Análise de um caso de evento severo de granizo

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Análise de um caso de evento severo de granizo ocorrido no sul do país na tarde do dia
15/11/2010
Mais de 20 cidades do norte e nordeste do RS foram atingidas por uma forte chuva de
granizo no início da tarde de segunda-feira (15/11/2010). Entre as cidades mais atingidas estão
Vacaria, São Marcos, Panambi, Floriano Peixoto, Getúlio Vargas, Cerrito, Arroio do Padre,
Serafina Corrêa, Fontoura Xavier, Erechim, São Francisco de Paula, Gramado, Canela e Santo
Antônio da Patrulha. Mais de 12 mil pessoas foram afetadas pelo evento. Segundo a Defesa
Civil estadual, mais de 600 pessoas deixaram suas casas. No total, 905 residências e dez escolas
foram danificadas. Na agricultura foram contabilizados danos irreparáveis.
Na Figura 1 pode-se observar que no horário da ocorrência da tempestade havia
nuvens de alto desenvolvimento vertical entre o norte e nordeste do RS, com topos muito
profundos, alcançando os -60C, indicando condição favorável à ocorrência de tempo severo.
A) 16:00Z
C) 16:45Z
B) 16:30Z
D) 17:00Z
Figura 1 – Imagens realçada do satélite GOES 12
Na análise das cartas sinóticas (Figura2) observa-se um cavado ao longo de toda a
coluna atmosférica. Em 250 hPa (Figura 2A) percebe-se a atuação do Jato Subtropical na
dianteira do cavado, justamente sobre a área em estudo. Os fortes ventos intensificam a
convecção nas camadas baixas da atmosfera, uma vez que estão associados com divergência,
potencializando o desenvolvimento vertical das nuvens.
Em nível médio (Figura 2B) também nota-se a presença de um cavado e isotermas com
valores relativamente baixos, em torno dos -15C. Este cavado acompanhado do intenso ar frio
no nível de 500 hPa favorece a instabilidade do ar na camada atmosférica, sendo este um dos
principais fatores para ocorrência de eventos extremos. Em 850 hPa e superfície (Figuras C e D,
respectivamente) nota-se um reflexo dos níveis mais altos da atmosfera, áreas de baixa
pressão nos dois níveis.
A) Carta Sinótica de Altitude – 18Z
B) Carta Sinótica de Nível Médio – 18Z
D) Carta Sinótica de 850 hPa – 18Z
D) Carta Sinótica de Superfície – 18Z
Figura 2 – Cartas Sinóticas referentes ao dia/hora do evento
Em superfície foram registrados valores de temperatura máxima elevados, em torno
dos 29C entre o norte e nordeste de RS, como foi o caso de Iraí (30C) e Porto Alegre (28C). O
significativo gradiente vertical de temperatura observado ao longo da coluna atmosférica foi o
principal motivo da forte instabilidade.
De acordo com Silva Dias (2000), grande cisalhamento vertical indica baixa eficiência
de precipitação e tendência a tempestades severas. No caso de tempestades severas com
ocorrência de granizo, outro ingrediente importante é a existência de uma camada de ar seco
em níveis acima de 700 hPa sobreposta a uma camada úmida e quente em níveis baixos.
Através da sondagem atmosférica (Figura 3) do Aeroporto Internacional Salgado Filho, em
Porto Alegre, referente ao horário das 12Z, pode-se observar que as duas condições citadas
acima são obedecidas: uma atmosfera muito úmida até o nível de 711 hPa. Na camada
700/500 hPa observou-se uma região com ar muito seco, tendo em 700 hPa um depressão do
ponto de orvalho (T – Td) de 21C. A análise do perfil vertical do vento mostra, na camada
baixa, um giro anticiclônico do vento, indicando advecção quente. Já na camada média e alta,
o giro passa a ser ciclônico, mostrando advecção fria. Desta maneira, com advecção fria por
cima e quente por baixo, a instabilidade do ar aumenta de forma significativa.
Fawbush e Miller (1953) mostraram que granizo está associado a altura em que a
temperatura de bulbo úmido Tw chega a zero. Ou seja, para a formação de granizo, Tw = 0 C
tem que estar idealmente na altura acima da superfície entre 2000 e 3500 m. Essa condição
também pode ser observada na Figura 3, onde a temperatura do ponto de orvalho (Td),
praticamente equivalente à Tw, alcança o valor de 0C a aproximadamente 3000 m de altura.
Figura 3 – Sondagem atmosférica do Aeroporto Internacional de Porto Alegre das 12Z
Na Figura 4 são apresentados os principais índices de instabilidade, onde pode ser feita
uma análise da instabilidade atmosférica. Segundo Silva Dias (2000), para previsão e
ocorrência de granizo é importante que Totals Totals (TT) seja maior que 50, o Showalter e
Lifted devem ser negativos e SWEAT deve ser maior 270. O índice K não precisa ser muito alto,
pode ser por volta de 24. Como pode-se observar na figura abaixo, todos os valores dos índices
citado por Silva Dias (2000) são atingidos. Uma ampla área com TT acima de 50 cobria todo o
estado do RS (Figura 4A). Os valores de Lifted (Figura4B) oscilaram entre -6 e -4 entre o
norte/nordeste do RS. Os valores de SWEAT eram superiores à 400 e o K tinha valores entre 30
e 35.
A) Total Totals > 50 (vermelho tracejado)
B) Lifted (contínuo)
C) Sweat (sombreado) e K (contínuo)
Figura 4 – Índices de Instabilidade
Diante do exposto acima, conclui-se que a ocorrência deste evento de granizo ocorreu
devido principalmente a presença de um cavado baroclínico, cujo ar frio associado na
troposfera média, contribui para instabilizar o perfil vertical da atmosfera. Assim, os índices de
instabilidade associados a este padrão sinótico atingiram valores extremos típicos de
ocorrência de eventos severos.
Elaborado pelo Meteorologista Carlos Moura
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