DESINDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL: O efeito da taxa de câmbio sobre a indústria brasileira no período entre 2000 e 2012 Aécio Alves Mandu Graduado em Ciências Econômicas Universidade Paulista – Campinas [email protected] Waldemar Rodrigues Mestre em Administração Financeira Professor da Universidade Paulista – Campinas [email protected] Resumo: O processo de desindustrialização ocorre com a transferência da mão de obra e do nível de renda do setor industrial para o setor de serviços. O objetivo geral deste artigo é verificar se o Brasil passou por um processo de desindustrialização no período entre 2000 e 2012. Analisamos, especificamente, o efeito da taxa de câmbio e do nível de renda sobre a indústria brasileira. Utilizamos, como metodologia, um estudo bibliográfico para conceituar a desindustrialização e, para verificar a influência da taxa de câmbio e do nível de renda sobre a indústria brasileira, utilizamos o método correlacional, por meio de cálculos de regressão linear. O que se constatou foi que o processo de desindustrialização é inerente ao processo de desenvolvimento econômico e, que o processo, apontado pelas teorias alternativas como desindustrialização precoce, representa, na verdade, o estrangulamento do setor industrial. Concluímos então, com base na análise de dados de emprego e renda do setor industrial, que o Brasil não passou por um processo de desindustrialização no período analisado. O que se observa na economia é a estagnação do setor produtivo. Verificamos também que as importações no período foram, basicamente, em função do nível de renda, visando o abastecimento de insumos produtivos para a indústria. Palavras-Chave: Importação; Câmbio; Renda. Abstract: The de-industrialization process happens with the transference of employment and income from the industrial sector to sector of services. The general objective of this research is to check if the Brazilian economy went through for process of deindustrialization from 2000 to 2012. We analyzed, specifically, the effect of the exchange rate and income upon the Brazilian industrial production. We used, as methodology, a bibliographic study to conceptualize the de-industrialization process and correlational method to measure the influence of exchange rate and income on industrial production, by means of linear regression calculations. We conclude that de-industrialization process is intrinsic to economic development process, and the process called premature deindustrialization represents, in true, the bottlenecks of the economy. We also conclude, analyzing data of employment and income of Brazilian industrial sector, that Brazilian economy did not goes through a process of deindustrialization. What is observed in the economy is stagnation of the productive sector. We also conclude that imports in the period were primarily a function of income level, targeting the supply of productive inputs to industry. Keywords: exchange rate; income; imports. ______________________________________________________________________ 1. Introdução A revolução dos sistemas microeletrônicos que ocorreu nos anos 80 tornou a relação econômica mais dinâmica no mundo. Essa revolução afetou os sistemas econômicos em dois campos, sendo o primeiro na produção e nos serviços de pesquisas tecnológicos e o segundo, nas relações financeiras e comerciais dos países. Esse processo é chamado de globalização, e vai muito além das relações econômicas. No contexto de amadurecimento da globalização, a economia brasileira iniciou seu processo de inserção no comércio internacional através da abertura comercial no início dos anos 90. Segundo os autores que afirmam que a economia brasileira passa por um processo de desindustrialização, esse movimento de abertura comercial seria um dos responsáveis pela perda de competitividade da indústria doméstica. O objetivo geral desta pesquisa é conceituar o processo de desindustrialização e observar se a economia brasileira passa por um processo de desindustrialização a partir do ano 2000. Vamos analisar, especificamente, o efeito da taxa de câmbio sobre a produção industrial brasileira e observar se ela foi determinante para uma mudança na estrutura produtiva. Para isso, usamos, como metodologia, um estudo bibliográfico com a finalidade de conceituar o processo de desindustrialização. Para medir os efeitos da taxa de câmbio sobre a indústria, vamos utilizar o método de análise correlacional que permite verificar, conjunta e individualmente, as variáveis taxa média de câmbio e nível de renda sobre as importações brasileiras. 2. O processo de desindustrialização A desindustrialização é um processo que ocorre nas economias capitalistas, em que o setor industrial perde participação relativa no nível geral de emprego e de renda, quando comparado ao total da economia (Cano, 2012). Esse é um processo natural nas economias capitalistas que atingem o desenvolvimento econômico (Rowthorn e Coutts, 2004). O processo de desenvolvimento econômico começa com a transferência da mão de obra disponível no campo para a indústria, associada as novas técnicas de produção adquiridas por esta, que consequentemente aumenta sua produção e transforma o setor industrial no principal gerador de renda e empregos numa economia (Cano, 2012). Após alcançar, ou mesmo se aproximar do pleno desenvolvimento, o setor industrial de uma economia perde mão de obra para o setor de serviços e também diminui a participação relativa, em relação a renda total gerada pela economia, caracterizando, assim, o processo de desindustrialização. Isso ocorre devido ao aumento da produtividade do trabalho, que representa maior uso tecnologia e menor utilização da mão de obra. A desindustrialização ocorre porque o setor industrial é limitado pela sua própria capacidade instalada e pelo nível tecnológico. O alto nível tecnológico aumenta a produtividade do trabalho, o que indica que o processo de desindustrialização está em curso e, principalmente, o setor de serviços ligados a produção de novas tecnologias produtivas, gera mais renda para este setor do que para o setor industrial. Logo, se o processo de desindustrialização é inerente ao processo de desenvolvimento, o evento apresentado pelas teorias alternativas como desindustrialização precoce, representa na verdade, pontos de estrangulamento da economia. Quando a economia retoma o crescimento, o setor industrial tende a recuperar seu dinamismo. A recuperação da dinâmica industrial nos últimos anos também evidencia que o processo de desindustrialização precoce, mesmo que se considerado, não ocorre no Brasil. Após duas décadas de estagnação, a indústria nacional voltou a recuperar sua atividade a partir de 2004, com um diferencial que foi a observação da consolidação de um mercado interno (Sarti e Hiratuka, 2011). A evolução da renda per capita, maior distribuição de renda e expansão do crédito favoreceram a ascensão de grande parte das famílias das classes “E” e “D” para a classe “C”. Nas palavras de SARTI e HIRATUKA 2011, p. 11 a retomada de um mecanismo de retroalimentação dinâmica da economia extremamente importante, com a expansão do mercado de trabalho estimulando o consumo e a própria produção industrial. 2.1 Efeito da elasticidade-renda sobre o processo de desindustrialização A elasticidade expressa uma relação entre duas variáveis inter-relacionadas funcionalmente. Na economia, a elasticidade pode expressar, por exemplo, o efeito do nível de renda sobre a demanda por determinado bem. No caso da elasticidade-renda, medimos a sensibilidade da demanda em relação a alterações no nível de renda (Vasconcelos e Oliveira, 2009). Conforme verificamos anteriormente, a partir dos textos de Rowthorn e Coutts (2004), o aumento da renda per capita altera o padrão de consumo e de produção da economia. Países desenvolvidos tendem a demandar mais bens superiores, devido ao maior nível de renda. Essa maior demanda por bens superiores também é uma causa do processo de desindustrialização, uma vez que bens superiores demandam maior nível tecnológico para produção e, o setor responsável pelo desenvolvimento de novos produtos e novas tecnologia de produção é o setor de serviços. No caso britânico, o setor de serviços não favoreceu a manutenção da atividade industrial e a economia tende a enfrentar sério problema em suas relações comerciais no longo prazo. Ao contrário, nos Estados Unidos o processo ocorreu em um caminho diferente, pois o setor de serviços agrega ganhos de produtividades da atividade industrial, devido às novas tecnologias desenvolvidas (ROWTHORN E COUTTS 2004). Já nos países em desenvolvimento ocorre o contrário, pois, muitas vezes, ainda está em curso a transferência da mão de obra do setor agrícola para o setor industrial e, nesses países, a demanda por produtos industrializados é elástica á renda, independentemente do nível tecnológico. A produtividade do trabalho tende a ser baixa nesses países, o que mantém em equilíbrio os salários da economia e, portanto, a manutenção do emprego no setor industrial. A manutenção da baixa produtividade do trabalho é um empecilho ao desenvolvimento da economia, pois é um indicativo de que a indústria não está desenvolvendo novas tecnologias e, com isso, a economia continua dependente e estagnada. Outro fator que deve ser considerado em países em desenvolvimento é o hiato de consumo causado pelo baixo nível de renda per capita. Esse hiato de consumo tende a ser suprido com o aumento da renda per capita, gerando maior dinâmica aos setores da economia, como o setor de serviços ligados a produção tecnológica que, em geral, são geradores de altos níveis de renda agregada. No Brasil, a maior distribuição de renda observada nos últimos anos - que ocasionou ascensão da classe “C” - tem elevado o padrão de consumo das famílias. 2.2 Desindustrialização pela ótica da participação da indústria no total da renda nacional O aumento da renda per capita de uma nação vai mudando a preferência dos consumidores que ficam mais dispostos a demandar bens com maior coeficiente técnico de produção, os chamados bens superiores. Essa evolução no padrão de consumo fez com que as economias de subsistência se modernizassem e fossem criadas novas técnicas de produção. No Brasil a transição de economia basicamente agrícola para uma economia industrial começou a ocorrer de forma mais intensa na década de 1950. Porém não houve modernização significativa no parque industrial nas décadas seguintes e a indústria voltou a participar do PIB nos mesmos níveis apresentados entre as décadas de 1930 e 1940. A tabela a seguir mostra a dinâmica da composição do PIB a partir do ano 2000. Tabela 2.1 - Participação (%) das Classes de Atividades no PIB (Valor Adicionado) a Preços Básicos* Ano Classe 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Agropecuária 5,6 6 6,6 7,4 6,9 5,7 5,5 5,6 5,9 5,6 5,3 5,5 Indústria 27,7 26,9 27,1 27,9 30,1 29,3 28,8 27,8 27,9 26,8 28,1 27,5 Serviços 66,7 67,1 66,3 64,8 63 65 65,8 66,6 66,2 67,5 66,6 67 Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comercio Exterior, MDIC. (* Valores Calculados a partir das Contas Nacionais Trimestrais, conforme informado pelo MDIC) Conforme verificamos na tabela acima, no período analisado, a estrutura do PIB permaneceu sem grandes alterações ao longo do período. Analisando ano a ano, verificamos que as variações não são suficientes para validar qualquer argumento sobre o processo de desindustrialização. Pelo contrário, os dados indicam que, nos períodos de maior crescimento da economia, o PIB do setor industrial aumentou sua participação no total da renda nacional e, nos períodos de menor crescimento o setor de serviços recuperou essa participação. Assim, fica evidente que o setor industrial ainda é dinâmico, e eventuais crescimentos da atividade industrial tendem a gerar crescimento em todo o conjunto de atividades da economia (SARTI e HIRATUKA, 2011). A participação média dos três setores no período indicou não haver mudanças significativas na estrutura da formação do PIB no período. Analisando a média da evolução da participação das classes, as três mantém variação média bem próxima de zero. Analisando, separadamente, o setor industrial, podemos observar uma leve tendência de queda na participação do PIB no período entre 2005 e 2009, acentuada, neste último, devido à crise internacional, o que por si não é suficiente para indicar desindustrialização e, portanto, podemos concluir pela ótica da participação da indústria no PIB que o Brasil não passou por um processo de desindustrialização no período entre 2000 e 2011. No entanto, fica evidente a preocupação em relação ao longo prazo, uma vez que tanto o setor industrial quanto a economia como um todo não acompanharam o ritmo de crescimento de algumas economias emergentes como a China, o que tem motivado vários estudos apontando um possível processo de desindustrialização, como os de Cano (2012). 2.2.1 Formação Bruta de Capital Fixo no Brasil de 2000 a 2012 O indicador que melhor reflete as tendências do setor industrial é a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF). Segundo Kon (1991, p. 105) “é a medida estatística do investimento físico da economia, ou seja, indica o crescimento da sua riqueza real determinada pelo estoque de Capital Fixo”. A formação desse estoque de capital pode ser tanto por iniciativa do investimento interno, quanto através de importações (KON, 1991). A Formação Bruta de Capital Fixo entrou em um ciclo de crescimento refletido pela boa conjuntura apresentada tanto pela economia interna quanto pela economia externa. A taxa média de crescimento no período foi de 4,66%, contra o crescimento médio de 3,33% do PIB. Como mencionado anteriormente, a formação de capital fixo é uma espécie de termômetro da economia, o que é facilmente percebido quando observamos que a formação de capital converge com o PIB. A partir do ano 2000, os anos em que houve retração na formação bruta de capital fixo observamos eventos na economia que contribuíram a para retração da atividade econômica e do investimento. No ano de 2009, o investimento foi negativo, em função da conjuntura desfavorável, decorrente da crise financeira de 2008. A retração na atividade econômica de 0,33%, e a formação de capital recuou 6,72%, porém, já em 2010, houve retomada do crescimento, incentivado pela política de crédito que alavancou o consumo. A retração na formação do capital, em 2012, é reflexo do pior cenário de curto prazo desde 2002. O esgotamento do modelo de crédito, associado ao endividamento das famílias, têm gerado cenários de incerteza na economia doméstica e, principalmente, no comportamento da demanda agregada. Outra variável que tem contribuído, decisivamente, é a conjuntura desfavorável da economia mundial. O conjunto desses fatores contribuiu para queda de 4% na formação de capital, o que mostra cautela do setor produtivo em relação a novos investimentos, uma vez que o risco se mostra maior que em anos anteriores. Outro fator importante a ser analisado é a produção doméstica de bens de capital como indicativo, ou não, de dependência externa. Em geral, esse setor tende a responder aos estímulos da atividade econômica. Entre outros fatores, a limitação para formação de capital na economia doméstica é o fator tecnológico e a elasticidade das importações desse setor em relação à taxa de câmbio. O setor de produção de bens de capital teve crescimento robusto no período analisado. As variações da produção de capital estiveram em geral ligadas ao desempenho da atividade econômica interna. A Formação Bruta de Capital Fixa é composta também por importação de bens de capital. As importações de bens de capital também tiveram comportamento convergente com o PIB, reagindo ao aumento ou retração do mesmo. Assim como as importações de bens de capital, em 2009 ouve retração na produção interna de bens de capital, refletindo os fatores externos que contribuíram para a retração da atividade econômica. Assim como as importações, a produção interna de bens de capital se recuperou já em 2010, acompanhando a tendência de alta na formação de capital produtivo. O último ano da série apresentou retração na formação bruta de capital fixo. Isso foi reflexo da estagnação da atividade econômica do país em 2012, onde o produto interno cresceu apenas 0,87%. Os resultados apresentados comprovam a teoria apresentada no início deste tópico e mostraram que a formação bruta de capital fixo é reflexo da atividade econômica interna. Os anos de crescimento econômico a formação de capital foi positiva acompanhado o crescimento da renda no país. No entanto, em anos em que houve retração da atividade econômica a formação de capital também reagiu retraindo em relação aos períodos anteriores. 2.3 Desindustrialização pela ótica do emprego A transferência do emprego do setor industrial para o setor de serviços é um dos indicadores do processo de desindustrialização. Quando uma economia segue a tendência natural e saudável de crescimento, as tecnologias implantadas tendem a aumentar a produtividade do trabalho e diminuir a demanda por mão de obra no setor industrial. Essa mão de obra tende a se especializar e, assim, ocorre a transferência para o setor de serviços. Foi essa dinâmica que tomou as economias britânica e norte americana após a Segunda Guerra Mundial, apesar de ambas tomarem caminho bem diferente em relação à dinâmica do setor de serviços e da economia como um todo (Rowthorn e Coutts, 2004). No Brasil, o nível geral de empregos na economia cresceu 9,5% entre 2004 e 2009. Durante o período, o setor de serviços foi responsável por 47,33% dos empregos gerados na economia. Houve também redução do nível de emprego industrial, o que não é, necessariamente, um fator negativo para a economia. Nos Estados Unidos da América, em 20121, a indústria representou apenas 20,3% do total de empregos na economia, e as atividades ligadas ao setor de serviços somaram 79% dos empregos totais, e o setor agrícola ficou com apenas 0,7% de participação. A participação do setor industrial, na formação do PIB, representou 19,1% do total da renda gerada pela economia, e as atividades ligadas ao setor de serviços, somaram 79,9% da renda gerada no país, neste mesmo ano. O setor industrial brasileiro também absorveu 20% da mão de obra disponível no período analisado e com um crescimento de 6% no período. No entanto, quando analisamos a produtividade do trabalho temos uma retração percentual média de 1,5%. O aumento da utilização média da capacidade instalada, associado ao crescimento do emprego industrial e a redução da produtividade do trabalho, indicam que o setor industrial passa por um momento de estagnação do investimento em novas tecnologias apesar do crescimento do setor de bens de capital no período (Galeano e Feijó, 2013). Segundo Rowthorn e Coutts (2004, p. 4) “By definition, the growth rate of labour 1 Central Intelligence Agency – CIA, The World Factbook. productivity is equal to the growth rate of output minus the growth rate of employment.” Portanto, o setor industrial, para aumentar o nível de renda agregada, necessita de evolução tecnológica e produtiva constante, o que, na prática, causa redução da capacidade do setor industrial de gerar emprego. Pela dinâmica do desenvolvimento econômico, essa mão de obra sem espaço na indústria é extremamente necessária para desenvolver o setor de serviços. Para comprovar essa afirmação Rowthorn e Coutts (2004, p. 4) concluem no idioma original que: statistics also indicate that in most countries the growth rate of labour productivity in the manufacturing sector has been much faster than in services. Thus, to maintain its share of real output, the manufacturing sector has required a decreasing share of total employment, whilst to achieve the same result, the service sector has required an increasing share of employment. Isso nos leva a conclusão de que desindustrialização é um processo benéfico, uma vez que o desemprego tecnológico tende a ser revertido como mão de obra especializada no setor de serviços, desenvolvendo a economia e aumentando o nível de renda per capta. 3. Determinantes das importações e aplicação ao modelo de regressão linear A valorização cambial ocorrida na última década tem sido apontada em vários estudos como a determinante do processo de desindustrialização no Brasil. Cano (2012, pág. 3) conclui que: Com as reformas liberalizantes e as políticas de estabilização, o câmbio excessivamente valorizado cumpre, até hoje, o papel de âncora de preços, no que recebe o devido apoio “logístico” da pratica de juros reais absurdamente altos e da âncora fiscal, que produz parte do pagamento da dívida. O resultado dessa insana trilogia foi a perda de competitividade internacional da indústria nacional perante a de outros países. O efeito do câmbio valorizado dentro dessa trilogia seria o maior poder de compra da moeda nacional por bens de consumo importados, em detrimento do consumo de produtos nacionais. Oreiro e Feijó (2010, pág. 231), também concluíram que existe “desindustrialização causada pela apreciação da taxa real de câmbio que resulta da valorização dos preços das commodities e dos recursos naturais no mercado internacional”. Os determinantes das importações são o nível de renda da economia e a taxa de câmbio. O aumento da atividade da economia leva a uma demanda doméstica maior por produtos domésticos e importados, assim como uma apreciação cambial leva ao aumento na demanda por bens importados (Blanchard, 2011). Partimos da ideia de que o aumento das importações de bens de consumo é um fator prejudicial à indústria doméstica. Com o câmbio valorizado, produtos similares poderiam ser importados a preços competitivos, o que reduziria a demanda por produtos domésticos e, com isso, a indústria perderia mercado. Para medir, estatisticamente, a influência da taxa de câmbio e do nível de renda sobre um possível processo de desindustrialização, utilizamos, o modelo de regressão linear. Segundo Gujarati (2006, pág. 13) “A análise de regressão se ocupa do estudo da dependência de uma variável, a variável dependente, em relação a outra ou mais variáveis, as variáveis explanatórias”. Assim conseguimos definir estatisticamente o grau de influencia de cada variável sobre as importações. No modelo consideramos, o nível de renda (Y) e a taxa de câmbio (E) como variáveis independentes, e a o nível de importação (M), como variável dependente. A série histórica compreende a soma trimestral do produto interno bruto e das importações, e a média cambial trimestral no período compreendido entre os anos 2000 e 2012. Os resultados obtidos foram os seguintes: A equação estimada do modelo foi a seguinte: M = -22683,76 + 0,139.Y + 1114,271.E + ℮ Erro padrão (8391,98) (0,005) R2 ajustado= 0,9488 (2692,57) Em que, M: Importações; Y: Nível de Renda; e E: Taxa Média de Câmbio ℮: erro Os cálculos de elasticidades-renda e elasticidade-taxa de câmbio mostraram que as importações da economia brasileira no período analisado foram basicamente função do nível de atividade econômica. O coeficiente da elasticidade-taxa de câmbio foi 0,163, ou seja, as importações foram quase inelásticas as taxas de câmbio apresentadas no período. Já em relação ao nível de renda, as importações se apresentaram extremamente elásticas, com coeficiente de 1,121. A análise da elasticidade-renda indica que para cada aumento ou diminuição de 100% no nível de renda a variável nível de importações responde com um aumento ou redução de 112% na quantidade importada considerando todos os demais fatores constantes. Portanto, a demanda da importação, em relação à taxa média de câmbio, é elástica, ou seja, variações no nível de renda tendem a causar variações de mesma ordem ou maior no nível de importações. 4. Influência das importações sobre a indústria brasileira A valorização cambial observada no período seria uma das causas da perda de competitividade da indústria nacional que passaria a sofrer a concorrência de produtos importados a preços competitivos e, com isso, o Brasil entraria em um processo de desindustrialização (Cano, 2012). No entanto, já concluímos que o processo de desindustrialização, apresentado por Rowthorn e Coutts (2004), é inerente ao desenvolvimento econômico, diferente da visão apresentado por Cano (2012), e concluímos que as ideias desse autor representam pontos de estrangulamento e, não, desindustrialização precoce. Conforme verificado anteriormente, a taxa de câmbio nos níveis observados no período estudado não tem poder de influenciar, elasticamente, o nível de importação. O aumento da renda nas classes inferiores criam uma demanda que tende a diminuir o hiato de consumo causado pela distribuição irregular de renda. Essa demanda, a princípio, busca a oferta interna de produtos, e esse aumento da demanda tende a elevar o produto da indústria nacional, que, em consequência da estrutura tecnológica interna e da escassez na produção de insumos, tende a demandar mais insumos e bens de capital importados. Os produtos importados são classificados em quatro categorias de uso, de acordo com sua finalidade, sendo Bens de Capital, Combustíveis e Lubrificantes, Matériasprimas e produtos intermediários e Bens de consumo. Consideramos apenas os bens de consumo como produtos destinados direto ao consumidor final, e o restante, como insumos produtivos ou componentes de montagem. A participação total dessas categorias destinadas ao setor produtivo no total das importações brasileiras recuou cinco pontos percentuais, ao longo do período analisado. A participação esteve constante durante todo o período, porém, a partir de 2008, a categoria bens de consumo aumentou sua participação percentual sobre o total das importações. Essa mudança no perfil das importações ocorre a partir de 2008, estimulada pela crise econômica nos países do centro e favorecido pelas taxas de câmbio que, mesmo tendendo à desvalorização, continuaram favorecendo as importações. Essa mudança no perfil de consumo, associado ao fraco desempenho da economia internacional e aos pontos de estrangulamentos da economia brasileira, influenciaram a redução do investimento em bens de capital no Brasil. Apesar do recuo da produção doméstica de bens de capital, a participação dessa categoria no total das importações manteve-se nos mesmos patamares do período de crescimento econômico registrado entre 2003 e 2008. O item que apresentou maior participação dentro da categoria bens de consumo foi o de Maquinaria industrial. Esse subgrupo representava, aproximadamente, 7% das importações no início da série e, após um longo período com queda de participação nos dois últimos anos, voltou a ter participação semelhante e hoje é o terceiro subgrupo com maior participação nas importações brasileiras. Os combustíveis e lubrificantes também aumentaram a sua participação no total das importações. O aumento foi de 4,5 pontos percentuais no período e ocorreram devido ao período de estabilização econômica e crescimento econômico e principalmente devido ao aumento da renda no período, que proporcionou novos padrões de consumo nas classes econômicas com menor poder aquisitivo. A produção nacional foi outro fator que induziu ao aumento de importação desse grupo. Segundo dados do Balanço Energético Anual de 2012 do Ministério de Minas e Energia, o consumo de gasolina nos meios de transporte cresceu 18,8%, em 2011, quando comparado a 2010. O substituto imediato no caso dos veículos de passeio seria o etanol, porém houve redução de quase 25% do consumo devido ao preço desfavorável do produto ocasionado pela redução da oferta de etanol causada pelo preço favorável das commodities de açúcar. A categoria Matérias-primas e produtos intermediários representaram, durante todo o período analisado, o maior percentual das importações brasileiras. Apesar da retração no fim do período analisado, que foi de mais de seis pontos percentuais, essa categoria continua liderando com folga a pauta de importações brasileiras. É nessa categoria que está a subcategoria com maior participação nas importações brasileiras que são os Produtos Químicos e farmacêuticos. Os bens de consumo apresentaram aumento na participação total das importações brasileiras nos últimos anos do período analisado. Favorecido, em especial, pela conjuntura econômica, mais especificamente, pelas condições do poder aquisitivo artificialmente criado pelo crédito e pelo câmbio em patamar relativamente favorável. O aumento de cinco pontos percentuais no total das importações é construído basicamente a partir de 2008. O item de maior destaque nesta categoria são os automóveis que, em 2012, representaram 4,66% do total de importações brasileiras. Ao afirmarem que o Brasil passa por um processo de desindustrialização precoce, autores como Palma (2005) e Cano (2012) afirmam que o câmbio valorizado favorece as importações e aumentam a concorrência dos produtos internos. Em geral, os Bens de consumo seriam os mais afetados, uma vez que os insumos produtivos são importados mais em função das deficiências tecnológicas no mercado doméstico. As importações de insumos produtivos quebrariam os elos produtivos que mantêm a cadeia de produção de uma economia. Durante todo o período analisado, os Estados Unidos foi o principal país importador. Apenas no ano de 2012, a China foi o principal importador brasileiro, porém, no total do período, os americanos lideraram o setor importador. A participação dos Estados Unidos era de 23% do total das importações, porém esse percentual foi caindo ao longo do período chegando a, aproximadamente, 14,5% do total importado. A Argentina também merece posição de destaque, apesar de perder importância nos últimos anos no quadro de importações. No ano 2000, representavam 12,3% do total importado, enquanto, em 2012, representavam 7,4% do total importado. A Alemanha manteve constante sua participação ao longo do período e, no ano 2012, representava, aproximadamente 6,5% do total importado pela economia brasileira, número próximo dos 8% que representava em 2000. A China merece o maior destaque no período analisado. Esse aumento da participação chinesa se intensifica a partir do ano de 2003. Até então, a China ocupava a sétima posição na lista de países que o Brasil importava. Entre os primeiros da lista, a China é o país de quem o Brasil mais importa bens de consumo, porém componentes eletrônicos e insumos que demandam, em geral, baixo e médio nível tecnológico, também compõem a pauta de importações, tendo a China como origem. 5. Conclusão O fenômeno da industrialização ocorreu de forma bem lenta na economia brasileira ao longo dos séculos. Seja por problemas de competitividade, falta de investimento interno ou por imposição de países com maior poder econômico, a indústria somente formou suas bases a partir da revolução de 1930 e consolidou seu desenvolvimento com o governo de Juscelino Kubistchek. O golpe militar de 1960 representou duas décadas de crescimento forçado e economia fechada, que causaram a ilusão de que a indústria brasileira seria capaz de gerar empregos e renda competindo, com um mercado aberto. As revoluções eletrônicas que ocorreram na década de 1980 afetaram a economia mundial e, consequentemente, a brasileira. A evolução do processo de informações e a maior capacidade de integração dos países mudaram a dinâmica da economia mundial. Não alheio a esse mundo em transformação, o Brasil entrou nessa economia globalizada através da abertura comercial no início da década de 1990. Essa abertura comercial seria a causa inicial na visão dos autores que defendem que o Brasil passa por um processo de desindustrialização. Após definir a desindustrialização como um processo natural e inerente ao desenvolvimento econômico, em que o setor industrial perde participação na renda gerada e no total de empregos gerados pela economia, podemos concluir que o Brasil não passa por um processo de desindustrialização. Observamos que a indústria brasileira manteve sua participação na formação do Produto Interno Bruto quase constante durante todo o período analisado. A mão de obra, utilizada pela indústria no período, também cresceu num ritmo mais acelerado que a Formação Bruta de Capital Fixo, o que explica a diminuição da produtividade do trabalho no Brasil. Essa diminuição da produtividade do trabalho também é um indicador de que a economia brasileira não passa por um processo de desindustrialização. Concluímos também que alguns autores chamam de Desindustrialização Precoce na verdade, são os problemas estruturais ou gargalos econômicos que impedem o desenvolvimento do setor industrial. Verificamos, através de cálculos de regressão linear, que dadas, as taxa médias apresentadas no período analisado, o câmbio não tem capacidade de determinar sozinho o nível de importações. Essas importações, em geral, respondem elasticamente ao aumento do nível de renda, enquanto respondem de forma inelástica a taxa de câmbio. Portanto, o nível de importação, nesse caso, é função do nível de renda da economia. Ao analisarmos a pauta importadora, observamos que, até 2008, as importações no Brasil mantiveram as mesmas características. Os bens de consumo aumentaram sua participação somente a partir de 2009, ano em que tiveram um aumento mais considerável, o que pode ser atribuída à desvalorização das moedas nos países centrais. No mais, o Brasil basicamente importa insumos produtivos, expondo a carência de desenvolvimento de áreas de P&D para reduzir as importações desses setores e contribuir para o desenvolvimento da economia. Referências: BLANCHARD, Olivier. Macroeconomia. 5 ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2011. BRESSER-PEREIRA, Luis C. The Dutch disease and its neutralization: a Ricardian approach. Brazilian Journal of Political Economy, vol. 28, nº 1 (109), pp. 47-71, JanuaryMarch/2008. Disponível em: < http://www.rep.org.br/issue.asp?vol=28&mes=1>. Acesso em: 16/07/2013 CANO, Wilson. A Desindustrialização no Brasil. Texto para Discussão. IE/UNICAMP n. 200, janeiro 2012. Disponível em: <http://www.eco.unicamp.br/index.php/textos>, acesso em 05/05/2012. GUJARATI, D. Econometria básica. 4. Ed. Rio de Janeiro. Elsevier, 2006. KEYNES, John M. Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. Lisboa: Relógio D’água, 2010. KON, Anita. A Formação Bruta de Capital Fixo do Estado de São Paulo. 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