prega, de um lado, a redução dos gastos públicos e, de outro, que sua
função passaria a ser a de agir como reguladora das políticas sociais.
No que diz respeito à criança e ao adolescente, neste momento ocorre
um dos grandes marcos que é a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), de 1990, que propõe uma linha de ação acerca da execução de políticas de
atendimento a criança e o adolescente, e que impôs ao Estado e à sociedade uma
série de obrigações e deveres que resultaram em uma grande rede de proteção
social para crianças e adolescentes.
Assim, vemos que as alterações trazidas por essa nova legislação, que
busca um tratamento indiferenciado para todas as crianças e adolescentes e não
mais apenas para os “menores”. Ou seja, o ECA não trata apenas de questões
relacionadas aos direitos da criança e do adolescente em situação de risco ou
vulnerabilidade, mas sim ao direito da criança e do adolescente de uma forma
universal.
No percurso da legislação e das políticas de atendimento a criança, como
também na educação, podemos verificar que as mesmas se transformam ou
recebem uma nova “roupagem” de acordo com a conjuntura política e econômica do
país. O que foi possível verificar é que, por um lado, estas “políticas sociais”
serviram diretamente para a manutenção do sistema capitalista e que, somente com
a democratização do pais na década de 1990, elas se tornam efetivamente políticas
sociais com novas configurações. No entanto, ainda resistem não como políticas
universalistas (o que na educação ocorreu), mas como políticas focais de acordo
com o próprio sistema, que continua de apresentado de forma agressiva no cenário
mundial.
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