^ Capítulo 7 As Teorias Comportamentais Sobre o Consumidor

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^ Capítulo 7
As Teorias Comportamentais
Sobre o Consumidor
7.1 Os Fundamentos da Teoria de B. R Skinner
Seguindo uma linha positivista, a Psicologia Comportamental colocava como
objeto de estudo apenas os fenómenos observáveis, eliminando emoções, afetos e, evidentemente, qualquer noção de inconsciente.
Utilizando algumas ciências biológicas de apoio, como a Neurologia e a
Fisiologia, os psicólogos comportamentais, ou behavioristas, criaram uma série de
pesquisas em laboratório que muito contribuíram para a compreensão do Ser humano.
Entre os autores mais importantes e muito estudados em marketing encontramos
Frederick B. Skinner, com sua teoria do condicionamento27. Em um de seus primeiros
artigos (Skinner, 1950), o autor questiona o uso de teorias que apresentam conceitos
não-observáveis, como inteligência. Era uma crítica a numerosos modelos em
Psicologia que partem de pontos indefensáveis nos paradigmas das ciências.
Uma confusão muito frequente sobre o uso do conceito de condicionamento está
na diferença entre os estímulos que são apresentados antes da compra e os que são
apresentados após. Os primeiros são estímulos eliciadores do comportamento, isto é,
que pretendem levar a pessoa a comprar (nem que seja uma vez só), enquanto os
segundos são os condicionantes do comportamento, isto é, estímulos que pretendem
que as pessoas continuem a comprar após a primeira vez, ou aumentem sua frequência de compra.
Queremos dizer (e aqui nos apoiamos nos experimentos do próprio Skinner) que
um comportamento poderá ser incrementado (isto é, sua frequência aumentada) se for
r
sucedido por uma recompensa importante para o sujeito. E o caso clássico da mãe
que dá um doce ao filho por ele ter comido todo o prato salgado. O trato feito antes do
almoço (a promessa da mãe) é o estímulo eliciador, que pretende que o comportamento (comer o prato salgado) ocorra. Os estímulos anteriores ao ato de consumo
27
Deixamos de lado os comentários sobre a teoria de Pavlov e seus cães por serem extremamente conhecidos e por não serem importantes para o marketing, bem como outras abordagens da teoria estímuloresposta, como a de Dollard e Miller, por terem estruturas semelhantes à de Skinner.
68 • O Comportamento do Consumidor
podem ser analisados conforme os conceitos sobre percepção (veja capítulo adiante
sobre percepção e seleção de estímulos). Já o doce é o estímulo condicionante (ou
reforçador como também é conhecido) que vem imediatamente após o comportamento, reforçando-o. Dizer que o estímulo é reforçador significa que existe a probabilidade de ocorrer o mesmo comportamento, ou aumentar sua frequência, se for provado
que esse mesmo estímulo estará presente e é importante para a pessoa. Se ela de fato
gosta de doce, então o contrato pode ser renovado, ou mesmo modificado, exigindose cada vez um pouco mais do comportamento (por exemplo, aumentando a quantidade de comida salgada).
Todas as promessas de prémios, presentes, brindes seguem essa mesma estrutura do estímulo eliciador e do reforçador.
7.2 As Relações do Behaviorismo com o Marketing
Toda gama de serviços e brindes pós-venda, que nos últimos anos ganhou notoriedade, pode ser entendida sob a ótica de fornecer "presentes" após a compra, objetivando a repetição da compra, ou a realização de propaganda boca a boca. Os empresários do negócio de eletrodomésticos - linha branca - compreenderam bem esse
aspecto e acompanham o consumidor muitas semanas após sua compra, oferecendo
revisões gratuitas e mandando cartas de congratulações pela aquisição, reforçando o
comportamento.
Temos aqui dois pontos a serem comentados. Em primeiro lugar, entendemos
que as propagandas funcionam como estímulos eliciadores, buscando um lugar na
consciência das pessoas, naquele fluxo constante de estímulos, enquanto os presentes
posteriores (brindes, por exemplo) seriam os verdadeiros responsáveis pelo condicionamento. Eles buscam estabelecer uma ligação com os produtos comprados, passando a fazer parte integrante das expectativas. Em alguns casos excepcionais, como
o ocorrido nas lojas McDonald's, os presentes podem mesmo tornar-se o principal
argumento de compra. Sobre esse exemplo, esperamos que a diretoria do McDonald's
tenha planejado que ocorreria, caso contrário estão num beco sem saída, pois toda uma
geração infantil condicionou-se a ganhar seus presentinhos.
Skinner defendeu que em muitas áreas, como leis do governo, da economia e
da educação, nosso comportamento é condicionado pelos estímulos reforçadores.
Com a repetição do circuito comportamento-presente, criamos hábitos e não pensamos
mais no assunto (Skinner, 1967).
Uma vez estabelecido um hábito, quebrá-lo não é tarefa fácil. Em momentos de
crise e de mudança, como em casamentos, nascimentos, separação, pós-cirurgias, as
pessoas reavaliam seus hábitos e ficam mais propensas a modificá-los. Nesses instantes, o sujeito traz à consciência seus condicionamentos que estavam em segundo
plano.
Segunda Parle - O Leque de Teorias Sobre o Comportamento do Consumidor • 69
Nos negócios, em situações de desabastecimento ou necessidade de mudança de
fornecedor, pode ser mais fácil ao profissional de marketing tentar introduzir um novo
produto, atacando o concorrente que havia criado um hábito no consumidor. O que
importa, seja uma venda a um consumidor final, ou empresa, é fazer com que as pessoas voltem a pensar no processo de consumo.
O segundo ponto que queremos abordar refere-se aos limites do uso do conceito
de condicionamento. Quando Skinner escreveu seu livro Walden II (Skinner, 1978),
acreditava que o uso científico dos estímulos reforçadores poderia criar uma sociedade
mais justa e feliz. Já nas últimas obras, premido pelo relato de experiências, ele admitia que havia algo entre o comportamento e o reforço, que nós, numa licença
metodológica, vamos chamar de "liberdade de escolha".
O que queremos dizer é que as pesquisas têm demonstrado que o estímulo
reforçador muda não só no tempo, como também de categoria e importância. Em última análise, assim que um profissional de marketing descobre um estímulo reforçador,
deve acompanhar e pesquisar a liberdade das pessoas em alterar a importância dada ao
presente. A maioria dos shoppings brasileiros tem utilizado reforçadores na época de
Natal, só que o mesmo reforçador não pode ser utilizado dois anos seguidos. Se num
ano foi um carro, no outro tern de ser um importado, no outro uma Ferrari, no outro
um helicóptero...
7.3 Um Exemplo de Condicionamento Operante
Em seu livro Walden II (1978), Skinner mostra
como as regras da sociedade são, no fundo, um conjunto de estímulos operantes positivos, ou negativos, e que
o Ser humano repete os mesmos comportamentos dos
animais de laboratório. Dê-lhe um presente e ele apresenta um comportamento; dê-lhe um castigo e o comportamento será extinto. É tudo muito simples, mas ao
mesmo tempo complexo, pois os estímulos condicionantes mudam para os seres humanos.
Skinner verificou que todo comportamento tem
uma frequência de repetição que se mantém razoavelmente constante. Por exemplo, ao estudar um alcoólatra, verificou que ele consumia em média quatro copos
de uísque por dia28. Conversando com ele, puderam
obter sua aceitação de um novo tratamento. Essas falas
28
Figura 8
O comportamento pode
ser modelado oferecendo-se
recompensas.
Skinner estimulou uma série de pesquisas para tratamento de doenças psiquiátricas e psicológicas, entre
as quais o alcoolismo. Num artigo intitulado "O Bar de Coral Gables", ele explica como se aplicava a teoria
do condicionamento.
70 * O Comportamento do Consumidor
são os estímulos aliciadores para o comportamento. Pesquisadores construíram uma
máquina que ao se abaixar uma alavanca liberava uma dose de uísque num copo. Por
alguns dias, deixaram que o sujeito bebesse o quanto quisesse, até obter seu consumo
médio. Essa é a chamada linha de base. Obtendo-a inicia-se o tratamento. Na fase de
linha de base o sujeito abaixava a barra e obtinha a dose. Num segundo momento, foilhe dito que a frequência mudaria: ele teria de apertar mais vezes a barra. A quantidade de apertos foi aumentando até que chegou a um ponto em que o sujeito passava
muito mais tempo apertando a barra do que bebendo. Apertar era o comportamento
esperado, o uísque era o presente. O que se esperava era que o presente diminuísse de
importância, quando o esforço para obtê-lo aumentasse demais.
Em seguida, foi-lhe dito que seria adicionado um choque elétrico cada vez que
ele apertasse a barra. Esse era o estímulo operante, nesse caso, um castigo29. Aliado ao
esquema anterior, pretendia-se que o uísque (presente) fosse associado com algo negativo (um castigo) e deixasse de ser um presente desejado e de ser consumido. Algum
tempo depois, o sujeito estava bebendo bem menos que sua média. Introduziu-se então
um estímulo operante positivo, altamente gratifícante para o sujeito (definido por ele
mesmo). Cada vez que ele ficasse um certo tempo sem beber, alguém viria conversar
alguns minutos com ele e o tempo aumentaria gradativãmente. Aqui foi colocado um
presente (falar com pessoas), conforme um comportamento desejado (ficar um tempo
sem beber).
Aos poucos, os estímulos operantes negativos (os castigos) foram sendo retirados, os estímulos eliciadores de abaixar a alavanca foram diminuindo e os positivos
incrementados, até chegar-se a um ponto em que a linha de base do sujeito estava no
nível zero, ou muito próximo disso. A diminuição da linha de base era anotada e o
tratamento encerrado30.
7.4 Vantagens e Limites da Teoria Behaviorista
Todo o consumo, nessa teoria, pode ser explicado como o resultado de estímulos operantes que funcionaram, isto é, uma cadeia de estímulos eliciadores que levam
ao consumo e uma cadeia de estímulos operantes que mantém o comportamento. Os
presentes ou castigos podem estar inseridos nos quatro campos de relacionamento que
já comentamos: com o corpo (por exemplo, a visão de ter emagrecido alguns quilos é
um estímulo operante para continuar a consumir tratamentos dietéticos), as ideias e
Apenas como curiosidade, o fato de pessoas voltarem a beber, terminado o tratamento, é explicado nesse
30
Apesar da força de tradições humanistas, as pesquisas mostram que o castigo é mais eficiente que a recompensa na modelagem dos comportamentos.
29
modelo pelo fato de os estímulos que levaram ao comportamento de beber continuarem presentes na vida
do sujeito, tais como amigos que bebem, voltando a agir assim que ele voltava à sua rotina. Pessoas que
tentam parar de fumar apontam os amigos como culpados por seu retorno ao hábito.
Segunda Parle - O Leque de Teorias Sobre o Comportamento do Consumidor • 71
emoções (por exemplo, o fato de ter coragem de falar o que se pensa pode ser um estímulo para se continuar uma terapia) os objetos (por exemplo, o estímulo de se
preencher uma página de um álbum de figurinhas é suficiente para fazer o consumidor continuar a comprar as restantes) e as pessoas (ganhar elogios do marido pode ser
um estímulo para uma mulher continuar a comprar e cozinhar determinados pratos).
Assim, os psicólogos behavioristas conseguiram reduzir a um modelo simples
os complexos agrupamentos humanos e suas regras e comportamentos.
Apesar de seu caráter reducionista, as teorias comportamentais têm apoio nos
fatos e no embasamento lógico, o que falta às teorias da motivação. Os numerosos
casos de sucesso no condicionamento de pessoas têm um peso importante.
A teoria behaviorista encontrou um campo fértil no marketing. com todos aqueles ramos de negócios que necessitam de uma alta frequência de recompra, como é o
caso de produtos de higiene, limpeza e alimentos. Não é por acaso que numerosas
empresas adotam estratégias de presentes (as chamadas promoções) para tentar atrair
o consumidor e levá-lo a criar um hábito de compra. Os presentes também são extensivos aos vendedores das empresas e mesmo revendedores.
7.5 A Aplicação da Teoria do Condicionamento
na Formação de Hábitos e Fidelidade
Nós, humanos, temos uma consciência dos condicionamentos aos quais estamos
expostos. O que já foi amplamente pesquisado, a ponto de podermos afirmar com
alguma segurança, é que algumas pessoas preferem (novamente escolhem) diminuir
sua consciência de liberdade optando mais por rotinas do que por reflexões e escolhas.
Nesta seção estaremos comentando a inserção da teoria do condicionamento
nas táticas e ações de marketing.
O primeiro comentário é que a teoria, apesar de simples, pode não ser bem compreendida. Quem não entender claramente a diferença entre estímulos eliciadores e
operantes poderá confundir as ações a serem realizadas.
Outra confusão diz respeito ao hábito, que não é, obrigatoriamente, o resultado
de um condicionamento, já que a palavra refere-se a um conjunto maior de comportamentos. O condicionamento pode ser realizado para um comportamento simples,
como apertar uma barra, mas o hábito de compras, por exemplo, inclui um sem-número de comportamentos, como: escolha do dia da semana, modo de locomoção, horário,
local, roteiro dentro do supermercado etc. A cadeia toda acaba formando uma sequência conforme as vontades do sujeito. O que a teoria do'condicionamento pode fazer é
provocar estímulos eliciadores e operantes no roteiro de hábitos das pessoas, objetivando que determinado comportamento (por exemplo, ir sempre ao mesmo local)
incorpore-se ao conjunto de comportamentos do hábito.
72 • O Comportamento do Consumidor
O terceiro ponto a ser comentado refere-se à fidelidade, isto é, à escolha do consumidor em comprar o mesmo produto e marca. Algumas pesquisas parecem demonstrar que o consumidor vem se tomando menos fiel para algumas linhas de produtos,
como higiene e limpeza. Caso a afirmativa seja verdadeira, um dos motivos pode estar
na maior disponibilidade e variedade de produtos.
Vejamos um pouco mais esses pontos.
Observando o comportamento das pessoas nas várias descrições dos campos
científicos, somos levados a refletir que o ser humano pouco tem de aberto, flexível
no seu dia-a-dia. A liberdade por vezes é mais um ideal, uma busca, justamente porque
nosso cotidiano é outro: a rotina que começa no organismo, desde o nascimento e
aparece na escola, no trabalho, nas diversões, nos costumes, nas regras sociais e no
consumo.
Por que criamos rotinas? Qual seria a função dos nossos hábitos e condicionamentos?
Quando conversamos com as pessoas sobre a rotina do seu dia-a-dia, verificamos que o ponto central dos relatos gira ao redor da função de hierarquia dos assuntos. Os que não têm importância para os planos imediatos e conscientes da pessoa, mas
devem ser realizados com alguma frequência (dirigir, banhar-se, vestir-se, alimentarse) são colocados em segundo plano no dia-a-dia. Não se dá mais atenção a eles.
Embora dependam de aprendizagem e é por esse motivo que cada um adquire modos
diferentes nos seus hábitos, eles ficam como que organizados num nível subconsciente. Utilizando uma imagem energética, diríamos que gastamos muito menos energia não pensando em certos detalhes diariamente.
Construímos os comportamentos repetitivos conforme nossa própria experiência (isto é, minhas relações com meu corpo, minhas ideias com os objetos), ou conforme influências do meio ambiente (minhas relações sociais). Neste último caso,
deixamos que a televisão, ou os amigos, não só nos dêem desejos, como também a
forma de satisfazê-los. Na participação em grupo, por exemplo, repetimos o comportamento alheio, ao mesmo tempo em que diminuímos nossa crítica.
O condicionamento tem sido bastante utilizado pelos profissionais de propaganda que acreditam no seu poder. Ao lançar um novo produto, a estratégia de promoção é provocar experimentação e criar o hábito. Estudos anteriores aos lançamentos já
são mais raros, mas deveriam ser realizados, para se conhecer os planos e rotinas das
pessoas. Com esses estudos, seria possível verificar a eficácia dos estímulos que serão
apresentados. Mesmo pessoas com hábitos absolutamente semelhantes podem diferir
quanto ao modo de selecionar estímulos.
Além da descrição de um perfil dos planos e rotinas das pessoas, é importante
detalhar como os consumidores encaram a liberdade e como pretendem alcançá-la na
sua vida. Como dissemos, o condicionamento do comportamento é uma condição de
liberação da consciência, para se ocupar de assuntos (estímulos) considerados mais
importantes.
Segunda Parle - O Leque de Teorias Sobre o Comportamento do Consumidor • 73
7.6 Algumas Sugestões de Táticas e Ações de Marketing
A. Caso um administrador esteja organizando os dados obtidos em entrevistas
com clientes, nesse momento pode iniciar uma análise mais detalhada dos
seus hábitos de consumo. O objetivo consiste em verificar em quais situações o hábito pode ser quebrado, ou reforçado (conforme o objetivo). Seja
qual for o interesse e ramo de negócio desse profissional e o seu objetivo
com o cliente (tornar-se conhecido, construir um condicionamento ou
mante-lo), ele deve levar em consideração que o seu produto/serviço precisa facilitar o leque de escolhas da pessoa. Oferecer um telefone celular na
compra de um carro é um presente? Para quem? Essa ação possibilita algum
condicionamento? Dificilmente. É uma ação promocional isolada que dificilmente exercerá influência dali a dois anos, quando a pessoa for trocar seu
carro. Por outro lado, realizar revisões gratuitas além da garantia e estabelecer um contrato de recompra do automóvel, isso sim pode levar ao condicionamento de recompra da mesma marca.
B. Caso haja interesse em condicionar um comportamento, um profissional
deve, em primeiro lugar, conhecer os estímulos reforçadores (esse é o termo
técnico para os presentes) que têm mais condições de atrair o consumidor.
Quem vai contar quais são os estímulos é o próprio consumidor.
O segundo passo consiste em construir uma linha de base, que nada mais é do
que mensurar a sequência e frequência de compra dos seus consumidores. Essa linha
serve de parâmetro para se determinar a eficácia do condicionamento.
Uma vez definido(s) o(s) estímulo(s) reforçador(es), deve-se planejar e operacionalizar o modo desses presentes serem oferecidos. Se eles vierem muito tempo
depois da compra, por exemplo, não terão efeito. Deve-se ter bem claro em mente a
diferença entre experimentar e repetir. Para condicionar, é necessário repetir e essa frequência também é dada pelo consumidor.
7.7 Comentários Sobre as Máquinas de Condicionamento
No subitem 7.3 desse capítulo vimos uma situação de condicionamento operante. Os livros que ensinam esse condicionamento têm vários exemplos de máquinas
que ajudam as pessoas a se livrar de alguns problemas. Uma delas, que causou muita
polémica na década de 1960, era utilizada para tratamento de alcoólatras. Tinha o
porte de um videogame, com um assento para a pessoa, uma alavanca e um local com
um copo para a saída de líquido. Mecanismos elétricos e mecânicos permitiam seu
funcionamento. Ela foi instalada numa clínica de recuperação.
Sua operação era absolutamente simples. A pessoa puxava a alavanca para
baixo e o resultado era que um pouco de bebida caía no copo. No início, deixava-se a
74 * O Comportamento do Consumidor
pessoa beber quanto quisesse, pois só assim obter-se-ia uma linha de base (a sua média
de consumo). Relembrando o exemplo, queremos ressaltar que o sujeito era completamente instruído sobre o que aconteceria dali para a frente, inclusive sobre as punições que receberia. Esse ponto muito importante por vezes é esquecido pelos críticos,
que colocam a falta de ética do tratamento.
O tratamento dava certo? Sem dúvida. Os efeitos eram permanentes? Em muitos
casos sim, pois havia substituição do hábito por um outro (existem muitas outras combinações que o espaço não permite discutir aqui). Era eticamente incorreto? Não, pois
as pessoas eram voluntárias no tratamento, podendo deixá-lo quando quisessem.
Era uma novidade? Apenas a maquinaria, pois com um pouco de reflexão veremos que estamos cercados de recompensas e punições que modelam o nosso comportamento, embora estejamos livres para aceitá-las ou não. Nos negócios existem empresas
especializadas em planejar e operacionalizar as melhores recompensas para os colaboradores de uma outra empresa. No mundo todo existem milhares de máquinas de jogo,
que ocasionalmente oferecem um presente. A possibilidade do presente ocasional é um
estímulo eliciador suficiente para que dezenas de pessoas fiquem gastando alguns trocados, até que o automatismo da máquina libere outro presente aleatoriamente.
Podemos concluir, para nosso objeto de investigação, que é o comportamento do
consumidor, que não necessitamos da generalização extremada de Skinner (tudo é
condicionamento), mas não podemos esquecer que ele nos alertou para o perigo de
ignorar a força das recompensas, principalmente as sociais e materiais da sociedade
ocidental. Mesmo que um produto não tenha sido projetado para criar certo benefício
(estímulo reforçador, na linguagem behaviorista), ele pode aparecer por circunstâncias
as mais diversas. Em artigo nosso (Giglio, 1998), levantamos a hipótese de que a mulher que compra um imóvel pode acreditar estar ganhando liberdade como presente.
Trabalhos de nossos alunos têm mostrado que uma variedade de aquisições pode ser
seguida de uma crença na obtenção de um presente31.
Bibliografia
GIGLIO, E. "A compra de imóvel na planta por mulheres solteiras e sua relação com a identidade",
Revista da ESPM, vol. 5, n° 4, pp. 16/22, nov./dez.-1998.
SKINNER, B. F. "Are Theories of learning necessary?" In: Psychology Review, pp. 57, 193-216,
1950.
^__
__. Ciência e comportamento humano. Brasília: Universidade de Brasília, 1967.
. Walden II: Uma sociedade do futuro. 2a ed., São Paulo: EPU, 1978.
31
Dois comentários: em primeiro lugar, os presentes não precisam ser físicos, materiais, mais sim sociais
(como receber atenção). Até mesmo a crença de ter recebido um presente (real ou não) pode ter a força
de um estímulo durante algum tempo. Em segundo lugar, os estímulos não são apenas aqueles criados
pelos profissionais, mas também existem como valorizações que as pessoas fazem do que desejam obter
na vida. Os profissionais podem criar estímulos (presentes) ou simplesmente repetir o que a pessoa já sabia
e buscava.
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