Imprimir () 13/07/2015 ­ 05:00 Proteção tarifária desestimula produção local, mostra estudo Por Marta Watanabe A estrutura tarifária brasileira não estimula a produção doméstica de bens finais. No Brasil, a carga com imposto de importação sobre bens intermediários é muito próxima à dos setores de bens acabados que estão na mesma cadeia produtiva. Apenas 12,4% do valor da transformação industrial se beneficia de forma clara da escalada tarifária, na qual as tarifas de importação aumentam de acordo com o grau de beneficiamento e transformação. O problema é que quando são altamente protegidos ­ ou seja, possuem tarifa pesada de importação ­, os intermediários custam mais para as indústrias que os utilizam como insumos, o que compromete a competitividade e desestimula a produção interna. Essa é a conclusão de estudo elaborado pelo grupo de indústria e competitividade do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a pedido da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O estudo levantou a proteção tarifária efetiva e a nominal, que levou em consideração oito setores divididos em 30 subcadeias nas quais foram identificados os produtos de acordo com a etapa de transformação. A tarifa efetiva reflete o grau de proteção para um determinado setor. Um setor pode ter sua proteção "corroída", caso as tarifas sobre os insumos por ele usados sejam elevadas. Para o cálculo da proteção efetiva deduz­se a tarifa de importação incidente sobre os insumos da tarifa aplicada sobre ao bem final. Para se fazer a dedução, o estudo considerou a importância ponderada dos insumos nos produtos finais analisados. Com coordenação da professora Marta Reis Castilho, da UFRJ, o estudo mostra que a escalada tarifária é bem marcada em apenas três setores: ônibus e caminhões, automóveis e vestuário. Automóveis, caminhões e ônibus encontram­se num dos extremos de elevada proteção efetiva, porque possuem nominais com forte diferença entre os insumos e os bens finais. A proteção maior também reflete peso desses segmentos na estrutura industrial doméstica. Vestuário e artigos têxteis também apresentam níveis de proteção bem acima da média da economia, também por conta da alta tarifa nominal principalmente nas etapas finais de produção, que tentam proteger o setor da concorrência asiática. Dentre os setores no extremo oposto, com menor proteção, estão os de baixo grau de transformação, como extração mineral, vegetal, originados da agricultura e da pesca, para os quais o país possui vantagens comparativas em relação a outros países. Retirados os setores com proteção elevada e os de baixa proteção, porém, resta a maioria dos setores com tarifa efetiva em torno da média da economia (26,3%). Dentre esses setores estão tanto bens intermediários quanto finais, e em muitos não se verifica a escalada tarifária nas alíquotas nominais. Nos setores químico e siderúrgico, por exemplo, a tarifa sobre os intermediários é mais alta do que no bem final. No químico, as resinas e elastômeros têm proteção efetiva de 34,9% enquanto tintas e vernizes são taxados em 29,7%. Nos dois casos, a proteção efetiva está acima da média da economia A proteção elevada nesses intermediários prejudica setores usuários, como plásticos e borrachas, que tem bens finais tarifados a 26,4%. Paulo Francini, diretor de pesquisas e estudos econômicos da Fiesp, diz que o estudo mostra as atuais distorções da atual estrutura tarifária. Para ele, essas distorções devem ser analisadas caso a acaso discutidas de forma profunda e detalhada. "O fato de bens intermediários terem tarifa muito próxima às dos bens finais em muitos setores significa que devemos elevar a tarifa dos bens finais? Acho que isso seria uma insânia", diz Francini. O contrário também ­ ou seja, a redução da tarifa dos intermediários ­ não deve ser aplicada de forma indiscriminada. A ideia é gerar um debate para que se possa chegar a uma estrutura com escalada tarifária, que dê mais competitividade à produção industrial. No estudo, o grupo da UFRJ pondera que as estimativas de proteção efetiva realizadas no estudo foram feitas em nível de agregação alto, que impede incorporar especificidades dos setores, tanto em termos de composição como de medidas específicas, como ex­tarifários ou medidas antidumping. O estudo destaca ainda que setores produtores de bens de capital, que não têm sido estimulados por uma proteção nominal ou efetiva, demandam análises mais detalhadas. O mesmo se aplica para segmentos que são fornecedores de bens intermediários para várias indústrias, como o setor siderúrgico e segmentos do setor químico, como resinas e elastômeros e tintas e vernizes. Rogério Dias de Souza, do Iedi, lembra que a ideia é prosseguir a análise da estrutura tarifária brasileira e fazer uma comparação com a proteção dada por outros países. "A estrutura atual é resultado de uma colcha de retalhos, em que nada foi planejado de forma organizada. É preciso seguir o exemplo de outros países e formar uma política de longo prazo." Para Francini, o processo de privatização e a tentativa de tornar o país mais atrativo aos investidores resultou em elevação do grau de proteção para alguns setores. "Um ambiente de extrema dificuldade de competitividade levou alguns segmentos a buscar maior proteção. Mas não há capacidade para atender a todos e a combinação desses fatores causou a distorção atual." Para o diretor da Fiesp a desvalorização do real oferece "excelente oportunidade" para discutir a proteção tarifária. "Não existe taxa de câmbio e nem processo industrial capaz de resolver a falha na deficiência da estrutura tarifária. " Francini acredita que é possível estabelecer uma política tarifária mais racional, com programas claros e prazos para alteração de alíquotas. "A discussão não é fácil. Nosso objetivo não é a proteção ou a desproteção, mas a busca de racionalidade e maior competitividade. Qualquer mudança enfrenta resistências. Há setores que não vão ficar tão felizes ou satisfeitos."