Stuart Hall

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UFGD – UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS
FACALE – FACULDADE DE COMUNICAÇÃO, ARTES E LETRAS - CURSO DE
LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS – MESTRADO
DISCIPLINA: DISCURSO, IDENTIDADE E IDEOLOGIA
DOCENTE: PROF. DR. MARCOS LÚCIO DE SOUZA GÓIS
DICENTE: PROF. ESP. LUIS BENEDETTI
FICHAMENTO: HALL, STUART. A IDENTIDADE CULTURAL NA PÓS-MODERNIDADE.
RIO DE JANEIRO: DP&A. 2006.
Stuart Hall nasceu em Kingstown, Jamaica, em 1932, oriundo de uma família de classe
média. Já durante sua educação básica começa a se destacar, além do brilho próprio nos
estudos, pelas leituras extras que passa a realizar, cobrindo desde a literatura e poesia
caribenha até obras fundadoras do pensamento sociológico ocidental, tais como Karl
Marx, Lenin e mesmo Freud.
Radicado no Reino Unido a partir de 1951, esse estudioso da cultura dedicou-se
primeiramente à compreensão dos meios de comunicação como fenômeno social, o
papel ideológico da mídia e sua natureza, posteriormente evoluindo seus estudos para
abranger o ‘novo ser humano’ que emerge das mudanças globais ocorridas na
intersecção dos segundo e terceiro milênios da história, em busca de uma alternativa
para as análises de cunho funcionalistas e estudos de medição de audiências, típicas de
seus contra-pares americanos, interessados e financiados pelo setor privado.
Formado pelo Merton College, em Oxford, chegou a diretor do Centro de Estudos
Culturais da Universidade de Birmingham – o Birmingham Centre of Cultural Studies,
um dos principais focos da corrente de pensadores, filósofos e sociólogos, preocupados
em compreender como a evolução das T.I., tecnologias da informação e da
comunicação, afetaram o mundo do século XX, que ficou conhecida pelo nome de seu
departamento: The British Cultural Studies.
Publicou livros dedicados à compreensão do indivíduo como sujeito exposto às mídias,
como o concebemos o ser humano típico do fim do século XXI, tais como as obras
“Representação cultural e práticas de significação” e o artigo “Codificando e
decodificanto o discurso televisivo”, de 1973, que examina o processo de comunicação
televisiva tanto em seu aspecto técnico-tecnológico, a produção, circulação,
distribuição/consumo e reprodução; quanto na sua relação com os destinatários das
indústrias televisivas, as audiências, que Hall define como relação de decodificações
midiáticas ‘dominante’, ‘oposicional’ e ‘negociada’.
Se nestas obras já se adivinhava uma preocupação na análise das fontes de significação
pelas quais se constroem os sujeitos participantes da vida social, na atual obra “A
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identidade cultural na pós-modernidade”, dedica-se a analisar os descentramentos e
deslocamentos que sofreram as identidades dos indivíduos da era informacional, bem
como a dinâmica e as repercussões do surgimento de novas fontes de identificação e
significação, advindo da evolução social e tecnológica da humanidade que desembocou
em um novo formato econômico e social ao qual o mundo está atrelado, era que Stuart
Hall nomeia de ‘pós-modernidade’ ou ‘modernidade tardia’.
Dividido em seis capítulos, o livro percorre caminhos da sociologia, política e teoria
culturológica para tentar dar conta de explicar as transformações sociais que
transtornam o locus vivendi dos sujeitos atuais.
Parte da busca de definições de sujeito e de ser humano, remontando ao iluminismo e à
reforma protestante para dali recompor, primeiramente, o sujeito que surge no momento
em que a Europa emerge das trevas da idade média. Sobre essa base, delineia o sujeito
moderno, surgido do processo de acentuada industrialização e concentração
populacional em torno das cidades, fenômeno que ‘cria’ as grandes massas
populacionais e acentua o conflito de classes, principal objeto de estudo de seus teóricos
de influência, tais como Karl Marx.
Finalmente, parte desse sujeito moderno e da discussão a respeito das fontes de
estabilização desse sujeito, para esboçar novos formatos de identificação, que nascem
da desagregação das identidades assumidas pelo sujeito moderno.
Hall provoca o leitor a pensar e repensar as próprias bases de sua auto significação e
esse é talvez o maior mérito do livro: ao mesmo tempo em que aponta caminhos, sem
no entanto definir seu ponto final, o livro desperta em nós um sentimento de
identificação, de que nossa trajetória como indivíduos e sujeitos está ali exposta.
CAP. 1 - A IDENTIDADE EM QUESTÃO. (P.07)
Stuart Hall coloca que o momento atual é de rediscussão a respeito das identidades na
teoria social, pois as velhas fontes de identificação, que estabilizaram o mundo por
durante os últimos dois séculos estão agora em declínio e fragmentação, dando lugar a
novas identidades surgidas do processo de mudança que ora desloca as estruturas e
processos centrais das sociedades modernas.
Mas o que é a chamada “crise da identidade”? Qual sua origem? Quais acontecimentos
das sociedades modernas precipitaram essa crise? Como se constitui essa crise em
relação tanto às identidades do sujeito quanto às identidades culturais?
Stuart Hall parte da premissa que as identidades atuais estão sendo descentradas e
fragmentadas, pela mudança estrutural que acontece nas sociedades pós-modernas,
esfarelando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, religião, raça e
nacionalidade, até então os pilares de sustentação e estabilização dos sujeitos sociais.
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A descentração ou deslocamento do sujeito se dá pela perda do ‘sentido de si’ que a
transmutação do habitat social causa ao indivíduo enquanto sujeito de uma série de
papeis sociais a que se propõe como forma de estabilizar sua vivência e
desenvolvimento sociais.
“A identidade só se torna uma questão quando está em crise, quando algo que se supõe
como fixo, coerente e estável é deslocado pela experiência da dúvida e da incerteza”
(Mercer, 1990, p.43)(p.9).
Tomando por base o argumento de Marcer, além do fato que a globalização não se
espalha de modo uniforme, conceito que Hall nos irá proporcionar mais a frente,
podemos intuir que a própria inserção da questão das identidades nas mídias e no
panorama de discussão social que vêm rompendo os padrões estabelecidos e tidos como
estabilizados no Brasil é o sinal inequívoco que também nossa sociedade encontra-se
em pleno processo de entrada no rol das revoluções sociais que permeiam a
modernidade tardia global.
CAP. 1.1 - TRÊS CONCEPÇÕES DE IDENTIDADE. (P.10)
O autor considera a existência de três tipos de identidade, surgidas ao longo do
desenvolver histórico, social e teórico das sociedades, a saber: Sujeito Iluminista,
Sujeito Sociológico e Sujeito Pós-moderno.
Sujeito Iluminista – concebe a pessoa como um ser único, centralizado e original,
dotado das capacidades de razão, de consciência e de ação, cujo centro de si localiza-se
em seu próprio interior. Reação à concepção teológica do mundo, busca pela razão e
realização do indivíduo. Concepção individualista, o sujeito como centro do universo.
Sujeito Sociológico – concebe a pessoa não como um ser autômato e autossuficiente, de
características totalmente inatas, pois expressa a noção que o sujeito é formado em
relação às outras pessoas e aos ambientes onde ocorre sua aparição, desenvolvimento e
fenecer. O ‘eu’ de cada um se desenvolve somente pela interação do indivíduo com a
sociedade a qual pertence e aos demais grupamentos humanos. A identidade ocupa o
espaço entre o interior e o exterior do indivíduo, constituindo-se na interface entre o
particular e o público.
Sujeito Pós-moderno – concebe a pessoa como um ser sem uma identidade estável. Na
medida em que as sociedades e suas estruturas são transmutadas pela revolução social
que vivemos, as identidades também mudam e se adaptam, no processo de busca por
coerência e unidade do indivíduo quando em dissonância cognitiva com a sociedade.
Não existe um ‘eu’ coerente, de tal modo que nossas identificações estão sendo
continuamente deslocadas.
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CAP. 1.2 - O CARÁTER DA MUDANÇA NA MODERNIDADE TARDIA. (P.14)
Retomando a definição de Karl Marx sobre as sociedades modernas, temos um mundo
em constante ebulição, onde todas as estruturas criadas estremecem e caem por terra
antes de se estabelecerem solidamente.
Como disse o próprio Marx:
“É o permanente revolucionar da produção, o abalar ininterrupto
de todas as condições sociais, a incerteza e o movimento eternos . . Todas
as relações fixas e congeladas, com seu cortejo de vetustas representações
e concepções, são dissolvidas, todas as relações recém-formadas
envelhecem antes de poderem ossificar-se. Tudo o que é sólido se
desmancha no ar..” (Marx e Engels, 1948: p.70)(p.14)
A globalização acelera e potencializa esse processo, ao colocar em contato culturas
antes geograficamente separadas, de forma que a modernidade atual não pode ser
descrita apenas como a experiência do sujeito diante as práticas societais vigentes, mas
sim o próprio exame dessas práticas, em comparação a si e as demais culturas humanas
existentes, ocasionando sua constante evolução e mutação. O sujeito torna-se, assim
como a sociedade, descontínuo.
A globalização e o contato próximo entre diferentes culturas, ao mesmo tempo em que
expandiu os limites físicos do indivíduo, alterou algumas das características mais
fundamentais, intimas e pessoais da vivência cotidiana.
A visão tradicional da sociologia sobre as sociedades modernas é de um organismo
fechado, que se produz e desenvolve a partir de suas próprias forças interiores. A
modernidade tardia esfacelou esse quadro por seu caráter caótico e multipolar, no qual a
sociedade está sujeita a constantes deslocamentos ou descentramentos oriundos de
forças externas/exteriores a si.
As sociedades da pós-modernidade são caracterizadas pelas diferenças, pois são
atravessadas por incessantes vetores de antagonismos sociais e divisões ideológicas que
produzem uma admirável variedade de ‘posições de sujeito’ ou seja, identidades, para
que sejam ‘vestidas’ pelos indivíduos em interação.
Se não há uma completa desagregação da sociedade mundial é por que essas múltiplas
identidades podem, circunstancialmente, associarem-se em torno de objetivos e pontos
de vista em comum, não obstante essa associação seja sempre temporária e as estruturas
de identidades permaneçam constantemente em aberto, mutando-se conforme mudam os
panos de fundo social onde a ação do indivíduo se desenrola.
Se por um lado esse quadro parece assustador, na medida em que nos coloca em mundo
convulsivo, em permanente distorção e desagregamento, por outro abre a possibilidade
de construção de novas identidades, recompondo as estruturas em torno dos pontos em
comum existentes.
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CAP. 1.3 - O QUE ESTÁ EM QUESTÃO NO JOGO DAS IDENTIDADES? (P.18)
Podemos tomar alguns apontamentos de Hall sobre as identidades transitórias e
diferenciadas da sociedade pós-moderna:
Essas identidades são basicamente contraditórias, intercruzando-se e deslocando-se
mutuamente;
Essas contradições e deslocamentos ocorrem tanto exteriores ao indivíduo, tendo seu
lugar na sociedade quanto se manifestam interiormente, dentro da cabeça do indivíduo;
Nenhuma identidade em particular tem o poder de congregar todas as demais em seu
entorno, se tornando o que seria uma ‘identidade mestra’, reguladora das demais;
As estruturas sociais e paisagens políticas do mundo atual são transpassadas e fraturadas
por essas identidades rivais, surgidas da erosão das identidades mestras hegemônicas até
meados do século XX;
A identidade muda de acordo com a forma pela qual o indivíduo é interpelado, de
maneira que não é atribuída por um pano social, mas decidida pelo indivíduo. A
identidade tornou-se politizada, porém evolui longe das ideologias centralizadoras. A
identidade mudou seu foco do conflito de classes para a exaltação da diferença e de
diversidade.
Hall considera os seguintes elementos do jogo das identidades:
•
As identidades são contraditórias. Elas se cruzam e se deslocam mutuamente;
•
As contradições atuam tanto na sociedade, o exterior do indivíduo, quanto em
seu interior, nos seus pensamentos;
•
Nenhuma identidade singular pode, hoje em dia, alinhar a si todas as demais
identidades, surgindo como uma “identidade mestra” tal como tínhamos dentro da
sociedade organizada como um eterno conflito de classes;
•
As paisagens políticas do mundo estão sendo fraturadas, de forma crescente, por
estas identidades conflitantes advindas da falência das identidades mestras existentes até
o século XX;
•
A identificação não é automática, mas sim atribuída. Ganha-se ou perde-se essa
identidade. Atualmente estamos migrando das identidades de classe para as identidades
da diferença.
CAP. 2 - NASCIMENTO E MORTE DO SUJEITO MODERNO. (P.23)
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Esse capítulo se dedica a transcorrer sobre o surgimento do ‘sujeito humano’, durante os
séculos XIX e XX, com certas capacidades fixas e um sentimento estável de sua própria
identidade, com sua cristalização e estabilização no discurso e nas teorias da sociologia
moderna.
A seguir, aponta como esse sujeito evoluiu para um estado sociológico e interativo na
era que precedeu a atual e como a modernidade tardia vem descentrando esse sujeito,
pela mudança dos processos sociais e das dinâmicas sociais que são os moldes das
identidades.
Assim como o sujeito moderno é a base para tentarmos delimitar o que seriam as novas
identidades advindas de um ‘sujeito pós-moderno’ ainda não completamente formado,
temos que compreender que a concepção moderna de sujeito é fruto de uma evolução
anterior.
E para delinearmos o sujeito moderno temos que retornar ao seu predecessor, tido como
um ente soberano, único e absoluto, surgido entre o humanismo renascentista e o
iluminismo dos séculos XVI até XVIII, nomeado por Hall de ‘Sujeito Iluminista’.
Por um lado a reforma protestante libertou o homem para que este passe a ter de si uma
consciência individual, a partir do momento em que passa ter um canal direto e
exclusivo com Deus. Por outro, o renascimento e a evolução científica, que trouxeram à
humanidade novas formas de pensar e inquirir, colocaram o ser humano em foco, não
mais como parte de uma classe de pessoas, mas como ente único e indivisível.
Aliás, Hall (p27) resgata a definição de Willians para o sujeito pré-moderno,
caracterizando-o como indivisível, ou seja, uma entidade unificada, e também como
“singular, distintivo e único”, contrariando a visão predominante até a idade média que
o homem se construía a partir de sua constituição social, religiosa e hereditária.
O homem passa de um sujeito historicamente delineado, ou seja, formado a partir das
realizações, ‘raça’, posição social e racial de seus antecedentes, para um sujeito formado
por suas próprias qualidades essenciais, cujo destino é definido por seu
desenvolvimento, não por suas características inatas.
Um bom exemplo desse novo pensamento humano é o matemático e suposto criador da
filosofia moderna, Renè Descartes (1596-1650), que condicionou a criação do mundo à
Deus, à guisa de meia culpa, explicando todo o resto da história por argumentos lógicos
e matemáticos.
Ao colocar que as coisas devem ser explicadas a partir de suas reduções máximas, ou
seja, a partir de suas partes indivisíveis e por ver o mundo como uma bipartição entre
uma substância espacial (matéria) e uma substância pensante (mente), Descartes
refocalizou o grande dualismo mente-matéria, que aliás tornou-se um dos pontos
centrais do questionamento filosófico moderno.
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Seu dito: “Cogito, ergo sum”, “penso, logo existo”, serviu de apoio para a definição de
pensamento e mundo segundo as visões modernas, onde o mundo não “é”, quer dizer, o
mundo não existe como entidade independente, mas sim como a percepção que os seres
têm deste mundo. Seria equivalente a dizer que nosso universo tem a extensão de nossa
capacidade de percepção e entendimento.
“A identidade de uma pessoa alcança a exata extensão em que sua consciência pode ir
para trás, para qualquer ação ou pensamento passado”, disse John Locke, postulando o
indivíduo soberano como uma identidade que atravessa e limita a si mesma. Essa é a
origem do sujeito da razão, não apenas como o conhecedor da ciência e das práticas,
mas como o ‘sofredor’ das consequências dessas práticas.
Através de Raymond Willians (p28), Hall nos trás a noção que o desmonte ideológico
que solapou o sistema feudal trouxe um novo significado ao indivíduo, como um sujeito
soberano, superior e independente de qualquer função que possa lhe ser atribuída dentro
de uma sociedade hierarquicamente rígida.
Porém, o sujeito iluminista, o sujeito-da-razão, entra em colapso a partir do século
XVIII, quando a evolução humana nos aspectos tecnológico, social, industrial e,
principalmente, demográfico, cria as massas populacionais características do
capitalismo industrial então nascente.
O crescimento e complexificação das sociedades impeliram os teóricos a encontrarem
um novo sujeito que dê conta de explicar esses novos fenômenos. A regulação social
baseada no indivíduo e suas aspirações deram lugar a uma visão coletiva da
humanidade.
O empreendedor individual da Riqueza das Nações de Adam Smith ou mesmo do O
Capital, de Marx, foi transformado em grandes conglomerados empresário-industriais.
As maquinarias e entraves burocráticos do estado moderno enredaram o cidadão
individual.
O sujeito moderno, em consonância com os séculos XVIII, XIX e primados do século
XX, surge dessa concepção mais social do indivíduo. A pessoa passa a ser definida e
localizada pelas macroestruturas as quais está atrelada.
Essa visão mais ampliada e interacional da existência humana se deve, sobretudo, a dois
‘fatos científicos’: Darwin e seu evolucionismo; o nascimento das ciências sociais.
O primeiro nos descreve como um organismo inserido dentro de um ambiente em
permanente evolução, forçado a adaptar-se pelas próprias estruturas de sustento vital das
quais depende, de modo que o sujeito tomado em separado da sociedade não existe,
nem como ser real e nem como uma mera hipótese, pois seria despida de coerência.
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O segundo ‘fato’, as ciências sociais, apesar das evoluções que trouxe ao conceito de
sujeito, ainda manteve e cristalizou alguns postulados típicos das concepções anteriores
de sujeito, tais como:
•
O dualismo de Descartes, mente e corpo, com a designação da psicologia como
campo privilegiado para o estudo da mente;
•
A manutenção do “sujeito soberano”, com seus desejos e necessidades, como
figura central da economia e dos estudos jurídicos.
Porém, apesar da manutenção desse sujeito soberano, as ciências sociais o revestiram de
uma lógica interacional, ao inseri-lo dentro de um grupo e sob determinadas regras
coletivas que tornam-se inerentes a qualquer contrato estabelecido entre os sujeitos.
A constituição do sujeito moderno deriva dessa internalização do sujeito social, pela
constituição da identidade em oposição ao mundo ao seu redor, na busca de uma
individualização das necessidades de sua classe, além de uma crescente exteriorização
dessas necessidades interiorizadas, trasmutadas em desejos pela sua inserção
ideológico-sócio-política em aderência a um dos campos em conflito na luta de classes.
Quer dizer, as próprias aspirações e os desejos do sujeito se derivam de macro fontes de
significação comuns e auto definidoras da classe à qual pertence.
Se observarmos boa parte das teorias sociais que descrevem o indivíduo-sujeito
moderno sob uma ótica histórica, poderemos facilmente associar o dualismo indivíduosociedade com a bipartição cartesiana do ser entre matéria (sociedade) e pensamento
(indivíduo).
Ironicamente, a estabilização do sujeito como um ente em permanente interação
interior/exterior dá-se pela metade do séc. XX, justamente o momento em que o mundo
que originou este sujeito começa a desmoronar, ou ao menos, mostrar fortes sinais de
fadiga da megaestrutura, indicando um desmoronamento próximo.
Da ruína desse homem social que surge o sujeito do final do sec. XX, alienado e
perdido nas grandes metrópoles, inserido contra o pano de fundo de uma multidão
anônima e impessoal. O peão de fábrica, a empregada doméstica, o jovem advogado e o
bancário, que sacolejando no mesmo vagão de trem, olham a paisagem cinza, tão
igualmente descontentes com a situação como incapazes de compreende-la. Ou mudala.
Hall cita Baudelaire e Walter Benjamin (p33), mas poderíamos facilmente nos referir a
tantos outros autores, tanto das letras como nas demais artes, empenhados em retratar o
indivíduo desumanizado do final do século passado. Um semi-humano, um ser em
constante decepção de suas aspirações, porém acorrentado a um sistema do qual se
mantém dependente por sua própria vontade.
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CAP. 2.1 - DESCENTRANDO O SUJEITO. (P.34)
Hall (p34) sustenta que os teóricos envolvidos em defender a fragmentação do sujeito
na modernidade tardia na verdade apontam seu deslocamento, não a desagregação pura
e simples. Hall apoia o capítulo sobre cinco avanços das ciências e do pensamento
humano que acabaram por ocasionar essa descentração do sujeito cartesiano.
O primeiro deslocamento deve-se a releitura de Marx efetuada por Louis Althusser, que
partiu da construção do sujeito histórico e dialético do Marxismo para assumir que o
indivíduo somente pode agir com base nas condições sócio técnicas do momento
histórico no qual se insere. O sujeito é despido assim de sua essência, tanto para o
conceito de raça humana quanto para o conceito de indivíduo.
Ainda que essas definições partam de um anti-humanista tão famoso quanto criticado
como Althusser (p36), sua influência sobre o pensamento moderno foi inegável. A
reflexão do homem sobre si mesmo não mais como um organismo único e individual,
mas fruto de um tempo e uma era, inevitavelmente atrelado aos desafios de sua época,
trás o gosto amargo de uma redução do homo sapiens, como espécie ‘privilegiada’ pelo
pensamento, para um organismo refém do próprio sistema do qual, na visão do
indivíduo médio, é o criador e controlador.
O segundo dos grandes descentramentos do sujeito dá-se pela descoberta do
inconsciente por Freud. Ao retirar nossos atos da esfera privilegiada do pensamento
lógico para uma fusão entre este e atividades cerebrais incontroláveis e externas ao ser,
uma vez que são constituídas em oposição ao mundo, o pai da psicanálise dinamita o
sujeito-da-razão iluminista.
Tanto Freud, como posteriormente seu discípulo Jacques Lacan, definiram a criança
como um ente em aberto, cuja imagem de “eu” inteiro e único é construída a partir de
suas relações familiares e do seu desenvolvimento social, o que desloca o centro de
formação do sujeito do interior do indivíduo para o exterior, para sua interface com o
mundo que o cerca.
Essa é a concepção do “eu” como um ser em permanente formação pelos estímulos
recebidos do exterior evoluirá para o sujeito interativo de Mead e Cooley (p37), com a
grande diferença que para Freud essas interlocuções dão-se de modo subjetivo ao passo
que os outros dois afirmam ser a socialização fruto de um aprendizado consciente.
Talvez seja o caso de trocar a palavra identidade por identificação, a partir da
compreensão que esta não é dada no momento do nascimento, mas sim formada a partir
do olhar do outro e pelas relações pessoais.
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Na verdade, o homem não é uma criatura completa, mas sim um todo incompleto, sendo
a identidade essa matéria que preenche os espaços vazios que existem entre um
indivíduo e o outro.
O terceiro grande descentramento a ser observado é o trabalho do linguista estrutural
Ferdinand Saussure, que fixou a língua como um sistema social, não como uma posse
individual.
Desta maneira, não somos mais os autores das nossas expressões na língua que
utilizamos para nos comunicar, antes estando condicionados por esta língua. Apenas
podemos produzir significados quando nos posicionamos dentro das regras do idioma e
dos sistemas de significado de nossa cultura.
Quer dizer, novamente temos que o homem colocado à parte da sua sociedade não pode
ser definido como homem, na nossa concepção de ser racional, histórico e social. Os
significados das palavras e das expressões não são fixos, formando e reformando-se em
relações uns com os outros.
Nosso próprio sentido de ser está atrelado a essa relação com a comunidade entorno.
Sabemos quem somos apenas quando colocados em relação aos outros, ou seja, apenas
o conhecimento da sociedade(s) circundante é que leva o indivíduo a definir-se como
um todo único e exclusivo.
Como diria Lacan (p41) a identidade, como o inconsciente, está estruturada como a
língua, ou seja, o indivíduo não pode nunca fixar os significados que emite, inclusive o
significado de identidade, sendo estes variáveis e mutáveis, interdependentes do
momento da evolução social em que o falante se encontra.
Apesar de não termos consciência plena das premissas sociais que condicionam nossa
experiência e viver, estamos atrelados a elas. Tudo o que dizemos tem um antes, um
depois e uma margem máxima por onde os pensamentos podem seguir antes de serem
desconsiderados como significados válidos.
Desta maneira os significados são basicamente instáveis, apesar de sempre procurar seu
fechamento (a identidade) são permanentemente perturbados pela diferença, ou seja,
pela oposição ao outros. Equivale a dizer que se mudarmos o significado de “dia”,
automaticamente também estaremos modificando o significado de “noite”, afinal o
significado de um dá-se somente em oposição ao outro.
O quarto grande descentramento vem do trabalho de Michel Foucault. Em seus estudos,
o filósofo e historiador francês traça uma genealogia do sujeito moderno, onde destaca o
aparecimento de um novo tipo de poder, o “poder disciplinar”, representado pelos
governos e demais aparelhos regulatórios da sociedade.
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O poder disciplinar está preocupado, sobretudo, com a regulação e vigilância do
indivíduo tanto como cidadão, membro de uma comunidade; quanto um ente biológico,
pela regulação e vigilância do seu próprio corpo. As instituições que policiam o viver
humano estão em todos os lugares, escolas, oficinas, hospitais, quartéis, prisões, clínicas
e assim por diante.
Esse poder disciplinar objetiva manter as vidas, as atividades e o trabalho, as alegrias e
as infelicidades dos indivíduos, sua saúde física e mental, suas práticas sexuais, sua vida
familiar e sua consciência moral sob estrito controle. (p42).
Mesmo sem haver a necessidade estrita de acreditarmos plenamente no que nos diz
Foucault, seus escritos trazem uma percepção incômoda sobre a identidade do sujeito,
colocando-a, além de no exterior do indivíduo, dentro de um esquema manipulador do
qual o sujeito não pode se desprender. Na verdade, o objetivo final do sistema é a
regulação e o controle sem que os indivíduos tomem consciência disso.
O último grande descentramento do indivíduo foi levado a cabo pelo movimento
feminista, recentemente auxiliado por movimentos estudantis, antibelicistas e
ecológicos. Em geral esses movimentos:
•
Criticam a política liberal do ocidente sem identificar-se ao extremo estatismo
do oriente;
•
Suspeitam de quaisquer organizações burocráticas dos movimentos sociais,
favorecendo a espontaneidade e os atos de vontade política;
•
Possuem a teatralidade e a ênfase cultural das grandes revoluções do
pensamento;
•
Refletem o enfraquecimento e desfragmentação do poder de seus representantes
políticos ou classistas.
•
Cada um desses movimentos apela a uma das identidades de seus participantes,
como as mulheres no movimento feminista, no movimento gay, nas lutas raciais: A
mesma pessoa pode ser acionada por diferentes identidades. Estes movimentos
inauguram o que viria a ser chamado de política de identidades.
•
Cada movimento, uma identidade – desagregamento da massa.
De todos os movimentos anteriormente apontados, porém, o feminismo, além de ser o
movimento pró-identidade pioneiro, deve ser considerado a parte, pois:
•
Questionou a clássica distinção entre o público e o privado. “O pessoal é
público” era seu slogan.
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•
Essa abertura inseriu na arena política a discussão sobre outras áreas da vida
particular, tais como a sexualidade, o trabalho, a família, o cuidado com as crianças, etc.
•
Politizou a subjetividade, através da contestação dos significados de
pai/mãe/homem/mulher, etc.
•
Foi a partir da contestação do papel social atribuído às mulheres que surgiu o
debate em torno das identidades sexuais e de gênero.
•
Quebra da dicotomia entre homens e mulheres como partes diferentes de um
mesmo organismo, cada qual com seus papeis e potencialidades pré-definidas.
CAP. 3 - AS CULTURAS NACIONAIS COMO COMUNIDADES IMAGINADAS. (P.47)
Neste capítulo Hall discorre sobre os efeitos do descentramento do sujeito
pós-moderno nas identidades culturais, partindo da identidade nacional como base
para implicar todos os demais aspectos da questão de identidades.
A questão de nacionalidade como uma fonte identificação do sujeito parece a
nós algo tão natural e necessário quanto possuir olhos ou orelhas, mas na verdade essa
identificação nacional é apenas uma construção.
Não temos impresso nos nossos genes as características que costumeiramente
são acionadas para se definir um determinado povo, o que equivale a dizer que não
existem brasileiros, apenas indivíduos criados dentro da cultura brasileira. Ou seja, não
é todo brasileiro que é bom de bola, assim como nem todo italiano é um pizzaiolo e nem
todo japonês sabe lutar karatê.
Apesar disso, a cultura nacional é uma das fontes de significação mais fortes em
nosso mundo moderno. Efetivamente entendemos certas características como
qualidades essenciais a qualquer um que pertença ao grupo que as define, formando
diversos estereótipos culturais.
Hall cita Roger Scruton (p48): “a condição de homem exige que o indivíduo,
embora exista como um ser autômato, faça isso somente por que ele pode
primeiramente identificar a si mesmo como membro de algo mais amplo”. Isso em
relação a uma sociedade, a um país, time, etc.
As identidades nacionais, longe de serem qualidades inerentes ao ser, se
constituem na verdade de representações construídas pelo desenvolver daquela nação.
São construções modernas que passaram a concentrar a lealdade e identificação
anteriormente focadas na tribo, família ou região de vivência.
A identidade nacional também é dominante, na medida em que hierarquiza todas
as demais diferenças como ‘menores’ diante do grande escopo linguístico-cultural que
se define em uma nação/povo. As pequenas diferenças regionais são subordinadas ao
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‘teto político’ do estado nação, que torna-se assim a principal fonte de significação das
identidades modernas.
CAP. 3.1 - NARRANDO A NAÇÃO: UMA COMUNIDADE IMAGINADA. (P.50)
A formação de uma cultura nacional permite a padronização do ensino, define uma
única língua vernácula como meio dominante de comunicação, auxilia o
estabelecimento de uma hierarquia social estável e unificada, além de homogeneizar o
sistema jurídico.
Da mesma maneira, a adoção de uma fonte maior de significação por ‘todo mundo’
unifica o desenvolvimento da nação pelo atrelamento das demandas regionais aos
grandes objetivos nacionais.
As culturas nacionais não são constituídas apenas por instituições culturais, mas
também por símbolos e representações. Uma cultura nacional é um discurso, ou seja,
um modo de construir os sentidos que organizam e regulam nossas ações.
Uma identidade nacional se constrói a partir das histórias que são contatas sobre um
povo, privilegiando as conexões entre certos fatos do passado e o presente, de forma que
acaba por se constituir em uma “comunidade imaginada”.
Hall busca apoio em Enoch Powell (p51): “A vida das nações, da mesma forma que a
dos homens, é vivida, em grande parte, na imaginação” e em Homi Bhabha(p51) “As
nações, tais como as narrativas, perdem suas origens nos mitos e efetivam plenamente
seus horizontes apena nos olhos da mente”. As diferenças entre as nações são as
diferentes formas pelas quais estas foram imaginadas.
Hall aponta cinco elementos para responder a pergunta “como contar a narrativa de uma
cultura”:
•
Existe, em primeiro lugar, a narrativa da nação, ou seja, a história contata pelo
próprio país, com suas estórias, mitos e rituais nacionais que representam as
experiências compartilhadas pelos membros dessa comunidade imaginada.
•
Em segundo lugar existe a ênfase na continuidade, na tradição e na
intemporalidade. Os elementos básicos da nação permanecem imutáveis, apesar de
todas as vicissitudes da história.
•
Uma terceira estratégia para a cristalização de uma identidade é a criação de
tradições. Algumas tradições que nos parecem muito antigas são, na realidade,
invenções recentes ou adaptações de antigas tradições para novos formatos.
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•
Também há a estratégia do MITO FUNDAMENTAL, uma origem da nação
perdida no tempo, contada como se passasse em uma era anterior à existência humana,
fixando a origem da experiência desse povo num plano divino.
•
Algumas vezes essa identidade é derivada na ideia de um povo puro, original.
Seria a constituição de um espaço sagrado destinado a esse povo, sua cultura como a
resistência contra seu desaparecimento no pano de fundo social da história.
Temos então que o discurso da cultura nacional não é algo tão moderno quanto parece
ser. Esse discurso está equilibrado entre a vontade de voltar às glórias do passado e o
impulso para seguir adiante, rumo à modernização de suas estruturas.
Às vezes uma nação se envolve no resgate de suas origens, mas esse movimento
normalmente se dá face a algum enfrentamento ou crise, de forma que essa volta às
origens se constitui, na verdade, de uma retomada para a evolução social dentro dos
limites tradicionalmente aceitos pela experiência daquele povo.
CAP. 3.2 - DESCONSTRUINDO A IDENTIDADE NACIONAL: IDENTIDADE E DIFERENÇA.
(P.57)
Aqui o livro questiona se essas identidades nacionais criadas são realmente
unificadas, sobre os apontamentos de Ernest Renan (p58)(p.58) afirma que existem três
unidades constitutivas da identidade nacional:
• A posse comum de um rico legado de memórias;
• O desejo de viver em conjunto;
• O desejo de perpetuar sua herança.
Se resgatarmos a noção que uma identidade nacional é um discurso ou narrativa
cultural e acrescentarmos esses três conceitos, evoluiremos para uma noção de
identidade nacional como um espaço compartilhado necessário para a existência de uma
vida social.
Isso significa dizer que da mesma maneira como somente podemos respirar
oxigênio, retirando-o da mistura de gases que chamamos de ar, as identidade nacionais
necessitam encontrar um “meio de respiração comum”, ou uma interface comum, para
que os indivíduos possam sobreviver e se desenvolver naquele grupo, retirando do
escopo de significações possíveis suas próprias significações.
As identidades nacionais representam ao mesmo tempo a estabilidade da
cultura, tornando a esfera pública e política congruente e unificada, como um
amálgama cultural. Assim, não importa o nível socioeconômico de dois cidadãos
quaisquer, se ambos forem pertencentes a mesma cultura nacional, pertencerão à
mesma ‘grande família’.
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Uma identidade nacional não é a soma das participações culturais de sua origem
tomadas em partes iguais, mas sendo antes o retrato da história de conquistas e
subjulgos que as populações daquela região sofreram.
As identidade nacionais são sempre generalistas, na medida que forçadamente
solapam as diferenças regionais em nome de uma agremiação mais universal. Assim,
temos as identidades como um dispositivo discursivo em pleno desenvolvimento,
forjado pelas divisões e diferenças internas, que são unificadas apenas através de
diferentes formas de poder cultural.
As nações modernas são todas elas híbridos culturais, uma vez que pouquíssimas
identidades nacionais, se é que há alguma, são representativas de apenas um grupo
étnico, sendo as nações mais comumente constituídas de diversos povos em constante
miscigenação.
A noção de “raça” também não pode ser utilizada como constitutivo de uma
identidade, se tomada como uma forma de separação biológica, na medida em que não
podemos apontar um ‘povo puro’ dentro dos principais países foco de ideologias
racistas.
A noção de raça passa a ser deslocada para um foco político-cultural,
representando uma raça como a detentora de uma cultura original e diferenciada. A
constituição de um país, ou melhor, de uma identidade cultural nacional, advém de uma
costura entre as diversas significações e diferenças que as torna um todo heterogêneo.
Na verdade, as identidades nacionais são bem menos unificadas e
homogêneas que suas representações nos fazem crer.
CAP. 4 - GLOBALIZAÇÃO. (P.67)
Posto que as identidades nacionais são propostas como fonte principal de significação
na modernidade, unificando e se sobrepondo às demais fontes de identificação do
sujeito, temos que nos centrar no estudo de qual o processo da modernidade tardia que
possa ter potência suficiente para deslocar essas fontes.
Denominado de “globalização”, esse processo pode ser sintetizado como o crescimento
da intercomunicação entre pessoas e países, ocorrendo em escala global, conectando
comunidades e organizações em novas combinações no espaço-tempo.
A globalização nos afasta da noção tradicional de sociedade como um sistema
delimitado e nos coloca frente a uma nova forma de organização e desenvolvimento
sociais.
Temos, porém, que ter em mente que a humanidade já havia se expandido e
interconectado mundialmente ainda no século XVI, e podemos pensar nas sociedades
mercantilistas como parte de um sistema global de atividade capital.
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Mas é somente a partir da década de 1970 que a tecnologia permite ao homem o contato
direto, imediato e em tempo real com qualquer outro ser humano, em qualquer lugar que
esteja.
É neste ponto que o deslocamento do sujeito moderno passa e mostrar-se mais
premente, com principalmente três consequências:
1 - As identidades nacionais estão se desintegrando;
2 - As identidades locais ou particularistas estão sendo reforçadas pela resistência à
globalização;
3 - As identidades nacionais estão em declínio, substituídas por identidades híbridas.
CAP. 4.1 - COMPREENSÃO DO ESPAÇO TEMPO. (P.70)
É importante ressaltar que a percepção de tempo e de espaço é fundamental para
qualquer tipo de representação. Seja a escrita, pintura, desenho, fotografia ou qualquer
outro tipo de simbolização, deve traduzir seu objeto em termos espaciais e temporais.
Diferentes épocas têm diferentes percepções do espaço tempo. Se tomarmos que a
identidade é extremamente relativa ao processo de representação, temos que a
percepção do espaço-tempo molda a narrativa, a manifestação de uma identidade
cultural.
A grande ruptura do espaço tempo vem do deslocamento do lócus social no qual o
indivíduo se desenvolve.
Historicamente o espaço e o tempo foram coincidentes, uma vez que a maioria das
atividades eram exercidas localmente. Com a globalização, o espaço permaneceu o
mesmo, fixo, mas o tempo reduziu-se de tal forma que hoje interagimos mais com
pessoas fora do aspecto interpessoal que ‘face a face’.
Saímos do espectro de vivência local, trabalho local, interações locais e noticiamento
local. A ‘destruição do espaço através do tempo’, como disse Harvey (p73) trouxe o
mundo para a nossas vistas, de forma que hoje interagimos, trabalhamos, interamos, nos
relacionamos e nos noticiamos em nível mundial.
CAP. 4.2 - EM DIREÇÃO AO PÓS-MODERNO GLOBAL? (P.73)
Diversos teóricos argumentam que a globalização está enfraquecendo ou mesmo
solapando as formas nacionais de identidade cultural, pois apesar das identidade
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nacionais continuarem a se constituir em fortes polos de significação, outras
identificações e laços de fidelidade cultural vêm surgindo, acima e abaixo do nível
nacional.
A identificação nacional segue como polo estabilizador da cidadania e das leis,
porém por baixo desta as identidades locais, regionais e comunitárias têm crescido de
importância. O indivíduo localiza-se primordialmente em relação a estas identidades
locais e regionais, somente então voltando-se para a fonte de significado nacional.
Por outro lado, identidades globais, tais como o feminismo e o movimento
ecológico, têm sido colocadas acima das identidades nacionais, deslocando-as e,
algumas vezes, mesmo apagando-as.
Os fluxos culturais globais, somados ao consumismo global, fragmentam as
identidades nacionais pelo processo de criação de identidades partilhadas entre indivíduos
de diferentes nações, como consumidores de um mesmo produto ou fãs de uma mesma
banda, por exemplo.
Jovens de classe média-alta no Brasil, na Índia ou nos EUA terão diversos
pontos de identificação em comum, muitas vezes mais fortes e presentes que as
fontes nacionais de identificação.
Na medida em que as identidades nacionais tornam-se expostas a múltiplas
influências ocasionadas pala inter-convivência cultural no mundo globalizado, fica cada
vez mais difícil impedir seu enfraquecimento e fragmentação pelo bombardeamento e
infiltração cultural.
Prescindiu-se da necessidade de estar deslocado fisicamente nos grandes
centros para se ter acesso à informação, tanto cultural e acadêmica quanto
jornalística e de entretenimento. Um cidadão isolado em um rincão remoto dalgum
país do terceiro mundo consegue estar em contato com praticamente as mesmas
fontes de significação que um indivíduo que more na Times Square, em Londres.
A difusão do consumismo global nos leva à sociedades mediadas não por um foco
nacional ou racial/religioso, mas sim pela mídia, pelo mercado global de estilos e
modas, pelas viagens internacionais e pela ampla infiltração cultural.
As identidades encontram-se em estado flutuante, desancoradas de qualquer apoio
fixo, alterando em conformidade com os apelos recebidos das diversas fontes de
identificação a que somos expostos diariamente.
As diferenças foram reduzidas, de focos de ancoragem para a constituição de um
identidade em contraposição, para uma língua franca global, partindo de uma reificação
da diferença, agora colocada como fonte de novas identificações globais.
O mercado busca essas diferenças como forma de emular suas próprias fontes de
significação, em um fenômeno conhecido como HOMOGENEIZAÇÃO CULTURAL.
As identificações nacionais dizem respeito a lugares, eventos e histórias
particulares, desenvolvimento familiar e vínculos geográficos. Hall indaga: As novas
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identificações partem de onde? Quais serão os modos pelos quais estas articularão a
tensão entre interior e exterior do indivíduo?
CAP. 5 - O GLOBAL, O LOCAL E O RETORNO DA ETNIA. (P.77)
Existem clamores mundiais contra o que se chama de homogeneização cultural em nível
mundial, dissolvendo as identidades locais em prol de uma única massa global. Mas
essa observação, além de simplista, tem em conta apenas um aspecto da realidade.
Se por um lado certos aparatos, dispositivos, produtos e significações tornaram-se
lugares de pertencimento mundial, tais como o blue jeans e os telefones celulares, existe
uma tendência à valorização da cultura local.
Hall aponta 3 tendências contra globalizantes, que inferem no processo de dissolução
das identidades culturais nacionais:
•
A globalização dos mercados e o marketing de nichos trouxeram uma
valorização do indivíduo enquanto ser unitário e separado da multidão. A globalização
trouxe o interesse pelo local. “Pensar global, agir local”. Não se trata de uma
substituição do local pelo global, mas sim de uma nova articulação entre ambos.
•
Em segundo lugar, a própria globalização é heterogênea, atingindo diferentes
pontos do globo com diferentes vetores de força. Uma teoria global fundamentada em
jovens europeus seria inaplicável na realidade das áreas africanas mais pobres.
•
A partir do segundo ponto, temos a geopolítica do poder sobre a globalização.
Os fluxos de informação são desiguais, tratando mais de uma ocidentalização que um
fenômeno legitimamente global.
Assim colocado, podemos pensar no processo chamado de globalização como uma
bipolarização mundial, entre o que seria o ocidente globalizado e “o resto”. O centro
mundial ainda continua no eixo EUA, EU, Japão.
As periferias, atentas aos movimentos das metrópoles, produzem uma profusão de
materiais culturais próprios tanto quanto interagem com as influências externas
recebidas, porém, pouco ou nada desta produção vence o contra fluxo poderoso que
emana do “primeiro mundo”. Isto não quer dizer obrigatoriamente que as metrópoles
permanecem surdas e isoladas das margens do globo, mesmo por que sempre há uma
busca pelo novo, mas o fluxo que vai das ex-colônias (exceção os USA) para as exmetrópoles é sempre, além de pífio, altamente preconceituado.
Talvez o maior engano das metrópoles (e pelo que podemos ver, de muitos países
periféricos também) é ver os nativos deste mundo como entes fixados no tempo e na
experiência, nalgum momento localizada entre 1 e 3 séculos atrás. Para os participantes
desta visão não pode, por exemplo, haver o índio integrado à sociedade, pois neste
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ponto ele se torna “branco”. O ser índio apenas pode existir plenamente apenas como o
bom selvagem solto no paraíso.
É uma visão estupeficante que desconsidera o fato de os próprios “brancos” das excolônias são eles mesmos entes deslocados de suas fontes tradicionais de significações a
aculturados para um novo sistema social. Se fosse contrário, nenhum euro descendente
poderia se considerar brasileiro.
O que Hall aponta é que o fenômeno da globalização atinge a todos e as periferias
também vivenciam seu momento globalizador, mas de uma forma mais lenta e desigual.
CAP. 5.1 - O RESTO NO OCIDENTE. (P.80)
Hall apontou 3 fatores com consequências na construção de identidades na modernidade
tardia:
•
A globalização caminha em paralelo com o reforçamento das identidades locais;
•
A globalização é um processo desigual que possui sua própria geometria do
poder;
•
A globalização retém alguns aspectos do colonialismo ocidental, mas todas as
culturas estão sendo relativizadas pela compressão do espaço tempo.
Após a segunda guerra mundial, as potências europeias retiraram-se de suas antigas
colônias como parte de uma estratégia de isolar-se do caos que nelas se instalava, porém
a ocidentalização das aspirações de uma ‘boa vida’ levou as antigas metrópoles a
pagarem seu preço.
Na contramão da exportação de representações e dos ditames da moda e da cultura, os
antigos países-sede receberam milhares imigrantes de suas ex-colônias. Esses
‘estrangeiros’ acabam por diluir a cultura dos próprios países do assim chamado
primeiro mundo.
Hall cita (p81) a invasão da Europa por indivíduos de suas ex-colônias e o aumento
exponencial de hispânicos e sul-americanos na composição populacional dos EUA. Em
ambos os casos essa infiltração cultural acaba por deslocar as significações tradicionais
de ‘ser’ europeu ou ‘ser’ americano.
CAP. 5.2 - A DIALÉTICA DAS IDENTIDADES. (P.83)
O aumento do contingente imigrante acaba por levar as populações a uma contestação
dos contornos estabelecidos da identidade nacional, além de expor o fechamento desta
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identidade às pressões da diferença, da alteridade de identidades culturais de matrizes
alienígenas às culturas tradicionais dos países do ocidente.
No atual mundo, de fronteiras dissolvidas e continuidades rompidas, tem-se o foco da
discussão no deslocamento das identidades nacionais. Não existe mais nenhum país
ocidental que seja um refúgio privilegiado de uma cultura única e original.
Uma vez que a historicidade e a continuidade das identidades nacionais estão em xeque,
os contornos da tradição são constantemente redesenhados e rediscutidos pelo
imperativo de se formar novas auto interpretações, ou seja, o deslocamento das
identidades tradicionais trás à luz a busca por novas fontes estáveis de significação.
Outro processo catalisado pela globalização é o alargamento e proliferação das
identidades, provocando o aparecimento de novas posições de identidade, juntamente
com um aumento da polarização entre eles. Esses processos indicam duas prováveis
consequências da globalização: o reforço das identidades locais e o aparecimento de
novas identidades.
O reforço das identidades locais aparece no esforço dos grupos culturalmente
tradicionais em reforçar e promover sua cultura em enfrentamento contra a infiltração
de significações alienígenas ao seu escopo tradicional de significações. Esse racismo
cultural pode ser verificado em toda Europa e EUA, em uma luta dos grupos mais
antigamente estabelecidos contra os novos componentes populacionais advindos da
imigração das terceiro para o primeiro mundo
Uma outra fonte de significação que concentra uma ação de reforço cultural se encontra
nos jovens, filhos de imigrantes, em forma de um recuo até sua cultura de origem.
Assim, filhos de asiáticos, latino-americanos e africanos na Europa e EUA passam a
buscar nas fontes tradicionais de significações de seus pais um lugar de pertencimento e
uma base de estabilização de suas auto interpretações.
O fenômeno do aparecimento de novas identidades pode ser observado a partir dos
guetos sociais e culturais e toma a forma de identidades de protesto em busca de
legitimação. Porém se tratam de identidade posicionais e conjunturais, ou seja, são
agremiadoras de pessoas em prol de objetivos comuns, tais como a afirmação da cultura
negra, do feminismo ou do movimento gay, mas não se tornam nem uma identidade
estabelecida e estável, nem o ponto único e privilegiado de significação das pessoas.
Isso é o que Laclau e Mouffe (p86) chamam de ‘eixo comum de equivalência’, ou seja,
os dilemas sociais que são os centralizadores do debate nas atuais sociedades também se
tornam os polos irradiadores de significação em torno dos quais essas novas
identificações condicionais se desenvolvem.
Hall aponta (p87) que a globalização possui sim esse caráter de deslocar e contestar as
velhas e fechadas identidades tradicionais, por seu efeito pluralizante sobre as
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identidades, degenerando-se em novas possibilidades de posições de identificação, mais
políticas, diversas e variadas.
Porém, algumas dessas identificações apenas orbitam em torno da tradição, almejando
um retorno às fontes tradicionais de significação. Outras assumem seu caráter dialético
e histórico, concebendo essas identidades como instáveis e impuras, gravitando ao redor
daquilo que Robins (p87) chamou de tradução.
Será em torno desses dois polos, tradição e tradução, que se dá a construção da
identidade? Por todos os lugares emergem identidades culturais flutuantes, identidades
de transição entre um agora e um futuro próximo, que retiram seus recursos de
diferentes fontes de significação. São o produto do cruzamento entre muitas diferentes
matrizes culturais.
Assim, podemos apontar o processo de TRADUÇÃO como um dos grandes formadores
de identidades da modernidade tardia. Pessoas dispersadas de seus locais de origem
cultural, vivendo em outros países, são obrigadas a negociar entre sua cultura original e
sua cultura de adoção (do local onde se fixou).
Neste processo, estas pessoas passam a assimilar a nova cultura sem, no entanto,
desprender-se totalmente de sua cultura de origem. Elas carregam sua cultura, história e
lendas tradicionais e as fazem dialogar com a cultura, história e os mitos da cultura
predominante de seu local de vivência.
Para estas pessoas, um retorno a sua cultura pura é apenas uma utopia desprovida de
possibilidades reais, pois estarão definitivamente traduzidas, ou seja, a partir de suas
culturas tradicionais e em diálogo e negociação com as culturas de influência constroem
novas fontes de identificação, híbridas, miscigenadas e variantes.
As diásporas modernas, oriundas das imigrações ocorridas nas últimas décadas do
século XX e início do século XXI, criaram diversos seres bi ou multiculturais, imbuídos
do desafio de falar, no mínimo, duas línguas, conhecer dois códigos culturais e
desenvolver-se em dois palcos culturais diferentes. E principalmente, a negociar
inconstantemente com essas fontes de significação divergentes.
CAP. 6 - FUNDAMENTALISMO, DIÁSPORA E HIBRIDISMO. (P.91)
O hibridismo e o sincretismo cultural possuem tanto seus defensores quanto seus
críticos, empenhados em um combate entre o velho e o novo, o gueto e o mundo. De um
lado, os que apontam a mistura como uma forte e poderosa fonte criativa, de outro os
que apontam essa mistura como o vírus que lhes destruirá a própria identidade,
entendida aqui como uma volta aos mananciais tradicionais de significação.
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Hall (p91) aponta o conflito entre Salman Rushdie, autor do livro “Versos Satânicos” e
os extremistas islâmicos do Irã, detonado pela miscigenação cultural apresentada no
livro, que foi considerado de tal forma ofensivo à fonte pura, no caso o Islã, que seu
autor foi condenado a morte pelas sumas autoridades eclesiásticas mulçumanas.
Rushie, que teve a morte decretada pelos Aiatolás, foi imprensado entre a tradição e a
tradução, incapaz de se desvencilhar do embate cultural que ele próprio, como
emigrante árabe vivendo na Grã-Bretanha, é ao mesmo tempo sujeito e objeto.
Por outro lado, a proliferação dos movimentos de pureza étnica são a faceta exposta da
contra ação dessa miscigenação. Diversos grupos, mais ou menos numerosos, por vezes
em situação de hegemonia política, outras em franca desvantagem, encetam um
fechamento social.
Estes movimentos pregam um retorno não apenas aos seus mananciais tradicionais de
significação cultural, mas também à noção que a sobrevivência destes depende da
contraposição e conflito aberto aos outros sistemas de significação. Sua identidade
apenas sobreviverá pelo afastamento das outras possibilidades.
O leste europeu é um bom exemplo de uma arena dessa confrontação de culturas e
fluxos de cultura. Ex-repúblicas soviéticas, ex-integrantes da Iugoslávia e dos impérios
Austríaco e Turco-Otomano enfrentam um panorama social conflituoso, onde
movimentos de pura racial, étnica ou religiosa chocam-se contra enclaves de populações
de vertentes sócio-étnico-culturais variantes ou diferentes.
Outro bom exemplo desse retorno extremista ao conflito entre identidades supostamente
opostas é o fundamentalismo islâmico, que gera identidades de tal forma fechadas e
concentradas em torno de um manancial único de significação que seus possuidores
facilmente se dispõe ao sacrifício em nome dessa auto significação.
As opiniões sobre o combustível e os motores desse fenômeno dividem-se, a partir da
análise do problema sob 3 diferentes aspectos: o político, o social-econômico e o
religioso.
Do ponto de vista político, o oriente médio não teve nenhuma liderança modernizante
que se mostrasse capaz de realizar a tradução entre os modos de vida tradicional e o
“novo proposto” de forma a mobilizar a população em torno do projeto de
modernização. Antes, as lideranças modernizadoras acabaram identificadas como
facínoras lacaios dos interesses internacionais que ameaçam a existência de seus
mananciais de cultura.
Em segundo lugar, é fato comprovado que o extremismo mulçumano espalha-se com
maior amplitude e virulência nas regiões mais subdesenvolvidas. Neste caso podemos
supor que a reação contra cultural reveste-se de uma roupagem socioeconômica, ou seja,
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a identificação da cultura ‘moderna’ com as mazelas da população, ao passo que a
pureza étnico-religiosa é encarada como um retorno aos ‘áureos-tempos’.
Finalmente, se somarmos os fracassos dos governos ditos modernizantes nos aspectos
político, econômico e social, relegando vastas regiões a um locus vivendi instável,
violência, miserável e sem perspectivas de desenvolvimento, o único polo de
significação que sobra, e, portanto empodera-se paralelamente ao desenvolvimento
negativo, é a religião.
Interessante notar que nem o iluminismo, nem o liberalismo ou mesmo o Marxismo
previam esse contra fluxo do movimento globalizante. Para todos essas correntes do
pensamento, o apego ao local, ou tradicional, eram subjetividades superficiais que
seriam dissolvidas em prol de uma conglomeração global, aos moldes da aldeia global
prevista por Marshal McLuhan em seu “Understanding media: o meios de comunicação
como extensões do homem”.
O que podemos observar é que os movimentos em prol de uma manutenção da
hegemonia cultural, social e econômico do ocidente desembocaram em diversos
movimentos de revalorização de identidades soterradas, além de uma vertente de
miscigenação, mistura e criação de novas significações que leva a um deslocamento, ou
como diz Hall (p97), um descentramento do Ocidente.
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