Expressão e caracterização de HtrA de S. aureus, possível

Propaganda
Expressão e caracterização de HtrA de S. aureus, possível alvo vacinal e
terapêutico contra infecções estafilocócicas
Marcelo B. Zani1,2, e Ana Paula Mattos Arêas1,3
1
Centro de Ciências Naturais e Humanas (CCNH), Universidade Federal do ABC.
2
[email protected]
3
[email protected]
Palavras Chave: Staphylococcus aureus, HtrA, Caracterização
1. Introdução
Staphylococcus aureus é uma bactéria gram-positiva, colonizadora natural da microbiota humana,
presente nos tratos respiratório, gastrintestinal, urogenital e também da pele. A parede ainda possui diversas
proteínas (como coagulases e adesinas) relacionadas à manutenção desse microorganismo dentro do
hospedeiro, bem como sua patogenicidade (6), além de ainda apresentar um fator agravante para sua
patogenicidade, ela é dotada de uma cápsula polissacarídica bastante importante para a evasão da via de
fagocitose do sistema imune do hospedeiro (6). Infecções hospitalares adquiridas estão, em sua maioria das
vezes, relacionadas à S. aureus, ocorrendo principalmente em pacientes imunocomprometidos, como os que
acabaram de passar por cirurgias invasivas, transplantes ou implantes de próteses ou catéteres (11). Por ser
tão comum ao sistema do hospedeiro, é difícil evitar contaminações por essa bactéria, e está ficando cada vez
mais difícil o tratamento para S. aureus devido ao aparecimento de linhagens resistentes a antibióticos
(MRSA - resistente a Meticilina; VRSA – resistente a Vancomicina) (3), fazendo com que novos meios de
tratamento sejam desenvolvidos.
A família de proteínas HtrA (do inglês high temperature requirement A) é uma das famílias relacionadas
à manutenção celular de diversos organismos, como bactérias, fungos, protozoários, plantas e inclusive
mamíferos. As proteínas HtrA são proteases, estando envolvidas no processo de degradação de proteínas que
perderam parcial ou totalmente sua funcionalidade na célula, garantindo assim a homeostase celular (1).
Diferente de outras proteínas, as HtrA não precisam de ATP para realizar sua função, pois possuem um
domínio capaz de reconhecer proteínas que perderam sua conformação. Esse domínio (PDZ) além de
reconhecer essas proteínas, também as encaminha para o sítio de protease, o qual possui três aminoácidos
responsáveis pela degradação da proteína danificada: histidina, aspartato e serina (4, 8). O domínio PDZ
ainda é encontrado em diversas outras proteínas, estando relacionado muitas vezes à sinalização celular,
fazendo interação proteína-proteína (2).
S. aureus possui dois genes para HtrA, htrA1 e htrA2, os quais codificam as proteínas HtrA1 e HtrA2
respectivamente, e ambas proteínas mostraram ter papel fundamental na virulência desse microorganismo (7).
Essas proteínas possuem uma região transmembrana, um domínio de serino-protease, além do PDZ. Estudos
vêm mostrando que os genes para HtrA em S. aureus fazem parte de um regulon envolvido na resposta ao
estresse sofrido na parede celular, como a ação de antibióticos (10), além de contribuírem para a
patogenicidade através do controle da expressão de certos fatores extracelulares que são cruciais para a
disseminação da bactéria, como as Hemolisinas (7). Os autores especulam que as proteínas HtrA agem por
uma via de regulação dependente do gene agr (accessory gene regulator), envolvido no sistema de quorumsensing da bactéria, sugerindo que HtrA auxilia o correto enovelamento e/ou maturação de alguns
componentes de superfície do sistema agr.
O sistema quorum-sensing, altamente ligado à manutenção do biofilme (5) é uma sinalização célulacélula capaz de alterar a expressão gênica de cada bactéria. Para isso, as células bacterianas secretam
moléculas sinalizadoras chamadas autoindutoras, que sensibilizam outras células bacterianas transmitindo
informações principalmente sobre a densidade populacional. Dessa maneira a comunidade é capaz de
controlar sua densidade populacional de acordo com a viabilidade de nutrientes. Colônias estruturadas em
biofilmes são até mil vezes mais resistentes a antibióticos e microbicidas, além de estarem estimados em
mais de 65% das infecções bacterianas e serem um alto agravante nas infecções hospitalares (CDC, Centers
for Disease Control Prevention, 2005; 9). Não existe na literatura um estudo que caracteriza HtrA como um
possível alvo terapêutico, ou relacionada à formação de biofilme, sendo esta a hipótese e motivação desse
projeto.
O projeto ainda se encontra no inicio de desenvolvimento, sendo que está vinculado ao Edital 001/2009
(inicio em 01/08/2009 e termino em 31/07/2010) de iniciação científica, e tem como propósito no II-SIC da
UFABC receber críticas para melhor desenvolvimento nesse ano que se segue. O primeiro ano do projeto
consiste em expressar, purificar e caracterizar essas proteínas através de ensaios bioquímicos. Para isso, o
projeto terá etapas como busca bibliográfica, análise com ferramentas de bioinformática, treinamento para
manipulação de bactérias antes da realização da clonagem e daexpressão das proteínas.
2. Materiais e Métodos
Até o momento foram feitas buscas bibliográficas a fim de obter dados para o bom desenvolvimento do
projeto, além de análise quanto à composição de aminoácidos, pI (ponto isoelétrico), Massa Molecular e
domínios dessas duas proteínas. Os artigos procurados se concentravam em aspectos como a patogenicidade
da bactéria, caracterizações das duas proteínas de interesse, organização de colônias e biofilmes, e possíveis
papéis dessas proteínas. Para tal, foi utilizado o banco de dados do portal NCBI (Natinal Center of
Biotechnology Infomation, www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed). A análise das composições das proteínas foi
realizada através de ferramentas de bioinformática no portal ExPASy (Expert Protein Analysis System,
www.expasy.ch), onde a principal ferramenta usada foi o “ProtParam Tool”. Foi necessário realizar buscas
no banco de dados do UniProt (www.uniprot.org) para obter as seqüências das proteínas, onde também foi
feita a análise dos domínios (em especial do sítio catalítico).
Também foram realizados alinhamentos proteômicos através de ferramentas apresentadas no ExPASy,
T-Coffee, Muscle e ClustalW, sendo o último o mais utilizado por apresentar um enquadramento melhor
com os alinhamentos apresentados em outros trabalhos. A comparação das proteínas de interesse foi feita
com as HtrA de humanos (alvo da possível terapia), de E. coli (organismo em que serão expressas as
proteínas do trabalho) e também de S. pneumoniae (competidor natural da S. aureus no trato respiratório).
Esses alinhamentos são importantes para o desenvolvimento da possível vacina, a qual é a motivação do
projeto, e tem como objetivo verificar possíveis seqüências que não resultem em resposta contra as proteínas
de nosso próprio organismo ou de outros colonizadores naturais. Os parâmetros do programa foram todos
utilizados em “Default”, e as seqüências foram utilizadas em formato FASTA, obtidos no banco de dados do
UniProt (também possível obter através do NCBI).
3. Resultados e Discussão
Com a análise dos padrões das proteínas, foi possível inferir a composição de ambas as proteínas em
termos de pI, Massa Molecular (em kDa), número de aminoácidos, número de resíduos carregados negativa
e positivamente, coeficiente de extinção molar e índice de instabilidade, como mostrado na tabela 1, e pelos
alinhamentos feitos no ClustalW, pôde-se prever o quão parecido são as proteínas entre si, bem como a
comparação com as HtrA de E. coli, de humanos e de S. pneumoniae, como mostrado na tabela 2.
Tabela 1: Composição das HtrA de S. aureus.
424
Resíduos
Negativos
48
Resíduos
Positivos
57
Coef.
Extinção
0,315
Índice de
Instabilidade
24,00
769
126
121
0,467
32,59
pI
M.W.
N° aa
HtrA1
9,30
45,80
HtrA2
6,51
86,45
Tabela 2: Comparação das HtrA de S. aureus com outros membros da família, mostrado em porcentagem
DegP E.c.
DegQ E.c.
DegS E.c.
hHtrA1
hHtrA2
hHtrA3
hHtrA4
HtrA S.p.
HtrA1 S.a.
27
27
30
20
19
19
20
32
HtrA2 S.a.
20
19
24
12
12
14
14
18
O índice de instabilidade mostra se uma proteína é estável, sendo que proteínas com valores maiores que
40 são classificadas como instáveis. Foi observado então que ambas as HtrA são estáveis.
De acordo com a tabela 2 foi observado que todas as proteínas comparadas apresentam maior
similaridade com a HtrA1 da S. aureus, mesmo porque a HtrA2 apresenta um número de aminoácidos muito
maior que todas as outras (769, sendo que nenhuma outra ultrapassa 500) além de apresentar uma região de
410 aminoácidos do lado interno da membrana, a qual não parece ocorrer em nenhuma outra HtrA de
nenhuma outra espécie. Tal afirmação pode ser feita, pois foi realizado um alinhamento via BLAST pelos
portais do NCBI e ExPASy a fim de procurar no banco de dados uma seqüência similar. Não houve
similaridade com seqüências de nenhuma outra proteína. Foi observado também que as HtrA de humanos
apresentam os valores de score mais baixos, talvez por apresentarem ainda dois outros domínios além do
PDZ e de serino-protease, o Insulin-like Growth Factor Biding Protein (IGFBP) e o Kazal-like Inhibitor
Domain (KI).
Apesar de não mostrado na tabela 2, as HtrA da S. aureus apresentam uma similaridade de 28% entre si.
Os alinhamentos ainda permitiram observar em qual parte das proteínas ocorrem os maiores score, e foi
observado que os mesmos se encontram no domínio de serino-protease, principalmente na região do terceiro
aminoácido da trinca do sítio catalítico (o aminoácido serina).
4. Conclusão
A partir das pesquisas inferidas nesse trabalho, foi observado que a família de proteínas HtrA apresenta
um papel essencial na manutenção celular, além de apresentarem também, aparentemente, um forte papel
relacionado à virulência de bactérias, como em S. aureus. Essas proteínas são encontradas nos mais diversos
organismos, e apresenta um bom grau de conservação, notado pelos domínios de serino-protease (bem como
os aminoácidos de seu sítio catalítico) e PDZ. Ainda assim, apresentam certo grau de diferenciação ao longo
dos organismos, como observado nas HtrA de humanos, dotadas de domínios nunca antes apresentados.
Bibliografia
1. Clausen, T.; Southan, C. e Ehrmann, M. (2002) The HtrA Family of Proteases: Implications for Protein
Composition and Cell Fate. Molecular Cell, 10: 443-455.
2. Harris, B.Z. e Lim, W.A. (2001) Mechanism and role of PDZ domains in signaling complex assembly.
Journal of Cell Science, 114: 3219-3231.
3. Hiramatsu, K. (2001) Vancomycin-resistent Staphylococcus aureus: a new model of antibiotic resistence.
Lancet Infectious Disease, 1 (3): 147-155.
4. Kim, D.Y. e Kim, K.K. (2002) Structure and Function of HtrA Family Proteins, the Key Players in
Protein Quality Control. Journal of Biochimestry and Molecular Biology, 38 (3): 266- 274.
5. Miller, M.B. e Bassler, B.L. (2001) Quorum Sensing in Bacteria. Annual Reviews of
Microbiology. 55: 165-199.
6. Murray, P.R.; Rosenthal, K.S.; Pfaller, M.A.; “Microbiologia Médica”, 5°ed., Rio de Janeiro: Elsevier,
2006.
7. Rigoulay, C.; Etenza, J.M.; Halpern, D.; Widmer, E.; Moreillon, P.; Poquet, I. e Gruss, A. (2005)
Compartive Analysis of the Roles of HtrA-Like Surface Proteases in Two Virulent Staphylococcus
aureus Strains. Infection and Immunity. 73 (1): 563-572.
8. Spiers, A.; Lamb, H.K.; Cocklin, S.; Wheeler, K.A.; Budworth, J.; Dodds, A.L.; Pallen, M.J.; Maskell,
D.J.; Charles, I.G. e Hawkins, A.R. (2002) PDZ Domains Facilitate Binding of High Temperature
Riquirement Protease A (HtrA) and Tail-specific Protease (Tsp) to Heterologous Substrates through
Recognition of the Small Stable RNA A (ssrA)-encoded Peptide. The Journal of Biological Chemistry,
277 (42): 39443-39449.
9. Tortora, G.J.; Funke, B.R.; Case, C.L.; “Microbiologia”, 8°ed., Rio Grande do Sul: Artmed, 2005.
10. Utaida, S.; Dunman, P.M.; Macapagal, D.; Murphy, E.; Projan, S.J.; Singh, V.K.; Jayaswal, R.K. e
Wilkinson, B.J. (2003) Genome-wide transcriptional profiling of the response of Staphylococcus aureus
to cell-wall-active antibiotics reveals a cell-wall-stress stimulon. Microbiology, 149: 2719-2732.
11. Who website - http://www.who.int/vaccine_research/diseases/soa_bacterial/en/index4.html. Acessado em
03/05/2009.
Download