Instituto Biomédico – Faculdade de Medicina Disciplina de Fisiologia VI e Disciplina de MAD I – 3º período - Medicina CASO CLÍNICO INTEGRADO INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA Definição: A insuficiência renal crônica, também conhecida como doença renal crônica (DRC), é uma disfunção patológica persistente do rim, que apresenta sinais clínicos como hematúria e/ou proteinúria, ou uma redução na taxa de filtração glomerular (TFG) de <60 mL/minuto/1.73 m2, por mais de 3 meses, independente da causa. As anormalidades patológicas podem ser constatadas por biópsia renal, estudos de imagem, EAS, excreção de albumina e outros. A taxa de filtração glomerular (TFG) pode ser obtida através da coleta de urina de 24 horas ou através de métodos que estimem a TFG. O tempo de três meses é essencial para diferenciar a insuficiência renal crônica da aguda. Epidemiologia: Esta é uma condição comum que muitas vezes não é reconhecida até os estágios mais avançados. Estima-se que, em todo o mundo, 10% da população adulta terá DRC. A incidência está aumentando e acredita-se que seja devido a uma população em envelhecimento e uma maior incidência de doenças como diabetes mellitus (DM) e hipertensão arterial sistêmica (HAS). Etiologia e fisiopatologia: As causas mais comuns na população adulta brasileira são a HAS e DM. Causas mais raras incluem distúrbios císticos do rim (doença renal policística), uropatia obstrutiva, síndromes nefrítica e nefrótica, doença glomerular, nefrite lúpica, amiloidose. A fisiopatologia é complexa. Independente da causa da lesão renal (DM, HAS ou distúrbios glomerulares), quando há dano renal, uma cascata de eventos ocorre. Em resposta à lesão renal, acredita-se que haja um aumento na pressão intraglomerular com hipertrofia glomerular nos néfrons remanescentes pois o rim tenta adaptar-se à perda dos néfrons para manter a filtração glomerular constante. Um aumento na permeabilidade glomerular para macromoléculas como fator de transformação de crescimento beta (TGF beta), ácidos graxos, marcadores pró-inflamatórios de estresse oxidante e proteína pode resultar em toxicidade à matriz mesangial, causando inflamação, fibrose e cicatrização glomerular. Alterações estruturais e alterações moleculares, celulares e bioquímicas concomitantes parecem ser responsáveis pela cicatrização renal progressiva e perda da função renal. Na DRC a perda da função renal é lenta, progressiva e irreversível. Classificação clínica: A DRC é classificada em 5 estágios distintos com base na TFG, como segue: (pode-se utilizar a urina de 24h ou o método estimado para determinar a TFG): Estágio 1: dano renal com TFG normal ou elevada, ≥90 mL/min/1.73 m2 Estágio 2: dano renal com diminuição leve na TFG, 60 a 89 mL/min/1.73 m2 Estágio 3: dano renal com diminuição moderada na TFG, 30 a 59 mL/min/1.73 m22 Estágio 4: dano renal com diminuição grave na TFG, 15 a 29 mL/min/1.73 m2 Estágio 5: insuficiência renal (doença renal em estágio terminal) com TFG <15 mL/min/1.73 m2. Manifestações clínicas: É importante observar que uma proporção significativa de pessoas é assintomática, e o diagnóstico depende da evidência patológica de dano renal como hematúria e/ou proteinúria, ou da evidência laboratorial de uma redução na taxa de filtração glomerular (TFG).Sinais e sintomas muitas vezes são vagos, incluindo fadiga, náuseas e possivelmente o desenvolvimento de edema. Como a DRC evolui para os estágios mais avançados de uremia (nível de uréia elevado no sangue), os pacientes muitas vezes irão descrever anorexia, náuseas, vômitos, prurido e, em geral, não se sentem bem. Se os pacientes começarem a ter diminuição na produção de urina, poderá ser observado um aumento no edema periférico e edema pulmonar com dispneia. Nos estágios mais avançados de uremia, os pacientes podem apresentar alterações sensoriais, neuropatias periféricas e até convulsões ou coma. Tratamento: O tratamento da DRC pode ser conservador (através de medicações e com monitorização frequente do quadro a fim de intervir caso haja complicações associadas) ou através de terapia renal substitutiva (transplante renal, hemodiálise ou diálise peritoneal). Nos estágio de I a IV pode ser feito tratamento conservador, mas no V é necessário intervir com TRS (Terapia Renal Substitutiva). Além disso, os fatores de risco subjacentes ao dano renal devem ser tratados, incluindo otimização do controle glicêmico no diabetes mellitus e alcance da PA de <140/90 mmHg com inibidores da ECA ou agentes bloqueadores do receptor de angiotensina (as doses dependem de cada caso). Complicações: Anemia, hipertrofia de VE, pericardite urêmica, hiperfosfatemia (em associação com o cálcio pode se depositar em diversos vasos, entre eles as coronárias podendo causar doença cardíaca isquêmica, IAM, parada cardíaca ou morte súbita). O acometimento cardiovascular representa aproximadamente 50% das mortes em pacientes com DRC. Distúrbios do metabolismo osteo-mineral também são bastante comuns, podendo levar à osteoporose, fraturas e à alteração na estrutura óssea (osteodistrofia renal). Referências bibliográficas: British Medical Journal em BMJ Learning. Acesso em 21 de maio de 2015. Definitionandstagingofchronickidneydisease in adults - UpToDate. Acesso em 21 de maio de 2015. Diabetes mellitus, hipertensão arterial e doença renal crônica: estratégias terapêuticas e suas limitações. Revista Brasileira de Hipertensão. 2008. INFECÇÕES DE CORRENTE SANGUÍNEA ASSOCIADAS A CATETER VENOSO CENTRAL (ICS-CVC) O que é um cateter venoso central? São dispositivos inseridos em uma veia central (Ex.: Jugular interna, femoral, subclávia ou outras) quando necessário, por falta de acesso periférico, por necessidade de utilização de medicações que exigem administração por veia profunda, para a diálise ou monitorização hemodinâmica. Epidemiologia As infecções associadas a cateter são a causa mais comum de infecção de corrente sanguínea nosocomial. São particularmente comuns entre pacientes críticos, dependentes de hemodiálise e pacientes recebendo quimioterapia ou nutrição parenteral total. É um tema de grande importância por ser causa importante de aumento de mortalidade entre pacientes internados em unidades intensivas. Patofisiologia e etiologia Infecções de cateteres vasculares surgem de biofilme bacteriano, composto por bactérias incorporadas dentro de uma matriz polissacarídica extracelular sobre a superfície do cateter ou através da adesão a proteínas séricas do paciente (ex. fibronectina, fibrinogênio, fibrina e laminina) que se depositaram na superfície do cateter. As bactérias localizadas no biofilme tipicamente têm uma atividade metabólica diminuída o que as tornam menos susceptíveis aos antibióticos. Além disso, o antibiótico tem dificuldade de penetrar no biofilme. Tudo isso justifica a dificuldade de erradicar a infecção sem a retirada do dispositivo responsável. As ICS-CVC podem ocorrer durante a inserção do cateter, por migração do microrganismo da pele, a partir de uma infecção em outros sítios e, menos incomumente, por infusão de soluções contaminadas. Manipulações mais frequentes da conexão entre o sistema de infusão e o cateter aumentam o risco deste tipo de infecção. O risco de infecção associada ao cateter aumenta de acordo o tempo de permanência desse. No entanto entre o 15 ° e o 17° dia da implantação esse risco aumenta significativamente. Os patógenos mais frequentemente associados são espécies de Staphylococcuscoagulase negativos (Ex.: S. epidermidis) e Staphylococcusaureu. Outros agentes comuns são Klebsiellaspp.,Acinetobacterspp., Pseudomonasaeruginosae o fungo Candidaspp.. Diagnóstico A forma mais comum de apresentação clínica da infecção associada a um cateter é a presença de calafrio com ou sem febre. A presença de eritema e secreção purulenta na região de inserção do cateter acontece na minoria dos pacientes. Pode acontecer também hipotensão e taquicardia, sendo que a presença de leucocitose é comum. O diagnóstico desse tipo de infecção permanece desafiador e não pode ser realizado baseando-se somente em critérios clínicos ou laboratoriais, visto que esses apresentam baixa especificidade e sensibilidade. Deve utilizar assim, além das características clínicas e laboratoriais, informações decorrentes de cultura do cateter removido ou hemocultura de sangue colhido através do cateter. As técnicas diagnósticas que não exigem a retirada do cateter podem ser: Comparar o número de unidades formadoras de colônias (UFC) que cresceram na cultura do sangue colhido pelo cateter com a quantidade de UFC no sangue colhido em veia periférica. Se a relação entre as UFC do cateter venoso central e sangue periférico for de 5 a 10:1 é indicativo de ICS-CVC. Tempo diferencial de positividade, onde se compara o tempo para uma cultura de sangue periférico e de sangue colhido através de cateter para positivar. Se a cultura de sangue colhido através do cateter positivar no mínimo duas horas antes da cultura de sangue periférico é um forte indicativo de ICS-CVC As técnicas diagnósticas que realizam a retirada do cateter: Cultura semiquantitativa da ponta do cateter. Esta técnica consiste em rolar os 4 cm distais da ponta do cateter numa placa de ágar para a cultura. Um rendimento de ≥ 15 UFC de bactérias distingue colonização do cateter de infecção. Uma grande limitação é que apenas microrganismos a partir da superfície externa do cateter são cultivadas. O diagnóstico rápido de ICS relacionadas a cateter pode também ser conseguida através de exame microscópico direto da ponta do cateter corados com coloração de Gram. Tratamento Fatores que interferem na decisão terapêutica incluem o tipo do cateter, agente patogênico causador da infecção, viabilidade de outros locais de acesso e a gravidade da doença. O cateter deve ser removido se houver secreção purulenta, bacteremia persistente por mais de 48h, se o agente causador for S. aureus ou Candidaspp. ou se houver complicações como endocardite ou tromboflebite séptica. O tratamento empírico com antibiótico dependerá da epidemiologia do estabelecimento. Já a antibioticoterapia direcionada de acordo o agente patogênico deve seguir informações da literatura associada a informações oferecidas pelo antibiograma. BIBLIOGRAFIA 1) 2) 3) Principles and Practice of Hospital Medicine. McKean, S. C., et all. The McGraw-Hill Companies, 2012. Medicina intensiva, abordagem prática. Azevedo, L. C. P.; Taniguchi, L. U.; Ladeira, J. P. Manole, 2ª edição, 2015. Principles of Critical Care. Hall J. B.; Schimidt G. A.; Kress J. P. .McGraw-Hill Education, 2015, 4ª edição. CASO CLÍNICO Identificação: LA, 42 anos, sexo masculino, natural de São Paulo, SP, casado, consultor tributário, católico. Queixa principal: pressão alta e pernas inchadas. História da doença atual:paciente deu entrada na emergência do HUAP no dia primeiro de maio de 2014 com queixa de aumento da pressão arterial. Na ocasião apresentava pressão arterial de 190 x 110 mmHgapesar do uso de medicação anti-hipertensiva. Referenão ter feito uso regular dos medicamentos, exceto nos últimos dois meses. Há quatro dias, apresenta edema de membros inferiores, progressivo e ascendente, mole, indolor, além de diminuição do volume urinário. Referia também fadiga muscular e astenia. Foi medicado com diversos anti-hipertensivos e encaminhado ao serviço de Nefrologia para melhor acompanhamento clínico, por apresentar nível de creatinina sérica de 5,3 mg/dL. No dia 21 de maio de 2014, foi internado para definição diagnóstica e conduta. Revisão de sistemas: referia urina espumosa há três anos e impotência sexual há quatro. Negava disúria, polaciúria, dispnéia, dor torácica e palpitação. História patológica pregressa:ao ser questionado sobre as doenças típicas da infância não soube informar quais teve. Apendicectomia aos 14 anos. Negou ter sido submetido a transfusões sanguíneas e alergia medicamentosa e alimentar. Refere ser diabético há dezoito anos, sempre em tratamento irregular. Inicialmente com antidiabéticos orais seguidos de insulinoterapia, sempre com controles glicêmicos inadequados. Hipertensão arterial mal controlada havia 13 anos. História familiar:paciente filho único, mãe diabética, pai diabético falecido de morte súbita aos 42 anos, avós paterno e materno diabéticos. História social:ex-tabagista, dez maços por ano, abstêmio havia 20 anos, negava uso de drogas ilícitas ou álcool. Sinais vitais: PA: 172 x 94 mmHg, frequência cardíaca: 99 batimentos por minuto (bpm); frequência respiratória: 23 incursões por minuto (irpm), temperatura axilar: 36,4 C. Exame físico geral:estado geral regular, consciente, orientado no tempo e no espaço, eupnéico, anictérico, acianótico, afebril, sem linfonodomegalias. Peso: 100 kg; altura: 1,73 m; índice de massa corporal (IMC): 33,4 kg/m 2. Mucosas: hidratadas, coradas. Pescoço: estase jugular ausente, tireóide de dimensões e textura preservadas, ausência de sopros carotídeos. Aparelho respiratório:exame normal. Aparelho cardiovascular:ritmo cardíaco regular, em dois tempos, com sopro sistólico em bordo esternal esquerdo alto de (3+/6+) e bulhas normofonéticas. Pulsos: palpáveis nos quatro membros e simétricos. Abdome: exame normal. Membros inferiores: edema frio importante em região maleolar bilateral, estendendo-se até a raiz da coxa, sem sinais inflamatórios. Exames laboratoriais: Glicemia: 206 mg/dL (valor de referência: normal até 99 mg/dL). Uréia: 121 mg/dL (valor de referência: 15 a 45 mg/dL). Creatinina: 5,3 mg/dL (valor de referência para sexo masculino: 0,8 a 1,6 mg/dL). Potássio: 5,0 mEq/L (valor de referência: 3,5 a 5,0 mEq/L. Sódio: 140 mEq/L (valor de referência: 135 a 145 mg/dL). Cálcio total: 8,6 mg/dL (valor de referência: 8,5 a 10,1 mg/dL). Fósforo: 5,4 mg/dL (valor de referência para adultos: 2,5 a 4,9 mg/dL). Albumina: 3,0 g/dL. (valor de referência:3,4 a 5,0 g/dL). Hemograma Série vermelha Resultado Referência Hematimetria 3,19 x 106/ mm3 4,2 a 5,4 x 106/ mm3 Hb (g/dL) 8,8 12,0 a 16,0 Hto (%) 25,6 37,0 a 47,0 VCM (fL) 82,0 80,0 a 98,0 CHCM (g/dL) 34,0 32,0 a 36,0 RDW: 14,7% Referência: 11,0 a 16,0 %. Série branca: leucócitos: 8.500.Referência: 5.000 a 10.000/mm3. Plaquetas: 287.000/mm3Referência: 150.000 a 450.000 /mm3. Gasometria arterial: Exame do paciente Valores de referência pH 7,31 7,35-7,45 pCO2 25mmHg 35-45 mmHg pO2 98mmHg 80 – 100 mmHg [HCO3-] 11mEq/L 22-26 mEq/L EAS: Cor.......amarelo Aspecto: .......turvo Volume urinário: ....... 40 mL Densidade: ....... 1020 pH: ....... 6,0 Pesquisa de elementos anormais: Leucócitos (esterase leucocitária) ....... negativo Proteínas.......350 mg/dL (++++) Nitrito.......negativo Glicose.......negativo Cetona.......negativo Urobiliogênio.......normal Bilirrubina.......negativa Hemoglobina.......(++) Sedimentoscopia: Células epiteliais.......raras Piócitos.......3 por campo Hemácias.......20 por campo Cilindros granulosos....numerosos Flora bacteriana normal Valores de referência: EAS Exame químico Sedimentoscopia - Densidade: 1.015 -1.022 - pH: 4.6 - 8.0 (media: 6.0) - Proteínas: <0.15 g/24 horas (+de ++++) - Glicose: Ausência - Cetona: 17 – 42 mg/dl (+ de++++) - Bilirrubina: Ausência - Urobilinogênio: 0.2 – 1.0 mg/dl (+ de ++++) - Nitrito: Negativo - Leucócitos/piócitos: 0 – 5/campo de 400 x - Hemácias: 0 – 2 / campo de 400 x - Células epiteliais: quantidade variável - Cilindros: até 2 hialinos/campo de 100 x - Cristais: quantidade variável Proteinúria de 24 horas: 18,56 gramas (valor de referência: menor do que 150 mg em 24h) Clearance (depuração) de creatinina em 24 horas: 14,1 mL/min (valor de referência: 80 e 120 ml/min) Eletrocardiograma: ritmo sinusal; freqüência cardíaca: 88 bpm. Sem alterações no eixo elétrico. Radiografia de tórax: área cardíaca pouco aumentada, campos pulmonares de aspecto normal, partes moles sem alterações significativas (Figura 1) Figura 1 Evolução: Houve melhora da pressão arterial em três dias, variando entre 140 x 90 mmHg e 130 x 80 mmHg, acompanhada de piora da função renal (creatinina: 6,2 mg/dL; uréia: 159 mg/dL, clearance de creatinina: 8,1 mL/kg/min). Em vista de o paciente não ter melhorado à terapia conservadora, programou-se realização de fístula arteriovenosa para tratamento dialítico em 10 dias e inserção do paciente em lista de transplante renal. PARTE 2 DO CASO CLÍNICO No entanto, antes mesmo de se realizar a fístula arteriovenosa, o paciente evoluiu com dispneia importante e palpitação retornando ao hospital para avaliação. Ao chegar ao prontosocorro estava taquipnéico, sudoréico e com esforço respiratório importante, quando foi diagnosticado com descompensação da insuficiência renal crônica. Ao exame físico: Sinais vitais:Saturação periférica de oxigênio (SpO2) de 89% em ar ambiente(normal acima de 94%), pressão arterial de 180x110 mmHg (normal 120x80 mmHg), FC: 110bpm (normal 60100bpm), FR: 30 irpm (normal até +ou- 20) e Tax: 36,5 °C Exame geral:Paciente em regular estado geral, orientado no tempo e espaço, com esforço respiratório, hipocorado (2+/4+), hidratado, anictérico, cianose periférica (1+/4+). CeP: Turgência jugular Tórax: Murmúrios vesiculares universalmente audíveis, presença de estertores subcreptantes bilaterais até terço médio do pulmão. ACV:Ritmo cardíaco regular, 2 tempos, taquicárdico, bulhas normofonéticas, presença de sopro sistólico(3+/6+) em borda esternal esquerda. Abdome: Globoso, com ruídos hidroaéreos presentes, timpânico, sem visceromegalias.MMII:Edema bilateral, mole, frio, 3+/4+, simétrico até altura de joelhos. Sabendo das comorbidades do paciente, e após a avaliação inicial, os médicos solicitaram uma radiografia de tórax, ECG, e exames laboratoriais onde o paciente apresentava as alterações em hemograma citadas anteriormente, no entanto, apresentava agora potássio sérico de 6,0 mEq/L. Foi iniciada macronebulização com oxigênio, obtendo-se melhora da saturação periférica, terapia com diurético e terapia apropriada para hipercalemia. Apesar das medidas tomadas o paciente não apresentou melhora do quadro clínico e laboratorial. Foi solicitada avaliação do nefrologista que indicou diálise de urgência, sendo assim posicionado um cateter venoso central em veia femoral direita para início do processo. O paciente permaneceu internado para compensação clínica e aguardando a realização da fístula arteriovenosa. No décimo dia de internação o paciente passou a apresentar febre de 38°C e calafrios e anormalidades no hemograma antes ausentes. Ao exame físico não foi notada nenhuma alteração sugestiva de um foco infeccioso que justificasse a febre, no entanto apresentava PA 100x60mmHg e FC de 110bpm. EAS realizado há 1 dia com resultado normal. Pensou-se na possibilidade de infecção associada ao cateter e foi iniciada antibioticoterapia empírica com vancomicina e piperacilina + tazobactan. Resultados dos exames complementares abaixo: 1)Hemograma: Hemograma Série vermelha Resultado 6 Referência 3 6 Hematimetria 3,19 x 10 / mm Hb (g/dL) 9,2 12,0 a 16,0 Hto (%) 28,3 37,0 a 47,0 VCM (fL) 83,0 80,0 a 98,0 CHCM (g/dL) 33,2 32,0 a 36,0 RDW: 13,7% 4,2 a 5,4 x 10 / mm 3 Referência: 11,0 a 16,0 %. 3 Série branca:Leucócitos: 13.500 Referência: 5.000 a 10.000/mm . Segmentados: 77% - 10.395Referência: 50 – 70% / 1.800 – 8.000 Bastões:10%-1.350Referência: 0 – 4% / 0,0 - 300 Linfócitos: 11% -1.485 Referência: 18 -36% / 1.000 – 3.000 Monócitos: 2%- 270 Referência: 2 -20% / 90 – 1.000 Basófilos: 0% - 0 Referência: 0 -1 %/ 0,0 - 100 3 3 Plaquetas: 247.000/mm Referência: 150.000 a 450.000 /mm . 2) Hemoculturas: Teste da catalase Frascos de hemocultura Gram Ágar manitol salgado Teste da coagulase em tubo Hemoculturas foram realizadas com amostras de sangue periférico e de cateter, com a de cateter tornando-se positiva 2h e 56 minutos antes da amostra de sangue periférico. Cresceu o mesmo microrganismo tanto a partir do sangue periférico quanto do cateter. Acima, o crescimento bacteriano no meio de cultura e os testes realizados, com os resultados obtidos. 4) Antibiograma: Após resultados dos exames foi retirado do esquema terapêutico a Piperacilina+ Tazobactam, mantendo a Vancomicina por 14 dias, e trocado o acesso venoso profundo. O paciente evoluiu com melhora clínica e laboratorial, sendo realizada fístula arteriovenosa e tendo alta. Aguarda agora em fila de transplante para tratamento definitivo. QUESTÕES FISIOLOGIA Com base no caso clínico, responda: 1- Sabe-se que a DRC é uma doença progressiva, lenta e com perda irreversível da função renal podendo permanecer assintomática por longos períodos até que o prejuízo na função renal seja suficiente para a manifestação dos sintomas. Sendo assim, responda com base no gráfico abaixo, porque é possível um paciente, em estágios iniciais da DRC, mesmo com prejuízo na função renal, manter os níveis de creatinina normais e como isto pode prejudicar ainda mais, a longo prazo, a função renal. 2 – A TFG (taxa de filtração glomerular) pode ser estimada avaliando a depuração (clearance) de creatinina. Neste sentido, conceitue TFG e como você espera que esta esteja no paciente do citado caso, justificando sua resposta por meio dos exames laboratoriais fornecidos. Sabese que creatinina é uma molécula filtrada (em maior proporção) e também secretada (menor proporção) e, por isso, não representa a TFG real. Justifique a afirmativa anterior dizendo se a TFG é subestimada ou superestimada ao utilizar a creatinina. Neste mesmo sentido, porque a uréia não é a molécula ideal para se fazer a estimativa da TFG. 3 – A análise do hemograma do paciente em associação com os seus dados clínicos permite que seja feito o diagnóstico de um importante distúrbio hematológico. Sobre este assunto, qual seria este distúrbio hematológico? Qual informação do hemograma permite a confirmação deste diagnóstico? Classifique-o com base nos índices hematimétricos e explique como ele provavelmente se estabeleceu. 4 – Explique, levando-se em consideração o gráfico abaixo, porque um ligeiro aumento da glicemia do paciente (concentração de glicose no sangue) poderia levar a detecção de glicose na urina através do EAS. Complemente sua resposta explicando o mecanismo de reabsorção de glicose pelos túbulos renais. 5- Os resultados da gasometria arterial apresentam uma informação relevante no que diz respeito à regulação ácido-básica no organismo do paciente. Na insuficiência renal crônica ocorre uma perda progressiva e irreversível da função renal, de tal forma que o pH encontra-se alterado em virtude dessas mudanças (pH = 7,31 para valores de referências entre 7,35 e 7,45). Com base no caso clínico e em seus conhecimentos sobre regulação ácido-básica, interprete os valores obtidos na gasometria (para pH, pCO2 e [HCO3-]) e discuta se a alteração do pH está acompanhada por uma resposta compensatória, justificando com base nos dados observados. 6- A análise da excreção de proteínas pela urina fornece um dado importante sobre a função renal. A presença de proteinúria foi evidenciada no exame de urina do paciente ao se encontrar 18,56 gramas de proteína na urina coletada em 24 horas (valor de referência: menor do que 150 mg em 24h). Explique o motivo da proteinúria exacerbada no paciente, a partir da fisiopatologia da doença, e discuta se há alguma complicação fisiológica decorrente desta perda de proteína na urina. QUESTÕES – MAD I De acordo com o caso clínico relatado anteriormente responda as questões abaixo. Questão 1 O diagnóstico final da complicação infecciosa apresentada por esse paciente foi ICSCVC. Considerando essa complicação referente ao uso de um cateter venoso profundo e os conceitos de assepsia e antissepsia, quais medidas devem ser tomadas durante a inserção e manuseio do dispositivo que ajudam a prevenir tal evento. Questão 2 Ao suspeitarem de ICS-CVC, a equipe médica que acompanhou o paciente decidiu por iniciar um esquema terapêutico empírico de amplo-espectro pensando nos germes que mais comumente causam esse tipo de doença. No entanto, busca-se a identificação do agente patogênico e a determinação do seu perfil de sensibilidade aos antimicrobianos para direcionaro tratamentoadequado, reduzir custos e evitar seleção de resistência bacteriana. Portanto, os médicos solicitaram hemoculturas, sendocolhidasamostras do sangue periférico e do cateter. De acordo com os resultados da cultura e antibiograma, qual o agente etiológico do caso acima. Explique, diferenciandodos principais patógenos envolvidos em ICSde acordo com as características microbiológicas evidenciadas nos testes. Questão 3 Os testes de sensibilidade aos antimicrobianos ou antibiogramas são indicados para bactérias que estejam causando um processo infeccioso e o seu perfil de susceptibilidade não seja possível de predizer. Diversos métodos podem ser realizados para determinar a susceptibilidade aos antimicrobianos e indicar a terapia apropriada. Em muitos laboratórios de microbiologia clínica, utiliza-se rotineiramente o método de disco-difusão ou difusão de disco. Com base nos resultados do antibiograma do caso clínico, quais antimicrobianos não poderão ser utilizados (mesmo aqueles que não foram diretamente testados). Explique a sua resposta. Questão 4 Em relação aoagente etiológico com perfil de resistênciaidentificado que foi responsável pelo caso de ICS-CVC acima, compare os tipos de infecçãoque mais causam em unidades de saúdee na comunidade?