Filtração glomerular

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Princípios da função renal
(Eduardo Butturini de Carvalho)
 Introdução à fisiologia renal dos mamíferos
O rim é o principal órgão com a responsabilidade de manter a homeostase. Em média,
25% do débito cardíaco e destinado aos rins, o que pode demonstrar sua importância. Sua
função é de não apenas filtrar o sangue para excreção dos resíduos metabólicos, mas
também recuperar substâncias filtradas necessárias ao organismo (incluindo proteínas de
baixo peso molecular, água e eletrólitos). Além disso, possui a importante função de
identificar e responder ao excesso de água e eletrólitos no organismo.
Diversos mecanismos para regulação da homeostase têm como sede e órgão efetor o
rim. Um desses mecanismos é a regulação ácido-base. Outro importante mecanismo é a
produção e liberação de hormônios para manutenção da pressão sanguínea sistêmica e da
produção de hemácias.
Histologicamente, a composição celular do rim é variada, habilitando o órgão a
responder a uma grande variedade de estímulos diretos e indiretos. Essas células estão
dispostas de forma a criar uma unidade básica funcional, o néfron.
O néfron é composto de um glomérulo (onde o sangue é filtrado), e de vários segmentos
distintos do túbulo renal, onde as substâncias filtradas são reabsorvidas e os componentes
plasmáticos secretados no líquido tubular. No córtex renal, os néfrons se unem ao sistema
de ductos coletores, que atravessam o rim e terminam no ducto coletor medular interno
(onde ocorrem as alterações finais no líquido tubular para formar a urina).
 Filtração glomerular
Pode-se considerar o primeiro passo no processo de formação da urina. O glomérulo é
uma rede de capilares com estrutura destinada a reter dentro do sistema vascular,
componentes celulares e proteínas de alto, e médio, peso molecular enquanto fornece um
líquido tubular. Esse líquido, no início, se assemelha ao plasma (composição basicamente
aquosa). A filtração glomerular é o processo pelo qual se forma o filtrado glomerular, ou
líquido tubular inicial.
O ritmo de filtração glomerular (RFG) é um parâmetro muito utilizado na clínica para
avaliar a função renal dos animais. É expresso em milímetros de filtrado glomerular
formado por minuto por quilogramas de peso corpóreo. Por exemplo: cão da raça Beagle de
10kg de peso, com RFG de 3,7ml/min/kg pode produzir aproximadamente 37ml de filtrado
glomerular por minuto, ou 53,3l de filtrado glomerular por dia, cerca de 18 vezes o seu
volume sanguíneo.
 Estrutura glomerular
O tufo glomerular é uma estrutura composta pela rede de capilares existentes no local.
Ele está envolto por uma camada de células epiteliais chamada Cápsula de Bowmann. É
nessa cápsula que se acumula o filtrado glomerular, conduzido diretamente para o primeiro
segmento do túbulo proximal.
O sangue proveniente da artéria renal, chega à arteríola aferente que se divide em
numerosos capilares glomerulares. Esses capilares por sua vez unem-se para formar a
arteríola eferente, que conduz o sangue para fora do glomérulo. Após esse trajeto, o retorno
para a circulação sistêmica é feito pela veia renal.
A estrutura dos capilares glomerulares influencia na velocidade e na seletividade da
filtração glomerular. A parede é composta de 3 camadas: endotélio capilar, membrana basal
e epitélio visceral.
1- Endotélio capilar - Camada simples de células fenestradas. Essa conformação
fornece uma passagem para a água e componentes não-celulares do sangue, em
direção à membrana basal glomerular.
2- Membrana basal glomerular - Estrutura acelular composta de glicoproteínas,
incluindo colágenos (tipo IV e V), proteoglicanos, laminina, fibronectina e entacina.
Possui 3 camadas: Lâmina rara externa, lâmina densa e lâmina rara interna. Essas 3
lâminas são compostas de uma rede frouxa de fibrilas de glicoproteína.
3- Epitélio visceral - Camada intrincada de podócitos (células diferenciadas).
 Ritmo de filtração glomerular
O RFG é determinado pela pressão efetiva de filtração (Pf), permeabilidade da barreira
de filtração e pela área disponível para filtração. A principal força que favorece à filtração
(ou movimento de água e solutos através da parede capilar do glomérulo) é a pressão
hidrostática do sangue no capilar (Pgc), já que a pressão oncótica do líquido no espaço de
Bowmann (ultrafiltrado), é geralmente desprezível. Em oposição a estas forças temos:
pressão oncótica do plasma dentro do capilar glomerular (Pb) e a pressão hidrostática no
espaço de Bowmann (Pt).
Logo, a pressão efetiva de filtração pode ser dada pela fórmula:
Pf = Pgc – (Pb + Pt)
Conforme o sangue passa pelo capilar glomerular, proteínas vão sendo retidas no
lúmen capilar e o líquido plasmático vai sendo forçado a atravessar a parede capilar. Em
conseqüência, a pressão oncótica plasmática se eleva ao longo do leito capilar, e a perda de
volume plasmático, provoca uma queda na pressão hidrostática no capilar (essa queda é
pequena, pois se cria uma resistência na arteríola eferente). Isso tudo resulta na diminuição
da pressão efetiva de filtração.
O ritmo de filtração glomerular é o produto da pressão efetiva de filtração (Pef) e o
coeficiente de ultrafiltração (Kf). Esse coeficiente é dado pelo produto da permeabilidade
da barreira de filtração pela sua área superficial.
RFG = Pef x Kf
 Permeabilidade seletiva
As características químicas e estruturais da parede capilar glomerular são responsáveis
por determinar essa permeabilidade seletiva da barreira de filtração. Normalmente,
componentes maiores que ou iguais à albumina são retidos, e água e solutos passam
livremente.
Outra característica importante é a carga elétrica da substância. Foi demonstrado que a
forma catiônica de algumas substâncias é mais facilmente filtrada que a forma neutra. E a
forma neutra mais filtrada que a forma aniônica. Exemplo: albumina catiônica é excretada
300 vezes mais rapidamente que a forma aniônica (forma natural). Além disso, a forma e a
capacidade de deformação também determinam se a filtração será mais fácil ou difícil.
 Regulação do ritmo de filtração
O rim é capaz de manter um RFG relativamente constante regulando a pressão
sistêmica e o fluxo sangüíneo renal. Os efeitos do rim sobre a pressão sangüínea e o volume
sangüíneo, são mediados principalmente por fatores humorais. O mais importante é o
sistema renina-angiotensina-aldosterona. Existem ainda outros dois sistemas reguladores
até agora descobertos: reflexo miogênico e retroalimentação tubuloglomerular.
O sistema renina-angiotensina-aldosterona controla o RFG e o fluxo renal sangüíneo.
Hormônios:
1- Renina - produzida por células especializadas da parede da arteríola eferente
(células justaglomerulares especializadas). O estímulo para a sua liberação é
geralmente a hipotensão sistêmica, e a inibição ocorre com a correção da perfusão
renal e com um aumento da Angiotensina II. Esse controle estímulo/inibição
mantém os níveis de perfusão renal e RFG no estado fisiológico. Sua função é
catalisar a transformação do Angiotensinogênio hepático em Angiotensina I, que
por sua vez é convertida em Angiotensina II pela ECA (Enzima Conversora de
Angiotensinogênio). A ECA possui distribuição ampla pelo corpo, mas está
predominantemente localizada no pulmão.
2- Angiotensina II - é um potente vasoconstrictor e age diretamente aumentando a
pressão sangüínea sistêmica e a pressão de perfusão renal. Além disso, estimula a
liberação da Aldosterona, um mineralocorticóide que aumenta a reabsorção de sódio
e água pelo ducto coletor, aumentando o volume intravascular.
O aumento de Angiotensina II também estimula a produção e liberação de Prostaglandinas
renais vasodilatadoras, outros importantes moderadores do sistema. A produção intra-renal
desses vasodilatadores ajuda a contrapor o efeito vasoconstrictor da Angiotensina II, e
ajuda a manter o nível fisiológico da resistência vascular renal. Sem esse efeito, o que
ocorreria seria uma redução drástica na FSR e RFG.
Reflexo miogênico – resposta por parte das arteríolas glomerulares a modificações
na tensão da parede arteriolar. O resultado é a constricção arteriolar imediata após um
aumento na tensão da parede arteriolar. Por outro lado, a redução nessa tensão resulta em
dilatação arteriolar. Essas possíveis modificações servem para regular o RFG e FSR.
Retroalimentação tubuloglomerular – adaptação do aparelho justaglomerular pouco
estudada e esclarecida até o momento, mas que visa, assim como o reflexo miogênico, a
regulação do RFG e FSR.
Outros importantes fatores nessa regulação do RFG são extra-renais. Alguns fatores
sistêmicos como o controle do volume sangüíneo e o tônus vascular são importantes. O
volume sangüíneo é regulado por vários hormônios, além da Aldosterona, podemos citar a
Vasopressina (hormônio antidiurético que promove a reabsorção de água pelo rim). Os
glicocorticóides e a progesterona também aumentam o volume sangüíneo. Além desses
fatores já conhecidos, há um fator recentemente descoberto: o PNA (peptídeo natriurético
atrial) produzido pelo átrio cardíaco. Esse hormônio causa natriurese e diurese (excreção de
sódio e água). Em relação ao tônus vascular, pode-se citar as catecolaminas e a
vasopressina. O estímulo β-adrenérgico pode ativar o sistema Renina-Angiotensina, e o
estímulo α-adrenérgico pode causar vasoconstricção renal. Além de alterar a perfusão renal,
os vasoconstrictores podem afetar o Kf (coeficiente de filtração). Esse coeficiente é
determinado pelo produto da área disponível para filtração, com a permeabilidade
hidráulica. Logo, a contração de algumas células provocadas pelos vasoconstrictores pode
alterar o Kf, alterando o RFG.
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