A REALIDADE DAS MULHERES: VIOLÊNCIA Carina Simone Crosara de Oliveira1 Thais Aguiane Veiga Jianelo2 Raça, Etnia, Gênero e Sexualidades INTRODUÇÃO Este trabalho aborda a temática violência contra mulher, pois esta consiste em um dos principais indicadores da violência de gênero, pois a independência da mulher ocorre de diferentes modos dentro da sociedade, pelo fato que a construção de gênero depende da cultura, etnia, cor e classe social. A violência contra mulher pode assumir diversas formas que não uma agressão sociopática de natureza sexual e perversa no sentido psicanalítico do termo, até formas mais sutis como assédio sexual, discriminação, desvalorização do trabalho doméstico de cuidados com a prole e maternidade. Em relação a esses acontecimentos, trazemos por meio deste trabalho alguns dados sobre as violências sofridas pelas mulheres, dados sobre o tipo de violência sofrida, quem foi o agressor, o motivo pelo qual não a denuncia por parte das mulheres vitimas de agressão. Os dados dessa pesquisa confirmam que a violência sexual e/ou doméstica é um grave problema de saúde pública, portanto uma questão social. Como observamos, há um número bem maior de ameaças e lesões corporais do que o próprio estupro. Devido tal problemática, várias entidades que se identificam com a temática da violência doméstica contra a mulher vêm se mobilizando, discutindo, para prevenir e combater esta questão social. Salientamos que o presente estudo será apenas um recorte diante das múltiplas questões que envolvem a violência contra a mulher. 1 Acadêmica do curso de Serviço Social e bolsista do Programa de Educação Tutorial- PET Serviço Social, Acadêmica do Núcleo Temático Criança e Adolescente: Controle social na efetivação dos Direitos. Pesquisadora do GEPPAS/ UNIOESTE. [email protected], (45) 9906-2267. 2 Acadêmica do curso de Serviço Social e bolsista do Programa de Educação Tutorial- PET Serviço Social, Acadêmica do Núcleo Temático Criança e Adolescente: Controle social na efetivação dos Direitos. Pesquisadora do GEPPAS/ UNIOESTE. [email protected], (45) 9914-4553. 2 Abordaremos, ainda, a violência doméstica contra a mulher dentro do contexto conjugal, e apontaremos as políticas e os serviços de atendimento no âmbito nacional para o enfrentamento do assunto. Violência: fenômeno novo Considerando que a violência contra mulher, não é um fenômeno novo, mas que nos últimos anos vem adquirindo maior visibilidade social, pelo fato dos movimentos feministas ganharem força desde a década de 19703, conquistando muitos direitos e um deles é o direito previsto na Constituição Federal 1988, que prevê que todos são iguais perante a lei, sem distinção entre homem e mulher. Porém cada indivíduo traz consigo heranças culturais, que podem estar fundada em uma cultura patriarcal e/ ou machista, e isto, fazem com que se construa um papel social de como ser homem e como ser mulher, pelo qual muitas vezes o papel do homem fica sempre em nível superior ao da mulher, portanto, entende-se este como um dos pilares que sustentam a violência contra mulher. O conceito de violência contra mulher é o mesmo adotado pela Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, segundo a qual é “qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado”. O referencial teórico utilizado foi fundamentado através de duas categorias centrais deste trabalho, e assim subdividido: gênero e violência contra mulher. Gênero 3 Segundo Leila Linhares Barsted: O movimento feminista brasileiro foi um ator fundamental nesse processo de mudança legislativa e social, denunciando desigualdades, propondo políticas públicas, atuando junto ao Poder Legislativo e, também, na interpretação da lei. Desde meados da década de 70, o movimento feminista brasileiro tem lutado em defesa da igualdade de direitos entre homens e mulheres, dos ideais de Direitos Humanos, defendendo a eliminação de todas as formas de discriminação, tanto nas leis como nas práticas sociais. De fato, a ação organizada do movimento de mulheres, no processo de elaboração da Constituição Federal de 1988, ensejou a conquista de inúmeros novos direitos e obrigações correlatas do Estado, tais como o reconhecimento da igualdade na família, o repúdio à violência doméstica, a igualdade entre filhos, o reconhecimento de direitos reprodutivos, etc. (BARSTED, 2001, p. 35). 3 Segundo Bandeira “Entende-se por gênero o conjunto de normas, valores, costumes e práticas através das quais a diferença biológica entre homens e mulheres é culturalmente significada [...]”. (BANDEIRA, 2005, p. 7). Para a realização deste trabalho, a questão gênero focalizou-se no papel social do homem e da mulher criado coletivamente a partir das características biológicas, ou seja, a partir do sistema reprodutor do homem e da mulher. Sendo assim ao nascer cada indivíduo já tem um papel préestabelecido, como por exemplo: se nascer uma menina ela ficara em casa com a mãe para ajudar nos afazeres domésticos, se for menino, sairá com o pai (trabalhar), e não ajudara nos afazeres domésticos, porque isto é coisa de menina. Através desta divisão social, a sociedade também carrega a ideologia de que o homem é um ser superior à mulher e este tem poder sobre ela. Em outras palavras o papel do homem e da mulher é construído culturalmente e muda conforme a sociedade e conforme o tempo, pois a realidade esta em constante mudança. Saffioti (2004) acredita que o sistema patriarcado que impõe ideologias que perpetua na sociedade, pelo qual quem tem o poder é o homem, branco e heterossexual, pois a sociedade se constitui por discriminações de diferentes maneiras seja por cor, raça, gênero, entre outras. Este mesmo autor também diz que as contradições presentes na sociedade, é composta pelo nó patriarcado, racismo e capitalismo. E esses eixos perpassam por toda estrutura social, sem exceção da religião e cultura. Pode-se destacar também que a mulher é a mais prejudicada por estes eixos, pois vejamos: a mulher é discriminada por ser mulher, se não for branca, (“duas vezes discriminada”), se a mulher pertence à classe do proletariado é menos valorizada ainda. Para o autor acima supracitado, a dominação patriarcal e exploração capitalista estão intrinsecamente ligadas. Ela também expõe a dificuldades de emancipação femininas por conta do conservadorismo patriarcal. Portanto, ao se trabalhar com o tema “violência contra mulher”, requer uma explanação da questão gênero, pois com isto entende-se o porquê da posição social da mulher em relação ao homem, sendo este papel construído historicamente e culturalmente hierarquizando o papel do homem e oprimindo as mulheres, e, estas opressões se estabelecem de diferentes formas, pois também dependem da sua raça/etnia, idade, classe social, e a sexualidade. Violência contra mulher 4 Como já se sabe, a violência contra mulher é uma manifestação das relações sociais construídas historicamente, que se revela em todos os setores da sociedade independentemente de classe social, religião, etnia, cor, raça, entre outros fatores ligados a preconceitos, atualmente esta violência se encaixa como expressão da questão social e como todas as outras expressões, acabam que se tornam rotineiras e acabam se transformando em estatísticas, pelo fato da sociedade capitalista visam somente o lucro e não o bem estar de todos os cidadão. Violência contra a mulher é considerada qualquer forma de violência seja ela física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Com esta definição percebem-se os inúmeros tipos de agressões que as mulheres estão sujeitas. (BRASIL, 2006). Day; et al. (2003) define violência como: Toda ação ou omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de um membro da família. Pode ser cometida dentro e fora de casa, por qualquer integrante da família que esteja em relação de poder com a pessoa agredida. Inclui também as pessoas que estão exercendo a função de pai ou mãe, mesmo sem laços de sangue. (DAY; et al. 2003, p. 10). A violência contra as mulheres é diferente da violência interpessoal em geral. Os homens têm maior probabilidade de serem vítimas de pessoas estranhas ou pouco conhecidas, enquanto que as mulheres têm maior probabilidade de serem vítimas de membros de suas próprias famílias ou de seus parceiros íntimos. Na sua forma mais grave, a violência leva à morte da mulher. Sabe-se que de 40 a 70% dos homicídios femininos, no mundo, são cometidos por parceiros íntimos. (DAY et al.,p.15, 2003). Nesse contexto, estima-se que, a cada dois minutos, cinco mulheres são agredidas violentamente no Brasil. (PORTAL BRASIL, 2015). Conforme Barros (1999), a naturalização e a banalização da violência no cotidiano feminino dão-se num esquema sutil de dominação, seja psicológica ou física, o que cria um obstáculo para o reconhecimento dos fatos. É como se esta fosse uma realidade natural e necessária e seus desdobramentos, comuns e cotidianos. Essas situações de violência refletem um limite de coação e desestruturação psicológica da mulher, inferiorizando o seu papel dentro da família, mudando o sentido das relações sociais que já havia sido construído no seu cotidiano, passando a tratar o que é imposto, dominador e violento, como naturalidades. Segundo Fonseca et al.(2012) as causas da violência são descritas principalmente pelo ciúme e jogo de poder. Considerando-se a complexidade do problema, associada à questão da 5 construção social dos papéis masculinos e femininos e da desigualdade existente nas relações de gênero, seriam essas as causas mais comuns que geram a violência contra a mulher. O jogo de poder masculino advém dessas crenças de o homem possuir certos direitos e privilégios a mais do que as mulheres. Os ciúmes podem estar relacionados à possessividade: muitos homens tratam as mulheres como objeto de sua propriedade. Os condicionamentos dominantes referentes a certas classificações e compreensões de violência, principalmente quando se trata de mulheres casadas ou em uniões estáveis, levam ao não reconhecimento da violência produzida na intimidade e na rotina de uma relação conjugal e à consequente aprovação dos atos abusivos cometidos pelos homens na posição de senhores e donos de suas mulheres. As consequências negativas da agressão atingem a saúde física e emocional das mulheres, o bem-estar de seus filhos. (DAY ; et. al. , 2003 p.16). De acordo com as diretrizes da ONU (1948), Art. XXI, inciso III: “a família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado”. Mas como se pode perceber é no próprio lar, e por seus companheiros íntimo que ocorre mais caso de violência. O Estado deveria assegurar a proteção de qualquer pessoa dentro da sociedade e principalmente no ambiente familiar. Mas, sua intervenção não é efetiva, frequentemente contribui menos para a segurança das vítimas de violência doméstica do que para impunidade do agressor. Como bem sabemos, nem todas as vítimas procuram seus direitos. Além disso, as políticas públicas existentes para o atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica são precárias e não atende a toda demanda. Para Camargo; Aquino (2003), As políticas de proteção e segurança são essenciais para o enfrentamento a violência, mas é preciso avançar tanto em políticas de prevenção corno na ampliação de políticas que articuladamente trabalhem para uma reversão da dependência financeira, elevação da auto-estima das mulheres, fortalecimento da capacidade de representação e participação na sociedade, enfim, criem condições favoráveis a autonomia pessoal e coletiva. Também as repercussões a saúde que são causadas pela violência doméstica têm que ser assumidas e acolhidas em programas de assistência a vítimas e agressores. (CAMARGO; AQUINO, 2003). 6 Portanto cabe a todos os setores profissionais como: da saúde, da educação, da justiça e segurança, assistência social e trabalho, mobilizarem-se para a socialização sobre a questão de gênero e a violência doméstica contra a mulher, pois um dos primeiros passos para erradicação da violência é a prevenção através de informações e divulgações. A Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004 é o instrumento legal que orienta sobre os princípios, diretrizes, objetivos, usuários e os tipos de proteção assegurados no campo da Assistência Social, a qual se configura como o tripé do Sistema de Proteção Social Brasileiro no âmbito da Seguridade Social. Sua regulamentação deu-se através da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, de dezembro de 1993 que a situa como política social pública articulada à saúde e previdência social e inaugura seu trânsito no campo dos direitos, da universalização dos acessos e da responsabilidade estatal. Portanto, o SUAS é o Sistema Único de Assistência Social que, segundo a Norma Operacional Básica - NOB/SUAS tem “caráter público, não-contributivo, descentralizado e participativo”, orientando a gestão da Assistência Social, fundamentando assim os compromissos da PNAS/2004 e “regula em todo território nacional a hierarquia, os vínculos e as responsabilidades do sistema de serviços, benefícios, programas, projetos e ações de Assistência Social, de caráter permanente e eventual, sob critério universal e lógica de ação em rede”. Com base no SUAS, os serviços prestados a população são atividades que visa a melhoria da vida da população, cujas ações voltem-se para o atendimento das necessidades básicas da população, observando os objetivos, princípios e diretrizes estabelecidas na Lei e o seu ordenamento em rede, de acordo com os níveis de proteção social: básica e especial, sendo a última subdividida em média e alta complexidade . Assim, com base na temática violência contra mulheres, o campo de atuação do Serviço Social, situa-se como um serviço de proteção especial de média complexidade, configurado na NOB/SUAS (2005) como um dos “serviços que oferecem atendimento às famílias e indivíduos com seus direitos violados, mas cujos vínculos familiar e comunitário não foram rompidos”. Preveem-se na mesma Norma, atendimentos que “requerem atenção especializada e individualizada e/ou com acompanhamento sistemático e monitorado”, que devem ser prestados de forma direta: nos Centros de Referência Especializados de Assistência Social – CREAS e em outras unidades públicas especiais de assistência social e de forma indireta: nas entidades e organizações de assistência social da área de abrangência dos CREAS, especializadas neste atendimento. 7 CONSIDERAÇÕES Com este trabalho temos a consciência da importância de se atentar às formas de prevenção sobre a violência contra a mulher ocorrida em nosso país em determinados estados, como ela se da, os motivos, o tempo e suas mais variadas expressões. Desde a sua origem, os tipos de violência sofrida, quem foi o agressor e o que leva a mulher a não denunciar o agressor. Percebemos também que mesmo com a Lei Maria da Penha ainda acontecem muitos casos de violência, não só física como moral, psicológica e patrimonial. A violência conjugal contra as mulheres manifesta a demonstração de poder dos homens e a ideia de que as mulheres são objeto de posse. É uma forma de reproduzir e manter o machismo e de dizer o tempo todo que a mulher é inferior. Pelo fato da violência contra mulher já ser considerada uma questão social, e este por sua vez, objeto de estudo e intervenção do profissional de Serviço Social, pois este profissional possui competências e atribuições que assegura uma intermediação de qualidade. Mas também entendemos que falta de educação a respeito da violência de gênero, é um fator predominante na sociedade, pelo fato de muitas vezes essa violência estar voltada a herança cultural do país. REFERÊNCIAS BANDEIRA, L. Brasil Fortalecimento da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres avançar na transversalidade da perspectiva de Gênero nas Políticas Públicas. Disponível em: <http://portal.mte.gov.br/data/files/FF8080812BAFFE3B012BCB0932095E3A/integra_publ_ lourdes_bandeira.pdf >. Acesso em: 05 nov. 2015. BARROS, N. V. Mulher e violência: desvelando a naturalização da violência simbólica no contexto familiar. Texto e Contexto. V.8, n. 2, 1999, p. 266- 269. BARSTED, L. L. Lei e realidade social: igualdade x desigualdade. In: As mulheres e os direitos humanos. Coletânea Traduzindo a Legislação com a perspectiva de gênero. Rio de Janeiro: Cepia, 2001. BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Emendas Constitucionais de Revisão. Portal da Legislação, Brasília, out. 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 28 de out. de 2015. BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 11.340, de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, 8 Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências, Brasília, ago. 2006. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso em 28 de out. de 2015. CAMARGO, M.; AQUINO, S. Secretaria Especial de Políticas Públicas para as Mulheres. Programa de Prevenção, Assistência e Combate a Violência Contra a Mulher — Plano Nacional: Diálogos sobre violência doméstica e de Gênero: Construindo políticas públicas. Brasília: A Secretaria, 2003. DAY, V. P. et al. Violência doméstica e suas diferentes manifestações. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rprs/v25s1/a03v25s1>. Acesso em: 05 de setembro 2015. FONSECA, D. H., RIBEIRO, C. G.; LEAL, N. S. B. Violência doméstica contra a mulher: realidades e representações sociais.2012. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/psoc/v24n2/07.pdf>. Acesso em: 05 de setembro 2015. ONU. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada em 10 de dezembro de 1948. PORTAL BRASIL, Combate à violência contra mulher mostra resultados. Disponível em: < http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2014/09/combate-a-violencia-contra-mulhermostra-resultados Acesso em: 10 de setembro 2015. SAFFIOTI, H. Gênero, patriarcado e violência. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2004.