1 Grupo 5 A Nova Medicina na Ciência, na Prática e na Ética Alexandra Mesquita (59166), Ana Maria Pereira (59255), Ana Sofia Sousa (59253), André Miranda (59274), Bela Machado (59246), Dinis Oliveira (56201), Fani Veiga (54465), Diogo Teles (59201), Luís Gonçalves (63614), Manuel Louro (59758) e Marta Costa (59267). A prática da medicina, tal como todas as profissões, tem sido obrigado a se alterar por pressão das circunstâncias, contudo, as especificidades de ser médico tornam necessário o recurso a olhar diferenciado. Apesar desta “nova medicina” conservar como objetivo principal o prevenir, tratar e curar a doença, ela engloba novos propósitos. Nos quais se inclui uma crescente preocupação com a funcionalidade, tanto na sua promoção como a sua preservação com a qualidade de vida; as apostas na prevenção e a particular atenção reservada à saúde infantil conduziram a medicina a uma atualização da perspetiva sobre a saúde, tornando-a mais completa e abrangente. E, como tal, mais complexa e talvez mesmo insustentável economicamente. Os avanços tecnológicos e científicos com que nos deparamos no nosso quotidiano vieram revolucionar a prática desta arte que é a medicina. A nova medicina depara-se com novos meios auxiliares de diagnóstico, novos tratamentos, que nas últimas décadas seriam inimagináveis mas que atualmente enriquecem o exercício desta profissão, aumentam a precisão do médico e aproximam a cura do doente. O novo médico tem a sua cargo novos desafios, segundo o professor Lobo Antunes “Na nossa educação, de médicos, o que importa é descobrir o que está escondido, afinal, dentro de nós próprios”, pois ele acreditava que apenas quem se conhece estará disposto a conhecer o outro, e assim ajudá-lo na sua plenitude. A insustentabilidade é uma da muitas ameaças que o médico do futuro próximo tem à espreita, algumas claramente identificadas apesar de, muitas vezes, não muitas claras. Como a convivência com exames complementares de diagnóstico inovadores mas desprovidos de contato humano, até o facto, quase paradoxal, da prática médica ser remunerada e cada vez mais mercantilizada. Existe, de forma gradual, embora de todo tal seja uma novidade do mundo contemporâneo, uma pressão do capital e dos grandes grupos económicos para tornar o ato médico algo meramente uma troca comercial. Isto leva, por exemplo, à transformação da medicina num serviço que tem uma crescente preocupação com a estética, algo tradicionalmente fora do âmbito clínico. Embora, para alguns esteja claro que o ato médico não é um gesto de solidariedade, existe uma dimensão associada que se 2 Grupo 5 transcende para além do puramente monetário. Convém perceber, e mesmo interiorizar, a responsabilidade que tal acarreta ao profissionalismo de um profissional de saúde. Como muito bem escreveu professor Lobo Antunes: “não sei o que nos espera mas sei o que me preocupa: é que a medicina, empolgada pela ciência, seduzida pela tecnologia e atordoada pela burocracia, apague a sua face humana e ignore a individualidade única de cada pessoa que sofre. Não se descobriu ainda a forma de aliviar o sofrimento sem empatia ou compaixão”. As preocupações do autor estão longe de ser infundadas… Uma temática intemporal e que se arrasta pela nova medicina é a prática da eutanásia. Por mais décadas que passem será sempre um assunto sensível, controverso e a obtenção de um consenso poderá estar longínquo. A palavra eutanásia (eu+thanatos) significa boa morte ou morte sem dor. Com a aproximação da morte, há uma crescente vulnerabilidade e fraqueza, medo e angústia por parte do próprio doente que por vezes são subestimados pelo médico. É dever do profissional de saúde criar todas as condições necessárias para que o doente morra com dignidade e respeitar todas as suas decisões. O direito fundamental à vida, patente no artigo 2º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, deverá ser uma constante na fase terminal de uma vida. A Europa apresenta-se relutante à prática da eutanásia. À data, os países Baixos, são os únicos a apresentar uma lei de despenalização dos atos de eutanásia voluntária ativa e de suicídio com ajuda médica, afirmando que a morte de uma pessoa doente, pelo próprio médico, a pedido da mesma, constitui uma boa prática clínica e por isso, uma prática não reprovável. Em Portugal, o Comité de Bioética afirma que o direito à vida, não pode ser anulado pela vontade do doente, seja ela actual ou até mesmo expressa no passado sob a forma escrita, aquilo a que chamamos testamento vital. Ou seja, em Portugal a morte não poderá ser infligida a ninguém intencionalmente, pelo que a eutanásia e outras formas de suicídio assistido continuam a constituir crime no nosso país. Segundo o Professor Daniel Serrão, “Morrer é o mais rigorosamente íntimo e pessoal de todos os acontecimentos humanos”, pelo que uma lei não deverá regular a morte com a mesma indiferença emocional com que regula a vida, pelo que não deverá haver lei que despenalize ou descriminalize a morte intencional de um doente terminal pelo médico. 3 Grupo 5 Domínios Verticais V Ética e a Medicina do Futuro 1. Onde fica a ética no confronto entre a escassez de recursos (financeiros) e ‘o melhor para o doente’? Os avanços tecnológicos e científicos com que nos deparamos no nosso quotidiano vieram revolucionar a prática da medicina. Hoje em dia, a medicina depara-se com novos meios auxiliares de diagnóstico, assim como novos tratamentos farmacológicos e intervenções cirúrgicas que, no seu conjunto, aumentam a precisão dos diagnósticos e aumentam as possibilidades de cura para o doente. Contudo, esta “cavalgada tecnológica” que caracteriza o tempos correntes, além de levantar questões morais/éticas quando analisadas quais as suas verdadeiras motivações (serão elas em prol da saúde ou do lucro?), apresentam custos muito onerosos quer para o doente quer para a gestão dos hospitais e dos serviços de cuidados de saúde primários. De acordo com o Artigo 2.º, “Primado do ser humano” da Convenção Europeia dos Direitos Humanos e da Biomedicina, “O interesse e o bem-estar do ser humano devem prevalecer sobre o interesse único da sociedade ou da ciência”, ou seja, o médico, bem como todos os profissionais de saúde, devem zelar primeiro pelo bem-estar e pela saúde do doente antes de pensar nas políticas, nas medidas e na gestão de recursos hospitalares. Sendo os recursos financeiros cada vez mais limitados na área da saúde, o médico e o doente devem encontrar um equilíbrio entre a beneficência para o paciente e uma gestão recursos adequada, de forma a garantir um acesso equitativo aos cuidados de saúde de qualidade apropriada para todos os utentes. A outra vertente desta questão, a invenção e investigação tecnológica, levanta algumas questões éticas em relação às suas reais motivações. Certamente alguns cientistas da área de investigação médica são movidos por interesses económicos e apoiados por grandes empresas farmacêuticas, que apoiam estas investigações com financiamento e até publicidade. De salientar que esta premissa não é extensível a toda a classe profissional, enquadrando-se nela apenas uma minoria dos cientista. A principal objetivo dos investigadores é, e deve ser sempre, a melhoria dos cuidados de saúde, quer através de novos métodos de diagnóstico ou novo tratamento. Com efeito, a reflexão ética sobre esta matéria deverá ser cunhada com o pragmatismo que lhe é devida. Sendo de reconhecimento universal que a saúde é um bem inestimável e de que farão parte dos desígnios do sistema nacional de saúde zelar pela preservação da saúde e salvaguarda da vida dos seus doentes, é também certo que que a plena aplicação destes princípios seria apenas aplicável num contexto de ilimitados recursos. Esta matéria configura, assim um complexo dilema de reflexão ética e assistencial, nas quais as duas realidades colidem na sua essência, e onde a beneficência para a população emergirá de um rigoroso balanço entre o respeito pelas premissas éticas que sustentam a prática médica, a fundamentação técnica e, inevitavelmente, a disponibilidade de recursos. Mas importa aqui levantar uma questão: apesar de a motivação de alguns cientistas não ser beneficência dos doentes, se o resultado da mesma é a descoberta de novas invenções biomédicotecnológicas, não será atingida a finalidade da investigação médica? 4 Grupo 5 2. Que novos desafios éticos anteveem com a emergente predeterminação genética, fatores de risco e a antecipação do historial clínico do indivíduo? Os avanços na Medicina e mais propriamente na genética médica têm permitido conhecer o nosso genoma e, assim, realizar um aconselhamento genético. Este permite informar as pessoas sobre os riscos e as probabilidades de desenvolver uma doença. A genética tem sido fundamental no apoio a famílias com doenças genéticas, permitindo planear a reprodução, ou realizar o diagnóstico de doenças após o nascimento de um filho, após a constatação de alterações corporais e/ou cognitivas. No entanto, a ansiedade gerada pelo conhecimento do surgimento iminente de uma patologia, potencialmente limitante ou letal, pode condicionar uma alteração na tomada de decisões futuras e na qualidade de vida da pessoa. Um diagnóstico genético pode levar a um sofrimento e a uma antecipação da doença física, podendo gerar repercussões psíquicas e sociais à vida das pessoas, tais como depressão, tentativas de suicídio, dilemas ligados às decisões reprodutivas, dificuldades nos relacionamentos afetivos, bem como discriminação no mercado de trabalho e nas empresas responsáveis pelo fornecimento de planos de saúde ou seguros de vida. Desta forma, torna-se fulcral conhecer a vontade da pessoa de querer ter conhecimento do seu condicionamento genético. Para além disso, a confidencialidade de um resultado genético é essencial para que se mantenha a privacidade, com o objetivo máximo de evitar a discriminação com base no material genético do ser humano. 3. Toda a verdade, o consentimento informado, e a literacia do paciente: Aonde estamos e para onde vamos? A exposição e divulgação pública da doença e sofrimento na comunicação social, internet e redes sociais. Quais os aspetos positivos e negativos desta realidade? A relação entre literacia e saúde é complexa. A literacia tem a ver com conhecimento em saúde, estado de saúde e acesso a serviços de saúde. O respeito pela autonomia constitui um princípio basilar na relação do profissional de saúde com o paciente. Qualquer intervenção no domínio da saúde só́ pode ser efetuada após ter sido prestado pela pessoa em causa o seu consentimento livre e informado. Esta pessoa deve receber previamente a informação adequada quanto ao objetivo e à natureza da intervenção, bem como às suas consequências e riscos. No entanto, atualmente os modos de configuração da autonomia são objeto de debate na comunidade científica e na reflexão da bioética, estando em causa tanto a existência de diversos tipos de limite à autonomia, como a possibilidade e a pertinência da articulação da capacidade de decisão por parte do doente com a autonomia do próprio clínico. 5 Grupo 5 Estará,́ então, o consentimento informado posto em questão? É necessária uma educação para a cidadania que promova uma atitude mais ativa por parte dos doentes no exercício dos seus direitos. O fácil acesso aos meios de comunicação social, internet e redes sociais predispõe à divulgação de casos de sucesso (cura de doenças graves), bem como de eventuais erros clínico. A comunicação social poderá ser utilizada como meio de promoção da saúde através de programas / iniciativas que permitam o acesso a informação médica credível numa linguagem acessível e clara. Permitindo desta forma, aumentar a literacia do doente na saúde. Contudo, esta fácil divulgação de informação sobre saúde permite perpetuar casos / situações de eventuais erros médicos que poderão pôr em causa a confiança dos doentes nos profissionais de saúde. 4. O papel da regulação e escrutínio da atividade médica: Qual a fronteira entre o benefício e o pernicioso? Devido à responsabilidade descomunal que se encontra nas mãos da atividade médica – vidas humanas – e a sua complexidade, o escrutínio e a regulação da mesma acaba por assumir um papel importante, sem desprezar a fronteira entre o benefício e o pernicioso para o doente (fronteira essa que é subjetiva, variável e, por vezes, muito ténue). Os responsáveis pela regulação da atividade médica acabam por ser os próprios médicos (auto-regulação). Esta questão acumula o maior escrutínio e cepticismo, uma vez que, enumeras vezes, os médicos mostram-se relutantes em retificar profissionais que violam as normas. A fronteira entre o benefício e o pernicioso para o doente varia muito de caso para caso, estando dependente de diversos fatores como, por exemplo: as crenças do doente, os seus desejos, os seus valores e o seu estado de espírito, não esquecendo que determinado procedimento médico tem consequências/efeitos diferentes em doentes diferentes e que cada doente valoriza essas mesmas consequências/efeitos de maneira diferente. Tudo isto obriga o médico a estar atento para decifrar esta misteriosa fronteira, de modo a conseguir proporcionar ao utente a melhor resolução possível para o seu problema, procurando sempre provocar o menor malefício possível. O profissional de saúde também não se deve descorar da sua obrigação de analisar o trabalho dos seus colegas de profissão, de forma a evitar a ocorrência de erros e a denunciá-los, caso estes aconteçam. A atividade médica encarrega-se de preservar vidas humanas, que se forem perdidas, não podem ser restauradas. Tem como missão evitar o sofrimento, que condiciona de diversas formas o quotidiano das pessoas. Por isso, é de extrema importância, formar adequadamente os indivíduos que a irão exercer no futuro de modo a que esta profissão seja exercida da melhor forma possível. Devem ser não só ensinados a executar as tarefas, como também a analisá-las e a regulá-las, com o objetivo de as melhorar (conforme o avanço da ciência e das exigências da sociedade) e de evitar ao máximo erros que, muitas vezes, são 6 Grupo 5 irreversíveis. Tudo para assegurar um direito fundamental de toda a população: o direito à saúde. 5. A distinção entre dor e sofrimento e a valoração deste pelo pessoal de saúde. No significado mais estrito falamos da “dor para os efeitos sentidos como localizados nos órgãos particulares do corpo ou no corpo inteiro”, ao passo que nos reportamos ao sofrimento quanto aos “efeitos suscitados sobre a reflexividade, a linguagem, a relação a si, a relação ao outro, a relação ao sentido, ao questionamento”. Drummond resume de forma acutilante esta relação, na medida em que “O sofrimento não e a dor, mas pode ser evocado ou enfatizado pela mesma”. Nesta relação dual, o que é mais valorado pela comunidade médica é, de facto, o controlo da dor, na medida em que tomam esta como algo mais mensurável e, portanto, passível de instituição de tratamento recomendados. No entanto, esta forma de ver a dor tende a esquecer que a mesma é, de facto, muito influenciável pelo bem-estar psíquico do paciente, na medida em que ele tenderá a veicular outros problemas de índole pessoal nesta dor, num fenómeno de somatização. DOMÍNIOS VERTICAIS V |GRUPO 8| Ética e a Medicina do Futuro 22 de Abril de 2016 1. Onde fica a ética no confronto entre a escassez de recursos (financeiros) e ‘o melhor para o doente’? Segundo a teoria Kantiana, uma acção “ética” é-o apenas quando levada a cabo com o único propósito de realizar o bem e o dever moral por si só, sendo a única finalidade a intenção primária dessa acção, sem propósitos paralelos ou calculismos. É com esta visão que muitos estudantes se dirigem às escolas de medicina, querendo aprender a fazer o melhor pelos que necessitam, o bem pelo bem do outro. No entanto, mais e mais, agora como estudantes de medicina em anos clínicos, os nossos ensinamentos teóricos e tão precisos são confundidos e questionados com o surgimento de termos como “custo-benefício”, “rentabilidade”, “despesas” e os tão temidos “cortes”. Apesar de considerar que a ética médica deve ser a pedra basilar de todo o conhecimento a actuação como profissional de saúde, estes termos supracitados são inquestionavelmente uma realidade cada vez mais presente, com a qual devemos aprender a lidar da melhor forma e à qual nos devemos saber adaptar, no entanto, sem nunca abdicar de princípios fundamentais como a beneficiência e não maleficiência, fazendo sempre “o melhor para o doente” que temos à nossa frente e, essencialmente sabendo reconhecer as nossas limitações. Devemos reconhecer que uma boa gestão dos recursos em saúde a par de um domínio sustentável da economia são peças fulcrais para se alcançar os objectivos a que nos propomos 7 Grupo 5 no exercício da medicina. No entanto, e quando todo o conhecimento e experiência do médico são arrasados e deitados a perder por entraves económicos, é seu dever não baixar os braços. O doente que temos em frente não deixa de merecer toda a nossa vontade e esforço ético na busca do melhor possível. O doente não pode ser abandonado ou vítima de desistência por parte do médico ou por parte do sistema. 2. Que novos desafios éticos anteveem com a emergente predeterminação genética, fatores de risco e a antecipação do historial clínico do indivíduo? A Medicina, tem enfrentado nas últimas décadas, um período de evolução e mudança, não só nos meios de abordagem dos doentes, mas também na forma como abordamos os mesmos. O aumento do conhecimento no domínio da genética e a sua utilização na prática clínica diária, assim como a introdução de plataformas informáticas no registo clínico do doente, são bons exemplos de “novidades” da prática de Medicina do séc XXI, que têm trazido, para além dos seus benefícios, alguns desafios éticos relevantes. Por exemplo, no que toca à Genética Médica, esta não só envolve o diagnósico preditivo, mas também temas como o diagnóstico pré-natal, intervenções terapêuticas e ainda a clonagem. Atualmente as novas tecnologias reprodutivas, as questões referentes ao aborto e principalmente os avanços no campo da genética tem introduzido o aspecto intergeneracional na discussão ética, uma vez as decisões afetam não apenas as pessoas presentes e capazes de se manifestar com relação a elas mas também as gerações futuras. A inclusão dos novos sujeitos, muitas vezes indivíduos que ainda não existem e que não se sabe se existirão. Outro aspecto ético importante do diagnóstico preditivo são as questões relativas a confidencialidade e privacidade. Os resultados para um único indivíduo tem repercussão imediata para seus familiares. A maioria dos autores sugere que deva haver consentimento do paciente para revelação da informação para os familiares. Muitas vezes o médico confronta é o dilema entre o seu dever de informar para prevenir um dano e o direito do indivíduo de não querer saber. Para além que devemos atuar de formar a preservar a autonomia do doente. O respeito à autonomia deve ser extendido sempre que os doente apresentem condições de compreender todos os aspectos dos testes e tenham capacidade de manifestar sua opinião com relação a sua realização. O segundo aspecto que quero focar antes de terminar diz respeito à nova ética associada a uma prática clínica hospitalar essencialmente baseada no tratamento informático da informação, na chamada e-medicina, e nas decisões médicas apoiadas em provas ou confirmações disponibilizadas em programas informáticos. Se por um lado facilita o acesso a informação relevante do doente, que o doente não consegue explorar tão bem na anamnese, por outro lado também já observamos o doente com o viés de uma observação prévia, que não foi realizada por nós, estabelecendo a ideia errada que já conhecemos o doente, aumentado a tendência de subvalorizar as queixas dos mesmos, como acontece, por exemplo, com os antecedentes psiquiátricos. A informatização da Medicina, a disponibilidade de informação “online” permitem também que quando o doente chegue ao Hospital, sabe tudo da sua doença, do tratamento e prognóstico. Mas muita desta informação é falsa ou tendenciosa, muitas vezes associada a publicidade directa de medicamentos. O desafio da medicina electrónica dirigido aos médicos obriga a um apoio cada vez mais 8 Grupo 5 qualificado das Comissões de Ética Hospitalares. A Comissão de Ética Hospitalar que tem de acompanhar as inovações atuais, ao se encontrar mais ativa e próxima do doente e dos profissionais, pela utilização de recursos como o email e Internet. 3. Toda a verdade, o consentimento informado, e a literacia do paciente: Aonde estamos e para onde vamos? A exposição e divulgação pública da doença e sofrimento na comunicação social, internet e redes sociais. Quais os aspetos positivos e negativos desta realidade? Na minha opinião a verdade do que acontece no coração da atividade médica, normalmente longe dos olhos dos doentes, continua a ser muito pouco assumida e divulgada pelos responsáveis. Não sei se por medo das consequências a nível judicial ou da carreira ou se por receio que o doente e os familiares não entendam. E o mesmo acontece com o Consentimento Informado que, apesar de ser obrigatório a sua assinatura para a maioria dos procedimentos, são poucos os casos em que o seu uso faz jus ao nome. De informado tem pouco. E, novamente, não sei se por falta de tempo de consulta ou se por receio que o doente não tenha capacidade para perceber o procedimento e os seus riscos e benefícios. De facto, apesar do claro aumento da escolaridade da população atual, escolaridade e literacia não são sinónimos e os níveis de literacia em saúde continuam muito longe do desejado. No entanto, o valor da liberdade e do consequente princípio da autonomia são essenciais para a prática da ética. Por muito difícil que seja, é imperativo lutar contra o rumo que a prática médica tem vindo a tomar. A pressão sobre a eficiência exercida pelas autoridades que gerem os sistemas de saúde tem resultado cada vez mais num consentimento informado assinado à pressa, sem qualquer informação, só para satisfazer um imperativo legal, e num doente que nem sabe o que se passa com a sua própria saúde. Por muito inconveniente que a pressão dos media seja, a exposição pública de casos reais “obriga” as autoridades a investigar as verdades, impedindo que fiquem escondidas no segredo dos deuses. Claro que nem tudo são rosas. A comunicação social é um negócio e, como tal, além de informar as pessoas, um dos objetivos é ter lucro. As notícias dependem do que as pessoas procuram e, portanto, tudo o que suscita interesse geral é levado ao exagero. E já é mais que sabida a capacidade de influência dos media, principalmente porque, e mais uma vez, a literacia da população não é a ideal. Uma capacidade crítica e a construção de opiniões próprias são imprescindíveis para uma boa transmissão de informação. Assim, seria essencial capacitar as pessoas de forma a reduzir os riscos do importante serviço público realizado pela comunicação social. 4. O papel da regulação e escrutínio da atividade médica: Qual a fronteira entre o benefício e o pernicioso? A prática médica deve ser pautada por princípios éticos, dos quais fazem parte a autonomia, justiça, não maleficiência e beneficiência. Estes quatro princípios, não possuem um caráter absoluto, não tendo 9 Grupo 5 prioridade uns sobre os outros, servindo sim, como orientações para a tomada de decisões frente a problemas éticos. São deveres “prima facie”, ou seja, obrigações que devem ser cumpridas, a não ser que entrem em conflito com algo igual ou ainda mais forte. Muitas vezes, é difícil para o médico perceber, até que ponto a execução de determinado procedimento será legítimo quando comparado com o risco que provocará ao paciente. O médico depara-se, então, no seu exercício diário, com uma dicotomia, a maleficiência e a beneficiência. Beneficência requer atitudes positivas, ou seja, é necessário que o profissional actue para beneficiar seu paciente. Obriga o profissional de saúde a ir além da Não Maleficência (não causar danos intencionalmente) e exige que ele contribua para o bem-estar dos pacientes (saúde física, emocional e mental). A tomada de decisão, deve minimizar os riscos e maximizar os benefícios do tratamento/ procedimento a efectuar. Não Maleficiência, é definida como não causar dano, tem importância pois, o risco de provocar danos é indissociável de um procedimento que está à partida adequado. Trata-se de um dever profissional, que, se não cumprido, coloca o profissional de saúde numa situação de má-prática ou prática negligente da medicina. Logo maleficiência trata-se precisamente do oposto. Existe então, na prática médica uma fronteira muito ténue entre uma actuação para benefício do paciente e as consequências da mesma. Claro está que, todas as decisões são condicionadas pelo escrutínio a que a própria actividade está sujeita. Em suma, é necessária uma reflexão e balanço cuidadoso para que a tomada de decisões nesta profissão seja a mais acertada possível. 5. A distinção entre dor e sofrimento e a valoração deste pelo pessoal de saúde Embora sejam definições distintas, a fronteira entre dor e sofrimento é ténue para a grande maioria das pessoas, até porque muitas vezes se sobrepõem. Por um lado, o termo dor deve ser reservado aos efeitos sentidos como localizados nos órgãos particulares do corpo ou no corpo inteiro. Por outro, o termo sofrimento, mais complexo e abrangente, relaciona-se com os efeitos suscitados sobre a relação a si, a relação ao outro e a relação ao sentido (inclui as dimensões psíquicas, socais e espirituais do ser humano). No entanto, raramente se encontram no seu estado “puro”, sendo que são dependentes um do outro. Por exemplo, um sofrimento importante para a pessoa raramente deixa de ser acompanhado por um grau de somatização. Esta sobreposição explica as hesitações da linguagem comum: fala-se de dor por ocasião da perda de alguém, mas diz-se que se sofre de um mal de dentes. No contexto dos cuidados de saúde, fala-se muito de dor e muito pouco de sofrimento, isto porque é muito mais fácil atuar na primeira do que na segunda. Devia ser obrigação dos profissionais atenuar ao máximo a dor, com a ajuda de fármacos e 10 Grupo 5 técnicas, mas sem nunca esquecer ou desvalorizar o possível sofrimento que o doente esteja a sentir.