Artigo 14 - TÉCNICAS DE INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL

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Fundamentos de Direito Penal
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§ 14 – TÉCNICAS DE INTERPRETAÇÃO
DA LEI PENAL
Luiz Carlos Hallvass Filho1
Rodrigo Leite Ferreira Cabral2
Sumário: 1. Referência Jurisprudencial. 2. O Caso. 3. Os Fundamentos da Decisão. 4. Problematização. 5. Referências.
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REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL
Superior Tribunal de Justiça – 5ª T. – Habeas Corpus 177.472/MG – Rel.
Min. Jorge Mussi – j. em 21.06.2011.
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O CASO
O pano de fundo da discussão será a análise de um caso concreto,
que recebeu a seguinte ementa:
Habeas corpus. Fotografar pornografia infantil. Art. 241 do ECA, nos termos
da Lei 10.764/03. Atipicidade da conduta de fotografar. Inocorrência. Interpretação integral da norma. Ordem denegada.
1. A alteração na redação do art. 241 do ECA pela Lei 10.764/03, não descriminalizou a conduta de fotografar pornografia infantil. Precedente do STJ.
2. Embora o termo “fotografar” não constasse, literalmente, do caput do art.
241 do ECA – redação dada pela Lei 10.764/03 –, a mera interpretação gra1
2
Promotor de Justiça do Estado do Paraná. Especialista em Direito Processual Civil. Mestrando em Criminologia Forense pela UCES, Buenos Aires, Argentina.
Promotor de Justiça no Estado do Paraná. Especialista em Direito Constitucional. Mestre
em Criminologia e Ciências Forenses pela Universidade Pablo de Olavide, Sevilha/Espanha. Doutorando em Ciências Jurídicas e Políticas pela mesma Universidade.
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Luiz Carlos Hallvass Filho e Rodrigo Leite Ferreira Cabral
matical se mostraria suficiente para a compreensão do real sentido jurídico da
norma em exame.
3. Ao intérprete, contudo, cabe considerar também a finalidade e o sistema (jurídico) no qual a norma está inserida, é a chamada interpretação integral, na qual
o procedimento interpretativo passa obrigatoriamente, e nessa ordem, pela observação gramatical, lógica, sistemática, histórica e teleológica.
4. O termo “produzir fotografias”, portanto, como definido pela Lei 10.764/03, e
em vigor ao tempo da conduta imputada ao paciente, deve ser considerado tal
qual “fotografar”; expressões, inclusive, sinônimas, segundo os dicionários da
língua portuguesa Aurélio e Houaiss.
5. Neste contexto, buscar na expressão “produzir fotografia” significado diverso
a “fotografar”, além de ilógico, diverge de forma radical do viés sistêmico da
norma que ampara e protege crianças e adolescentes, tanto em sua face histórica
(sempre fotografar pornografia infantil foi considerado crime) quanto teleológica
(conduta repudiada pela sociedade)”.
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OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO
A questão central julgada no Habeas Corpus diz respeito à alegação da defesa no sentido de que a alteração legislativa operada pela Lei
10.764/03 – que mudou a redação do tipo penal do art. 241 do Estatuto da
Criança e do Adolescente, modificando a palavra “fotografar” contida anteriormente pela expressão “produzir fotografia” – acabou por tornar atípica a
conduta de fotografar pornografia infantil.
O Superior Tribunal de Justiça rejeitou tal alegação, utilizando-se,
para tanto, do significado da expressão fotografar trazido por dicionários,
além de invocar as técnicas interpretativas gramatical, lógica, sistemática,
histórica e teleológica para justificar a decisão. E é justamente nesse último
argumento é que focaremos nosso trabalho.
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PROBLEMATIZAÇÃO
A proposta do presente estudo é discutir criticamente as denominadas técnicas de interpretação da Lei Penal.
A ideia é noticiar as técnicas tidas tradicionalmente como relevantes
para auxiliar a realização de uma interpretação jurídica, buscando revelar suas
origens ideológicas e apontar sua crença cientificista baseada na ilusão de que é
possível, por meio de um método, obter-se uma interpretação neutra e segura.
A escolha do referido julgado se deu muito mais pela invocação,
por parte do Tribunal, dos métodos interpretativos como caminho para a
Fundamentos de Direito Penal
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solução do conflito, do que propriamente em decorrência da discordância
com o resultado final do julgamento.
O que chama a atenção no julgamento é a dificuldade que o Tribunal
parece ter em responder a uma questão, a nosso ver, extremamente simples. O
que é um forte sintoma de uma arraigada influência positivista sobre os julgadores (e em Direito Penal não há que se confundir princípio da legalidade com
a necessidade de uma interpretação literal descafeinada), o que justamente gera
essa falta de desenvoltura para apresentar uma justificação a um caso fácil.
E justamente por conta dessa dificuldade, é que o Tribunal acaba
por apelar às famosas técnicas interpretativas como meio de impor o resultado que lhe parece mais justo.
É sabido que a maioria dos manuais de Direito Penal brasileiro,
quando falam sobre a interpretação da norma penal, trazem as referidas técnicas
como métodos idôneos para a interpretação da lei penal, sendo que não chegam
a fazer uma análise crítica sobre esse tema (v.g., Gomes3; Nucci4; Greco5).
Por isso, ainda que de modo bastante breve, passaremos a analisar
tais métodos interpretativos, com uma análise de sua origem e das suas funções ideológicas escondidas por detrás de uma falsa alegação de neutralidade:
a) método gramatical ou literal: o método gramatical aparece
após a edição do Código Civil napoleônico e tinha como ideia central a de
que as palavras têm um sentido unívoco, sendo o papel do intérprete desco3
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“Quanto aos meios ou critérios utilizados, a interpretação pode ser: (a) gramatical (é a
interpretação literal, a busca do sentido das palavras empregadas pelo legislador). O ponto
de partida de toda interpretação reside justamente na literalidade do dispositivo legal. (b)
lógica (alguns tipos de argumentos lógicos são muito apropriados em Direito Penal: argumento a contrario sensu (ou a contrario), argumento a fortiori etc.) (...) (c) teleológica
(deve-se sempre saber qual é a finalidade da lei e, em consequência, da norma concreta; faz
parte da interpretação teleológica a descoberta do bem jurídico protegido; o tipo deve ser
sempre interpretado nesse sentido); (d) histórica (é relevante também descobrir toda tramitação legislativa, os projetos, as emendas etc.). A história da lei é importante não para saber
a vontade do legislador, sim, para saber qual é o sentido do texto legal em vigor (mens legis)
e (e) sistemática (toda lei deve ser interpretada de acordo com sua topologia assim de acordo com todo ordenamento jurídico). De todos os critérios, o mais relevante é o teleológico,
isto é, a primeira tarefa do legislador é descobrir a finalidade da norma concreta, é dizer,
qual é o bem jurídico protegido por ela e que deve ser afetado concretamente para que
exista delito”. (GOMES, Luiz Flávio; GARCÍA-PABLOS de Molina, Antonio. Direito Penal, Parte Geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. v. 2, p. 75)
“A interpretação é um processo de descoberta do conteúdo da lei e não de criação de normas. Por isso, é admitida em direito penal qualquer forma. Não desperta polêmica a interpretação literal, nem a teleológica ou mesmo sistemática. O ponto problemático fica circunscrito às formas extensivas e analógica”. (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal, parte geral, parte especial. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 83)
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, parte geral. 11. ed. Rio de Janeiro: Impetus,
2009. v. 1, p. 40-41.
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Fundamentos de
Direito Penal
Organizador: Paulo César Busato
ISBN: 978853624289-7
Número de Páginas: 306
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