24042 Sexta-feira 5 DIÁRIO DO SENADO FEDERAL A questão foi levantada pelos nossos mais eminentes doutrinadores a partir da constatação de que face ao mandamento constitucional, o divórcio pode ser obtido em tempo inferior a dois anos de matrimônio. O exemplo é de fácil compreensão. Uma das hipóteses da dissolução conjugal (art. 2º, da Lei nº 6.515/77) resulta absolutamente incoerente, eis que não há lógica em que para obter a sentença de divórcio a lei determine dois procedimentos diferentes, um para a separação litigiosa e outro para a consensual, esta com exigência de tempo maior que aquela. E, o que é mais incompreensível, que o pedido de separação judicial litigiosa possa ser formulado a qualquer tempo mas que o mesmo pedido, se consensual, necessite do decurso de dois anos de matrimônio! Nesse sentido, por exemplo, a manifestação da Desembargadora Áurea Pimentel Pereira (in Divórcio e Separação Judicial, 6º ed., Editora Renovar, RJ, 1991, p. 24) quando afirma: “Quanto à exigência formulada pelo legislador no art. 4º, da existência de casamento contraído há mais de dois anos, como condição para o rompimento da separação por mútuo consentimento, entendemos que deverá ser revista pelo legislador ordinário, em face das disposições contidas no § 6º do art. 226 da Constituição em vigor, pois não parece justo que para uma simples separação consensual se continue a exigir uma espera de mais de dois anos, quando este prazo já é havido pelo legislador constituinte como suficiente para a própria concessão de divórcio direto.” Também esse o magistério de Paulo Lúcio Nogueira (in Lei do Divórcio Comentada, Saraiva, 1995, 4ª ed., ps. 7/8): “...é de se ver que o art. 4º da Lei do Divórcio estaria derrogado pela Constituição Federal, que permite o divórcio depois de dois anos de comprovada separação de fato, não sendo assim justicicável a exigência de dois anos de casamento para a separação consensual, que poderia então ocorrer também dentro de prazo anterior. Desse modo, um pedido de separação contenciosa, que pode ser feito a qualquer tempo, antes não podia ser convertido em amigável, quando inferior a dois anos o casamento, mas atualmente sim, face do dispositivo constitucional vigente (art. 226, § 6º), pela redução dos prazos.” Outubro de 2001 Fica evidente que o dispositivo da lei ordinária, afora a incoerência no contexto jurídico, aqui apontada, está derrogado ante a força do mandamento inserto no § 6º do art. 226 da Constituição Federal. Assim, o presente projeto de lei objetiva retirar do ordenamento jurídico uma disposição de lei absolutamente inócua e que só se presta a questionamentos desnecessários. Com estas razões, submetemos à apreciação dos ilustres membros do Congresso Nacional a presente proposição que, em última análise, se aprovada, estará possibilitando mais fácil compreensão e aplicação do nosso Direito de Família no tocante à difícil questão da dissolução do matrimônio. Sala das Sessões, 4 de outubro de 2001. – Senador Carlos Bezerra. LEGISLAÇÃO CITADA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL .................................................................................... CAPÍTULO VII Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer