conselho federal de medicina Parecer do CFM julga antiéticas imposições para atendimento de pacientes com DMRI Impor o local onde os pacientes devem ser tratados? Impor o médico o local de atendimento? Desviar pacientes de seus médicos para outros médicos que aceitem valores determinados pelas empresas e cooperativas? A resposta é uma só: são práticas antiéticas. Esta é a conclusão do Parecer nº 8 divulgado no final de setembro pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), assinado pelo conselheiro e coordenador da Câmara Técnica de Oftalmologia do CFM, José Fernando Maia Vinagre. Leia a íntegra do Parecer, bem como a avaliação que dele faz Nelson Louzada, integrante da Comissão de Saúde Suplementar do CBO. Parecer nº 8 - Conselho Federal de Medicina Os planos de saúde, cooperativas de trabalho médico e clínicas de referência não poderão impor aos usuários e aos seus médicos assistentes o local onde esses pacientes deverão ser tratados, bem como não poderão enviá-los a outros médicos Da consulta A Cooperativa dos Médicos Retinólogos do Estado de Minas Gerais – Retcoop – e a Associação Zona da Mata de Oftalmologia – AZMO (reclamantes) consultam acerca da correção no comportamento ético de algumas clínicas, cooperativas de trabalho médico e planos de saúde do Estado de Minas Gerais. Referem-se a condutas antiéticas adotadas pelos planos de saúde Bradesdo e Geap, bem como as cooperativas Unimed BH e Unimed Juiz de Fora, em relação ao tratamento ocular quimioterápico com antiangiogênico para tratamento da DMRI na forma exsudativa. Listam condutas e argumentos tais como: Imposição aos usuários portadores da DMRI de que sejam atendidos exclusivamente nas clínicas indicadas, que aceitaram os valores fixados para aplicação do medicamento Lucentis e remuneração de honorários sob a forma de pacote; Exigência de que os médicos assistentes tratem a DMRI de seus pacientes também nas clínicas que aceitaram valores por elas determinados e com remuneração de honorários sob a forma de pacote; Desvio de pacientes para aquelas clínicas e médicos que aceitaram os valores predeterminados para aplicação do medicamento Lucentis; Remuneração do médico assistente sob a forma de pacote e em valores inferiores à tabela da CBHPM; Argumento dos planos de saúde e das cooperativas com relação ao preço pago para tratamento da DMRI e aplicação do medicamento Lucentis está associado ao fato de que o mesmo ode ser comprado com desconto pelos médicos assistentes, diretamente do laboratório Novartis S/A. Assim, os planos de saúde e cooperativas impõem que o preço para o tratamento, incluindo a medicação, deverá ser aquele considerando o valor mínimo do medicamento e desconsiderando que alguns médicos assistentes, cujo poder econômico é inferior, não podem comprar a medicação por um preço mais em conta. Ou seja, os preços de aquisição do medicamento Lucentis têm variação dependente da quantidade de ampolas adquiridas pelo médico A reclamação explicita de que, em Belo Horizonte, a Unimed BH e os planos de saúde Bradesco e Geap vêm desviando pacientes para a Clínica Oculare Centro de Oftalmologia e, em Juiz de Fora, a Unimed Juiz de Fora vem desviando pacientes para o Centro Médico Rio Branco, para a Clínica de Olhos A. G. e para a Clínica de Olhos R. M., que aceitaram o preço imposto para o tratamento da DMRI e aplicação do medicamento Lucentis. José Fernando Maia Vinagre Jornal Oftalmológico Jota Zero | Setembro/Outubro 2014 49 conselho federal de medicina do parecer Em nota de divulgação ampla, em setembro do corrente ano, o laboratório Novartis S/A reviu sua política de preço e passou a disponibilizar o medicamento Lucentis com preço único (segundo a nota, com desconto máximo), independentemente da quantidade adquirida, para os médicos ligados às cooperativas e planos de saúde, superando-se, portanto, parte desta reclamação (item “e”, elencado acima). Pesquisa deste relator identificou, também , a Unimed Juiz de Fora, após ação ajuizada pela Azmo, fez “acordo judicial” com esta reclamante e retirou a imposição de clínicas específicas para o tratamento ocular quimioterápico com antiangiogênico para a DMRI na forma exsudativa (aplicação do medicamento Lucentis), estendido a todos os médicos habilitados e credenciados à referida cooperativa. Esse acordo judicial atende, assim, outra parte desta reclamação referente à solicitação da Azmo. Analisando as reclamações, afirma-se que o usuário de plano de saúde tem o direito de escolha do medico assistente desde que credenciado ao plano ou cooperado. O profissional decide onde o procedimento deve ser realizado, desde que o centro médico ou hospital indicado seja um prestador devidamente credenciado. A imposição, por parte do plano de saúde e da cooperativa, do local onde o usuário deverá ser tratado fere o disposto na resolução CFM 1.642/02, a qual define que as empresas que atuam sob a forma de prestação direta ou intermediação de serviços médicos devem estar registradas nos Conselhos regionais de Medicina de sua respectiva jurisdição, bem como respeitar a autonomia profissional dos médicos efetuando os pagamentos diretamente aos mesmos e sem sujeita-los a quaisquer restrições. O documento diz ainda que (art. 1º, “a”) as empresas de seguro-saúde, de medicina de grupo, cooperativas de trabalho médico, empresas de autogestão ou outras que atuem sob a forma de prestação direta ou intermediação dos serviços médico-hospitalares, devem respeitar a autonomia do médico e do paciente em relação à escolha de métodos diagnósticos e terapêuticos, corretamente indicados. O inciso VIII do Capítulo I do Código de Ética Médica (CEM), ao tratar dos Princípios Fundamentais, diz: VIII – O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho. Exigências que contrariem tais preceitos desrespeitam a autonomia do médico assistente. Os artigos 4º e 5º da Resolução CFM 1.642/02 determinam que as empresas que a descumprirem poderão sofrer sanções cabíveis pelo Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição e ter o fato comunicado ao Serviço de Vigilância Sanitária e à Agência Nacional de Saúde Suplementar, para as providências devidas, podendo implicar em procedimento ético-profissional contra o diretor técnico da empresa. É antiético o desvio de pacientes para outros médicos assistentes e centros de tratamento relacionados com os custos do procedimento, bem como é antiético que o serviço de referência aceite esta prática; É importante frisar que o diretor técnico e o diretor clínico são responsáveis pela prestação de assistência médica nas instituições privadas e por ela respondem, na forma definida pelo artigo 15 da lei 3.399/61 e artigo 1º da Resolução CFM 1.342/91. Os Princípios Fundamentais do CEM preconizam: Capítulo I I – A Medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza. ... IX – A Medicina não pode, em nenhuma circunstância ou forma, ser exercida como comércio. ... XV – O médico será solidário com os movimentos de defesa da dignidade profissional, sema por remuneração digna e justa, seja por condições de trabalho compatíveis com o exercício ético-profissional da Medicina e seu aprimoramento técnico-científico. ... XVII – As relações do médico com os demais profissionais devem basear-se no respeito mútuo, na liberdade e na independência de cada um, buscando sempre o interesse e o bem-estar do paciente. XVIII – O médico terá, para com os colegas, respeito, consideração e solidariedade, sem se eximir de denunciar atos que contrariem os postulados éticos. 50 Jornal Oftalmológico Jota Zero | Setembro/Outubro 2014 Sobre a reclamação relacionada com a conduta de remunerar o médico assistente sob a forma de pacote e em valores abaixo da CBHPM, lembra-se que a resolução CFM 1.673/03 estabelece que a Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos é adotada como padrão mínimo e ético de remuneração dos procedimentos médicos para o Sistema de Saúde Suplementar. Seus artigos 1º e 2º definem que os valores de referência deverão ser exarados pelas entidades médicas nacionais, por intermédio da Comissão Nacional de Honorários Médicos. O artigo 2º da resolução CFM 1.642/02 define que nos contratos de credenciamento ou similares de médicos para prestação de serviços às empresas citadas no artigo 1º deverá ser expressamente estabelecida a forma de reajuste dos honorários médicos. Deduz-se que os honorários médicos deverão ser pagos sem restrição ou retenção de qualquer espécie, desvinculados de taxas, materiais, medicamentos, exames, curativos etc. Conclusão É questionável a conduta médica e procedimento do plano de saúde e da cooperativa de trabalho médico: ao impor a seus usuários o local onde deverão ser tratados, em dissonância àquele indicado por seu médico assistente; ao impor ao médico assistente o local onde deverá tratar seus pacientes em desacordo ao local por ele escolhido; o desvio de pacientes/usuários de seus médicos assistentes para outros médicos assistentes e clínicas que aceitaram valores por elas determinados, assim como é antiético que o serviço médico de referência aceite esta prática. Sobre esta análise em relação aos procedimentos (e condutas) questionados pelas reclamantes em relação aos planos de saúde, cooperativa de trabalho médico e clínicas de referência, conclui-se que são inadequados e deverão ser revisados pelos planos de saúde, cooperativa médica e clínicas que acolhem e tratam pacientes já em tratamento por outros médico; e também deverão ser encaminhadas ao CRM-MG as denúncias específicas em relação à conduta de médicos, clínicas e planos de saúde. José Fernando Maia Vinagre Conselheiro relator conselho fedeeral de medicina Contra os “oftalmo-predadores” e a favor da Medicina Ética M uito apropriado o PARECER CFM nº 8/14, contrário a prática abusiva do referenciamento exclusivo de oftalmo-predadores, que praticam a economia de escala fraudulenta. Consiste em fazer dezenas de aplicações de antiangiogênicos fracionados, ou seja dividem um frasco para 2, 3 ou mais pacientes, em alguns casos diluindo o produto. Alegam que ganham na quantidade (economia de escala) de infiltrações. Na verdade prejudicam os pacientes que recebem quantidades insatisfatórias do medicamento, em alguns casos utilizando Avastin, que no momento encontra-se vetado por determinação governamental. Os pacientes correm o risco de endoftalmites no fracionamento e diluição. Isto sem falar na realização das infiltrações realizadas em lugares inadequados, quando ficou determinado que as mesmas só poderão ser feitas em centros cirúrgicos, com anestesista presente, havendo, inclusive, porte anestésico estipulado para o evento. Como se não bastasse a contravenção cometida, contaminam o nosso já aviltado mercado de trabalho. Ficam os demais oftalmologistas autorizados apenas a fazer a triagem para que os oftalmo-predadores possam usufruir ganhos obscenos. Fazer medicina social, gratuitamente ou por preços módicos, para quem não tem condições financeiras é uma coisa - 3/4 da população brasileira, ou seja, 150 milhões de brasileiros, precisam de ajuda. Vilipendiar o mercado da saúde suplementar, onde 98% dos médicos dependem do 1/4 restante da população (50 milhões), que tem recursos e são assegurados pelas operadoras de planos de saúde, é revoltante. Cumpre ressaltar que a prática de pacotes, congelamento de valores acordados e referenciamentos exclusivos pode levar, inexoravelmente, à eventual prática de crime contra a economia popular, se forem utilizados materiais e medicamentos inadequados, o que certamente trará enorme prejuízo ao paciente. Por seu turno, as seguradoras que estimulam a fraude e a concorrência desleal visando seus lucros são igualmente culpadas. Importante deixar claro que o referido PARECER CFM nº 8/14 é aplicável para todos os casos de referenciamento exclusivo, incluindo cirurgias refrativas, de catarata e congêneres. Nelson Louzada Nova diretoria do CFM C arlos Vital Corrêa Lima, de Pernambuco, é o novo presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), eleito em 01 de outubro. Também foram eleitos o 1º vice-presidente Mauro Luiz de Britto Ribeiro (Mato Grosso do Sul); o 2º vice-presidente Jecé Freitas Brandão (Bahia); o 3º vice-presidente Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti (Alagoas); o secretáriogeral Henrique Batista e Silva (Sergipe); o 1º secretário Hermann Alexandre Vivacqua von Tiesenhausen (Minas Gerais); e o 2º secretário Sidnei Ferreira (Rio de Janeiro). Integram ainda a nova diretoria o tesoureiro José Hiran da Silva Gallo (Rondônia); o 2º tesoureiro Dalvélio de Paiva Madruga (Paraíba); o corregedor José Fernando Maia Vinagre (Mato Grosso) e o vice-corregedor Celso Murad (Espírito Santo). A Comissão de Tomada de Contas do CFM será composta por Cláudio Balduíno Souto Franzen (Rio Grande do Sul), Lúcio Flávio Gonzaga Silva (Ceará) e Donizette Dimer Giamberardino Filho (Paraná). A gestão da nova diretoria do CFM permanece até 2019. Carlos Vital Corrêa Lima Jornal Oftalmológico Jota Zero | Setembro/Outubro 2014 51