IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO E O FÊNOMENO DA EXTRAFISCALIDADE ANA PAULA FERNANDES DE QUADROS¹ GILMAR ARAÚJO VIANA² LUAN SOARES BOTELHO³ VANESSA ANJOS SOARES* Resumo: Este artigo objetiva abordar a função extrafiscal dos impostos de importação e exportação, observando a sua não vinculação aos princípios da legalidade e anterioridade. Tais impostos além da função arrecadatória possuem a função de regulamentar a economia, por meio da extrafiscalidade, sendo de relevante importância para estruturação da economia. Assim, objetivando uma abordagem de maneira prática aos casos de extrafiscalidade, estudaremos as motivações e consequências da incidência dos impostos de importação e exportação no cenário nacional. Palavras-chave: Imposto de importação, Imposto de exportação, Extrafiscalidade, Segurança jurídica, Economia. Abstract: This article aims to address the extrafiscal function of import and export taxes, not watching their attachment to the principles of legality and precedence . Such taxes beyond the tax collection function have the function of regulating the economy through extrafiscality, being of great importance for the structure of the economy. although, aiming at a practical way to approach cases extrafiscality will study the motivations and consequences of the impact of taxes on imports and exports on the national scene . Keywords: Import tax, export tax, Extrafiscalidade, Security, Legal, Economics. ¹Graduanda em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros. ² Graduando em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros. ³ Graduando em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros. *Graduanda em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros. Sumário: Introdução. 1. Conceito. 2. Imposto de importação e Imposto de exportação e sua função extrafiscal. 3. Imposto de importação e Imposto de exportação versus o princípio legalidade e anterioridade tributária. Considerações finais. Referências bibliográficas. INTRODUÇÃO A arrecadação tributária atua como o principal instrumento pelo qual o Estado, ente soberano, faz frente às despesas decorrentes de sua atuação na sociedade, caracterizando, assim, o modo mais comum de intervenção estatal na vida de seus tutelados. Entretanto, há, ainda, uma finalidade extraordinária de interferência do Estado, que também enseja a cobrança de tributos e alterações de alíquotas, um pouco menos divulgada do que aquela tida como principal, mas tão importante quanto: a Extrafiscalidade. A polêmica envolta sobre esse tema gira em torno da ausência de sujeição nos impostos de importação e exportação aos princípios tributários da anterioridade e legalidade, haja vista a presença do fenômeno da extrafiscalidade. O fato destes impostos não se submeterem a tais princípios acaba por gerar uma insegurança jurídica para o contribuinte, uma vez que este pode ser surpreendido com uma majoração na carga tributária de determinados produtos, importados ou exportados, a qualquer momento. Assim, feitas as considerações iniciais, este artigo tem por finalidade analisar brevemente alguns aspectos teóricos e práticos do fenômeno extrafiscal, demonstrando sua ocorrência nas diferentes espécies tributárias. 1. CONCEITO O imposto de importação, também conhecido como Tarifa Aduaneira, é o índice que recai sobre os produtos estrangeiros importados pelo país e, tem como fato gerador a entrada destes produtos em território nacional, sendo seu lançamento feito por homologação. Vale ressaltar, ainda, que a alíquota do Imposto de Importação tem por base a Tarifa Externa Comum - TEC adotada pelo MERCOSUL. Já o imposto de exportação incide nos produtos nacionais que serão exportados para fora do país de origem. Seu fato gerador é a entrada de produtos estrangeiros em território nacional e seu lançamento também é feito por homologação. Ambos são impostos federais, de competência da União, o que permite ao Poder Executivo, nas condições e nos limites estabelecidos em lei, alterar suas alíquotas, a fim de ajustá-los aos objetivos da política cambial e do comércio nacional. A segurança jurídica aqui relatada diz respeito à garantia da exigibilidade de direito certo, estável e previsível, devidamente justificado e motivado com vistas a uma maior proteção ao contribuinte e a uma busca pela justiça. Em relação ao conceito de extrafiscalidade há divergências doutrinárias, existem duas concepções para tanto, uma ampla e outra restrita. De acordo com a concepção ampla, a extrafiscalidade além de proporcionar estímulos e desestímulos a comportamentos, possui todo um expediente tributário que visa à realização de valores que exceda a arrecadação de tributos. Já a concepção restrita, considera a extrafiscalidade apenas como medidas fiscais de incentivo ou desestímulo a comportamentos. De acordo com o princípio da anterioridade, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estão proibidos de cobrar quaisquer tributos no mesmo exercício financeiro e/ou antes de noventa dias da data de publicação da lei que os institui ou majora. Já o princípio da legalidade é a base fundamental do Estado democrático de Direito. De acordo com este princípio, a administração pública somente pode agir segundo a lei. Para o direito tributário, o princípio da legalidade aduz que nenhum imposto poderá ser cobrado sem lei anterior que o defina. 2. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO E IMPOSTO DE EXPORTAÇÃO E SUA FUNÇÃO EXTRAFISCAL A maioria dos tributos é criada com uma finalidade específica: a arrecadação fiscal. Isso ocorre porque o Estado necessita de recursos financeiros para fazer frente às despesas oriundas de sua intervenção na sociedade. Logo, a fiscalidade, ou o caráter fiscal, nada mais é do que a finalidade arrecadatória que enseja a criação de grande parte das exações do sistema tributário brasileiro, tendo vistas, quase que exclusivamente, a arrecadação de valores aos cofres públicos. Entretanto, tanto o imposto de importação quanto o imposto de exportação são utilizados como instrumentos de política econômica, que vão além do propósito meramente arrecadatório, haja vista que são espécies dotadas, além da fiscalidade, de um viés extrafiscal. A extrafiscalidade é figura de derradeira importância porquanto visa à intervenção estatal no domínio econômico do país, através da redução ou majoração das alíquotas buscando, assim, o desenvolvimento e a estabilidade econômica do Estado. Nesse sentido, Raimundo Bezerra Falcão define claramente a diferença entre a fiscalidade e a extrafiscalidade: Considerando a tributação como ato ou efeito de tributar, ou ainda, como o conjunto dos tributos, podemos afirmar que: a) a tributação se diz fiscal enquanto objetiva retirar do patrimônio dos particulares os recursos pecuniários – ou transformáveis em pecúnia – destinados às necessidades públicas do Estado; b) tributação extrafiscal é o conceito que decorre do de tributação fiscal, levando a que entendamos extrafiscalidade como atividade financeira que o Estado desenvolve sem o fim precípuo de obter recursos para seu erário, mas sim com vistas a ordenar a economia e as relações sociais, sendo, portanto, conceito que abarca, em sua amplitude, extensa gama de opções e que tem reflexos não somente econômicos e sociais, mas também políticos. (FALCÃO, 1981, p. 118) No mesmo sentido, ensina Ataliba: Consiste a extrafiscalidade no uso de instrumentos tributários para obtenção de finalidades não arrecadatórias, mas estimulantes, indutoras ou coibidoras de comportamentos, tendo em vista outros fins, a realização de outros valores constitucionalmente consagrados. [...] É lícito recorrer aos tributos com o intuito de atuar diretamente sobre os comportamentos sociais e econômicos dos contribuintes, seja fomentando posicionamento ou inibindo certos procedimentos. Dá-se tal fenômeno (extrafiscalidade) por intermédio de normas que, ao preverem uma tributação, possuem em seu bojo, uma técnica de intervenção ou conformação social por via fiscal. São os tributos extrafiscais, que podem ser traduzidos em agravamentos ou benefícios fiscais dirigidos ao implemento e estímulo de certas condutas. (ATALIBA, 1990, p. 233.) Isto posto, é notório que a extrafiscalidade é o objetivo excepcional de um tributo, que ultrapassa o setor puramente financeiro e reflete de diversas maneiras em diferentes âmbitos, tais como o político e o econômico. Assim, o controle de alíquotas sobre a importação constitui um importante instrumento de proteção da indústria nacional, assim como o controle sobre as alíquotas de exportação regulam a oferta de bem no mercado interno. Devido aos altos custos com matéria-prima, tributos e até mesmo com a rigorosa legislação trabalhista vigente em nosso país, faz-se necessária à função extrafiscal de impostos como o de importação e exportação, uma vez que é uma forma encontrada pelo Estado de resguardar sua economia, diminuindo ou majorando tributos conforme a necessidade econômica do país. Desta forma, constitui a extrafiscalidade dos impostos supracitados um meio por meio do qual as empresas nacionais passam a gozar de garantias fomentadas pelo Estado para que possam vir a ter condições de competir no mercado internacional. Caso o imposto de importação e o imposto de exportação não possuíssem esta função de regulamentar a economia, a indústria nacional, provavelmente, não teria condição de competir com mercados estrangeiros, o que poderia acarretar a falência de várias empresas brasileiras, que por consequência proporcionaria um alto índice de desemprego, desencadeando, assim, um caos na economia. 3. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO E IMPOSTO DE EXPORTAÇÃO VERSUS O PRINCÍPIO LEGALIDADE E ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA O Imposto de Importação está previsto no artigo 153, inciso I da Constituição Federal e o Imposto de Exportação no artigo 153, inciso II, do mesmo Diploma. A competência, conforme mencionado anteriormente, é exclusiva da União, pois se trata de impostos que implicam na relação do país com o exterior. Em conformidade com o artigo 1º, do Decreto-lei nº 37/66, o imposto de importação tem como fato gerador “a entrada de mercadoria estrangeira no território nacional” e suas alíquotas podem ser específicas ou ad valorem. A alíquota específica é calculada através de uma quantia determinada que varia de acordo com a unidade de quantificação do bem importado; já a alíquota ad valorem é indicada em uma porcentagem que é calculada sobre o valor do bem. Os artigos 20 e 22 do Código Tributário Nacional definem a base de cálculo do imposto de importação e seus contribuintes, a saber: Art. 20. A base de cálculo do imposto é: I - quando a alíquota seja específica, a unidade de medida adotada pela lei tributária; II - quando a alíquota seja ad valorem, o preço normal que o produto, ou seu similar, alcançaria, ao tempo da importação, em uma venda em condições de livre concorrência, para entrega no porto ou lugar de entrada do produto no País; III - quando se trate de produto apreendido ou abandonado, levado a leilão, o preço da arrematação. Art. 22. Contribuinte do imposto é: I - o importador ou quem a lei a ele equiparar; II - o arrematante de produtos apreendidos ou abandonados. Por outro lado, o imposto de exportação, conforme estabelece o artigo 23 do CTN e artigo 1º do Decreto-lei nº 1.578/77, tem como fato gerador “a saída do território nacional, para o estrangeiro, de produto nacional ou nacionalizado” e as alíquotas podem ser específicas ou ad valorem, nos mesmos moldes explicitados acima. O contribuinte, nesse caso, é o exportador ou quem a ele a lei equiparar e sua base de cálculo está definida no artigo 24 do CTN: Art. 24. A base de cálculo do imposto é: I - quando a alíquota seja específica, a unidade de medida adotada pela lei tributária; II - quando a alíquota seja ad valorem, o preço normal que o produto, ou seu similar, alcançaria, ao tempo da exportação, em uma venda em condições de livre concorrência. Parágrafo único. Para os efeitos do inciso II, considera-se a entrega como efetuada no porto ou lugar da saída do produto, deduzidos os tributos diretamente incidentes sobre a operação de exportação e, nas vendas efetuadas a prazo superior aos correntes no mercado internacional o custo do financiamento. Entretanto, por se tratar de impostos que agem diretamente sobre a economia, também chamados de impostos reguladores, ambos os impostos não estão sujeitos aos princípios da anterioridade e legalidade. O princípio da legalidade está previsto no artigo 150, I da Constituição Federal de 1988, em que determina que só haverá cobrança, instituição ou modificação de tributo quando houver a devida previsão legal. Não podendo, pois, um decreto ou outro instrumento infralegal fazê-lo. Em outro giro, o princípio da anterioridade está previsto no artigo 150, III, alíneas “b” e “c” da Constituição Federal, determinando que para a criação ou majoração de um tributo faz-se necessário a existência de lei anterior ao exercício financeiro em que será cobrado, respeitando a antecedência mínima de noventa dias entre a data da publicação e a data da sua instituição. A motivação para a não vinculação de tais princípios nos impostos de exportação e importação seria justificada, justamente, pela função extrafiscal que acoberta estes impostos, haja vista que o seu mecanismo de tributação consiste no fato de que a arrecadação seria uma maneira de exercício do poder de governo sobre o controle da economia, diminuindo ou aumentando a tributação sobre os produtos que entram e saem do país como uma forma de proteger e fomentar a economia. Assim, não é difícil vislumbrar uma situação na qual o imposto de importação, por exemplo, seja usado de maneira predominantemente extrafiscal: aumentando sua alíquota, a tendência será de aumento no preço dos produtos importados e consequente vantagem às indústrias nacionais, já que tendo preço menor, tornar-se-ão mais competitivas. Nesse sentido, leciona Hugo de Brito Machado: Se não existisse o imposto de importação, a maioria dos produtos industrializados no Brasil não teria condições de competir no mercado com seus similares produzidos em países economicamente mais desenvolvidos, onde o custo industrial é reduzido graças ao processo de racionalização da produção e ao desenvolvimento tecnológico de um modo geral, além disto, vários países subsidiam as exportações de produtos industrializados, de sorte que os seus preços ficam consideravelmente reduzidos. Assim, o imposto de importação funciona como valioso instrumento de política econômica. (MACHADO, 2009, p. 305). Do mesmo modo, o autor faz algumas considerações sobre o imposto de exportação: O imposto de exportação tem função predominantemente extrafiscal. Prestase mais como um instrumento de política econômica do que como fonte de recursos financeiros para o Estado. [...] Em face de sua função intimamente ligada à política econômica relacionada com o comércio internacional, o CTN determinou que a receita líquida deste imposto destina-se à formação de reservas monetárias (art. 28). Essa determinação chegou a ser autorizada, aliás, pela própria Constituição anterior (art. 21, § 4º). Na Constituição de 1988 não foi reproduzida, mas isto não quer dizer que não permaneça em vigor o Decreto-lei nº. 1.578, de 11.10.1977, onde tal destinação está prevista expressamente. A Lei nº. 5.072/66 indica expressamente que o imposto de exportação “é de caráter exclusivamente monetário e cambial e tem por finalidade disciplinar os efeitos monetários decorrentes da variação de preços no exterior e preservar as receitas de exportação” (art. 1º). (MACHADO, 2009, p. 310-311). Nesse ínterim, tanto o imposto de importação quanto o imposto de exportação podem ter suas alíquotas alteradas pelo poder executivo e, ao contrário do que prega o princípio da anterioridade, estes impostos podem ser cobrados no mesmo exercício financeiro da sua criação e até mesmo antes do prazo de noventa dias entre o dia da sua publicação e da sua cobrança. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República e Ministros de Estado, mas só o Presidente da Republica poderá alterar as alíquotas dos impostos, através dos decretos, entretanto, não poderá alterar a base de cálculo e nem mesmo criar tributos. Vale ressaltar, ainda, que a alteração das alíquotas destes impostos é facultativa, uma vês que a finalidade da obtenção do tributo é fomentar a prática ou abstenção de determinados atos. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar dos impostos de importação e exportação não se sujeitarem a princípios tais como da anterioridade e da legalidade, não são inconstitucionais. Uma vez que estes tributos não possuem apenas função arrecadatória, mas principalmente uma função regulamentatória. Apesar de gerar certa insegurança no contribuinte, que pode ser surpreendido com um aumento na carga tributária de determinado produto importado ou exportado, justifica-se esta ação executiva, uma vez que os impostos em questão funcionam como forma de controle econômico por parte do Estado, a fim de proteger sua indústria nacional. Após todo exposto podemos concluir que a não incidência dos princípios da legalidade e anterioridade é da natureza dos impostos de importação e exportação não constituindo em ilegalidade ou afronta à Constituição Federal. A sujeição destes impostos ao princípio da legalidade limitaria o poder executivo, uma vez que a este incorreria na obrigatoriedade de provocação do legislativo para edição de leis, o que demandaria tempo, sendo incompatível com a rapidez e dinamicidade exigida pelo mercado internacional. É inegável que as características do imposto de importação e do imposto de exportação são condizente com as reais necessidade do país, necessidades que abarcam um instrumento regulatório extrafiscal, para evitar prejuízos e o decréscimo da economia como um todo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ATALIBA, Geraldo. IPTU: progressividade. Revista de Direito Público, v. 23, n. 93, 1990. ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário, 2° edição, 2006, editora Saraiva, São Paulo. BARRAL, welber. Metodologia da pesquisa jurídica. 2. Ed. Florianópolis (sc): fundação boiteux, 2003. BRASIL, Constituição da República Federativa do, 30º edição, 2009, editora Atlas, São Paulo.Organizador: Alexandre de Moraes FALÇÃO, Raimundo Bezerra. Tributação e mudança social. Rio de Janeiro: Forense, 1981. GOUVÊA, Marcus de Freitas. A Extrafiscalidade no direito tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. SABBAG, Eduardo. 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