A Importância e as Consequências dos Princípios do

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A Importância e as Consequências dos Princípios do Contraditório e da
Ampla Defesa no Processo Administrativo
Josilene Guimarães Moroni 1
Danilo Vieira Vilela 2
“Sei que meu trabalho é uma gota no oceano, mas sem ele, o oceano seria menor.”
Madre Teresa de Calcutá
RESUMO
Este trabalho visa demonstrar a aplicação dos
princípios do contraditório e da ampla defesa nos
processos
administrativos
como
elementos
essenciais do devido processo legal, e como forma
de respeito ao princípio do Estado Democrático de
Direito. Para tanto utiliza pesquisa na doutrina
especializada, na Constituição Federal de 1988, na
legislação em vigor que regula o processo
administrativo e em jurisprudência recente publicada
pelos Tribunais nacionais. Ao final estabelece a
relação de importância dos princípios citados para o
alcance da justiça, sem a elevada discricionariedade
da Administração Pública, o que permite aos
servidores e administrados a certeza de verem seus
pleitos atendidos de forma eficaz e sem o abuso de
poder por parte do Estado, tendo em vista que a Lei
Maior colocou os princípios do contraditório e da
ampla defesa expressos em seu texto, o que faz com
que a Administração Pública tenha o dever de
observá-los e obedecê-los.
Palavras-chave:
administrativo.
Contraditório.
Ampla
defesa.
Devido
processo
legal.
Processo
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho teve como prioridade o estudo dos princípios do contraditório e da ampla
defesa dentro do processo administrativo. A aplicação destes princípios é cogente ao processo
penal, porém faz-se necessário a sua observância na esfera administrativa, pois sendo uma das
partes a Administração Pública, esta deve ser contida em sua discricionariedade, tendo em
1
Bacharel em Direito pela Universidade de Sorocaba – Uniso, 2011.
2
Professor orientador. Advogado. Bacharel em Direito e Mestre em Direito Obrigacional Público e Privado pela
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho - UNESP, Especialista em Direito Processual pela
Universidade do Estado de Minas Gerais, Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela UCDB e MBA
em Gestão Empresarial pelo UNESC. Professor dos cursos de graduação e pós-graduação em Direito no Centro
Universitário do Espírito Santo (UNESC) e no curso de graduação em Direito da Universidade de Sorocaba (UNISO). [email protected]
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vista o Brasil ter adotado como base de sua Constituição o princípio do Estado Democrático
de Direito.
Foram utilizadas pesquisas nas mais diversificadas doutrinas especializadas, em
jurisprudência editada pelos Tribunais nacionais, na Constituição Federal de 1988 e na lei
9.784/99, que rege o processo administrativo no âmbito federal, sendo aplicada
subsidiariamente nas esferas estadual e municipal.
O trabalho foi organizado passando pela evolução histórica do Direito Administrativo,
inclusive no Brasil, pois é esta a disciplina na qual está inserido o estudo do processo
administrativo. Foi demonstrada a diferença entre processo e procedimento tanto pela Teoria
Geral do Processo quanto pela doutrina de Direito Administrativo, bem como informados os
princípios constitucionais que regem a Administração Pública e também os aplicados aos
processos administrativos.
O objetivo alcançado foi demonstrar a importância dos princípios do contraditório e
da ampla defesa nos processos administrativos como corolários do devido processo legal,
inserido no texto constitucional como garantia fundamental a todos os indivíduos que buscam
a justiça tanto na via judicial quanto na via administrativa.
2 EVOLUÇÃO DO DIRETO ADMINISTRATIVO
2.1 Aspectos históricos do Direito Administrativo
O Direito Administrativo, como direito autônomo, nasceu em fins do século XVIII e
início do século XIX, porém é certo afirmar que existiam normas administrativas, uma vez
que existindo o Estado, existem órgãos encarregados do exercício de funções administrativas.
(PIETRO, 2011, p. 1)
Do período da Antiguidade, pouco se sabe ou se pode dizer, porém é certo afirmar que
na Antiguidade oriental (Índia, China, Assíria, Babilônia) predominava o traço teológico
como fundamento do poder supremo dos chefes, cujas ordens sempre eram cumpridas. Neste
diapasão, no poder de dar ordem, está a atribuição hierárquica, instituto do Direito
Administrativo. Na Antiguidade Clássica, precipuamente na Grécia, há a existência de
inúmeros institutos destinados à manutenção da ordem interna e à defesa das cidades contra
ataques externos, as cidades eram dotadas de serviços administrativos, havendo direitos e
deveres decorrentes da fruição por parte dos administrados. Em Esparta existiam servidores
encarregados da formação dos jovens, e em Atenas o destaque era a legislação concernente à
fiscalização dos dinheiros públicos, o que para alguns originou os Tribunais de Contas atuais.
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Em Roma, destaca-se a sua contribuição à organização dos Municípios, embora não tenham
alcançado grande desenvolvimento na área do Direito Público. (GASPARINI, 2011, p. 92)
Na Idade Média, sobressaem-se os períodos feudal e comunal, sendo que o primeiro
não ofereceu condições adequadas para o desenvolvimento de regras administrativas, já o
segundo desses períodos foi caracterizado pela Administração Comunal, que adotou os
preceitos da organização municipal romana. Surgem a responsabilidade pública, o sindicato e
as corporações de ofício. Embora não houvesse ambiente propício ao surgimento do Direito
Administrativo, em algumas obras de glosadores desse período, apontam-se a origem dos
atuais Direitos Constitucional, Administrativo e Fiscal, como por exemplo, a obra de Andrea
Bonello (1990 a 1275 d.C.), dedicada ao estudo dos três últimos livros do Código Justiniano,
que tinham sido deixados de lado, pois se dedicavam ao estudo de estruturas fiscais e
administrativas de um império que já não existia. (PIETRO, 2011, p. 2)
Na Idade Moderna, a Revolução Francesa, produziu grandes alterações sociais,
políticas e econômicas no país, que acabaram por influir na ordem jurídica. Passou-se ao
Estado de Polícia ou Absolutista para o Estado de Direito, consagrando-se o princípio da
tripartição do Poder, com o surgimento das funções legislativa, executiva e judiciária, em
razão da doutrina sistematizada por Montesquieu, e formula-se o princípio da submissão do
executivo à lei. O arbítrio cede à legalidade. (PIETRO, 2011, p.2)
O século XIX é conhecido como o período do surgimento e do início do
desenvolvimento do Direto Administrativo, sendo a França considerada seu país natal. Daí
afirmar que o Direito Administrativo nasceu das revoluções que acabaram com o velho
regime absolutista que vinha da Idade Média, contando com a contribuição do direito francês
para sua autonomia, principalmente após a elaboração jurisprudencial do Conselho de Estado
Francês, por meio do qual se construiu o Direito Administrativo. Da França, o Direito
Administrativo propaga-se pela Europa, e, depois, para o resto do mundo. (GASPARINI,
2011, p. 93)
2.2 Direito Administrativo Brasileiro
Semelhante ao que ocorreu na Europa continental, o Direito Administrativo não tem
origem no Brasil, como ramo autônomo, enquanto esteve sob o domínio da monarquia
absolutista, uma vez que no período do Brasil - Colônia aplicava-se a legislação lusitana, e
qualquer assunto que dissesse respeito a esse ramo do direito era objeto de estudo em obras
gerais de Direito Público dos autores portugueses.
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No período do Império, adotaram-se os princípios do Estado Liberal, sob influência do
direito francês. Em 11 de agosto de 1827, pela lei 2ª, são criados os cursos jurídicos e
instaladas as Faculdades de Direito de São Paulo e Olinda, porém em seus currículos ainda
não figurava o Direito Administrativo. A cadeira de Direito Administrativo foi criada em
1851, por meio do Decreto nº 608, de 16 de agosto de 1851, e aos professores dessas escolas
credita-se o trabalho de elaboração doutrinária do Direito Administrativo e a sistematização
de seus institutos, desenvolvidos e aprimorados pelos estudiosos que se seguiram. Em 1957
foi editada em Recife a primeira obra doutrinária, intitulada “Elementos de Direito
Administrativo Brasileiro”, de Vicente Pereira do Rego. Nesta época já havia uma
Administração Pública organizada, mas praticamente regida pelo direito privado.
(MARINELA, 2011, p. 13)
Com o advento do período republicano, a Administração Pública começa a agilizar-se
e afastar-se dos moldes do direito privado. A doutrina passou a sofrer influência do direito
estadunidense, onde os republicanos foram buscar o modelo para nossa Federação e para a
nossa primeira Constituição Republicana, daí em diante, inúmeras obras foram editadas,
demonstrando uma grande evolução para a disciplina. A Administração Pública passou a
submeter-se ao controle jurisdicional e a jurisprudência passou a desempenhar papel
importante na criação do direito, porém concernente aos princípios e às teorias, a influência
predominante foi a do direito francês, que aos poucos, diante da decisão de casos concretos e
da derrogação do Direito Privado antes aplicado à Administração, foi criando regime jurídico
próprio que por consequência acabou dando autonomia ao Direito Administrativo. (PIETRO,
2011, p. 20)
No Brasil, desde a implantação da República, foi adotado o sistema da jurisdição
única, que consiste no controle administrativo pela Justiça Comum, que é o da separação entre
o Poder Executivo e o Poder Judiciário, ou seja, entre o administrador e o juiz. As
Constituições posteriores (1934, 1937, 1946 e 1969) sempre afastaram a idéia de uma Justiça
administrativa coexistente com a Justiça ordinária e com essa diversificação entre a Justiça e a
Administração é inconciliável o contencioso administrativo, pois todos os interesses, quer do
particular, quer do Poder Público, sujeitam-se a uma única jurisdição conclusiva, que é a do
Poder Judiciário. Nesta seara, não é negado à Administração o direito de decidir, mas sim a
possibilidade de exercer funções materialmente judiciais, emprestando às suas decisões força
e definitividade próprias dos julgamentos judiciários. Portanto a Administração exerce
jurisdição por meio dos seus órgãos administrativos, mas não exerce funções judiciais, e suas
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decisões não tem caráter conclusivo para o Poder Judiciário, ficando sempre sujeitas a revisão
judicial. (MEIRELLES, 2011, p. 58)
As principais inovações no âmbito do Direito Administrativo foram introduzidas após
a Constituição de 1988, tanto pela adoção dos princípios do Estado Democrático de Direito,
quanto sob a inspiração do neoliberalismo e da globalização, do sistema da common law e do
direto comunitário europeu, que levaram à chamada Reforma do Estado, na qual está inserida
a Reforma da Administração Pública (Emenda Constitucional nº 19/98), e em consequência a
introdução de novidades no âmbito do Direito Administrativo. (PIETRO, 2011, p. 27)
3 CONCEITO GERAL DE PROCESSO E PROCEDIMENTO
O Estado tem como função o exercício da jurisdição para assegurar a eficácia do
direito no caso concreto e em última instância, sendo que para a concretização da função
jurisdicional foi criado o Poder Judiciário, ao qual, em regra, cabe o cumprimento da função
jurisdicional. Portanto para o exercício dessa função é necessário um instrumento, o processo,
por meio do qual se cumpre a função jurisdicional. Processo significa, etimologicamente,
marcha avante ou caminhada (do latim procedere = seguir adiante) e devido a isso foi
confundido por muito tempo com a simples sucessão de atos processuais (procedimento).
Porém apercebeu-se a doutrina de que o processo interliga os sujeitos processuais por meio de
uma força que justifica e motiva a prática dos atos de procedimento. Concluí-se, portanto, de
acordo com a definição de Rocha (2007, p. 185):
[...] processo é a série de operações praticadas pelos órgãos
judiciários, com a necessária participação das partes, tendentes a
realizar os direitos no caso concreto e em última instância, ou seja,
tendentes a cumprir a função jurisdicional.
Sendo o processo uma realidade material, que consiste numa cadeia de atos para a
produção de um efeito jurídico, percebe-se que o procedimento é o conjunto de normas que
disciplinam essa conduta ou atuação repetida de atos em que consiste o processo. “O
procedimento (aspecto formal do processo) é o meio pelo qual a lei estampa os atos e
fórmulas da ordem legal do processo.” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2009, p.
297)
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No entanto, o processo não é uma realidade apenas da área judicial. Como noção
jurídica, pode e deve ser estendida ao âmbito de outras funções do Estado, a administrativa e a
legislativa, tendo em vista que as funções estatais se desenvolvem por meio dessa estrutura
chamada processo, e mediante o emprego de diferentes procedimentos. As leis são elaboradas
através de um processo, chamado legislativo, e os atos administrativos resultam de uma
sucessão de atos, chamado processo administrativo. Os processos legislativos e
administrativos, por exemplo, são realizados por diferentes procedimentos, concluindo-se,
portanto, que o processo não é monopólio apenas da atividade jurisdicional. É por meio do
processo que as atividades estatais e também não estatais exercem seu poder, sendo
indispensável à função jurisdicional exercida com o objetivo de dirimir os conflitos e fazer
justiça de acordo com a aplicação do que determina a lei.
4 PROCESSO ADMINISTRATIVO
4.1 Conceito
Na conceituação de processo administrativo é necessário ter cuidado para demonstrar
a realidade contida nessa expressão, respeitando suas várias acepções. Em sentido amplo,
processo administrativo é o conjunto dos atos sistematizados e coordenados dos órgãos da
administração, cujo objetivo é a solução de um problema no âmbito da Administração.
Portanto pode ser encarado como um conjunto de regras que determinam os requisitos em
virtude dos quais a Administração deve exprimir sua vontade.
Neste sentido, observa-se o entendimento de Mello (2007, p. 466): “Processo
administrativo é uma sucessão itinerária e encadeada de atos administrativos que tendem,
todos, a um resultado final e conclusivo.”
Para existir o processo administrativo é necessário que haja uma sequência de atos
coordenados entre si. O caráter distinto do processo administrativo está no fato de que todos
os elementos e todas as manifestações de vontade que o compõem se concretizam em função
de um único interesse, o interesse público. É nele que ficam arquivados os atos
administrativos, e também onde as três funções essenciais do Estado se materializam. São
sujeitos do processo administrativo, no pólo ativo a Administração e no pólo passivo o
administrado ou o funcionário público, ambos com poderes para dar início ao processo.
Neste diapasão, portanto, é possível concluir que o processo administrativo é o
conjunto de atos preordenados e sucessivos destinados à produção de um ato ou decisão final,
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pertinente a função administrativa desempenhada pelo Estado, que solucione ou não algum
tipo de controvérsia, esclarecimento ou a concessão de um direito.
Dentro do processo administrativo são praticados vários atos administrativos, todos
destinados a um determinado fim. Tratando-se de edição de ato administrativo que não
dependa da manifestação do administrado ou do funcionário público, o processo é fase
unilateral, preparatória e vinculante do ato, como iniciativa do Estado. Tratando-se de edição
de ato administrativo que envolve administrado ou funcionário público, tem-se o processo
administrativo disciplinar, penal ou civil. É operação bilateral, onde figura o devido processo
legal.
4.2 Processo e procedimento administrativo
Em primeiro lugar é necessário verificar que não se deve confundir processo com
procedimento, tendo em vista que o primeiro é instrumento utilizado para o exercício da
função administrativa e o segundo é o conjunto de formalidades que devem ser observadas
para a prática de certos atos administrativos.
Para ilustrar segue a definição de Meirelles (2011, p. 734):
Processo e procedimento - Processo é o conjunto de atos coordenados
para a obtenção de decisão sobre uma controvérsia no âmbito judicial
ou administrativo; procedimento é o modo de realização do processo,
ou seja, o rito processual.
Os procedimentos desenvolvem-se dentro de um processo administrativo, portanto não
há processo sem procedimento. A lei nem sempre estipula procedimentos a serem observados
necessariamente pela Administração, portanto ela é livre na escolha da forma utilizada para
atingir seus objetivos, consoante a natureza da questão a decidir e os objetivos da decisão. O
que a lei estabelece são sucessões de atos preparatórios que devem obrigatoriamente preceder
a prática do ato final. Este é o procedimento.
O processo é instrumento indispensável para a função administrativa, pois é por meio
dele que a Administração se manifesta, como já visto. A litigância é o que distingue o
processo do procedimento, tendo em vista que no processo administrativo os princípios
constitucionais, tais como o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório devem
estar assegurados e serem observados.
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Pode-se extrair das diversas conceituações acerca de processo e procedimento um
resumo bem simples: Procedimento é o rito, que somado a litigância tem-se o processo, e não
existe processo sem procedimento, mas pode existir procedimento sem processo.
4.3 Finalidades do processo administrativo
Os objetivos do processo administrativo foram se ampliando à medida que as funções
do Estado e da Administração foram se alterando. Como espécie do processo, em geral, o
processo administrativo tem como foco um determinado fim, que é o pronunciamento final de
uma decisão concreta da Administração, um ato administrativo que consubstancie norma
vigente.
A atividade administrativa, para qualificar-se como legítima, deve obedecer a
determinados parâmetros, ou seja, está disciplinada em sua atuação, e o processo
administrativo visa fornecer garantia jurídica aos administrados, sejam estes particulares ou
servidores, uma vez que tutela direitos que o ato administrativo pode afetar. Está é a função
garantista do processo administrativo.
Dentro do processo administrativo, seus sujeitos apresentam argumentos e provas, e
desta forma contribuem para determinação do fato ou da situação objeto do processo. O
processo administrativo direciona-se à realização da justiça não só pelo contraditório e pela
ampla defesa, com os quais contam os indivíduos figurantes do pólo passivo da relação
processual, mas também por dar condições de sopesar os diversos interesses envolvidos em
determinada situação. A adoção do processo administrativo é medida indispensável à atuação
da Administração Pública, visando gerar uma condição de estabilidade social que é
compatível com o Estado Democrático de Direto. (MEDAUAR, 200, p. 196)
Nesta seara pode-se visualizar a aproximação entre Administração e cidadãos,
mediante contribuição individual ou coletiva de sujeitos no processo administrativo. Há a
sistematização de atividades da administração e em contrapartida há o conhecimento, por
parte do administrado, do modo de realização destas atividades.
A colaboração dos sujeitos e o conhecimento do modo de atuação da Administração,
decorrentes da relação jurídica processual, facilitam o controle por parte da sociedade, do
Poder Judiciário e dos entes que fiscalizam as atividades da Administração.
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5 FONTES DO PROCESSO ADMINISTRATIVO E COMPETÊNCIA PARA
LEGISLAR
5.1 Fontes do processo administrativo
Algumas normas servem como fontes para fundamentar o processo administrativo,
dentre as quais a mais importante é a Constituição Federal, que estabelece as bases do Direito
Administrativo.
Podem-se citar algumas leis federais que abordam o assunto, como por exemplo, a Lei
9.784/99 (norma geral de processo) e a Lei 8.112/90, que disciplinam o regime jurídico dos
servidores e também o processo administrativo disciplinar.
Os princípios gerais do direito e os princípios do Direito Administrativo também estão
na base do processo administrativo, além de se aplicar subsidiariamente os Códigos Civil, de
Processo Civil, Penal e de Processo Penal.
Devido à falta de codificação da matéria Direito Administrativo a doutrina e a
jurisprudência encontram dificuldades em uniformizar a sua construção, gerando assim
algumas dificuldades para o Estado suprir tal deficiência legislativa.
5.2 Competência para legislar
Por ser o processo administrativo instituto do Direito Administrativo, portanto matéria
administrativa, qualquer das pessoas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios)
pode legislar sobre o tema. Nesta matéria, não há que se falar em legislação federal que
submeta os Estados, o Distrito Federal e os Municípios às suas disposições, sob pena de ferir
o princípio da autonomia de seus serviços.
A Lei federal 9.784/99, por exemplo, estabelece normas básicas sobre o processo
administrativo no âmbito da Administração Pública federal direta e indireta, estendendo sua
aplicabilidade aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário, quando no desempenho de sua
função administrativa. Nesta seara pode-se citar a Lei 10.177/98, do Estado de São Paulo que
também disciplina a matéria no âmbito da Administração Pública estadual centralizada e
descentralizada, e embora não tenha estendido expressamente a sua aplicabilidade aos
Poderes Legislativo e Judiciário, a lei também é aplicável a esses poderes quando no exercício
de função administrativa.
Cabe mencionar que, segundo jurisprudência consolidada do Superior Tribunal
Federal, em se tratando de ausência de lei específica, poderá ser aplicada subsidiariamente a
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Lei 9.784/99 no âmbito dos Estados, tendo em vista que o direito processual administrativo
carece de ampla legislação e a existente data-se de pouco tempo.
6 PRINCÍPIOS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO
6.1 Noções e relevância dos princípios
Os princípios são fontes do direito e em alguns ramos do direito, como no caso do
Direito Administrativo, tem maior usualidade. Os princípios constituem as bases nas quais os
institutos e normas jurídicas se respaldam. São regras gerais que servem para orientar a
compreensão do ordenamento jurídico, norteando assim sua aplicação e elaboração de outras
normas e disciplinando um número indeterminado de situações que não podem ser
especificamente previstas pelo legislador. Segundo a definição de Mello (1991, p. 299 e 300):
Princípio – já averbamos alhures – é, por definição, mandamento
nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição
fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o
espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e
inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do
sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido
harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção
das diferentes partes componentes de todo unitário que há por nome
sistema jurídico positivo.
A atividade da Administração Pública, que é disciplinada em grande parte pelo Direito
Administrativo, observa princípios gerais e específicos, inclusive para a atuação e a
tramitação do processo administrativo.
Na dicção de Meirelles (2011, p. 88):
[...] por esses padrões é que deverão se pautar todos os atos
administrativos e atividades administrativas de todo aquele que exerce
o poder público. Constituem, por assim dizer, os fundamentos da ação
administrativa, ou, por outras palavras, os sustentáculos da atividade
pública. Relegá-los é desvirtuar a gestão dos negócios públicos e
olvidar o que há de mais elementar para a boa guarda e zelo dos
interesses sociais.
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Aplicáveis são os princípios previstos na Constituição Federal de 1988 a todos os atos
da Administração Pública, além dos princípios presentes na Lei 9.784/99 de 29/01/1999, em
outras leis esparsas que fazem referência a determinados princípios específicos de
determinados processos e na doutrina, sejam eles explícitos ou implícitos.
A Constituição Federal de 1988 inovou ao trazer escrito o seguinte na primeira parte
do caput do artigo 37:
Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência [...].
Além dos princípios fixados no artigo 37 da Constituição Federal, serão objeto de
análise também outros princípios contidos em seu texto, os quais se prestam para aplicação
cogente à Administração Pública em suas decisões, em seus atos administrativos e nos
processos administrativos.
Cabe mencionar que a Lei 9.784/99 determina em seu artigo 2º que “A Administração
Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação,
razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
interesse público e eficiência”, além de determinar em seu parágrafo único que nos processos
administrativos devem ser observados critérios que assegurem a aplicação dos princípios da
Administração Pública.
Além disso, outras leis esparsas fazem referência a determinados princípios
específicos utilizados em outros processos, como, por exemplo, a Lei 8.666/93, que trata
sobre licitação e contrato, entre outras.
Ressalvados os princípios específicos de determinados processos, seguem comentários
aos demais princípios constitucionais e legais já referidos, que informam o Direito
Administrativo.
6.2 Tipologia
6.2.1 Princípios constitucionais da Administração Pública aplicados aos processos
administrativos
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a) Princípio da legalidade e princípio da finalidade
O princípio da legalidade nasceu com o Estado Democrático de Direito, juntamente
com o controle da Administração pelo Poder Judiciário, constituindo assim uma das principais
garantias de respeito aos direitos individuais.
Os atos praticados no exercício da função administrativa devem ser expressamente
autorizados por lei, tendo em vista o interesse da coletividade que se representa. Desse modo,
a validade e a eficácia das atividades administrativas ficam condicionadas à observância da
norma legal. Porém é necessário ressaltar, seguindo o entendimento da obra de Marinela
(2011, p. 31):
[...] a exata compreensão do princípio da legalidade não exclui o
exercício da atuação discricionária do administrador, levando-se em
consideração a conveniência e a oportunidade do interesse público, o
juízo de valor da autoridade e a sua liberdade.
Portanto a legalidade não afasta a liberdade, a discricionariedade do administrador.
Atualmente a jurisprudência reconhece o princípio da legalidade em sentido amplo, ou seja, a
sua aplicação está condicionada tanto à observância da lei quanto das regras constitucionais, o
que permite o controle da legalidade de um ato e sua revisão em face de qualquer espécie
normativa.
O princípio da finalidade é inerente ao princípio da legalidade, pois o administrador
deve atender ao propósito da norma como elemento da própria lei. No processo
administrativo, a finalidade de sua existência decorre de razões específicas, a saber, segundo o
entendimento de Gasparini (2011, p. 1073):
[...] o processo administrativo tem por finalidade específica o registro
de ato da Administração Pública, o controle da conduta dos seus
agentes e administrados, a compatibilização do interesse público e
privado, a outorga de direitos, e a solução de controvérsias entre a
Administração Pública e seus agentes ou administrados.
b) Princípio da motivação
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O princípio da motivação tem por objetivo a fundamentação dos atos praticados pela
Administração Pública, indicando a norma jurídica utilizada como base para determinada
decisão. No caso do processo administrativo a motivação é a indicação dos fatos que levaram
a Administração a agir.
A Constituição oferece como fundamento para a exigência da motivação o artigo 5º,
inciso XXXV, que assegura a análise pelo Poder Judiciário de qualquer lesão ou ameaça a
direito. “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”
Porém só é possível esse controle se forem conhecidas as razões do ato para que o juiz possa
verificar se o administrador obedeceu às regras legais e os princípios constitucionais. Além
disso, o artigo 93, inciso X, da Constituição estabelece o dever do Poder Judiciário de motivar
suas decisões administrativas, sendo que esta regra deve ser aplicada por analogia aos demais
Poderes em razão do princípio da isonomia, que não permite tratamento diferenciado quando
se trata do exercício da mesma função administrativa.
A lei 9.784/99 no seu artigo 2º, inciso, VII, estabelece que devem ser indicados os
pressupostos de fato e de direito que motivaram a decisão, e no seu artigo 50, determina a
obrigatoriedade de motivação para um rol amplo de atos administrativos:
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação
dos fatos e dos fundamentos jurídicos [...]
§ 1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo
consistir em declaração de concordância com fundamentos de
anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste
caso, serão parte integrante do ato. [...]
Neste sentido observa-se a seguinte orientação jurisprudencial:
[...] 1. O motivo é requisito necessário à formação do ato
administrativo e a motivação, alçada à categoria de princípio, é
obrigatória ao exame da legalidade, da finalidade e da moralidade
administrativa. [...] (AgRg no RMS 15350/DF, Rel. Min. Hamilton
Carvalho, DJe: 08.09.2003, p. 367)
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A motivação deve ser prévia ou contemporânea à prática do ato, lembrando que sua
ausência pode ensejar em ilegalidade do ato administrativo decorrendo esse fato até mesmo à
sua anulação.
c) Princípio da razoabilidade e princípio da proporcionalidade
Pelo princípio da razoabilidade, exige-se que a atuação dos administradores públicos
seja de forma corrente, lógica e ponderada, mantendo certo padrão do razoável. Não pode o
administrador, a pretexto da lei, agir com excessos ou manter condutas insensatas. Já pelo
princípio da proporcionalidade, exige-se o equilíbrio entre os prejuízos e benefícios obtidos
com a prática do ato, além da proporção entre os atos e as consequentes medidas.
Ambos os princípios estão implícitos no texto constitucional, mas estão expressos na
norma infraconstitucional, como na lei 9.784/99, que assim dispõe sobre o princípio da
razoabilidade: “Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse
público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser
convalidados pela própria Administração.”
Já sobre o princípio da proporcionalidade, a referida lei, menciona, na segunda parte
do inciso VI, do artigo 2º, os dizeres de que a Administração Pública não pode impor
“obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao
atendimento do interesse público”.
Os dois princípios, portanto, representam limites à liberdade da Administração
Pública, inibindo a utilização abusiva da discricionariedade, que deve ser condicionada ao que
é razoável e proporcional, além de significar controle de legalidade me sentido amplo,
podendo, por isso, ser realizado pelo Poder Judiciário.
d) Princípio da moralidade e princípio da probidade
Este princípio determina que a Administração Pública deve ter comportamento lícito e
consoante com a moral e os bons costumes, observando as regras de boa administração e os
princípios de justiça e equidade. Além de estar previsto no artigo 37, caput, e artigo 5º, inciso
LXXII, da Constituição Federal, a lei 8.666/93 faz referência à moralidade e à probidade,
tendo em vista que a primeira ainda constitui um conceito vago e indeterminado, cuja esfera
de comportamentos ainda não foi absorvida pelo direito, enquanto a probidade tem contornos
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definidos e positivados em lei, sendo que a Constituição estabelece sanções para punir
servidores que nela incidem, conforme dispõe o artigo 37 § 4º:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]
§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão
dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade
dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas
em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
e) Princípio da segurança jurídica
A Administração Pública, para o devido atendimento às suas finalidades, reveste-se de
poderes e prerrogativas próprias, porém não pode desrespeitar os direitos fundamentais dos
indivíduos, sob pena de nulidade insanável do ato praticado. O princípio da segurança
jurídica, que informa a conduta estatal, está dentre os princípios garantidores do Estado
Democrático de Direito, ocupando lugar de destaque para assegurar a dignidade da pessoa
humana e a estabilidade nas relações sociais.
Prevê a manutenção do que já foi praticado, respeitando assim o conceito de direito
adquirido, sendo que se o ato foi praticado tendo lei que o amparasse, a mudança da lei não
pode interferir na qualidade do mesmo nem obrigar que seja repetido a partir da modificação
da lei. Para ilustrar segue entendimento de Veloso (2010, p. 94):
A partir da modificação da lei ou da interpretação da lei preexistente, a
prática do ato deve ser de acordo com as novas determinações.
Apenas, para garantia do que já foi feito, se foi feito por agente capaz
e autorizado para o cargo, não se deve mexer, alterar, reinterpretar o
que já foi decidido pela autoridade anterior, sob a lei anterior ou sob
interpretação pretérita de uma lei que ainda existe.
Outro não é o entendimento do disposto no artigo 2º da lei 9.784/99, que determina a
obediência ao princípio da segurança jurídica, devendo o administrador interpretar a norma
administrativa “da forma que melhor garanta o atendimento ao fim público a que se dirige”,
vedando assim aplicação retroativa de nova interpretação. O conceito de segurança jurídica
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vem definido em seu artigo 55, nos seguintes termos: “Art. 55. Em decisão na qual se
evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros os atos que
apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração.”
A segurança jurídica faz mais do que cumprir o princípio da legalidade, garante ao
administrado a boa-fé e a moralidade administrativa como atos válidos. Em distinção ao teor
do mencionado artigo aos princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, deve-se
relembrar que a convalidação do ato anteriormente praticado é em obediência ao princípio da
segurança jurídica, sendo que se o ato é atual e contém vícios sanáveis, a sua convalidação
atende ao princípio da razoabilidade.
Independente do âmbito de aplicação da lei nº 9784/99, faz-se mister ressaltar a função
garantidora do processo administrativo, que é vislumbrada por Medauar (2000, p. 195):
O processo administrativo vem finalizado à garantia jurídica dos
administrados (particulares e servidores), pois tutela direitos que o ato
administrativo pode afetar. Isso porque a atividade administrativa tem
de canalizar-se obrigatoriamente por parâmetros determinados, como
requisito mínimo para ser qualificada como legítima. No esquema
processual o cidadão não encontra ante si uma Administração livre, e
sim uma Administração disciplinada na sua atuação.
f) Princípio da supremacia do interesse público sobre o particular e princípio da
indisponibilidade do interesse público
Estes são os dois princípios que regem o regime jurídico da Administração Pública.
Pelo princípio da supremacia do interesse público, não pode o administrador dispor
livremente do interesse público, tendo em vista que não representa os seus próprios interesses
quando atua, mas sim os interesses da coletividade. Deve agir sempre de acordo com o que
determina a lei. Pelo princípio da indisponibilidade do interesse público é conferido ao
administrador público um conjunto de privilégios jurídicos, pois ele representa a coletividade,
sendo que a Administração está em posição de superioridade em relação ao particular, tendo
em vista que busca a satisfação do interesse público, enquanto que o particular busca a
satisfação dos próprios interesses. Pode-se dizer que este princípio é uma espécie de inibidor
do princípio da supremacia do interesse público.
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g) Princípio da impessoalidade e princípio da publicidade
Pelo princípio da impessoalidade, é imposta aos administradores públicos a exclusão
de divulgação pessoal nas realizações feitas pela Administração. Também é ilícito ao
administrador carregar o órgão para a realização de interesses particulares, como, por
exemplo, o favorecimento a amigos e particulares em cargos públicos (exceção feita apenas
para os classificados como “cargos de confiança”, permitidos pela constituição). Quem age
sempre é a Administração, momentaneamente dirigida por determinadas pessoas. Quem age
não são as determinadas e passageiras pessoas. A realização de concursos públicos é um dos
maiores exemplos de impessoalidade, pois dá a todos a oportunidade, se capacitado, de
ocupar os órgãos da Administração Pública. (VELOSO, 2010, p. 66)
Segue a disposição do artigo 37, § 1º, da Constituição Federal acerca do princípio da
impessoalidade:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]
§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas
dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de
orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou
imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou
servidores públicos.
Embora fale de publicidade, na realidade esta tem o sentido de propaganda e não da
obrigação da divulgação dos atos oficiais. E a propaganda deve sofrer restrições, em
observância ao princípio da impessoalidade, para não promover pessoas com dinheiro
público.
No caso do princípio da publicidade, os atos administrativos é que devem ser públicos.
A Administração Pública deve dar a todos a oportunidade de tomarem conhecimento dos
procedimentos que podem permitir que participem efetivamente dos serviços públicos, para
que todos possam fornecer produtos e serviços à Administração e para que todos tenham
conhecimento das leis, dando a oportunidade de benefícios e evitando multas pelo
descumprimento das leis.
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A publicidade, neste caso, é meio para conseguir o cumprimento do princípio da
impessoalidade, levando ao conhecimento de todos os atos da Administração, contratos ou
instrumentos jurídicos como um todo. Conferindo transparência e a possibilidade de qualquer
pessoa questionar e controlar toda a atividade administrativa, não justificando, em regra, o
sigilo. Pode, em determinados casos, como os elencados no artigo 5º da Constituição e em
outras leis infraconstitucionais esparsas, relativizar esse princípio em razões de segurança da
sociedade e do Estado e na defesa da intimidade ou do interesse social.
h) Princípio da eficiência e princípio da celeridade
Por este princípio entende-se que o Estado deve estar aparelhado com servidores bem
preparados, já que o servidor público, como o próprio nome diz, deve cumprir as suas funções
para satisfação do interesse do público, sem descumprir as regras a que são submetidos, pois
não estão sujeitos à impunidade e à eterna estabilidade. As sanções civis, penais e
administrativas tentam coibir a ineficiência e a negligência do servidor, que porventura cause
danos aos administrados ou aos cofres públicos, tendo em vista que ao Estado são reservados
os serviços essenciais ou mesmo monopolizados, sem a possibilidade do administrado
procurar por outro prestador do mesmo serviço. Por isso a eficiência dos servidores públicos é
o mínimo de direito que o administrado tem.
O erro do agente público obriga o Estado a indenizar a vítima que procurar pela
justiça, segundo termos do artigo 37 § 6º da Constituição Federal:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus
agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Outro princípio que é parte integrante do princípio da eficiência é o princípio da
celeridade. Por meio deste princípio, deve ser assegurada a todos a razoável duração do
processo, seja no âmbito judicial ou administrativo. Este princípio está expresso na
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Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, regra introduzida pela Emenda
Constitucional nº 45/04, intitulada “Reforma do Poder Judiciário”.
O princípio da celeridade é elemento básico na institucionalização das normas
processuais, e se expressa pelo princípio da oficialidade, sem prejuízo da atuação dos
interessados e pela fixação de prazos rígidos que podem agilizar o feito. Deve-se aplicar o
princípio da economia processual, considerando que o processo é instrumento para aplicação
da lei, de forma que as exigências a ele concernentes devem ser adequadas e proporcionais ao
fim que se pretende atingir.
A celeridade é fundamental no processo administrativo, igualmente à obediência a
todos os princípios já elencados, pois é difícil imaginar devido processo legal, com efetivo
contraditório, legalidade e finalidade da lei se isso não acontece, sendo a lentidão processual
incompatível com a proteção do interesse público, o que jamais permitirá o exercício da
verdadeira ampla defesa.
6.2.2 Princípios infraconstitucionais aplicados aos processos administrativos
a) Princípio da oficialidade e princípio da autotutela
Este princípio atribui a movimentação do processo administrativo sempre à
Administração, mesmo que instaurado por provocação do particular, sendo que uma vez
instaurado, cabe ao Poder Público a obrigação de dirigir, ordenar e impulsionar o processo de
tal forma a esclarecer ou resolver adequadamente a questão posta. A Administração não deve
postergar o seu andamento sob pena de infringir o princípio da oficialidade, e seus agentes
podem ser responsabilizados pela omissão. A instância não perime e nem o processo se
extingue pelo decurso do tempo, salvo se a lei expressamente o estabelecer.
Pelo princípio da autotutela, a Administração tem a possibilidade de rever seus atos
quando ilegais por meio de anulação e de revogá-los quando inconvenientes e inoportunos,
utilizando a revogação. Estas hipóteses estão consolidadas nas Súmulas nº 346 e 473, do
Supremo Tribunal Federal, e em algumas decisões da casa, como se observa:
[...] I - Em razão do poder de autotutela, a administração Pública pode
declarar a nulidade de seus próprios atos, quando eivados de vícios
que tornem ilegais, ou revogá-los, por motivo de conveniência e
oportunidade. II - Agravo regimental improvido (RMS25596/DF, STF
- Primeira Turma, Rel. min. Sepúlveda Pertence, julgamento:
01.04.2008, DJe: 104, 04.06.2009).
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b) Princípio da legalidade objetiva
Este princípio informa que o processo administrativo deve ser instaurado com base e
para a preservação da lei. Todo processo administrativo deve embasar-se em norma legal
específica para apresentar-se com legalidade objetiva, sob pena de invalidade. A Lei 9.784/99
impõe em seu artigo 2º, parágrafo único, incisos I e II, a observância deste princípio:
Art. 2º A administração Pública obedecerá, dentre outros, aos
princípios da legalidade [...]
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados,
entre outros, os critérios de:
I – atuação conforme a lei e o Direito;
II – atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou
parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;
c) Princípio da verdade material
Este princípio autoriza a Administração a valer-se de qualquer prova lícita de que a
autoridade processante julgadora tenha conhecimento, sendo que pode conhecer de novas
provas até o julgamento final, mesmo que decorrentes de outro processo ou de fatos
supervenientes que comprovem as alegações colocadas em discussão, diferente do que ocorre
no processo judicial, onde o juiz deve se cercar apenas das provas indicadas pelas partes no
devido tempo. Há certo desentendimento doutrinário quanto à busca da verdade formal ou da
verdade material (real), sendo defendida a aplicação da verossimilhança, que representa a
maior aproximação da verdade, porém a doutrina tradicional de Direito Administrativo
defende que a verdade real é a que deve ser adotada, apesar das críticas dos processualistas
mais modernos.
d) Princípio do informalismo
O processo administrativo é informal em todas as suas espécies no sentido de que não
é exigido rito especial para o seu desenvolvimento. As normas de observância obrigatória são
as que proporcionam garantir a segurança dos procedimentos, a comprovação, a qualquer
tempo, do cumprimento dos princípios da Administração Pública e a formação de feitos que
fique à disposição principalmente do o administrado. O informalismo busca beneficiar o
administrado e não a Administração, segundo disposição do artigo 22 da Lei 9.784/99: “os
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atos do processo administrativo não dependem de forma determinada, senão quando a lei
expressamente a exigir”. Existe o informalismo para o administrado e o formalismo para a
Administração, porém se a lei impuser uma forma ou uma formalidade, esta deverá ser
atendida, sob pena de nulidade do procedimento, principalmente se da inobservância desta
imposição resultar prejuízo para as partes.
e) Princípio da garantia de defesa
Por este princípio deve-se entender a observância do rito adequado, a cientificação do
processo ao interessado, por meio que assegure a ciência do mesmo, sob pena de lesão ao
contraditório e a ampla defesa, além da oportunidade de contestar a acusação, produzir prova
do seu direito, acompanhar os atos da instrução e utilizar-se dos recursos cabíveis. O princípio
da garantia de defesa está assegurado no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal,
juntamente com a obrigatoriedade do contraditório, como decorrência do devido processo
legal. Processo administrativo sem oportunidade de defesa ou com defesa cerceada é nulo, de
acordo com o que tem decidido nossos Tribunais judiciais, corroborando a aplicabilidade do
princípio do devido processo legal e também do princípio da garantia de defesa
(MEIRELLES, 2011, p. 740 e 741)
Neste entendimento, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula vinculante nº 21,
que diz ser “[...] inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro
ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.” (ADI 11.976-7-DF, RE 389.383 e
RE 390.513)
7 O CONTRADITÓRIO E A AMPLA DEFESA COMO COROLÁRIOS DO DEVIDO
PROCESSO LEGAL
7.1 O surgimento do Estado Democrático de Direito
O conceito, origem e evolução do Estado podem ser apontados histórica e
sistematicamente, abstraindo-se de sua formação. Mas a verdadeira extração científica
daquele conceito e a definição do caráter do Estado não podem prescindir dos dados
históricos e das investigações técnicas que conseguiram situar o Estado na sistemática
jurídica.
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O Estado é resultado de lenta e gradual evolução organizacional de poder, que não se
confunde com as formas de agrupamentos antigas como, por exemplo, o Estado egípcio, o
Estado medieval, o Estado feudal, entre outros. O surgimento do Estado, tal como se conhece
hoje, ocorreu no século XV, e em virtude da sua estruturação é definido, de acordo com
Moraes (2011, p. 2 apud Miranda, 1948, p. 39) como “o conjunto de todas as relações entre os
poderes públicos e os indivíduos, ou daqueles entre si.”
São várias as teorias que justificam a sua existência e outras tantas outras para
pretender justificar os seus fins, portanto tais teorias são complementares, tendo em vista que
o Estado sempre almeja fins, ainda que difusos, que são definíveis e mutáveis, e para o
pensamento político-constitucional trata-se de categoria estruturante. Portanto, na definição de
Moraes (2011, p. 3):
O Estado é forma histórica de organização jurídica limitado a um
determinado território e com população definida e dotado de
soberania, que em termos gerais e no sentido moderno, configura-se
em um poder supremo no plano interno e num poder independente no
plano internacional.
O constitucionalismo, neste contexto histórico, surge com o Estado, também com a
função de racionalização e humanização, trazendo consigo a necessidade da proclamação de
declarações de direitos. O Estado de Direito é consagrado com o constitucionalismo liberal do
século XIX e o Estado Constitucional configura-se, portanto, como uma das grandes
conquistas da humanidade, pois para ser um verdadeiro Estado de qualidades no
constitucionalismo moderno, deve ser um Estado Democrático de Direito. O Estado
Democrático de Direito, caracterizador do Estado Constitucional, significa que o Estado pode
reger-se por normas democráticas, com eleições livres, periódicas e pelo povo, bem como o
respeito das autoridades públicas aos direitos e garantias fundamentais, e o Estado
Constitucional, além de ser Estado de Direito, é também o Estado Democrático, introduzido
no constitucionalismo como garantia de legitimação e limitação do poder. (MORAES, 2011,
p. 5)
O Estado Democrático de Direito está inserido no caput do 1º artigo da Constituição
Federal de 1988, no título que trata justamente “Dos Princípios Fundamentais”, portanto é um
princípio fundamental, consistindo em uma das idéias diretivas básicas de toda ordem
constitucional.
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Para se ter a exata compreensão do que significa Estado de Direito, deve-se retornar ao
período das Monarquias absolutas (Estado de Polícia), anterior ao seu advento, no qual não
havia limites jurídicos à atuação dos órgãos estatais, sendo que a vontade do soberano ditava
as regras do Estado de maneira irrevogável. Mesmo havendo normas disciplinando o
funcionamento dos órgãos Estatais, por vezes não eram observadas pelo próprio Estado, pois
o soberano podia não aplicá-las, se esta fosse sua vontade. Ademais, tais normas eram apenas
conhecidas e aplicadas no interior do aparato estatal, sem conferir direitos subjetivos aos
particulares, que eram súditos e não sujeitos de direito, sem poderes para reclamar do Estado a
observância das normas que disciplinavam a sua atuação. A atuação do soberano sofria limites
religiosos ou políticos, mas limites jurídicos não eram conhecidos, conferindo à atuação
estatal da época a marca da arbitrariedade. (MELLO, 2007, p. 91)
Contra a arbitrariedade nasce o Estado de Direito, consequência das revoluções
burguesas dos séculos XVII e XVIII, onde se buscava a contenção do poder estatal e
pretendia-se estabelecer limites jurídicos à atuação do Estado, que fossem observados pelos
entes estatais e que essa observância pudesse ser cobrada pelos particulares. A vontade do
soberano precisava ser substituída pela vontade da lei. A marca essencial do Estado de Direito
é, portanto, a submissão à ordem jurídica, que o diferencia do Estado de Polícia, e para que se
configure é necessário estarem presentes os seguintes requisitos: subordinação à ordem
jurídica, submissão à jurisdição e garantia dos direitos fundamentais, vinculando os entes
estatais e tornando obrigatórios determinados comportamentos, bem como conferindo aos
particulares direitos subjetivos, permitindo assim a exigir do Estado o cumprimento das
normas jurídicas. (MELLO, 2007, p. 96)
7.2 A relação entre o Estado Democrático de Direito e o princípio do devido processo
legal (due process of law)
O princípio do devido processo legal é referência como regra constitucional desde a
Constituição Federal de 1824, porém sua aplicação era restrita apenas à via judicial, até que
com o advento da Constituição Federal de 1988, foi estendida sua aplicação também ao
processo administrativo. É princípio constitucional norteador de todo ordenamento jurídico e
direito fundamental previsto no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição, que dispõe: “ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Está fundamentado
no princípio da legalidade, que informa a maneira de serem realizados todos os procedimentos
judiciais, bem como os procedimentos administrativos.
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Assegura que as relações estabelecidas pelo Estado sejam participativas e igualitárias,
imputando à Administração Pública condutas formais e obrigatórias que devem ser
observadas e seguidas, e trazendo a certeza de que no processo, a tomada de decisões pelo
Poder Público não seja um procedimento arbitrário. Por estas razões, o princípio do devido
processo legal está substancialmente ligado ao Estado Democrático de Direito, haja vista que
um estado não pode ser de direito e nem democrático se não conferir aos cidadãos meios
necessários ao exercício dos mais diversos direitos, sejam eles coletivos ou individuais,
consagrados pela Constituição Federal. O Estado está adstrito à observância dos preceitos
inerentes ao devido processo legal, que é uma regra imperativa. (MARINELA, 2011, p. 1039)
Segue, para ilustrar, orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, no
sentido do ato atingir direitos dos administrados:
Concurso público. Nomeações. Anulação. Devido processo legal. “O
Supremo Tribunal Federal fixou jurisprudência no sentido de que é
necessária a observância do devido processo legal para a anulação de
ato administrativo que tenha repercutido no campo de interesses
individuais” (RE 501869 AgR/RS, STF - Segunda Turma, Rel. Min.
Eros Grau, julgamento: 23.09.2008, DJe: 206, 30.10.2008)
E mais, em relação à observância do referido princípio para a desconstituição das
relações já consolidadas:
[...] A jurisprudência predominante do Supremo Tribunal Federal
firmou-se no sentido de que a Administração Pública pode anular os
seus próprios atos quando ilegais, conforme disposto na Súmula nº
473 do Supremo Tribunal, desde que observado o devido processo
legal, para desconstituir as situações jurídicas já consolidadas que
repercutem no âmbito dos interesses individuais dos administrados.
(AI 730928 AgR/SP, STF - Primeira Turma, Rel.ª Min.ª Cármen
Lúcia, julgamento: 26.05.2009, DJe: 121, 30.06.2009)
A Administração Pública para praticar seus atos deve atender à exigência de processo
administrativo prévio, cuja realização se deve observar o devido processo legal. Seguir o
devido processo legal significa observar todos os demais princípios apontados no texto
constitucional e na forma infraconstitucional.
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7.3 A importância e as consequências dos princípios do contraditório e da ampla defesa
A lei 9.784/99 prevê, em seu artigo 2º, a observância por parte da Administração
Pública dos princípios do contraditório e da ampla defesa, regulando assim na esfera
infraconstitucional o cumprimento do disposto na Constituição Federal, em seu artigo 5º,
inciso LV, que diz: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com meios e recursos a ela inerentes.”
São corolários do princípio do devido processo legal e caracterizados pela possibilidade de
resposta e a utilização de todos os meios de defesa admitidos em direito. São princípios já
sedimentados na via judicial, entretanto, na via administrativa são novidades da Constituição
Federal de 1988, sendo que os administradores ainda estão aprendendo o seu significado,
denotando assim a necessidade de serem consolidados nesta seara.
O princípio do contraditório é inerente ao direito de defesa e norteia o processo
administrativo, sendo fundamental para a constituição da relação jurídica processual.
Determina que toda vez que uma parte pratica um ato no processo, deve ser dada a outra parte
a oportunidade de analisar o que foi feito, ver a documentação apresentada, e conhecer o ato.
O contraditório é a democracia do processo, pois dá o direito à participação dos sujeitos
dentro do mesmo, e significa que seus sujeitos devem tomar conhecimento de todos os fatos
que venham a ocorrer durante seu curso, podendo ainda se manifestar sobre tais
acontecimentos. Os sujeitos podem manifestar-se dentro do processo quando dele tomar
ciência e, com isso, interferir no convencimento do julgador ao apresentar suas alegações
sobre determinado assunto, o que torna a aplicação deste princípio indispensável para garantir
a igualdade entre as partes.
Para que essa paridade entre as partes ocorra é necessária a notificação dos atos
processuais à parte interessada, a possibilidade de exame das provas constantes do processo, a
participação na construção das provas e a apresentação de defesa escrita, aspectos que
também estão presentes no princípio da ampla defesa, ao qual o princípio do contraditório
sempre está interligado.
Segue para ilustrar, jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema em
tela:
[...] 1. A garantia do contraditório e da ampla defesa, insculpida no art.
5º da Constituição Federal, não pode ser ignorada pela comissão
processante de procedimento administrativo disciplinar, sobretudo
quando é aplicada penalidade ao recorrente, sem que haja qualquer
tipo de defesa escrita, nem mesmo de próprio punho. 2. A ausência de
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qualquer defesa, ainda que intimado o acusado, configura violação ao
princípio do contraditório e da ampla defesa no processo
administrativo disciplinar. [...] (RMS 21084/RS, STJ - Sexta Turma,
Rel.ª Min.ª Maria Thereza de Assis Moura, julgamento: 06.10.2009,
DJe: 26.10.2009)
O princípio da ampla defesa possibilita a oportunidade de apresentação e admissão de
todos os elementos lícitos de prova, ainda que não se trate de uma lide perante a Justiça, mas
sim na esfera administrativa. Determina que ao acusado seja assegurado o direito de saber que
está e por que está sendo processado, de ter vista dos autos do processo administrativo, de
apresentar a sua defesa preliminar, de indicar e produzir provas que entender pertinentes à sua
defesa, de ter advogado que o assista, de conhecer previamente das diligências e dos atos
instrutórios a serem realizados para que possa acompanhá-los, de fazer reperguntas, de
oferecer defesa final e de recorrer.
Este princípio é uma exigência fundamental para um Estado Democrático e para sua
efetivação há algumas exigências indispensáveis, que se tornam ainda mais importantes nos
processos administrativos disciplinares.
Dentre as exigências mencionadas pode-se citar o caráter prévio da defesa, que
consiste em conhecer as etapas do procedimento e as consequências possíveis antes de
efetivamente se defender; o direto à informação geral, que é decorrente dos princípios do
contraditório e da publicidade, o que torna fundamental o conhecimento do conteúdo do
processo, de seus documentos, decisões e provas; o direto de vistas do processo que deve ser
exercido na repartição com a presença do servidor responsável, normalmente membro da
comissão processante, sendo que, regra geral não é possível retirar o processo administrativo
da repartição em eu se acha, porém a Administração Pública pode, de acordo com sua
conveniência, definir a forma de exercê-lo. Para ilustrar tal afirmação, segue decisão do
Supremo Tribunal Federal acerca do direito de informação nos processos administrativos que
tramitam no Tribunal de Contas da União:
EMENTA: Tribunal de Contas da União: direito de acesso a
documentos de processo administrativo. CF, arts. 5º, XXXIII, XXXIV,
“b”, e LXXII, e 37. [...] direito da empresa impetrante, permissionária
de uso, ter vista dos autos da representação mencionada, a fim de
obter elementos que sirvam para sua defesa em processos judiciais nos
quais figura como parte. [...] Ressalva da conveniência de se
determinar que a vista pretendida se restrinja ao local da repartição,
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ou, quando permitida a retirada dos autos, seja fixado prazo para tanto.
(MS 25382/DF, STF - Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
julgamento: 15.02.2006, DJ: 31.03.2006)
Continuando a linha de raciocínio em relação às exigências indispensáveis à
efetivação do princípio da ampla defesa ainda tem-se o direito de cópias dos autos, sem que
esteja assegurada a gratuidade, sendo que a orientação de diversos órgãos públicos é a
exigência de advogado com procuração, para obtenção das cópias, principalmente no tocante
aos processos administrativos disciplinares; e por fim a produção de provas que deve ser feita
com o objetivo de serem analisadas, para que possam interferir e participar no convencimento
do julgador.
Estes dois princípios, o contraditório e a ampla defesa, são de suma importância e
estão consagrados na Constituição Federal, no Título II - Dos Direitos e Garantias
Fundamentais. Exige a existência de um processo regular, antes da tomada de qualquer
decisão gravosa pela Administração, assegurando aos indivíduos o poder de se manifestarem
sobre todos os atos ocorridos dentro do processo, produzindo provas lícitas para obter o
convencimento do julgador e, se for o caso, a aplicação de penalidades pela Administração,
adequadas e proporcionais à conduta praticada, evitando assim a arbitrariedade de seus atos.
Como consequência destes princípios está o devido processo legal, contemplado no Estado
Democrático de Direito, para que não haja o cumprimento da vontade soberana do Estado,
enquadrando a conduta estatal dentro de limites jurídicos, evitando que a sociedade possa
sofrer surpresas com medidas e providências abusivas por parte da Administração Pública.
Enfim, a lei não poderá ser aparentemente respeitada e os conflitos entre a Administração e
administrados não serem dirimidos imparcialmente, sem que a Administração em juízo seja
uma parte igual às outras. Aos princípios do Estado de Direito deve corresponder
necessariamente à obrigação de se responsabilizar o Estado por condutas que atinjam os
administrados, sejam estas lícitas ou ilícitas (artigo 37, § 6º da Constituição Federal). O
Estado não poderá impor vontades que não forem previstas em lei e nem poderá atuar contras
as normas já existentes.
7.4 Considerações atuais acerca dos princípios do contraditório e da ampla defesa
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Um tema que foi objeto de muita discussão jurisprudencial recentemente é a exigência
de defesa técnica nos processos administrativos, principalmente nos disciplinares, onde se
discute se a presença do advogado é ou não obrigatória.
No âmbito federal, para os processos administrativos disciplinares, é facultada ao
servidor público a presença de advogado, conforme prevê o artigo 156 da Lei 8.112/90. Sendo
assim, a lei não exige a defesa efetuada por profissional da área jurídica. Porém, a orientação
na doutrina e na jurisprudência é a de que o administrador não pode prejudicar a realização
dessa defesa, devendo viabilizar, inclusive, a sua realização como medida de justiça.
Com o fortalecimento das garantias constitucionais e o reconhecimento da necessidade
da aplicação do princípio da ampla defesa, o Superior Tribunal de Justiça foi levado a
reconhecer a importância da defesa técnica nos processos administrativos disciplinares, pois
no entendimento do digno Tribunal, essa medida colabora com a regularidade do processo,
garante o equilíbrio entre as partes e a segurança jurídica. Consolidado tal entendimento, a
matéria foi objeto de súmula, a Súmula nº 343, que dispõe: “É obrigatória a presença de
advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar.” (editada em 21.09.2007)
Porém a mesma orientação não predominou no Supremo Tribunal Federal, que no ano
de 2010 editou a Súmula Vinculante nº 5, reconhecendo ser dispensável a presença do
advogado, estabelecendo que: “A falta de defesa técnica por advogado no processo
administrativo disciplinar não ofende a Constituição.” Nesta seara, não resta mais o que
discutir devido o caráter vinculante da medida mencionada.
Outro tema que foi objeto de discussão é a necessidade à obediência ao direito de
recurso. Essa garantia pretende a revisão de uma decisão, viabilizando a para a correção de
injustiça ou abuso cometido pela autoridade julgadora. Este direto está previsto no artigo 5º,
inciso LV, da Constituição Federal, que diz em sua parte final: “[...] são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.” Mesmo para aqueles
que interpretam o dispositivo legal de forma diferente, há a possibilidade de interposição de
recurso, mesmo não havendo previsão explícita em lei, em razão do direito constitucional de
petição, garantido no artigo 5º, inciso XXXIV, alínea a, da Lei Fundamental, que dispõe:
Art. 5º [...]
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento
de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou
contra ilegalidade ou abuso de poder;
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A jurisprudência já consolidou entendimento de que o recurso administrativo não pode
ser condicionado ao depósito prévio, tendo sido editada pelo Supremo Tribunal Federal a
Súmula Vinculante nº 21, que define: “É inconstitucional a exigência de depósito ou
arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.”
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Direito Administrativo tem sua origem demarcada pelas revoluções ocorridas nos
séculos XVIII e XIX, e a França é considerada seu país natal. Antes desse período a disciplina
não era considerada como direito autônomo, tendo em vista que seu desenvolvimento ocorreu
justamente após as referidas revoluções, sendo que da França foi difundido para o resto do
continente europeu.
No Brasil o Direito Administrativo surge como direito autônomo durante o período
Republicano, porém a partir da criação da cadeira de Direito Administrativo, em 1851, nas
Faculdades de Direito de São Paulo e Olinda, a doutrina e a sistematização de seus institutos
começam a progredir e se aperfeiçoar. Embora as inovações mais relevantes em relação à
disciplina tenham sido introduzidas pela Constituição Federal de 1988, o princípio do devido
processo legal é referência desde a Constituição Federal de 1824. Entretanto a legislação que
versa sobre processos administrativos é relativamente recente e escassa, sendo usada
subsidiariamente pelos entes federados que não possuem lei própria, a lei 9.784/99, que
disciplina a matéria no âmbito da Administração Pública federal.
Mister se faz a importância da distinção entre processo e procedimento, tendo em vista
que o procedimento é meio indispensável para a existência do processo, que se desenvolve
por meio de uma sucessão de atos para chegar a um determinado fim, qual seja aproximar a
Administração de seus administrados, sejam estes servidores ou particulares, sempre com
aplicação dos princípios contidos na lei, principalmente na Constituição Federal, o que facilita
o controle por parte da sociedade e dos entes que fiscalizam as atividades da Administração.
Dentre todos os princípios gerais do direito e os princípios do Direito Administrativo
que regem a Administração Pública, destacam-se os princípios do contraditório e da ampla
defesa que são corolários do princípio do devido processo legal, aos quais a Administração
Pública deve atentar-se, especialmente se envolver processos administrativos sancionadores.
Por meio desses princípios, os administrados poderão apresentar provas e defesa condizentes
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ao processo, sem estarem à mercê da discricionariedade da Administração Pública, que deve
tomar suas decisões sempre pautadas na observância de todos os princípios a ela aplicados.
Os princípios do contraditório e da ampla defesa estão ganhando cada vez mais força e
reconhecimento, tendo em vista que a exigência da observância desses princípios aperfeiçoa a
produção legítima de decisões administrativas pautadas no confronto dialético de argumentos,
conferindo maior legitimidade ao processo e reduzindo a discricionariedade da Administração
Pública frente aos seus servidores e administrados, resguardando assim o princípio do Estado
Democrático de Direito.
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próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam
direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial. Disponível em:
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