A EDUCAÇÃO INCLUSIVA DE JOVENS E ADULTOS SURDOS: POLÍTICAS PÚBLICAS E GARANTIAS DE QUALIDADE NA EDUCAÇÃO TARDIA Fabiana Lopes Coelho Garcia* RESUMO: A presente pesquisa enfatizou a inclusão do aluno surdo na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Para isso, fez-se necessário abordar o processo histórico da educação dos surdos bem como as políticas inclusivas relacionadas à EJA, que contribuíram para a caracterização dos sujeitos existentes em seu espaço. Utilizou-se de revisão bibliográfica. Os resultados apontam que a EJA tem se transformado em um espaço inclusivo, por meio de mudanças conjunturais e mobilizações sociais que forçaram as políticas educacionais permitirem acesso dos surdos em seu espaço. Os resultados também demonstram a inadequação dos espaços inclusivos tornando o aprendizado ineficiente. Além disso, o trabalho apontou que os espaços inclusivos da EJA acolhem também outros sujeitos com necessidades educacionais especiais e grupos minotários. À guisa de conclusão, o trabalho aponta alguns desafios para que a EJA possa atender minimamente a diversidade de seus sujeitos. ABSTRACT: This research emphasized the inclusion of deaf students in the Education of Youth and Adults (EJA). For this, it was necessary to address the historical process of deaf education and inclusive policies related to adult education, which contributed to the characterization of the subject existing in your space. We used the literature review. The results show that the EJA has been transformed into an inclusive space, through changing circumstances and social mobilizations that forced educational policies allow access of the deaf in your space. The results also demonstrate the inadequacy of inclusive spaces making learning inefficient. Furthermore, the work indicates that the inclusive spaces EJA welcome also other individuals with special educational needs and groups minotários. In conclusion, the paper points out some challenges for the EJA to minimally meet the diversity of its subjects. PALAVRAS-CHAVE: Educação de Jovens e Adultos, Surdez, Inclusão . KEYWORDS: Education for Youth andAdults, Deaf, Inclusion INTRODUÇÃO O tema “A Educação inclusiva dos Jovens e Adultos surdos: Políticas Públicas e garantias de qualidade na educação tardia” é resultado das constatações de vários entraves na escolarização de alunos surdos submetidos aos métodos e propostas de ensino em escolas públicas na cidade de Dourados. Originou-se da preocupação em analisar como as especificidades do sujeito surdo têm sido entendidas no campo legal e atendidas no universo educacional. Surgiu, ainda, das experiências vividas ao longo dos anos de convivência com a comunidade surda local, onde o trabalho, de cunho social, INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 1 com a comunidade surda de Dourados, data de 1995. Não se pode negar, também, as expectativas de uma inclusão escolar genuína, para que estes tenham garantidos os direitos de acesso à educação e possam exercer, verdadeiramente, sua cidadania. Baseado no documento oficial “Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva”, o conceito de cidadania está fundamentado no reconhecimento das diferenças e na participação dos sujeitos. Em 2008, o Ministério de Educação e Cultura (MEC), através do Plano Nacional da Educação na Perspectiva da Educação Inclusiva, divulgou os seguintes dados: 14.150 alunos surdos matriculados no ensino médio; 58.420 alunos na educação de jovens e adultos e 48.911 alunos na educação profissional. No município de Dourados encontramos, atualmente, 42 pessoas com surdez matriculadas na modalidade EJA de escolas públicas, cuja idade está acima dos 20 anos. Ainda temos alunos surdos com idade entre 15 e 19 anos tentando concluir o ensino fundamental em escolas regulares. Somente cinco alunos concluiriam o ensino médio no ensino regular no ano de 2014. Estes dados foram disponibilizados pelo Núcleo de Inclusão (NUESP) e Secretaria Municipal de Educação (SEMED) em abril de 2014. Constatamos, assim, que os alunos que não tiveram acesso a esta modalidade de ensino, comum ou regular, recorrem a EJA juntamente com aqueles que não obtiveram sucesso na escolarização em tempo hábil. Dentre os fatores que despertam o interesse pela conclusão do ensino médio está a colocação no mercado de trabalho. Desde o fim da década de 1980, os movimentos associativos organizados pela comunidade surda fomentam discussões sobre a problemática da profissionalização, o acesso e a permanência no mercado de trabalho. Segundo relatório anual da FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos surdos- do ano de 1997: O Relatório Anual de 1997 na FENEIS explicita, também, que é objetivo da entidade divulgar e informar pais, educadores, autoridades e o público em geral, sobre, entre outras coisas, “a capacidade profissional da pessoa surda e sua completa integração na sociedade como membro participante ativo, com seus direitos e deveres” (FENEIS, 1999, p. 7). Outro fator muito importante é a alfabetização na Língua Portuguesa, língua oficial do país. Apesar da Língua Brasileira de Sinais ser reconhecida como língua oficial da comunidade surda, fato que se deu através da Lei 10.436 de 24 de abril de 2002, seus usuários ainda dependem do aprendizado da Língua Portuguesa, leitura e escrita, para sua inclusão social. No Brasil atual, 10,9% da população de surdos é considerada analfabeta, conforme dados do IBGE (2012), demonstrando os desafios que têm para aprender a leitura e a INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 2 escrita de uma língua que não é própria a eles, a Língua Portuguesa, já que a Língua de Sinais Brasileira, LIBRAS, é seu idioma oficial. Nesse contexto recorremos aos conceitos teóricos que estruturam o pensamento inclusivo e justificam as implementações nos espaços educacionais. Nos voltamos à análise de documentos oficiais a fim de nortear nossas práticas pedagógicas, direcionando estudos e esforços em tempos de movimentos por uma escola democrática e inclusiva. Entendemos que as políticas públicas são necessárias para direcionar e implementar as ações de todos os envolvidos no processo educacional. Sabemos que os espaços escolares são compostos por diversos sujeitos tornando-se heterogêneos, haja vista a diversidade de seres, identidades únicas e culturas em convivência. Observamos, então, que o discurso oficial é único a todas as instituições, porém, não podemos garantir que todos os alunos terão as mesmas histórias e percepções. Isso significa que, a partir das ações implementadas na escola, sejam de respeito ou não às diferenças, os sujeitos que a vivenciam vão significando e internalizando novos conhecimentos que, por suas vezes, contribuem na sua constituição subjetiva e identitária. Assim, observamos que, ao acessarem instituições que atendem pela modalidade EJA – Educação de Jovens e Adultos, os alunos com surdez demonstram a insuficiência de competências acadêmicas e linguísticas, reflexo da descontinuidade dos estudos anteriores, denunciando a falta de qualidade e adequação do ensino a que foi submetido e determinando a irregularidade da frequência escolar, a impossibilidade de novos empregos e o acesso às Instituições de Ensino Superior Esse desenho da realidade educacional de alunos com surdez tem desestruturado os profissionais atuantes na educação especial por colocar “em xeque” as suas (in) capacitações para o atendimento específico em questão. Como estimular o aprendizado do aluno surdo na escolarização tardia considerando as especificidades de cada um e os diferentes níveis lingüísticos e capital cultural? Quem é o profissional que atuará neste atendimento? Que tipo de ensino tem sido projetado para estes alunos? Quais as garantias de qualidade no aprendizado? Com base em tais questões propositivas, buscamos entender quais são as propostas de ensino que se tem apresentado nas políticas públicas voltadas para a educação dos alunos surdos e como esse aluno tem sido entendido e atendido no processo de escolarização nas escolas de EJA. Esperamos, com este artigo, estimular ainda mais pesquisas por uma educação de qualidade aos alunos surdos, acreditando na relevância da inclusão do tema nos INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 3 encontros promovidos nos cursos de Pedagogia bem como nos espaços educacionais para jovens e adultos surdos do município de Dourados. 1. EDUCAÇÃO ADEQUADA/ADAPTADA: POR QUÊ? Segundo Palangana (1994), o desenvolvimento do psiquismo, onde a criança apreende formas de ser, pensar e agir socialmente acontece através da interação com seus iguais. Ela realiza a troca de experiências com o meio externo, tendo acesso à linguagem da comunidade onde vive e pode, como indivíduo, internalizar conceitos, apropriar-se do conhecimento cultural e historicamente produzido, transformando seus conhecimentos empíricos em contextualizados. Nessa dinâmica interativa destacamos “... a linguagem como elemento fundamental para que as trocas se efetuem e, por conseguinte, para que ocorra o desenvolvimento das funções complexas do pensamento nas suas especificidades” (Luria, 1986). Partimos, então, do pressuposto de que a linguagem é o “veículo de transmissão de informação” (Luria, 1986). Quando a criança aprende, modificam-se o que ela pensa e também o modo como pensa. Ela organiza os processos mentais necessários para esta atividade, o que promove desenvolvimento. Dentro do ambiente escolar, segundo Kostiuk (1977), o processo educativo, ao colocar a criança perante novos fins e novas tarefas, ao estimular novas perguntas e procurar os meios necessários para respondê-las, conduz o desenvolvimento. Segundo Damázio apud Poker (2007), o ambiente escolar em que a pessoa com surdez está inserida, na medida em que não lhe oferece condições para que se estabeleçam trocas simbólicas com o meio físico e social, não provoca a capacidade representativa dessas pessoas, compromete o desenvolvimento do pensamento como consequência. Diante disso, surge a necessidade da difusão das línguas de sinais, utilizadas pelas comunidades surdas, em todos os ambientes sociais. Partindo desta língua, o sujeito surdo entra em contato com a língua majoritária de seu grupo social. Da mesma forma como ocorre com as crianças ouvintes, a criança surda exposta à língua de sinais irá desenvolver-se no que diz respeito aos aspectos cognitivos e linguísticos, conforme suas capacidades. Estudiosos defensores da inclusão, como Mantoan (2003), Quadros (2004), entre outros, afirmam que todos os alunos devem ter as mesmas oportunidades e frequentar escolas regulares. Sustentam, ainda, que os alunos especiais, incluindo os surdos, tenham INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 4 professores capacitados e materiais adaptados para que o atendimento seja adequado à condição do aluno. Para os alunos com surdez o ambiente em que está inserido constitui fator determinante para sua estimulação e trocas simbólicas. Segundo Damázio (2007), o aluno surdo, em um ambiente escolar desestimulante, possuirá uma deficiência de trocas simbólicas, ou seja, “o meio escolar não expõe esses alunos a solicitações capazes de exigir deles coordenações mentais cada vez mais elaboradas, que favorecerão o mecanismo da abstração reflexionante e consequentemente, os avanços cognitivos”(DAMÁZIO, 2007: p.15). Atentamos, assim, para a grande necessidade de profissionais capacitados, conhecedores deste processo de aprendizagem por que passam as pessoas com surdez. É importante pensar o processo de ensino-aprendizagem sob um olhar crítico e reflexivo para além da pedagogia mecanicista e tradicional. 1.1 A HISTÓRIA DO ESTIGMA Os alicerces para a prática pedagógica, em um contexto inclusivo, encontram-se nos estudos do desenvolvimento humano em uma perspectiva histórico-política. Considerando o contexto histórico, a prática do ensino às pessoas com necessidades especiais data do século XIX, onde o atendimento inicial possuía caráter assistencialista que se sobrepunha ao educacional em instituições especializadas. Com as revoluções Francesa e Industrial, os estudos desenvolvidos por Vygotski e as mudanças na mentalidade da sociedade, as instituições passaram a atender os alunos especiais em parceria com serviços de saúde e escolas regulares por entender que possuíam capacidade de aprender ofícios, adquirir conhecimento e contribuir com o desenvolvimento social de alguma forma. Muitos estudiosos europeus se frustraram na tentativa de ensinar as pessoas surdas a falar entre eles estão Pedro Ponce de Leon e Juan Pablo Bonet no século XVII. Na França do século XVIII foram introduzidos os “gestos” língua de sinais e Charles Michel de L’Epeé transformou a própria casa em escola para surdos visando o ensino da leitura e escrita através do alfabeto manual. Esse trabalho foi reconhecido passando a chamar-se Instituto Nacional de Paris (Sacks, 1998). No Brasil os primeiros atendimentos educacionais especiais para surdos foram registrados a partir de 1857, quando inaugurado o Imperial Instituto de Surdos-Mudos que hoje é conhecido como Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES. Aqui, destacamos Edward Huet, surdo francês, que desenvolveu o trabalho como primeiro coordenador da instituição reproduzindo o modelo europeu (Perlin&Strobel, 2005). INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 5 Porém, em 1957 a língua de sinais foi proibida nas escolas brasileiras e, ainda na década de 1970, praticava-se o oralismo. Segundo as autoras, os alunos surdos eram obrigados a usar recursos como treinamento de fala, leitura labial para se aproximarem do modelo ouvintista. Segundo Skliar (1998), o modelo ouvintista consiste num “conjunto de representações dos ouvintes, a partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e narrar-se como se fosse ouvinte” (Skliar, 1998, p. 15). Como consequência desse modelo educacional, a comunidade surda foi segregada dos espaços escolares e sociais, tolhida do seu direito à aquisição da língua materna, a LIBRAS, até obter força para projeção sócio-política, fato que se deu a partir da década de 1990 com as implementações na escola através das políticas públicas vigentes. 1.2 Políticas públicas brasileiras para inclusão e a EJA As discussões sobre uma educação especializada e sobre a temática “Inclusão Escolar do aluno surdo” (QUADROS, 1997; BRITO, 1993; LACERDA, 1989) teve início no meio acadêmico, nas Universidades, demandadas pelos movimentos sociais da época de 1990. Consequentemente, iniciaram-se os discursos sobre as relações estabelecidas entre o processo de ensino e aprendizagem para que se garantisse o desenvolvimento cultural, social e psíquico dos alunos em questão bem como a garantia da escolarização através de políticas. Ao discutirmos as imbricações entre ensino, aprendizagem e desenvolvimento, não podemos esquecer a relação existente no processo de formação do pensamento através da linguagem. Considerando estes conceitos pré-existentes, como nos reportarmos ao nosso aluno surdo atual sabendo que dele foram cerceados os estímulos e trocas devido à barreira linguística? Como as pessoas com surdez, que foram submetidas ao oralismo durante anos, serão (re)compensadas? Atualmente, as políticas públicas educacionais estão voltadas ao processo de inclusão escolar e educação para todos, reconhecendo que modelos anteriores naturalizaram o fracasso escolar e garantindo um direito já existente na Constituição de 1988. No artigo 3º, inciso IV lemos: “promover o bem de todos, sem preconceitos de raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva entrou em vigor em janeiro de 2008 assegurando a inclusão escolar de alunos com deficiência, orientando os sistemas de ensino e ofertando o Atendimento Educacional Especializado (AEE) para garantir o acesso e permanência destas pessoas no espaço escolar. INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 6 O AEE, segundo o documento oficial, deve ser realizado no contra-turno da classe comum, na própria escola ou centro especializado para esse serviço. Aos alunos surdos também é proposto o modelo bilíngue onde, segundo Quadros &Schmiedt (2006), ele aprende a Língua Brasileira de Sinais como primeira língua e a Língua Portuguesa como segunda. Conforme o Artigo 2º da Resolução 04/2009 (BRASIL/CNE 2009), o AEE tem como função complementar ou suplementar a formação do aluno por meio da disponibilização de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias que eliminem as barreiras para sua plena participação na sociedade e desenvolvimento de sua aprendizagem. Para a modalidade de EJA- Educação de Jovens e Adultos, as implementações das políticas em educação especial visam oportunidades de escolarização, inserção no mercado de trabalho e participação social (PNEE, 2008). Ela é uma categoria organizacional constante da estrutura da educação nacional, com finalidades e funções específicas. Representa uma dívida social não reparada para com os que não tiveram acesso a escolarização e tenham sido o trabalho empregado na constituição de riquezas públicas. Ser privado deste acesso é a perda de presença significativa para uma convivência social contemporânea (Parecer CNE/CEB-11/2000). Dentro deste contexto estão os alunos surdos que não tiveram tal acesso à escolarização e, atualmente, encontram-se no mercado de trabalho sem perspectiva de melhores colocações. Alguns ainda não dominam a própria língua, a Libras. Diante destas constatações, torna-se difícil acreditar no exercício da cidadania sem o desenvolvimento que se dá pela aquisição da linguagem. Segundo o Parecer CNE/CEB de 11/2000: “De todo modo, o não estar em pé de igualdade no interior de uma sociedade predominantemente grafocêntrica, onde o código escrito ocupa posição privilegiada, revela-se como problemática a ser enfrentada. Sendo leitura e escrita, bens relevantes de valor prático e simbólico, o não acesso a graus elevados de letramento é particularmente danoso para a conquista de uma cidadania plena”. (Parecer CNE/CEB-11/2000 p.5) Recentemente, com a Lei 5.016 de 11 de janeiro de 2013, a Educação Bilíngue vem sendo difundida no país, muito embora seja uma implementação no âmbito do Distrito Federal. Nessa modalidade educacional, o aluno surdo é instruído utilizando-se a LIBRAS e a Língua Portuguesa em todas as disciplinas curriculares em todos os níveis da Educação Básica. Porém, a LIBRAS é considerada a primeira língua ou L1 e a Língua Portuguesa, em sua modalidade escrita, a segunda língua ou L2. (BRASÍLIA, 2013) Segundo esse documento legal, a garantia dos parâmetros necessários à implantação das políticas públicas educacionais estabelecidas deve incluir a oferta educacional na INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 7 modalidade de Educação de jovens e Adultos – EJA com atendimento no primeiro, no segundo e no terceiro segmentos, diurno e noturno, da Educação de jovens e Adultos surdos, conforme a idade, a necessidade e o interesse dos alunos e dos seus familiares. 2. UMA BREVE REFLEXÃO No contexto de desigualdades socioeconômicas e políticas de nosso país, reconhecer direitos de pessoas surdas, bem como de toda pessoa com deficiência ao Ensino de Jovens e Adultos, ainda configura um grande desafio para a sociedade brasileira, pois quando se trata da escolarização e alfabetização desses estudantes, apesar de todo aporte político bem intencionado, muito frequentemente os resultados são de exclusão e educação de segunda qualidade. Esta qualidade reduzida, geralmente pela inadequação dos métodos educacionais e materiais, não garantem a possibilidade de continuidade dos estudos ou diferenciação, tornando-se uma forma de discriminação, deixando crianças com várias necessidades fora da escola e, quando adultas, estarão fora da vida social e cultural. Para a comunidade surda, cuja história de sua educação foi pautada em um modelo clínico-terapêutico, produzindo resultados insatisfatórios e estigma social, a possibilidade de resgatar a escolarização no EJA é a esperança de uma verdadeira inclusão, fomentada pelos movimentos surdos. Numa avaliação feita pela Feneis (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos) sobre os números de surdos matriculados nas escolas brasileiras, destacam como de importância extrema as medidas a serem tomadas no sentido de promover uma verdadeira inclusão escolar dos Surdos, o que implica repensar, também, o que vem a ser uma educação de qualidade para os Surdos, porque, segundo a federação, não basta a inclusão deles no sistema escolar, eles têm que conseguir ficar e terminar o ensino médio, já que os pouquíssimos que conseguem estudar, apenas 3% terminam o ensino médio (FENEIS, 2012). No entanto, a população de jovens e adultos que se encontra sem acesso à educação ou com baixa escolaridade constitui-se em um segmento expressivo nos municípios brasileiros. Segundo os relatórios do caderno de textos do PRADIME- Programa de Apoio aos Dirigentes Municipais da Educação, lançado em 2006, “Apesar dos esforços feitos, os programas específicos dirigidos à redução do analfabetismo e à elevação da escolaridade do brasileiro não têm alcançado os efeitos desejados. Alguns fatores são responsáveis por essa situação, como: a descontinuidade das políticas, com sua consequente falta de INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 8 prioridade para essa modalidade de ensino; a falta de preparação dos professores e a decorrente improvisação das práticas pedagógicas; a escassez de recursos financeiros; a ausência de sistemas de acompanhamento, registro e análise dos programas executados” (BRASIL/MEC, 2006). Observamos, ainda, neste documento, que, embasados nos trabalhos de Paulo Freire e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, o currículo deve ser orientado para o desenvolvimento da capacidade pelo aluno de: posicionar-se; propor ideias; elaborar projetos pessoais; participar de forma cooperativa de projetos coletivos; organizar-se em função de metas eleitas; e participar da gestão de ações coletivas, com vistas à construção da autonomia intelectual e social, como consequência do processo de construção de conhecimentos e do desenvolvimento de valores. Também aqui o processo de elaboração dos educadores, nas reuniões pedagógicas, em diálogo com a Secretaria é fundamental (BRASIL/MEC, 2006). Quando trazemos à baila dos discursos os temas Educação e Desenvolvimento, não podemos deixar de reconhecer as relações existentes entre a Educação de Jovens e Adultos e o desenvolvimento social que pode ser identificado em inúmeras declarações firmadas em eventos importantes, realizados tanto no Brasil, quanto em colóquios internacionais. Assim, é fundamental para o desenvolvimento social, humano e econômico dos municípios brasileiros uma atenção especial na construção das condições efetivas para a realização de programas voltados para esse segmento. “Os princípios de participação e de inclusão e de equidade devem ser os orientadores das ações desencadeadas. Para tanto, é preciso ter clareza de que essas condições devem ir além dos compromissos com a expansão das oportunidades de estudos, expressas nos números de matrículas ou vagas oferecidas nas escolas e nos programas de ensino. Elas incidem, principalmente, nas formas específicas de processos de ensino-aprendizagem próprias para a faixa etária correspondente, na qualificação de pessoal docente, nas especificidades do material didático e nas orientações pedagógicas. Incidem também sobre a superação da infantilização das práticas pedagógicas usuais e pela possibilidade real de participação e de protagonismo dos jovens e adultos no seu próprio processo de construção de conhecimentos e pelo reconhecimento de que esse segmento traz consigo uma história de vida que deve ser valorizada e ressignificada no confronto com o conhecimento escolar” (BRASIL/MEC, 2006). CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando a amplitude e a complexidade do trabalho com jovens e adultos bem como o contexto de exclusão e marginalização de surdos, resultante do processo INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 9 educacional inadequado, a escolarização tardia de jovens e adultos surdos constituiu um grande e assustador desafio à gestão educacional. É preciso buscar parcerias entre os três níveis de governo, instituições públicas e privadas, movimentos sociais e sociedade de uma maneira geral. Porém, não podemos permitir que se perca de vista a responsabilidade política dos governos federal, estadual e municipal para o cumprimento desse seu dever constitucional. Analisando o processo histórico da EJA, percebemos que a inclusão dos alunos surdos no contexto da EJA foi possível através de mudanças conjunturais políticas e mobilizações sociais que forçaram as políticas educacionais estabelecerem diretrizes que favorecessem essa inclusão. A EJA, portanto, a partir dos ganhos legais, vem em um processo acelerado de mudanças se configurando em um espaço para a inclusão não só do surdo, mas do cego, do negro, da mulher, do desempregado, do trabalhador, das pessoas com necessidades especiais e dos grupos minoritários Assim, constatamos outro desafio importante: o dos profissionais engajados na educação de jovens e adultos para elaborar estratégias e currículos, bem como procedimentos metodológicos e avaliativos que abarquem tamanha diversidade cultural em seus espaços. Consideramos que a pesquisa possibilitou uma reflexão a respeito do sistema educacional, em como os programas e políticas educacionais transformam, caracterizam e descaracterizam os sujeitos e os espaços escolares quando assim lhe convêm. Contudo, o jovem e o adulto analfabetos com deficiência continuam, portanto, a ser matriculados em escolas especiais, classes especiais ou em turmas regulares do ensino fundamental com crianças pequenas. Diante desse contexto, consideramos que a EJA precisa redimensionar seus valores e diretrizes, reorganizar os espaços de atendimento, capacitar seus profissionais e instrumentalizá-los com recursos didático-pedagógicos para fornecer-lhes boas condições físicas para atuação, para atender a diversidade dos alunos proporcionando a inclusão e socialização dos mesmos sem discriminação. Dessa forma, novas pesquisas poderão ser realizadas no sentido de analisarem o baixo índice de conclusão da Educação Básica, o percentual de surdos inseridos no mercado de trabalho com baixos salários e o número menor ainda dos que ingressam no Ensino Superior, apesar de já existirem ações para minimizar as barreiras linguísticas e garantir acesso desses alunos nesta modalidade de ensino. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 10 ANDRÉ, M.E.D.A. de. Etnografia da prática escolar. Campinas, SP: Papirus, 1995. BRASIL. 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