a transposição didática no ensino de projeto arquitetônico

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A TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA NO ENSINO DE PROJETO ARQUITETÔNICO
E SUA RELAÇÃO COM A PRÁTICA REFLEXIVA
Mabel Maria Sala Quintana
RESUMO
Esse texto, desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Paraná (UFPR), ressalta a importância do aprendizado do
desenho para o desenvolvimento do projeto arquitetônico, apoiando-se em diversos
conceitos para tecer relações sobre o ensino neste campo. Resgata a ruptura da
arte tradicional, que culminou na Nova Visualidade, apresentando caminhos
alternativos na forma de pensar o ensino da Arte e Arquitetura. Revela o significado
dos conteúdos do desenho e da percepção visual no Curso de Arquitetura e
Urbanismo como a base para a compreensão do projeto arquitetônico. Com a
evolução desses conteúdos, percebe-se a importância de se repensar o ensino do
desenho nessa área do conhecimento, que se liga a outras formas de conhecimento.
Discorre sobre alguns aspectos do ensino de Arquitetura e do projeto arquitetônico,
enfatizando o cotidiano do ateliê de projeto. Demonstra a evolução dos saberes
relativos ao ensino de desenho com base nos conceitos da transposição didática.
Enfatiza a prática reflexiva como um elemento essencial para a qualidade do ensino
de desenho e projeto arquitetônico, objetivando uma formação mais completa do
homem, aliando o desenvolvimento dos valores sensitivos e emocionais ao
conhecimento técnico.
Palavras-chave: Ensino de Arquitetura - Ensino de Desenho e Percepção Visual –
Transposição Didática – Ensino Prático Reflexivo.
Na disciplina escolar os conteúdos de ensino se apresentam como uma
forma de abordar os diferentes domínios do pensamento, do conhecimento e das
artes e são concebidos, muitas vezes, como dependentes de uma realidade cultural
exterior à escola.
Novos conhecimentos, como aqueles que envolvem a dinâmica do projeto
arquitetônico, no âmbito do ensino superior de Arquitetura e Urbanismo, se
introduzem no processo de ensino sem serem muitas vezes explicitamente
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formulados. As finalidades reais do texto do saber nem sempre são claras e
percebidas. Nesse campo de ensino, professores e alunos, muitas vezes, não
entendem a relação entre o aprendizado dos conteúdos referentes à fundamentação
artística e a percepção visual, e o aprendizado do processo do projeto arquitetônico.
Esse processo compreende tanto a atividade projetual em si, como também
o desenvolvimento criativo relativo à linguagem visual e sensorial em geral, a criação
de composições planas e tridimensionais, os diversos gêneros de expressões
plásticas, as representações técnicas do espaço e os métodos de análise e síntese
de projeto. Estes são considerados, no contexto do processo do projeto, os
elementos básicos de desenho. Juntamente a esses elementos devemos incluir o
contexto físico onde o objeto arquitetônico se integra, dado pelos meios construído e
natural, com qualidades biológicas, climáticas e visuais próprias e ainda o contexto
social, isto é, o âmbito humano com suas características sócio-econômicas e
culturais.
Tudo isso, dentro do processo de ensino do projeto arquitetônico, deve
estruturar-se de forma articulada, justificando o projeto como o centro em torno do
qual gira toda atividade educacional em arquitetura.
CHERVEL (1990), ao pesquisar sobre a história das disciplinas escolares,
aponta a história dos conteúdos como o componente central na construção do
ensinável, isto é:
A transformação pelo público escolar do conteúdo dos ensinos é sem dúvida
uma constante importante na história da educação. Encontramo-la na origem
da constituição das disciplinas, nesse esforço coletivo realizado pelos
mestres para deixar no ponto métodos que funcionem. Pois a criação, assim
como a transformação das disciplinas tem um só fim: tornar possível o
ensino (p. 200).
Nesse texto, buscamos compreender a relação entre o ensino do desenho e
do projeto arquitetônico e alguns conceitos pedagógicos atuais, como a transposição
didática (Chevallard, Perrenoud) e os caminhos irregulares do saber, social e
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culturalmente influenciáveis, e a educação prática reflexiva (Schön), resgatando o
valor do talento artístico.
OS CAMINHOS DO SABER: A TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA
A transformação do conhecimento, que proporciona novas formas de saber,
pode ser explicada, segundo CHEVALLARD (1991), ao considerar que o sistema de
ensino
(que
define
o
saber
ensinado)
pode
envelhecer,
supondo
uma
incompatibilização com seu entorno social. O ensino clássico da arte e arquitetura,
por exemplo, foi sendo lentamente substituído pelas idéias relativas à nova
visualidade, a nova arte, aquela que os artistas do final do séc. XIX e início do séc.
XX vinham descobrindo e propondo.
Mas os artistas não eram os únicos a definir uma nova postura artística. A
sociedade se movia como um todo, definindo em todas as áreas alguma forma de
mudança, respondendo às exigências da revolução industrial. Gropius, através da
Bauhaus, e outras escolas inovadoras tentaram sistematizar as novas idéias de
vanguarda para o ensino da arte e arquitetura que, apesar de continuarem a ser
discutidas até hoje, lançaram as bases para este novo saber.
Não poderíamos afirmar que o ensino clássico da arte empobreceu ou
morreu. Ao contrário, o que hoje denominamos de tradição clássica, que durou
praticamente quatro séculos (considerando desde as primeiras academias até o
período Neoclássico), ainda subsiste como referencial de valores para o ensino da
arte. Aos poucos, porém, essa tradição começou a sofrer desgastes. À medida que
começaram a surgir novas atitudes diante da arte e de seus processos criativos, o
modelo acadêmico começou a ser contestado, e hoje, a maioria dos cursos de arte
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no Brasil, “acabaram atuando de maneira híbrida, entre a tradição e a inovação e
suas propostas pedagógicas acabam por receber influência de ambas as
tendências” (CAMARGO, 1997, p. 56).
Visando uma melhor compreensão deste processo de mudança que ocorre
com o ensino da arte e da arquitetura, utilizamo-nos dos conceitos de transposição
didática que se apresenta como um caso especial da transposição dos saberes,
dentro de um sentido mais genérico da evolução do conhecimento. Apesar de se
atentar para a recente evolução teórica deste conceito, ainda em construção, a
transposição didática pode nos ajudar a entender o processo de formação dos
saberes para o ensino da arte e arquitetura.
A transposição didática é definida por PERRENOUD (1999) como
a sucessão de transformações que fazem passar da cultura vigente em uma
sociedade (conhecimentos, práticas, valores, etc) ao que dela se conserva
nos objetivos e programas da escola e, a seguir, ao que dela resta nos
conteúdos efetivos do ensino e do trabalho escolar e, finalmente – no melhor
dos casos -, ao que se constrói na mente de parte dos alunos (Verret, 1965;
Chevallard, 1991; Develay, 1992; Arsac et al., 1994; Raisky e Caillot, 1996)
(p.73).
CHEVALLARD (1991) nos apresenta três tipos de saberes, com os quais se
pode analisar a transposição didática: o saber científico (sábio), que sofre certas
influências externas e que o transforma, para que seja possível de ser ensinado, o
saber a ensinar (inicialmente designado como o que deve ser ensinado) e o saber
ensinado. O processo projetual em arquitetura pode ser analisados dentro desses
tipos de saberes, pois a escola de arquitetura é uma instituição enraizada na
sociedade, que participa ativamente da percepção, da construção e da difusão de
saberes.
O sistema didático, composto pelos professores, alunos e saber ensinado,
possui um entorno imediato constituído pelo sistema de ensino, que são os meios de
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regulação e que asseguram a formação do conjunto dos sistemas didáticos. Esse
sistema de ensino é envolvido e influenciado pela sociedade, formada por vários
outros grupos, como os cientistas, autores de livros, especialistas, acadêmicos e a
instância política, como o Ministério da Educação. Para CHEVALLARD (1991) o
saber ensinado, quando ultrapassado, ao se aproximar novamente do saber sábio, o
dos especialistas, revela a origem do processo de transposição didática. Isto se dá
como um conjunto de modificações globais e locais, de impressionante
complexidade, que procuram restabelecer a compatibilidade entre o sistema de
ensino e seu entorno, entre a sociedade e a escola. O restabelecimento da
compatibilidade entre sistema e entorno se dá tradicionalmente através dos métodos
e dos conteúdos. Para o professor, uma das ferramentas essenciais de sua prática é
o texto do saber. Por meio dele, o professor pode atuar para modificar os efeitos do
ensino ou para corrigir o que segue sendo patológico, ou carente de atenção.
A REFLEXÃO COMO PRÁTICA DO ENSINO
.Quando falamos sobre a transposição didática, supomos necessariamente o
professor como um profissional capaz de enfrentar problemas complexos e
inusitados da vida escolar, que resolvem situações incertas e desconhecidas, que
elaboram e modificam rotinas, que utilizam o conhecimento e a técnica de forma
integrada e criativa. Esta capacidade é analisada por SCHÖN (2000), como um
processo de reflexão-na-ação ou como um diálogo reflexivo com a situação
problemática concreta, e denomina-se conhecimento prático.
O conceito da prática reflexiva surgiu em meio à crítica generalizada contra a
racionalidade técnica, que ao invés de considerar a atividade docente como
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exclusiva e prioritariamente técnica, passou a encará-la como uma atividade
reflexiva e artística, na qual cabem algumas implicações concretas de caráter
técnico (GOMEZ, 1992, p. 97). Sobre isso ALARCÃO (1996), professora de Ciências
da Educação em Portugal, afirma: “Perscruta-se se a mensagem indiciadora de um
possível novo paradigma se esconde por detrás da prática da reflexão, atitude que
nos relança para os valores do humano, que insistentemente teimam em vir respirar
à tona da água num mundo vincadamente poluído pelo racionalismo técnico” (p. 15).
Dewey, filósofo americano que influenciou o movimento pedagógico do início do
século, é um nome de referência quando se trata de oposição ao chamado ensino
tradicional, cujos fatores de obediência, submissão e passividade dos alunos
encobriam valores de iniciativa e autonomia. Esse filósofo, também professor e autor
de vários livros, fundou uma escola laboratório, que se opunha à organização
curricular por disciplinas e propunha um programa aberto, caracterizado pela
resolução de situações problemáticas cotidianas, acentuando o valor instrumental e
operativo do conhecimento. Dewey constrói então a idéia do pensamento reflexivo,
como sendo “a espécie de pensamento que consiste em examinar mentalmente o
assunto e dar-lhe consideração séria e consecutiva”, onde “as partes sucessivas
derivam umas das outras e sustentam-se umas às outras” (apud ALARCÃO, 1996,
pp. 45-46).
Em relação a isso, PERRENOUD (2002, p. 15) explica, compartilhando da
mesma idéia de CHEVALLARD, que a ciência (saberes teóricos) por si só não
oferece uma base de conhecimento suficiente para muitos problemas que aparecem
na profissão, quer dizer, o saber estabelecido pela pesquisa é necessário, mas não
suficiente. A referência ao profissional reflexivo é uma forma de reabilitação da
intuição e da inteligência prática.
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A reflexão não é apenas um processo psicológico individual, ela “implica a
imersão consciente do homem no mundo da sua experiência, um mundo carregado
de conotações, valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afetivas,
interesses sociais e cenários políticos. A reflexão não é um conhecimento puro, mas
sim um conhecimento contaminado pelas contingências que rodeiam e impregnam a
própria experiência vital” (GOMEZ, 1992, p. 97).
Existem três conceitos diferentes que, segundo SCHÖN (2000), integram o
pensamento prático: o conhecimento-na-ação, a reflexão-na-ação e a reflexão sobre
a ação e sobre a reflexão-na-ação. O professor competente atua refletindo na ação,
criando e experimentando através do diálogo que estabelece com a realidade. Ele
constrói o seu próprio conhecimento profissional, o qual incorpora e ao mesmo
tempo transcende o conhecimento emergente da racionalidade técnica.
Neste caso a prática, que é um tipo de saber não oriundo da ciência, adquire
um papel central no processo de ensino e aprendizagem. No ensino do projeto
arquitetônico, a prática (saberes em ação) se define como a simulação da realidade.
Por um lado deve representar a realidade, em toda sua complexidade, sua
singularidade e conflitos e por outro deve demonstrar ao aluno os efeitos muitas
vezes irreversíveis que resultariam das ações reais, ajudando-o a tomar certas
decisões, para que possa evoluir no processo do projeto.
Em seu contexto técnico e artístico, social e culturalmente vinculado ao
momento histórico, a arquitetura tem na prática da reflexão um dos valores
essenciais para o desenvolvimento do projeto. Ao realizar um projeto de arquitetura
temos a oportunidade de encarnar o que os grandes pedagogos alegam ser uma
postura reflexiva, envolvidos pela paixão por compreender, pelo constante ir e vir
entre teoria e prática, pela obsessão por ajustar, pela ação de observar, levantar
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hipóteses, calcular, procurar caminhos, cogitar, observar, refazer, deliberar, meditar,
etc. Tudo isto realizamos de uma forma bastante espontânea, pois neste sentido a
reflexão é uma competência que adquirimos ao longo da vida, de forma natural, em
nosso dia-a-dia. O sentido de prática reflexiva, desenvolvido por SCHÖN (2000),
significa liberdade para aprender através do fazer, é profundo e consciente e remete
a dois processos mentais distintos, mas que se interrelacionam: a reflexão na ação e
a reflexão sobre a ação. PERRENOUD (2002) explica sobre essa teoria:
...refletir durante a ação consiste em se perguntar o que está acontecendo
ou o que devemos fazer, qual é a melhor tática, que desvios e precauções
temos de tomar, que riscos corremos, etc. Refletir sobre a ação já é algo
bem diferente. Nesse caso, tomamos nossa própria ação como objeto de
reflexão, seja para compará-la com um modelo prescritivo, o que
poderíamos ou deveríamos ter feito, seja para explicá-la ou criticá-la. (...)
Portanto a reflexão não se limita a uma evocação, mas passa por uma
crítica, por uma análise, por uma relação com regras, teorias ou outras
ações, imaginadas ou realizadas em uma situação análoga (pp. 30-31).
SCHÖN (2000) também não elimina a solução técnica de problemas, mas
esclarece que é através da designação e da concepção que as soluções técnicas
tornam-se possíveis.
A
PRÁTICA
REFLEXIVA
NO
ENSINO
DE
DESENHO
E
PROJETO
ARQUITETÔNICO
Dentro do ensino de arquitetura, a prática do projeto arquitetônico se dá
como uma simulação do trabalho do profissional. Procura-se passar ao aluno um
processo de trabalho com o qual ele poderá desenvolver qualquer projeto. A
complexidade do trabalho aumenta com o desenrolar do curso.
O processo de projeto é descrito a seguir baseado nas observações de
SCHÖN (2000) no âmbito de um ateliê de arquitetura: é uma forma de conversação
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reflexiva com a situação, que abrange três dimensões importantes: 1) os domínios
da linguagem nos quais o aluno de arquitetura descreve e aprecia as consequências
de suas ações, 2) as implicações que ele descobre e segue, 3) suas mudanças de
postura em relação à situação com a qual ele conversa.
O meio para a reflexão-na-ação é o mundo gráfico utilizado por ele: o papel
na prancheta ou o computador. A medida que o desenho vai sendo realizado,
tomando forma, ele vai revelando qualidades e relações não imaginadas de
antemão. As ações podem funcionar como experimentos que possibilitam a correção
de erros e o reconhecimento de resultados antes inesperados. Para que o mundo
desenhado realmente sirva de contexto para o experimento, o aluno deve adquirir
certas competências e capacidades de avaliação. Uma das principais é aprender as
tradições do meio gráfico, as linguagens próprias e as notações, ou seja: aprender a
desenhar. Com isso ele enxergará o mundo real através do desenho.
Os mundos virtuais (o desenho) oferecem, através do experimento, a
reflexão-na-ação. Enquanto o desenho vai sendo elaborado, construído, evoluído, o
aluno desenvolve a capacidade da reflexão-na-ação, chamada por SCHÖN (2000)
de talento artítistico. Neste caso, a prática “assemelha-se à pesquisa, sua
investigação é uma transação com a situação, na qual conhecer e fazer são
inseparáveis. A prática, assim, não é apenas uma complementação do processo de
ensino-aprendizagem” (p. 70).
Para podermos entender a relação da teoria do ensino prático reflexivo com
o ensino de arquitetura é importante esclarecer mais algumas características do
projeto arquitetônico, uma vez que o autor usa o próprio ateliê de arquitetura como
uma das fontes de sua pesquisa. Uma destas característica diz respeito a um
paradoxo revelado por SCHÖN (2000): “O estudante não pode inicialmente entender
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o que precisa aprender; ele pode aprendê-lo somente educando a si mesmo e só
pode educar-se começando a fazer o que ainda não entende” (p. 69).
A complexidade do processo de projeto é dada pelo número alto de
variantes que ele contém: o programa, os fatores climáticos, o relevo do terreno, a
implementação no contexto urbano, os valores estéticos, etc. São os códigos e as
mensagens próprias do falar arquitetonicamente. A dificuldade diminui com o tempo
de estudo e a boa comunicação entre professor e aluno deve ser desde o início um
objetivo comum. O diálogo entre eles pode acontecer no “contexto de uma tentativa
de desenhar do estudante; faz uso de ações, bem como de palavras, e depende da
reflexão-na-ação recíproca. Um instrutor tem muitas maneiras de dizer” (SCHÖN,
2000, p. 86).
Com isto nos remetemos novamente aos conceitos sobre a transposição
didática de CHEVALLARD (1991), onde o saber sofre certas modificações no
transcorrer do processo de ensino. O saber é passado de professor ao aluno
conforme sua experiência docente e profissional. Cada professor na situação de
instrutor de ateliê age provavelmente de forma diferente sobre determinado assunto.
As situações nesse processo específico são as mais diversas. Os alunos também
encontram-se em diferentes graus de conhecimento e experiência. E não há formas
de se controlar como todo o saber caminha nesse processo de refletir-na-ação. Ou
mesmo: “A instrução pode conter uma descrição que não seja específica o
suficiente, ou pode não ter o tipo de especificidade que seja adequada às
necessidades do saber do estudante” (SCHÖN, 2000, p. 87).
De qualquer forma, a relação entre professor e aluno depende da vontade
de ambos buscarem entender os significados específicos da arquitetura através de
um diálogo de reflexão-na-ação recíproca. A reciprocidade da reflexão significa que
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tanto o professor como o aluno, devem tentar diminuir a distância inevitável do
conhecimento sobre a linguagem do projeto, seus códigos e significados
particulares. O professor deve antes refletir sobre aquilo que já conhece e já sabe
como resolver, “tentando tornar explícito, a si mesmo, os procedimentos que
desenvolve espontaneamente e, então, deve tentar antecipar e clarear as
ambiguidades que o ouvinte poderá encontrar em sua descrição. Toda tentativa de
produzir uma instrução é um experimento que testa tanto a reflexão do instrutor
sobre seu próprio ato de conhecer-na-ação como sua compreensão das dificuldades
dos estudantes” (SCHÖN, 2000, p. 88).
É importante que o professor perceba as dificuldades do aluno e também
seus potenciais a serem desenvolvidos, a partir dos esforços tanto na execução do
processo como após sua intervenção, para verificar de que forma o aluno está
captando sua linguagem. Com o tempo o aluno deverá ter adquirido mais controle
sobre o processo. O importante é encorajá-lo a produzir suas intenções no projeto,
onde uma certa disciplina proporciona o desenvolvimento e a apreciação regula a
experimentação: “o processo da prática arquitetônica como uma forma de
experimentação auto-dirigida” (SCHÖN, 2000, p. 119).
REFLEXÃO FINAL
No que diz respeito às diferentes formas de expressão e percepção visual, o
saber traçou historicamente um longo caminho. A Nova Visualidade, que emergiu no
início do século XX, revelou uma verdadeira revolução na forma de ver e entender a
arte e também a arquitetura.
Os conteúdos sobre o desenho e a percepção visual revelam alguns passos
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do processo de transformação que vem ocorrendo neste campo de conhecimento.
No Curso de Arquitetura e Urbanismo eles proporcionam a base para a
compreensão e aprendizado do projeto arquitetônico e requerem uma constante
reflexão.
A compreensão do conceito sobre a transposição didática nos ajuda a traçar
caminhos na direção de um ensino de Arquitetura consciente e historicamente em
constante processo de refinamento. A teoria sobre o ensino prático reflexivo resgata
a importância do talento artístico, proporciona um exercício da inteligência e uma
nova forma de saber.
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