Economia Mundial: Riscos sistêmicos podem colocar em xeque o forte ritmo de expansão do PIB global e comprometer a evolução do setor externo brasileiro 1 Bruno Rodrigues Pinheiro 2 Paulo Sergio Ferreira 3 1. Introdução Diversas publicações econômicas de órgãos especializados no mundo inteiro têm destacado a continuidade do bom desempenho da economia mundial nos últimos anos. O FMI (Fundo Monetário Internacional), no seu World Economic Outlook de abril de 2007, projetou um crescimento de 4,9% do PIB global em 2007 e 2008. Entretanto, os riscos sistêmicos continuam a preocupar os analistas internacionais, sobretudo a desaceleração da economia estadunidense. Este relatório tem como objetivo avaliar em que medida os chamados desequilíbrios globais podem levar a economia mundial a um período de fortes turbulências, com conseqüências extremamente negativas sobre o conjunto dos países que compõem a estrutura do mercado mundial, particularmente os países emergentes, entre eles o Brasil. Neste sentido, serão analisados os tipos de riscos e em como eles afetam o desempenho da economia internacional. Além disso, serão ressaltados os possíveis mecanismos que os governos podem adotar na tentativa de solucionar estes graves problemas. Analisando o Brasil, percebe-se que: uma conjuntura internacional extremamente favorável – crescimento mundial vigoroso aliado a uma alta liquidez internacional – faz com que o produto brasileiro encontre demanda no mercado internacional. Além disso, essa alta na demanda faz com que os preços das commodities fiquem num patamar elevado. Entretanto, parece que a mercadoria que mais se cobiça no mercado internacional é o Real. O Real vem desde 2004 sofrendo um processo de valorização 1 Texto a ser apresentado ao NEC na reunião a ser realizada no dia 06/06/07 Aluno do Curso de Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia e bolsista do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC). 3 Aluno do Curso de Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia e bolsista do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC). 2 1 bem maior do que a média das moedas dos países emergentes (enquanto nesse período a média de valorização das moedas dos emergentes foi de 16% o real se valorizou 36%). 2. Quadro Geral O crescimento do PIB mundial continuará sólido e sustentado entre 2007 e 2008, mas haverá uma queda de 0,5 p.p se comparado a 2006, quando registrou um crescimento de 5,4%. Entretanto, os riscos continuam a trazer preocupação, segundo o FMI, ainda que eles sejam menores em relação ao último prognóstico realizado em setembro de 2006, na avaliação dessa instituição. Entre os principais riscos potenciais, destacam-se: • A desaceleração da economia estadunidense face ao esfriamento do seu mercado imobiliário. • A grande volatilidade nos mercados financeiros, o que pode diminuir os investimentos feitos pelas empresas estadunidenses. • O processo inflacionário causado, sobretudo, pelo aumento brusco nos preços do petróleo. Entre os riscos considerados de longo prazo há uma preocupação referente aos fatores que podem comprometer os ganhos de produtividade, que têm sustentado o bom desempenho econômico recente, entre eles: • O envelhecimento da população e os movimentos anti-globalização. • As conseqüências ambientais do rápido crescimento econômico de alguns países emergentes. Analisando de forma mais pormenorizada as principais economias do planeta, estima-se que os EUA devem ter uma desaceleração acentuada em 2007, recuperando-se ao longo de 2008 na medida em que o setor imobiliário se reanime. Na zona do euro espera-se uma desaceleração do ritmo de crescimento face ao avanço das medidas de contenção dos gastos públicos e a correção de alguns desequilíbrios na região. No Japão, o ritmo de expansão não deve se alterar de forma brusca, ficando mais ou menos estacionado. A 2 tabela a seguir traz informações acerca da previsão de crescimento do PIB realizada pelo FMI. Tabela 1 - Desempenho do PIB de países e regiões selecionados Projeções atuais 2005 2006 2007 2008 Economia Mundial 4,9 5,4 4,9 4,9 Economias avançadas EUA Zona do Euro Alemanha França Itália Espanha Japão Reino Unido Canadá Outras economias avançadas Economias asiáticas recém-industrializadas 2,5 3,2 1,4 0,9 1,2 0,1 3,5 1,9 1,9 2,9 3,9 4,7 3,1 3,3 2,6 2,7 2 1,9 3,9 2,2 2,7 2,7 4,3 5,3 25,5 2,2 2,3 1,8 2 1,8 3,6 2,3 2,9 2,4 3,8 4,6 2,7 2,8 2,3 1,9 2,4 1,7 3,4 1,9 2,7 2,9 3,8 4,6 Mercados emergentes e em desenvolvimento 7,5 7,9 7,5 7,1 5,6 6 4,6 2,9 2,8 6,6 6,4 6,9 5,5 5,4 9,2 10,4 9,2 5,5 5,7 5,5 3,7 4,8 7,7 6,7 9,7 6 5,7 9,4 10,7 9,2 6,2 6,8 4,9 4,4 3,4 7 6,4 8,3 5,5 5,5 8,8 10 8,4 5,8 6,1 4,2 4,2 3,5 6,4 5,9 7,5 5,3 5,5 8,4 9,5 7,8 5,2 5,4 5,5 5,8 Países Selecionados África África Sub-Sahariana América Brasil México Comunidade dos Estados Independentes Rússia Excluindo a Rússia Europa Central e Oriental Oriente Médio Países em desenvolvimento na Ásia China Índia ASEAN-4 Fonte: FMI em seu World Economic Outlook O crescimento econômico registrado nos países emergentes deve continuar forte em 2007 e 2008 graças ao cenário internacional extremamente favorável e a manutenção dos preços das commodities em patamares elevados no mercado mundial. A Índia pode desacelerar em função do endurecimento da política monetária, que tenta conter o superaquecimento da economia daquele país. O Oriente Médio, a América Latina e os países ricos em produtos básicos na África devem continuar a ter um acentuado crescimento em 2007. Entretanto, o México e as 3 economias emergentes da Europa seriam mais afetados pela desaceleração nos EUA e na Europa. 3. Quais os efeitos de uma desaceleração dos EUA sobre o PIB global? Este é o principal questionamento levantado pelos principais analistas ligados à economia internacional. É sabido que e economia mundial nos últimos 20 anos tornouse cada vez mais integrada do ponto de vista comercial, financeiro e produtivo. Desta forma, qualquer fonte de risco pode se espalhar com mais rapidez pelos canais comerciais e financeiros através dos países. Os EUA são responsáveis por 20% das importações mundiais e o seu centro financeiro é o mais importante no mundo. Neste sentido, as preocupações em torno dos riscos de uma desaceleração na economia norte-americana sobre o conjunto dos países tendem a ganhar terreno. Episódios recentes aumentam o temor, tais como: O estouro da bolha formada no mercado de ações entre os anos de 2000 e 2001 nos setores de alta tecnologia daquele país, que se repercutiu rapidamente sobre outros países, levando a um colapso nas valorizações das bolsas e do investimento empresarial em meio a uma mudança geral das expectativas. Entretanto, a recessão atual parece ter tido repercussões limitadas apenas aos vizinhos, Canadá e México. Alguns fatores podem explicar este resultado: • A desaceleração estadunidense está centrada no setor imobiliário, que tem um componente relativamente pequeno de produtos importados. • O esfriamento do setor imobiliário ocorre apenas nos EUA, já que em outras regiões ele continua crescendo. • As melhoras do balanço das empresas e das condições do mercado de trabalho na Europa têm estimulado o mercado interno, possibilitando que o crescimento econômico não dependa apenas das exportações. Não se podem descartar maiores dificuldades se a economia estadunidense reduzir ainda mais o consumo e o investimento empresarial em 2007. Há também a possibilidade de um grave risco de transbordamento para as economias emergentes da Ásia, sobretudo se 4 o ritmo do crescimento chinês se desacelerar de forma mais abrupta, situação que parece pouco provável, especialmente após a divulgação do resultado da economia chinesa para o primeiro trimestre deste ano, que registrou alta de 11,1%. 4. Orientações para a política econômica O relatório do FMI aponta as medidas que devem ser adotadas pelas autoridades governamentais tanto das economias avançadas quanto a dos países emergentes para a manutenção do crescimento mundial em bases sólidas e sustentáveis. Neste sentido, ressalta a necessidade dos governantes aproveitarem as condições internacionais favoráveis para avançar nas reformas estruturais e na consolidação fiscal de modo a assegurar a sustentabilidade do crescimento. Entretanto, este objetivo deve estar alinhado com a manutenção da estabilidade financeira e macroeconômica, sobretudo o controle da inflação. Para os países centrais, o desafio para as autoridades monetárias é manter o crescimento alinhado com a baixa pressão inflacionária. Cada país deve enfrentar a alta dos preços de acordo com os diferentes graus em que se encontra seu processo inflacionário. Nos EUA, o Federal Reserve (o BC americano) deve buscar o reaquecimento da economia, sem desconsiderar a preocupação de manter os preços sob controle. Na zona do euro, caso se confirme às previsões de crescimento do PIB acima ou próximo ao PIB potencial, o BCE deve aumentar as taxas de juros para conter as pressões altistas dos preços e salários. Para a maioria das economias, o relatório aponta a necessidade da consolidação fiscal considerada como um elemento crucial face ao envelhecimento da população. Neste sentido, são necessárias reformas fiscais para evitar distorções nas bases da arrecadação e o aumento dos desperdícios, sobretudo na área de seguridade social. O FMI defende a reforma do sistema de pensões de modo a encorajar os trabalhadores a se manter em atividade por mais tempo e assegurar a viabilidade fiscal. No que tange aos países emergentes, os desafios a serem enfrentados são semelhantes ao dos países desenvolvidos, ou seja, assegurar a estabilidade macroeconômica e financeira, promover o crescimento econômico sustentado. Segundo o relatório, vários países na região avançaram na consolidação dos fundamentos macroeconômicos, 5 tirando proveito do cenário internacional benigno. Entretanto, alguns problemas continuam pendentes, entre eles: • Os mercados emergentes enfrentam o desafio de manter a estabilidade macroeconômica e financeira frente ao grande fluxo de capitais estrangeiros entrantes, os quais podem minar a competitividade desses países, acentuando a vulnerabilidade externa. • Na China, a adoção de uma política cambial mais flexível poderia facilitar a gestão da política monetária. • Nas economias emergentes da Europa, os governos precisam enfrentar os grandes déficits nas transações correntes e o aumento expressivo do crédito. • Na América Latina, os governos precisam consolidar os processos recentes de diminuição dos déficits públicos. • Nos países exportadores de commodities, sobretudo nos grandes produtores de petróleo, as receitas oriundas do comércio exterior e com a arrecadação fiscal precisam ser geridas de forma a evitar o superaquecimento da economia. O FMI também ressalta a necessidade de iniciativas multilaterais através da cooperação e das ações coordenadas das políticas governamentais para a solução dos grandes desequilíbrios em conta corrente, quais sejam: • O aumento da poupança nos Estados Unidos, mediante austeridade fiscal e a redução dos desestímulos da poupança; • Reformas estruturais voltadas para o estímulo do crescimento no Japão e nos países que compõem a zona do euro; • Medidas para o estímulo do mercado interno e em direção a uma maior flexibilização das taxas de câmbio nos países emergentes da Ásia, em particular, na China. Setor Externo Brasileiro: Real, a commodity mais valorizada do mercado. 1. Introdução 6 A atual onda de valorização cambial frente ao dólar – que se verifica em todas as moedas espalhadas pelo mundo, com exceção da moeda japonesa – pode comprometer a evolução do setor externo brasileiro, em especial os setores intensivos em mão-de-obra. Entretanto, o impacto no saldo comercial ainda não se deu de forma mais contundente. O que se observa analisando os números do setor externo, no que tange à balança comercial, é que a taxa de crescimento das importações vem sendo maior do que a taxa de crescimento das exportações. Mesmo com essa sinalização, o saldo comercial, fazendo uma comparação anualizada, poderá ser igual ao do verificado no ano passado. Neste cenário, o relatório analisa os dados do Balanço de Pagamentos do Brasil e observar alguns indicadores de solvência externa. 2. Transações Correntes: valorização cambial, remessa de lucros e poupança externa. O saldo nas transações correntes saiu de posição de saldo negativo (1995 até 2002) para uma posição superavitária (2003 até 2006). Em 2007 a tendência de saldo positivo deverá ser mantida graças ao saldo extremamente positivo da balança comercial. 2.1 Balança Comercial No mês de maio, a cotação do dólar caiu abaixo de R$ 2, as importações bateram recorde histórico no Brasil e somaram US$ 9,78 bilhões. Outro recorde da balança comercial foi o saldo de US$ 3,87 bilhões, o maior para um mês de maio. As exportações somaram US$ 13,648 bilhões, o terceiro melhor desempenho do país. No ano, o superávit acumulado chegou a US$ 16,854 bilhões - alta de 8% sobre o mesmo período de 2006, como pode ser visto na tabela 2. 7 Tabela 2 - Balança Comercial (FOB em milhões) Anos Exportações Importações Saldo 1999 48.011 49.210 -1.199 2000 55.085 55.783 -698 2001 58.222 55.572 2.650 2002 60.321 47.240 13.081 2003 70.084 48.290 21.794 2004 96.475 62.834 33.641 2005 118.308 73.551 44.757 2006 137.471 91.394 46.077 2007* 60.097 43.243 16.854 Fonte: MIDIC (*)Dados acumulados até maio O governo minimizou o aumento das importações, e o secretário de Comércio Exterior, Armando Meziat, classificou o fato como “ilusório”, devido à greve da Receita Federal em maio do ano passado. Ante o mesmo mês de 2006, as importações cresceram 34,2% e as exportações, 32,4%. Para Meziat: “As importações vão continuar crescendo mais do que as exportações, mas não em ritmo suficiente para reduzir o superávit comercial”, afirmou. Com o resultado de maio, as exportações atingiram US$ 148,31 bilhões no acumulado de 12 meses desde junho do ano passado, um aumento de 20% em relação ao mesmo período anterior. Já as importações cresceram 26,7% no período e chegaram a US$ 100,45 bilhões. Mesmo reduzindo a importância do aumento nas importações, Meziat foi cauteloso e manteve a previsão de US$ 152 bilhões para as exportações no ano. “Muito provavelmente vamos alcançar a meta”, disse. Os principais produtos responsáveis pelas boas vendas ao exterior continuaram sendo commodities, cujo preço permanece aquecido. Tabela 3 - Exportação Brasileira - Fator Agregado Acumulado Jan/Maio de 2007 Janeiro/Maio 2007 2006 Var.% 2007/06 p/ média diária Part. % 2007 2006 32,5 30,6 27,7 69,8 Básicos 18.384 13.741 Industrializados 40.503 34.603 15,9 67,4 8.344 6.588 25,4 13,9 13,3 32.159 28.015 13,7 53,5 56,5 1.210 1.250 -4,1 2,0 2,5 60.097 49.594 20,0 100,0 100,0 . Semimanufaturados . Manufaturados Op. Especiais Total Fonte: SECEX/MDIC. Janeiro-Maio/2007: 104 dias úteis; Janeiro-Maio/2006: 103 dias úteis 8 Segundo o secretário, o Brasil ainda não sentiu um forte impacto da valorização do real ante o dólar por motivos diversos, como o uso de inovações tecnológicas, maior produtividade e redução de custos. Caiu a participação de industrializados no volume exportado e subiu a porcentagem de produtos básicos. Em 2006, os produtos básicos respondiam por 27,7% das vendas brasileiras no acumulado de janeiro a maio. Neste ano, o percentual chegou a 30,6%. Os industrializados reduziram de 69,8% para 67,4% o seu pedaço no bolo. (Folha, 2007). Analisando o destino das exportações observa-se que a União Européia, os Estados Unidos e a Argentina concentram boa parte das exportações. O destaque que pode ser levantado é a China que teve um crescimento de 35% no acumulado do ano em relação ao mesmo período do ano passado, como pode ser visto na tabela 4. Tabela 4 -Exportação Brasileira - Principais Blocos Econômicos - Janeiro/maio de 2007 Janeiro/Maio Part. % Var.% 2007/06 2007 2006 p/média diária 2007 2006 União Européia Aladi - Mercosul . Argentina - Demais da Aladi EUA (1) Ásia . China África Oriente Médio Europa Oriental 15.087 13.382 6.171 5.137 7.211 9.907 9.205 3.842 3.252 2.489 1.568 11.305 11.563 5.149 4.359 6.414 9.289 7.318 2.799 2.610 1.728 1.236 32,2 14,6 18,7 16,7 11,3 5,6 24,6 35,9 23,4 42,7 25,6 25,1 22,3 10,3 8,5 12,0 16,5 15,3 6,4 5,4 4,1 2,6 22,8 23,3 10,4 8,8 12,9 18,7 14,8 5,6 5,3 3,5 2,5 Demais 11.378 9.694 16,2 18,9 19,5 TOTAL 60.097 49.594 20,0 100,0 Fonte: SECEX/MDIC. Janeiro-Maio/2007: 104 dias úteis; Janeiro-Maio/2006: 103 dias úteis (1) inclui Porto Rico. 100,0 Já sobre as importações observa-se uma elevação em todas as categorias analisadas. O aumento na taxa de crescimento das importações pode ser justificado pela excessiva valorização cambial aliada como uma tentativa de modernização do parque industrial, como pode ser visto na tabela a seguir. 9 Tabela 5 - Importação Brasileira por Categoria de Uso - janeiro/maio 2007 Janeiro/Maio Var.% 2007/06 2007 2006 Part. % p/média diária 2007 2006 Bens de Capital Matérias-primas e intermediários Bens de Consumo - Não-duráveis - Duráveis . Automóveis Combustíveis e lubrificantes - Petróleo - Demais 9.113 21.703 5.791 3.055 2.736 842 6.636 4.112 2.524 7.311 16.883 4.251 2.171 2.080 548 5.696 3.588 2.108 23,4 27,3 34,9 39,4 30,3 52,2 15,4 13,5 18,6 21,1 50,2 13,4 7,1 6,3 1,9 15,3 9,5 5,8 21,4 49,5 12,5 6,4 6,1 1,6 16,7 10,5 6,2 Total 43.243 34.141 25,4 100,0 100,0 Fonte: SECEX/MDIC. Janeiro-Maio/2007: 104 dias úteis; Janeiro-Maio/2006: 103 dias úteis (1) inclui Porto Rico. Assim, o saldo da balança comercial só ficará menor neste ano se continuar aumentando a distância entre o ritmo de crescimento das exportações e das importações. Para o Ministro da Fazenda, Guido Mantega: “o atual crescimento das importações ainda não é suficiente para reduzir o superávit em valor absoluto. Tem que haver um distanciamento entre as duas taxas para que o superávit caia”, afirmou. 2.2 Conta Serviços A conta de serviços fechou o ano de 2006 tendo o terceiro maior resultado da historia (só atrás dos anos de 1998 e 1997). Além disso, essa conta tem uma contribuição negativa no fechamento do saldo das Transações Correntes. Das 13 sub-contas que compõe a Conta de Serviços o Brasil só 3 tem resultado positivo. 10 Tabela 6 - Saldo Conta Serviços por Sub-Contas(em US$ milhões) Ano 2003 2004 2005 2006 2007* -1590 -1986 -1950 -3128 -849 Transporte 218 351 -858 -1448 -262 Viagens Internacionais -436 -544 -568 -430 -134 Seguro -383 -77 -230 -123 69 Serviço Financeiro -1034 -1228 -1626 -1903 -579 Computação -1120 -792 -1303 -1513 -396 Royaltes -2312 -2166 -4130 -4887 -1289 Aluguel Equi. -151 -192 -755 -450 -143 Governo 84 174 127 104 20 Comunicação 10 1 8 18 2 Construção -92 -235 -279 -1 49 Rel. Comercio 2158 2378 3651 4556 1415 Empresarias -283 -362 -396 -452 -133 Culrural Fonte: Bacen (*) dados referente ao 1º trimestre 2.3 Conta Renda A Conta Renda também tem contribuição negativa no saldo total das Transações Correntes. O resultado verificado em 2006 foi o maior da história. Este dado é um pouco preocupante, pois dentro dessa conta está a remessa de lucros e dividendos. Depois da abertura da economia brasileira no começo dos anos 90, quando ocorreu um processo de desnacionalização dos ativos do Brasil, a remessa de lucros e dividendos, que funciona como uma contrapartida da entrada de Investimento Direto Estrangeiro teve um aumento exponencial, como pode ser visto nas tabelas a seguir. Tabela 7 - Saldo Conta Rendas por Trimestre (em US$ milhões) Ano I II III IV Total 2007 -5760 2006 -6925 -7638 -5505 -7376 -27444 2005 -5310 -7217 -5999 -7440 -25967 2004 -4592 -5775 -4180 -5973 -20520 2003 -3497 -5304 -3542 -6209 -18552 2002 -3550 -5716 -3742 -5181 -18191 Fonte: BACEN Um outro detalhe que chama a atenção sobre as remessas de lucro e dividendo se refere a atual onda de valorização cambial. Com o real extremamente valorizado fica muito mais atrativo para as empresas multinacionais fazerem suas remessas. Além dessa observação, um dado que chama a atenção é que o pagamento de juros (que sempre foi problemático no Brasil) já é inferior às remessas de lucros e dividendos. 11 Tabela 8 - Conta Renda do Balanço de Pagamentos (US$ milhões) 2002 2003 2004 Rendas -18191 -18552 -20520 Salário e ordenado 102 109 181 Renda de investimentos (líquido) -18292 -18661 -20701 Renda de investimento direto -4983 -5098 -5789 Lucros e dividendos -4034 -4076 -4937 Lucros reinvestidos no Brasil 0 0 0 -1022 -852 Juros de empréstimo intercompanhia -949 Renda de investimento em carteira -8384 -8743 -10415 Lucros e dividendos -1128 -1564 -2400 Juros de títulos de renda fixa -7256 -7179 -8015 -4820 -4497 Renda de outros investimentos (juros) -4925 Juros pagos -5578 -5681 -5495 Juros refinanciados 0 0 0 Juros atrasados 0 0 0 Fonte: Bacen 2005 -25967 214 -26181 -10302 -9142 0 -1161 -11778 -3544 -8234 -4101 -5452 0 0 2006 -27489 177 -27666 -12811 -11431 0 -1380 -11051 -4924 -6128 -3804 -5723 0 0 2007* -5760 111 -5871 -2691 -2427 0 -264 -2031 -696 -1335 -1149 -1612 0 0 2.4 Transações Correntes Com a implantação da âncora cambial, que mantinha o real valorizado para combater a inflação, o saldo nas transações correntes, passou a ser deficitária. Depois da mudança do regime cambial, em 1999, as transações correntes passaram a ter seu saldo positivo, com a reversão completa da Balança Comercial (essa reversão se deu no ano de 2003). No ano de 2006, o que se verificou foi um saldo das transações correntes menor do que o observado no ano de 2005, mesmo com a Balança Comercial batendo recorde atrás de recorde, o que mostra o impacto das remessas de lucro, pagamentos de juros e o saldo negativo da conta de serviço. Tabela 9 - Balanço de Pagamentos - Transações Correntes (anos selecionados) US$ milhões Ano Balança Comercial Serviços Renda Trans.Unilateral Transações Correntes 1997 -6753 -10646 -14876 1823 -30452 1998 -6575 -10111 -18189 1458 -33417 1999 -1199 -6977 -18848 1689 -25335 2000 -698 -7162 -17886 1521 -24225 2001 2650 -7759 -19743 1638 -23214 2002 13121 -4957 -18191 2390 -7637 2003 24794 -4931 -18552 2867 4178 2004 33641 -4678 -20520 3236 11679 2005 44703 -8309 -25967 3558 13985 2006 46115 -9656 -27489 4306 13276 2007* 8701 -2229 -5760 982 1694 Fonte: Bacen 12 3. Conta Capital e Financeira A abertura comercial e financeira da economia brasileira no começo dos anos 90, e seu aprofundamento nos anos subseqüentes, acarretaram uma entrada considerável de capital estrangeiro. Após o boom do começo dos anos 90, com o processo de privatização, houve uma queda no ritmo de entrada de investimento estrangeiro direto (IED. Em 2002 e 2003 o ritmo de entrada permaneceu elevado, mas houve um aumento significativo das saídas de capital brasileiro, a tal ponto que nos anos de 2004 e 2005 o saldo final da conta financeira fica negativo. Já em 2006, houve uma forte recuperada no ritmo de entrada desse capital, voltando a fechar o ano com saldo positivo na conta financeira. Tabela 10 - Conta Financeira e suas Subcontas (em US$ milhões) 2007* 2006 2005 2004 2003 Conta Financeira 21929 15458 -10257 -7895 4614 Investimento Direto 8514 -9420 12549 8339 9895 1936 -28202 -2517 -9807 -249 Inv. Brasil. Direto 6578 18782 15066 18146 10144 Inv. Estrangeiro Direto Investimento Carteira 9333 9573 4884 -4751 5308 367 523 -1771 -755 179 Inv.Brasil. Carteira Inv. Estrangeiro Carteira 8966 9051 6655 -3996 5129 Derivativos 383 -40 -677 -151 -9 Outros Inves. 4092 14922 -27650 -10806 -10438 Fonte: BACEN (*) Os dados referentes ao ano de 2007 ainda não está fechado. Assim, considera-se os dados até o 1º trimestre. 2002 7572 14108 -2482 16590 -5118 -321 -4797 -356 -1062 Uma observação importante que tem que se fazer desrespeito ao atual movimenta de internacionalização das empresas brasileiras. A saída de capital brasileiro em busca de novos investimentos no exterior pode estar relacionada: i) busca de investimentos mais lucrativos no exterior, uma vez que a economia interna não cresce; ii) processo de fusão e aquisição no exterior para ganhar escala e evitar a concorrência dos seus competidores; iii) especular com o câmbio valorizado. Na medida que a moeda local se valoriza é mais interessante para os empresários buscar uma rentabilidade maior e especular com o câmbio. Por exemplo: uma empresa que tenha filial no exterior pode conseguir um empréstimo com um custo menor do que o observado no mercado interno, fruto do alto diferencial de juros (interno x externo). Assim, uma filial pode captar esses dólares que conseguiu lá fora e trazer para o mercado interno, aplicando aqui e ganhando, tanto com o diferencial de juros como com a valorização cambial. 13 Dessa forma, se um empresário, hipoteticamente, conseguir US$ 100,00 no exterior como empréstimo, no começo do ano, caso decidisse aplicar esse dinheiro aqui no Brasil, receberia R$ 212,00 (considerando uma taxa de câmbio de R$2,12 por US$). Pode aplicar esse dinheiro rendendo os juros e quando voltar como esse dinheiro para o exterior ainda ganha com a valorização. Nesse caso hipotético, se ele remeter esse dinheiro com o câmbio de hoje, receberia US$ 112,00. Um valor superior ao que trouxe para o Brasil, sem contar os juros. Na tabela a seguir pode-se verificar esse movimento de saída de capital. Tabela 11 - Conta Financeira e sub-conta (em US$ milhões) Sub-Conta 2007 2006 2005 2004 Investimento Brasileiro Direto 1936 -28202 -2517 -9808 Participação no Capital -3345 -23413 -2695 -6640 Emprestimo Intercompanhia 5282 -4789 178 -3167 Matriz no Brasil e Filial no Exterior -718 -4773 103 -3170 Filial no Exterior e Matriz no Brasil 6000 -16 75 3 Fonte: BACEN 2003 -249 -62 -187 -187 0 2002 -2094 -2702 613 613 0 Dessa forma, tendo as Transações Correntes superavitárias e um saldo na conta Capital e Financeira também positiva, o resultado global do Balanço de Pagamentos é positivo. Isso justifica a atual acumulação de reservas, que já está em US$ 122 bilhões, o que sinaliza para o “mercado” uma queda na vulnerabilidade externa do país. Ora, qual é o argumento que comprova essa queda nos indicadores da vulnerabilidade do país? As agências de risco utilizam alguns índices que são os indicadores tradicionais de análise da vulnerabilidade de um país, entre os quais: serviço da dívida/ exportação; juros/ exportação; reservas/ dívida total entre outros. O que se pode verificar, na atual conjuntura do país é que esses indicadores, de fato, vem apresentando uma melhora significativa, seja pelo aumento das exportações seja pelo aumento das reservas, como pode-se observar na tabela a seguir. 14 Indicadores Tabela 12 - Indicadores de endividamento externo 2001 2002 2003 2004 Serviço da dívida/exportações (%) Serviço da dívida/PIB (%) Juros/exportações (%) Dívida total/PIB (%) Dívida total do setor público/dívida total (%) Reservas (liquidez)/dívida total (%) Dívida total/exportações Dívida total líquida/exportações Reservas (liquidez)/serviço da dívida Reservas (liquidez)/juros Fonte: Bacen 84,9 8,9 28,0 37,9 51,5 17,1 3,6 2,8 0,7 2,2 82,7 9,9 23,6 41,8 59,4 18,0 3,5 2,7 0,8 2,7 72,5 9,6 19,4 38,8 63,1 22,9 2,9 2,1 0,9 3,5 53,7 7,8 14,8 30,3 65,7 26,3 2,1 1,4 1,0 3,7 2005 2006 55,8 7,5 12,2 19,2 59,2 31,7 1,4 0,9 0,8 3,7 41,4 5,3 10,8 16,2 51,7 49,8 1,3 0,5 1,5 5,8 Entretanto, as análises desses indicadores podem distorcer alguns fatos. É verdade que está ocorrendo uma queda no total da dívida externa, a tal ponto, que o país é hoje credor em dólar. Mas, a política de acúmulo de reservas, com o objetivo de diminuir a vulnerabilidade externa e tentar controlar a queda do câmbio, esbarra numa nova configuração da vulnerabilidade externa, que ainda não tem merecido a devida atenção. O mecanismo de compra de dólares e emissão de dívida pública interna traz uma questão interessante, que é a análise do processo de internalização da dívida pública. Uma vez que, não há informações sobre os detentores da dívida interna, e sabendo que investidores internacionais podem adquiri esses títulos, entramos numa nova configuração da vulnerabilidade externa do país, pois, pode não ser verdade que esteja ocorrendo uma diminuição da “dívida externa” uma vez que agentes externos podem adquirir títulos da dívida interna. 15 Referências Bibliográficas BACEN. Banco Central do Brasil. Disponível em www.bacen.gov.br FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL (FMI). World Economic Outlook, abr. 2007. Disponível em: <www.imf.org>. Acesso em: 04 jun. 2007. INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL (IEDI). Perspectivas da Economia Mundial: Crescimento Sustentado, Carta IEDI, n. 259. Disponível em: http://www.iedi.org.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=2778&sid=20. Acesso em: 03 jun. 2007. MDIC. Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comercio. Disponível em www.midc.gov.br 16