Relato de Caso

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Relato de Caso
Doença de RosaiDorfman com envolvimento da infraglote
Marcello Deboni1
Soraia Ale Souza2
Thaís Claudio1
Onivaldo Cervantes3
Márcio Abrahão4
RosaiDorfman disease of the subglottis
RESUMO
ABSTRACT
A doença de Rosai-Dorfman (DRD) é uma doença sistêmica de
etiologia incerta. Os autores descrevem um caso de uma mulher de
46 anos com envolvimento infraglótico, necessitando de traqueostomia de urgência. A tomografia computadorizada e a ressonância
magnética detectaram lesões nos seios da face e na laringe. As
lesões das cavidades paranasais e da laringe tiveram o mesmo
diagnóstico de DRD.
Rosai-Dorfman disease (RDD) is a systemic disease and its
etiology is not well understood. We report a case of a 46-year-old
woman diagnosed RDD in the upper airway with stricture of the
subglottic space. Tracheostomy was performed. Computed
tomography and magnetic resonance showed sinuses and
laryngeal lesions. The lesions in the nasal cavity and larynx showed
the same histological findings.
Descritores: Histiocitose Sinus. Constrição Patológica. Excisão
de Linfonodo. Pólipos Nasais. Laringe. Traqueotomia.
Key words: Histiocytosis, Sinus. Constriction, Pathologic. Lymph
Node Excision. Nasal Polyps. Larynx. Tracheotomy.
INTRODUÇÃO
A Doença de Rosai-Dorfman (DRD) foi inicialmente descrita em
1969 pelos autores que deram o nome à doença. Essa doença
é relatada como uma desordem histiocítica proliferativa, não
neoplásica, de etiologia incerta, rara e auto-limitante, geralmente definida por seus achados histológicos. Os achados
incluem histiócitos aumentados com núcleo globoso, nucléolo
distinto, linfofagocitose conhecida por “emperipolesis”, que é
um achado diagnóstico da DRD sempre presente, mas não
patognomônico1. Ocorre com maior frequência na primeira e
segunda décadas de vida, mas qualquer grupo pode ser
acometido, principalmente nas formas extranodais. O comprometimento extranodal em cabeça e pescoço pode envolver o
sistema respiratório, necessitando de excisão da lesão ou
mesmo a realização da traqueostomia2,3. O envolvimento da
laringe associado à obstrução tem sido relatado como uma
complicação incomum4. Relata-se um caso raro de DRD com
envolvimento do trato aéreo superior que necessitou traqueostomia de urgência, devido ao seu envolvimento infraglótico,
pela ocorrência de estenose da via aérea.
RELATO DO CASO
Mulher de 46 anos iniciou com quadro de obstrução nasal,
epistaxe e epífora à direita. Realizou tomografia computadorizada (TC) (Figura 1) e ressonância magnética, sendo diagnosticada como polipose nasal. Foi submetida à turbinectomia e
sinusectomia endoscópica à direita. O diagnóstico anatomopatológico por imunoistoquímica foi compatível com DRD.
Manteve-se assintomática por três anos, quando começou a
apresentar rouquidão e dispnéia progressiva. Realizada TC dos
seios da face e pescoço, observou-se lesão sólida estendendose desde a parede lateral direita do anel traqueal infracricóideo
(Figura 2A, 2B, 2C), obliterando 50% da luz traqueal e conglomerado linfonodal ocupando os níveis IIA, III e IV mais evidentes à esquerda e linfonodos aumentados em número nos níveis
IB, VA e V B. Os seios maxilares estavam livres. Após avaliação
médica, a mesma foi submetida à traqueostomia de urgência
por insuficiência ventilatória. No mesmo tempo cirúrgico, uma
laringo-suspensão diagnóstica foi realizada, que evidenciou
uma lesão verrucosa, vegetante, em laringe infraglótica (à
direita), que obstruía aproximadamente 70% da luz. Foi
realizada biópsia da lesão. O resultado do anatomopatológico
evidenciou processo proliferativo constituído essencialmente
de histiócitos xantomizados em meio a folículos linfóides e
infiltrado inflamatório linfomonoplasmocitário. A imunoistoquímica apresentou positividade para CD68 (+) e proteína S100
(+), compatível com Doença de Rosai-Dorfman (Figura 3).
Concluído o diagnóstico de DRD laríngea, a paciente foi
encaminhada para radioterapia (RT) e submetida a uma dose
de 20Gy em região cérvico-facial. Após 60 dias da RT, apresentava condições de retirada da cânula de traqueostomia, embora
ainda apresentasse lesão laríngea residual (Figura 2D, 2E, 2F).
Manteve-se em acompanhamento, apresentando-se assintomática, quando oito meses após a RT, compareceu ao atendi-
1) Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, São Paulo/SP, Brasil.
2) Médica Radiologista da Universidade Federal de São Paulo – – Escola Paulista de Medicina. Aluna do programa de Doutorado do DDI da UNIFESP/EPM, São Paulo/SP, Brasil.
3) Professor Livre Docente da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. Chefe da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Departamento de Otorrinolaringologia da
UNIFESP/EPM, São Paulo/SP, Brasil.
4) Professor Livre Docente da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, São Paulo/SP, Brasil.
Instituição: Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina – UNIFESP/EPM, São Paulo/SP, Brasil.
Recebido em: 08/10/2008; aceito para publicação em: 11/04/2009; publicado online em: 15/11/2009.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
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Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 38, nº 4, p. 270 - 271, outubro/ novembro / dezembro 2009
mento relatando quadro de dispnéia leve (principalmente aos
médios e grandes esforços) (Figura 2G, 2H, 2I). Após nasofibrolaringoscopia (NFL), observou-se discreto aumento da
lesão residual infraglótica à direita (Figura 2J, 2K, 2L). Nova
biópsia foi realizada, confirmando histologicamente o resultado
apresentado anteriormente. A paciente foi encaminhada ao
serviço de Hematologia dando início à quimioterapia (QT).
Atualmente, encontra-se sem sintomas (ausência de traqueostomia) e em acompanhamento junto ao serviço de Cirurgia de
Cabeça e Pescoço.
Figura 3 – Biópsia de lesão infraglótica; imunoistoquímica – proteína
CD 68 (+).
Figura 1 – TC inicial de seios da face.
Discussão
A presença de linfonodomegalia é um achado muito frequente,
mas em 30-43% há envolvimento extranodal, sendo este
frequentemente encontrado em cabeça e pescoço, podendo
também acometer outros órgãos como rins, sistema nervoso
central, ossos e pele2,3.
O diagnóstico inicial pode também ser difícil, pois o quadro
clínico é semelhante ao encontrado em muitas outras doenças2.
Os sintomas variam na severidade de acordo com o sítio
envolvido. O comprometimento do trato respiratório pode ser
causa de emergência respiratória, como o que ocorreu nesse
relato de caso, necessitando de traqueostomia. Na maioria dos
casos, a doença é auto-limitada, não necessitando de tratamento, porém, em alguns casos pode ser necessária intervenção cirúrgica, quimioterapia ou radioterapia5. A RT é, na maioria
das vezes, justificada pela recorrência da doença em laringe ou
órbita4.
A DRD deve ser lembrada no diagnóstico quando na presença
de lesão cervical, com ou sem envolvimento linfonodal e o
tratamento deverá ser planejado de acordo com o sítio envolvido e com a severidade dos sintomas2.
REFERÊNCIAS
1. Rosai J, Dorfman RF. Sinus histiocytosis with massive lymphadenopathy. A newly recognized benign clinicopathological entity. Arch Pathol.
1969;87(1):6370. 2. Unal OF, Kocan EG, Sungur A, Kaya S. RosaiDorfman disease with multiorgan involvement in head and neck region.
Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2004;68(5):581-4.
3. Aluffi P, Prestinari A, Ramponi A, Castri M, Pia F. RosaiDorfman
disease of the larynx. J Laryngol Otol. 2000;114(7):565-7.
4. Cossor F, Al-Khater AM, Doll DC. Laryngeal obstruction and
hoarseness associated with Rosai-Dorfman Disease. J Clin Oncol.y
2006;1953-55. Disponível por: jco.ascopubs.org. Captura em:
10/02/09.
5. Maeda Y, Ichimura K. RosaiDorfman disease revealed in the upper
airway: a case report and review of the literature. Auris Nasus Larynx.
2004;31(3):27982.
Figura 2 – Exames de admissão e seguimento.
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